Resumo:A comercialização de peixes ornamentais marinhos (POMs) e sua relação como conceitos de sustentabilidade preocupam os pesquisadores. Análises indicam que a manutenção da exploração é inversamente proporcional à capacidade de suporte do meio ambiente, como pode ser observado em espécies como Zebrassoma flavescens e as do gênero Amphiprion, que foram inobservadas presenças em determinadas áreas de habitat natural, uma vez que o mercado multimilionário de peixes ornamentais para aquários teve preferência por essas espécies durante um longo tempo. A fiscalização efetiva deve pautar-se em pesquisas e leis que contemplem a necessidade de se verificar e regular a explotação de POMs no Brasil. Quantitativos são estabelecidos sobre sistema de cota/ano/empresa autorizada, sendo verificada uma relação de preocupação quanto à sobre-explotação do estoque natural, como é o caso das espécies nacionais do gênero Hippocampus. Diversas são as leis e decretos que tratam da matéria, porém de acordo com órgãos internacionais de fiscalização o controle do trânsito das espécies nacionais é ineficaz, sendo o repasse de informações defasado em 50% do que realmente é informado via Guia de Trânsito de Peixes com Fins Ornamentais e de Aquariofilia (GTPON), quando comparamos às informações da CITES.
Palavras chave: Exploração, Leis, Mercado, Peixes ornamentais marinhos
Abstract: Sales of marine ornamental fishes (OMFs) and its relation to sustainability concepts care researchers. Analyzes indicate that the maintenance of exploration is inversely proportional to the support capacity of the environment as can be observed in species as Zebrassoma flavescens and the genus Amphiprion, what were not seen in determined areas of natural habitat. The multimillionaire market of ornamental fish for aquariums had preference for these species for a long time. Effective oversight must be based on research and laws that contemplate the need to check and regulate the exploitation of OMFs in Brazil. Quantitative systems are established by quota / year / authorized company and verified a relationship of concern about over-exploitation of the natural stock, as is the case of the national species of the genus Hippocampus. There are several laws and edicts dealing with the matter, but according to the international supervisory the transit control of national species is ineffective and the transfer of information is lagged by 50% than it is informed via Transit Fish Guide for Ornamental and Aquarium Hobby (GTPON) when compared to information from CITES.
Keywords: Exploration, Laws, Market, Ornamental Marine Fishes
Sumário: Introdução.1. Gestão da exploração de POMs.1.1. Desenvolvimento de informações sobre a exportação de POMs.1.2. A participação do Brasil no mercado mundial. 2. Controle da exportação.2.1. Dados de controle da exportação de POMs. Conclusão. Referências.
Introdução
Em um panorama geral, a relação de exportadores de peixes para o abastecimento do mercado multimilionário de venda de peixes ornamentais faz com que o Brasil seja um dos países que figuram entre os 5 primeiros no ranking de fornecedores, sendo a Indonésia e as Filipinas os mais importantes, seguido de cerca de outros 45 países que em conjunto desenvolvem o mercado com aproximadamente 1.000 espécies (Wood, 2001a).
O comércio de espécies do litoral brasileiro é, na realidade, voltado para exportação, podendo ser encontrado cerca de 120 espécies recifais em aquários por todo o mundo, tendo o inchaço do mercado ocorrido a partir do meado da década de 1990 (Gasparini et al., 2005). Quando observado o quantitativo de espécies comercializadas, verifica-se a pertinência de 75 espécies mais exploradas, sendo em torno de 10% raras (8 espécies) e outras 26 endêmicas das costas brasileiras, além de outras55 que apresentam complexas estratégias reprodutivas (Gasparini et al., 2005). Consequentemente, por o Brasil estar em uma posição favorável ao abastecimento do mercado mundial de peixes ornamentais marinhos (POMs), temos 10 espécies mais exportadas, sendo direcionadas principalmente ao mercado dos EUA e Comunidade Europeia.
Dentre essas espécies podemos citar as mais procuradas como sendo o Parú ou Peixe-frade (Pomacanthus paru e P. arcuatus), o Tricolor (Holacanthus tricolor) e o Ciliares (Holacanthus ciliaris). Temos espécies menos comerciais, como o Borboleta (Chaetodon striatus) e o Sargentinho (Abudefdul saxatilis), que são ou de difícil manutenção ou seu convívio em ambiente confinado se torna complicado, além de não apresentarem um dos atrativos para ser um peixe ornamental que é a coloração exuberante (Sampaio e Rosa, 2005; Nottingham et ali., 2005a; Floeter et al.,2006; Sampaio e Nottingham, 2008).
A regulação desse mercado se dá no Brasil através da simbiose existente entre diversas leis e derivados de leis (decretos e instruções normativas), a fim de desenvolver uma melhor relação entre o que podemos difundir para um melhor entendimento e controle da apanha de exemplares da fauna marinha para fins de ornamentação. O Direito Ambiental (e suas diversas faces) entra como principal ator na fusão entre as regulamentações legais, tendo como base o desenvolvimento da mesma através das difusões da Constituição Federal de 1988, fazendo com que a diversidade de legislações consiga ser compreendida, formando uma relação possível entre as necessidades econômicas nacionais (e mundiais) e as necessidades ambientais existentes. Porém, trata-se do conjunto delas para que o controle se torne eficaz, via menção do Código de Pesca (Decreto-lei 221/1967), da Lei de Proteção a Fauna (5.197/1967), da Política Nacional do Meio Ambiente (6.938/1981) e da Lei de Crimes Ambientais (9.605/1998), por exemplo, além da Instrução Normativa nº 202/2008 (IN 202/2008).
Para auxiliar o manejo e conversões dessas leis e decretos regulamentadores, temos o Decreto-lei 76.623/1975, que estabelece a CITES (Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção), tendo como função criar licenças e controle sobre as importações e exportações que, junto ao IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e as autoridades científicas, elabora um guia para tornar possível e sustentável a coexistência econômico-social e ambiental da utilização dos recursos naturais, principalmente o comércio de espécies de peixes ornamentais marinhos. Mas será que isso é possível? De que forma isso ocorre?
1. Gestão da explotação de poms
Ao analisar o comportamento do mercado de piscicultura de peixes ornamentais brasileiros, existe a real possibilidade de um panorama de vínculo com a sustentabilidade, sendo possível manter a representatividade nacional no mercado mundial, sem esquecer da sustentabilidade da piscicultura (Monteiro-neto et ali., 2003). Os peixes ornamentais dulcícolas correspondem cerca de 90% do comércio, devido sua facilidade de cultivo e piscicultura (Livengood e Chapman, 2007). Por outro lado, quando falamos em espécies marinhas ornamentais, percebe-se que o Brasil é um dos maiores expoentes no abastecimento deste mercado, principalmente Estados Unidos da América e Europa (nesse caso, Alemanha, Inglaterra e França, principalmente), mas não apresenta quantitativo elevado de cultivo como o de espécies de água doce, tendo alcançado sucesso na piscicultura apenas de Neon Goby (Elacatinus fígaro) e Cavalo Marinho (Hippocampus reidi), com liberação para comercialização apenas para última espécie (Gasparini et al., 2005; IBAMA, 2008; Nottingham et ali., 2005; Monteiro-neto et ali., 2003; Wood, 2001a).
A relação de declínio das espécies de peixes consideradas ornamentais envolvidas e o estoque mundial são estabelecidos na forma como as políticas governamentais tratam do assunto, fazendo parecer como se os problemas e os recursos referentes ao controle da extinção dos POMs sejam intrínsecos à forma como o assunto é tratado (Hoof, 2010). Nesse caso, infelizmente estamos falando de um tratamento como se a referida pauta não fosse um bem comum, mas um patrimônio sem a menor relevância.
As soluções faladas são diversas, as identificações das espécies, por mais que carentes de estudos atualizados e/ou de relevância, são tidas, mas quando se fala em definir soluções sustentáveis ao comércio, empaca-se nas relações sociais, nos impactos causados na economia e no não desenvolvimento de políticas de conscientização da sociedade, em um nicho econômico embasado no fatal insucesso a curto prazo. Para dar início ao processo de equidade, deve ser estabelecido entre as agências governamentais que controlam o desenvolvimento das atividades de pesca e venda de espécies ornamentais um melhor controle e repasse das informações, de forma coerente, buscando-as a partir dos comerciantes, formando uma gestão co-participativa. Dessa forma, utilizando de informações e características de trabalho específicas, a co-participação real faz com que as esferas governamentais e comerciais passem a trabalhar juntas, produzindo conceitos e condições de mercado, de forma a executar melhor a gestão dos recursos naturais (Hoof, 2010).
Uma das formas de se melhorar a gestão de espécies, principalmente às de maior relevância para a ornamentação de aquários (que são, na maioria dos casos, as recifais) é a produção de legislação específica para o controle da pesca de tais espécies (Floeter et al., 2006). Tal motivo baseia-se no conhecimento de que os ambientes naturais recifais são conhecidos pela sua dinâmica e ciclagem de matéria e energia entre os estratos da teia alimentar, muitas das vezes as espécies recolhidas são as carnívoras de topo de cadeia ou as herbívoras, que por sua vez têm tanta importância quanto as suas antagônicas.
Ao redor do mundo temos políticas que controlam desde a limitação do número de coletores, volume de exportação até o desenvolvimento de quotas para controle da exploração de espécies, sendo este último específico para cada uma das espécies (observando principalmente as espécies taxadas como em perigo de extinção/raras/espécies-chave), e não vinculando a quota pela pertinência comercial, como encontramos no Brasil, inclusive pela escassez de pesquisas e interesses econômicos diferentes (Wood, 2001b; Sampaio e Nottingham, 2008).
Devido ao grande fluxo e suporte ao mercado tanto nacional quanto internacional, é permitida pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis) a coleta de 136 espécies de peixes marinhos utilizados para fins de aquarismo, ambas definidas através da Instrução Normativa 202, de 22 de outubro de 2008 (IBAMA, 2003; IN 202, 2008). Porém, não existem dados perfeitos ou de qualidade que consigam quantificar o montante de exemplares coletados, uma vez que os dados e informações perpassam a razão existente entre o que está no papel e o que é realidade, fazendo com que possamos concluir que o controle realizado até então é ineficiente ou se faz ineficiente, favorecendo o descontrole das espécies comercializadas, quantidade de exemplares e origem/destino das mesmas, além do escoamento de espécies com nomes alterados, propiciando o abastecimento dos mercados, principalmente internacionais, de forma clandestina (Sampaio e Nottingham, 2008; Floeter et al, 2006; Gasparini et al, 2005; Monteiro-neto et ali., 2003; Sampaio e Rosa, 2005; Nottingham et ali., 2005a).
1.1. Desenvolvimento de informações sobre a exportação de POMs
Organizações como o GMAD (Banco de Dados Mundial de Aquário Marinho – Global Marine Aquarium Database), FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação – Food and Agriculture Organization), UNEP (Programa Ambiental das Nações Unidas – United Nations Environment Programme) e a IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza – International Union for Conservation of Nature), são tidas ainda como poucos ambientes que apresentam informações sobre o assunto, sendo importante quando tentamos averiguar o caso discutido, porém a maioria das pesquisas vincula suas informações à CITES. As tendências mercadológicas apontam que, mesmo sem números concretos, o Brasil ocupa uma importante posição no abastecimento do mercado internacional de espécies de indivíduos marinhos, colocando-se como responsável por aproximadamente metade da exportação de peixes e invertebrados, vinculado o comércio de exemplares vendidos nos Estados Unidos da América (E.U.A.) e em toda a Comunidade Europeia (C.E.), representados para fins de comércio pelos países Inglaterra, Alemanha e França (Gasparini et al., 2005).
Acordos como a CITES promovem o controle regulatório sobre os movimentos de exportação, importação e reexportação de espécies (partes ou derivados). Existe uma relação entre a forma como se dá esse trânsito de indivíduos via controle por emissão de licença, onde a mesma só é adquirida a partir do momento que é constatada, via autoridade científica produtora de pareceres, a não intervenção ou influência da comercialização pretendida diante ao impacto prejudicial à espécie analisada. De acordo como material exposto no site da CITES, atualizado em 22 de dezembro de 2011, temos um quantitativo de 15 espécies de peixes no apêndice I (Appendix I) e 81 espécies no Apêndice II (Appendix II), onde encontramos Hippocampus spp., mundialmente conhecida por serem alvos durante a pesca sobre várias formas, podendo ser direta ou indireta (IBAMA, 2012).
1.2. A participação do Brasil no mercado mundial
Em uma investigação apenas no comércio do Ceará foi observada a comercialização de 143 espécies e um montante de 199.304 peixes foi comercializado apenas neste estado no ano de 2003. Deste total, 84% eram espécies nativas e outros 16% não tinham licença para exportação. Além disso, quase 90% do comércio foi direcionado para o mercado internacional, o que, comparando aos números oficiais, fazem com que tenhamos uma relação de subestimação do real valor explotado (Monteiro-Neto et ali., 2003).
Para se ter uma ideia do montante de exemplares de uma mesma espécie, segundo o GMAD 2.200 Parus (Pomacanthus paru) foram importados pelos E.U.A. e C.E. entre 1995-2000, sendo o dado exposto 10 vezes menor que o que apenas o estado do Ceará exportou na mesma época, onde o quantitativo chegou a 22.969 exemplares (Monteiro-neto et ali., 2003).
Segundo estudos, as capturas de peixes marinhos para ornamentação de aquários chegam a ser de 90% de origem natural para o total comercializado, se tornando insustentável para os parâmetros de quotas atuais realizados (Floeter et al., 2006; Sampaio e Rosa, 2005; Gasparini et al., 2005; Nottingham et ali., 2005a; Monteiro-Neto et ali., 2003). O volume da explotação apresenta um valor astronômico, sendo que em um estudo acompanhado 91,02% dos peixes coletados eram Holacanthus ciliaris e Pomacanthus paru, onde se observa respectivamente 60,47 e 30,55 % para as espécies em uma coleta com 21 embarques, 2.717 exemplares coletados diversos e média de 129,4 peixes por embarcação removidos em Fortaleza, estado do Ceará (Nottingham et ali., 2005a). A base nacional para a captura das espécies envolve os estados do Ceará, Pernambuco, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina, sendo o primeiro o mais citado em pesquisas.
2. Controle da exportação
Das empresas autorizadas a exportar peixes ornamentais marinhos no ano de 2012 pelo IBAMA, até a presente data e segundo investigação junto a Coordenação dos Recursos Pesqueiros (COREP/IBAMA), foram atuantes no processo de remessa de peixes ao exterior 10 empresas, sendo as mesmas sediadas em Belém (PA), Vitória (ES), Salvador (BA) e Fortaleza (CE), fortalecendo a ideia de esses estados estarem envolvidos na rota de exportação e comércio de POMs. Não foram informados dados quantitativos das referidas remessas, porém confirmou-se o não envolvimento, até presente data, dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo em remessas de POMs (com.pess.).
A Instrução Normativa nº 202, de 22 de outubro de 2008 (IN 202), estabelece as regras para a explotação de peixes nativos ou exóticos com finalidade de ornamentação e aquariofilia oriundos de águas marinhas e estuarinas, tendo o apoio do Decreto nº 6.514/2008 para sancionar e qualificar as infrações cometidas. Nela, estabelece-se a forma e local onde podem ser removidos exemplares para fins de comercialização, mostrando em anexo às espécies que podem ser comercializadas. Observa-se um cuidado quanto ao local, uma vez que fica proibida a extração de indivíduos que estiverem localizados em bancos e ilhas oceânicas, levando em consideração que os mesmos são locais para desenvolvimento reprodutivo da biota. Quaisquer espécies que não estiverem listadas no anexo da IN 202/2008 estão terminantemente proibidas de serem comercializadas para fins de ornamentação e aquariofilia, ficando vinculadas às regulamentações federais específicas para tais finalidades.
Outra base legal é a Lei de Crimes Ambientais (9.605/1998) e o Decreto-lei 3.179/1999, que regulamentava a lei citada, desenvolvendo características que dão capacidade a ela de punir com multas somada a detenção ou reclusão, porém ele foi revogado e substituído via Decreto 6.514, de 22 de julho de 2008.
Nos termos da Instrução Normativa nº 202 (I.N. 202), para que haja a prática de exportação e importação de espécies de peixes marinhos ornamentais, a mesma deve seguir alguns critérios, como a utilização de embalagens que permitam a visualização dos exemplares para fins de fiscalização (art. 7º, § 4º), porém nada fala sobre as condições de armazenamento desses seres vivos. Verifica-se que para que possam ser exportados, os peixes são confiados em embalagens plásticas transparentes (sacolas plásticas), porém as mesmas não são capazes de controlar os compostos amoníacos que são desenvolvidos durante o período de confinamento e transporte. Relatos indicam que os peixes ficam confinados por até 10 dias, levando em consideração o período de preparação, embalagem, transporte até o aeroporto, checagem da remessa pela fiscalização, chegada até a aduaneira de destino, liberação da mesma e soltura dos exemplares nas lojas/empresas (Nottingham et ali,2005a).
Dentro das necessidades para transporte e comercialização, o interessado deve levar em consideração os seguintes quesitos dispostos como a Guia de trânsito de peixes com fins ornamentais e de aquariofilia (GTPON) e o Registro de Exportação (R.E.), além de relacionar a atividade com as demandas da CITES. De acordo com o anexo I da IN 202/2008, existe um quantitativo que pode ser utilizado para fins de comercialização (Cotas = nº indivíduos/ espécie/ ano/ empresa), onde são estabelecidas as quantidades de exemplares de cada espécie permitidas a comercialização anual por cada empresa que trabalha com esse tipo de serviço.
Outra legislação pertinente ao tema é a Lei 11.959/2009 (Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca), onde a mesma dispõe de artigos que definem quais são as formas de exploração de recursos pesqueiros, diferenciando os tipos (art. 2º, I ao VI, XXI e XXII), procedimentos (art. 2º, VII ao XII) e os ambientes aquáticos exploráveis (art. 2º, XIII ao XVIII), as competências governamentais (art. 3º) e a natureza da pesca (art. 8º), além de demais informações.
O grande problema é que quando se analisa as tabelas dos anexos 1 e 2 (Floeter et al., 2006; Nottingham et ali, 2005a) e compara-as a tabela anexada na IN 202/2008. Percebe-se que a maior cota é dada a exatamente às espécies que são mais exploradas. Como exemplo dos percentuais comentados quanto à exploração de espécies, é de se admirar a preocupação dos autores aqui discutidos quando falamos que uma empresa X pode retirar 3.500 indivíduos da espécie Ciliaris, 2.000 Tricolores, 250 de cada espécie de Cavalos Marinhos (H. reidi e H. erectus), 1.500 Centropigues ou 2.500 de cada espécie de Parú (P. arcuatus e P. paru), de acordo com a lista de espécies permitidas de águas marinhas e estuarinas para comercialização encontrada no site do IBAMA.
Dados adquiridos durante pesquisas mostram que a FAO (Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) registrou, no ano de 2004, que foram negociados cerca de 260 milhões de dólares americanos, onde 10% são referentes a peixes ornamentais marinhos, acompanhados de 24 milhões de indivíduos de 1.500 espécies. Informações vindas do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o Brasil teve um montante de 5 milhões de dólares americanos em exportações de peixes ornamentais, onde a maioria era de espécies continentais (Sampaio e Nottingham, 2008).
2.1. Dados de controle da exportação de POMs
Conforme informações coletadas no site da CITES, no ano de 2007, foi comercializado mundialmente um montante aproximado de 406.250 peixes informado pelos exportadores e próximo a 218.750 peixes confirmados pelos importadores. A diferença do real controle existente entre a quantidade que é passada pelos exportadores e o que é reportada pelos importadores chega a ser próximo a 50%.
Analisando os dados fornecidos pela entidade, o comércio brasileiro de peixes brasileiros em 2007 reportou um volume de aproximadamente 3.000 peixes enquanto um pouco mais de 2.000 indivíduos foram citados pelos importadores a CITES. Porém, a maior diferença está no ano de 2008, quando foi reportado pelos importadores um montante próximo a 3.750 peixes, porém o quantitativo definido pelos exportadores foi amplamente superior, totalizando aproximadamente 100.000 exemplares. Acompanhando a linha, percebemos uma aproximação ao final de 2009 e uma inversão entre os exportadores brasileiros e o repasse das informações pelos importadores no ano de 2010.
Observando os dados da CITES em 2008, as espécies ornamentais marinhas Hippocampus reidi e Hippocampus erectus foram as mais comercializadas das brasileiras, sendo um quantitativo aproximado de 17.000 exemplares, com distribuição equilibrada entre elas. Dentre os anos de 2006 e 2010, os Estados Unidos da América importou próximo a 15.000 peixes brasileiros, seguido da Alemanha, Inglaterra e Japão, porém esses com valores inferiores a 2.500 exemplares para cada caso. Outro dado da CITES que confirma a relação de mercado nacional é que o Brasil tem 95,2% do seu comércio de peixes voltado para o mercado ornamental, com próximo a 40.000 exemplares.
Um dos questionamentos está no motivo que levaria a IN 202 ter um número estabelecido de 1.000 indivíduos de diversas espécies, mas quando se tratam das que apresentam maior pressão ambiental pela predação, como é o caso dos Bodianus pulchellus e Bodianus rufus, comparando os dados da tabela do anexo 1 (Floeter et al.,2006) e a lista em anexo I inclusa na IN 202/ 2008. Outra situação preocupante é de que forma foram estabelecidos esses valores, uma vez que a quantidade de dados/pesquisas é ínfima para se estabelecer uma real quantidade de indivíduos por espécies que podem ser coletados sem causar impacto sobre o estoque natural, uma vez que inexistem estudos a respeito da capacidade suporte das espécies, quantificando tais valores. Não são encontrados dados que possam afirmar ou embasar as decisões estipuladas pela IN 202/2008, pois existe uma discrepância entre, por exemplo, os valores indicados pelo IBAMA e a proteção das espécies. Analisando os dados da CITES, verifica-se que em 2008 foram comercializadas próximo a 9.000 unidades de cada espécie de Hippocampus, mesmo ano da publicação da IN 202 e no ano seguinte (2009) o quantitativo comercial caiu pela metade, aproximando-se de 4.500 indivíduos. Porém, se formos calcular a razão entre o último valor e a quantidade permitida pela lista do IBAMA chegaremos a 18 empresas exportando o valor máximo (250 de cada espécie). Acontece que atualmente temos sobre uma passiva proteção o gênero Hippocampus, onde as espécies estão inseridas na Lista Vermelha da CITES desde 2004. Estendendo essa razão a outras espécies, poderão ser expostas as espécies super exploradas Holacanthus ciliares e Pomacanthus paru à condição talvez futura de ameaçado de extinção, assim como temos os atuais casos Elacatinus fígaro e Gramma brasiliensis. A relação da não sustentabilidade é devido a taxa correspondente a morte de exemplares, diagnóstico vinculado ao elevado extrativismo e mortalidade dos exemplares capturados, além das dificuldades em se determinar qual seria a capacidade de suporte para este tipo de exploração (Kodama et ali., 2011).
A exploração maciça ocorre nos estados de Pernambuco e Ceará onde encontramos, respectivamente, o montante de exportação de 96.552 dólares americanos e 32.363 dólares americanos, segundo relatório do IBAMA de 2008, para exploração de peixes ornamentais marinhos (Coe e Araújo, 2010). Nos anos de 1995-2000, as espécies Pomacanthus paru, Pomacanthus arcuatus, Holacanthus tricolor, Holacanthus ciliaris e Hippocampus erectus foram as espécies que dominaram o mercado de exportação no estado do Ceará, sendo estas representantes do montante de 50% do total de espécies comercializadas, onde as espécies H. ciliares e P. paru atingiram 33% do mercado (Coe e Araújo, 2010).
O mercado de POMs no Ceará é proporcional e aproximadamente 3 vezes menor do que o de Pernambuco, porém o primeiro tem registro de 3 empresas cadastradas que são autorizadas a exportar peixes ornamentais marinhos no estado no ano de 2012 (ACLACE – Associação dos Criadores e Lojas de Aquário do Ceará -, com.pess.), sendo que de acordo com o COREP/IBAMA temos a atuação de 5 empresas registradas no referido estado. Dessa forma, vale a observação que para fins de comercialização de POMs no estado do Ceará, seguindo as informações do IBAMA, pode chegar até 12.500 exemplares de Pomacanthus paru, 17.500 de H. ciliares, 7.500 Centropyge aurantonotus e 1.250 indivíduos de cada espécie de Hippocampus, além de 5.000 indivíduos das demais espécies consideradas POMs que são liberadas via IN 202/2008 apenas no estado do Ceará.
O intrigante é quando comparamos com dados de espécies exógenas como o Zebrassoma flavescens que, segundos dados coletados entre 1999 e 2007, houve um decréscimo de 45% nas áreas de abrangência da espécie por conta de sua popularização de seu uso em aquarismo, fazendo com que fossem coletados mais de 1.000 exemplares da espécie durante o ano de 2007, comparamos que apenas um estado explota-se no mínimo 3 vezes o valor que para a espécie comentada, salvo comparação com o gênero Hippocampus, e 10,5 vezes a quantidade de H. ciliares (Stevenson et al., 2011).
Ainda discutindo o comércio no Ceará, houve uma explosão em 1995, aonde as H. ciliares e P. paru chegaram a alcançar a marca dos 75% do volume de exportação, porém ocorreu uma diversificação no mercado em 1997, ascendendo às espécies A. bahianus, G. brasiliensis e P. arcuatus, unindo-se ao H. erectus, onde o montante coletado foi de 100 espécies nativas e 200.000 exemplares até o ano 2000 (Monteiro-neto et ali., 2003; Araujo e Albuquerque-filho, 2005).
Conclusão
A autorização de explotação de espécies nacionais que são consideradas alvos de pressão comercial pode gerar esgotamento. Em casos de sobre-explotação de espécies exógenas como os analisados, a saída dada foi a diminuição na explotação desta espécie, realizada através de controle quantitativo, diminuindo assim a pressão comercial sobre ele e, posteriormente o equilíbrio de seu estoque natural.
De fato o mercado de aquarismo é mundialmente multimilionário, sendo o Brasil uma importante peça da engrenagem, chegando em 2008 a US$ 96.552,00 em remessas de exportação. As leis existentes são até contempladoras para fins de controle da comercialização, mas ainda se é possível verificar que não são claros os estudos de impacto ambiental sobre as espécies explotadas, além de quase 50% das informações sobre trânsito de exemplares não é repassada ao IBAMA. O resultado disso é a sobre-exploração do estoque natural de espécies, que vai desde o Hippocampus ssp.até os com cotas mais elevadas, como é o caso do Holacanthus ciliaris. Diversos autores apontam as espécies Holacanthus ciliaris, Pomacanthus paru, Pomacanthus arcuatus e Holacanthus tricolor como sendo as mais exploradas e, mesmo assim, consta na lista de espécies liberadas para comercialização o volume de 2.000 a 3.500 exemplares dessas espécies para fins de cotas/empresas/ano quando comparadas às demais espécies (salvo Hippocampus spp.).
Países importadores como os Estados Unidos da América desenvolve uma política de controle sobre espécies mais reclusa quanto à explotação, produzindo um quantitativo máximo muito inferior ao aplicado aqui no Brasil sobre 49 espécies quanto a tamanho e volume de quota. Nas Bahamas, a coleta é infinitamente menor, chegando a 50 exemplares de cada espécie (cinco vezes menor do que a quantidade de Hippocampus reidi ou H. erectus observada na IN 202/2008). Porém, quando verificamos a listagem da CITES para fins de acompanhamento de países que importam peixes do Brasil, os EUA está em primeiro lugar, chegando ao montante de aproximadamente 15.000 exemplares, ficando bem a frente da soma das importações da Alemanha, Inglaterra, Espanha e Itália juntas.
Percebe-se a presença em listagem de espécies consideradas pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) como vulneráveis à extinção, sendo elas o Gramma brasiliensis e o Elacatinus fígaro, ambas proibidas comercialmente através da Instrução Normativa nº5/2004 do MMA (Ministério do Meio Ambiente), porém não é difícil encontrar essas espécies em lojas de aquário pelo Brasil, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro.
Já de acordo com o Fishbase e o IUCN, a espécie Balistes vetula é considerada vulnerável, estando na Lista Vermelha da IUCN (IUCN, 2012). Atualmente, via IN 202/2008, não é permitida a comercialização desta espécie.
Entre os anos de 1997-2004, a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo tinha em sua lista de espécies ameaçadas de extinção as seguintes espécies: Chaetodon sedentarius, Centropyge aurantonotus, Gramma brasiliensis, Holacanthus tricolor, Holacanthus ciliaris, Hippocampus erectus e Hippocampus reidi. Em mesma época, salvo a espécie Gramma brasiliensis, não eram proibidas a comercialização de todas as demais espécies via normativa da União IN nº 5/2004, sendo considerada possível a comercialização de espécies como as Hippocampus spp. fora do estado de São Paulo, demonstrando um esforço estadual sobre o que consideramos ser a mola propulsora para a sustentabilidade.
Confirmando sua explotação, H. reidi e H. erectus obtiveram a marca de 15.000 exemplares comercializados entre os anos de 2006-2010, sendo H. reidi presente em Apêndice II da CITES desde 15 de maio de 2004.
Dessa forma, pode-se perceber a presença de forma passiva dos órgãos de controle ambiental legislando sobre um quantitativo sobre-explotado de exemplares da ictiofauna brasileira que não possui informações suficientes para dizer se apenas uma empresa pode comercializar 3.500 indivíduos de uma espécie ou 1.000 de outra.
Percorrendo toda a cadeia de custódia, desde a captura até o consumo final, não se é mensurável a pressão ambiental ocasionada às espécies comercializadas nacionalmente e para fins de exportação, uma vez que muitos exemplares são perdidos por relações de descarte (cerca de 11%).
Hoje, temos 136 espécies liberadas para explotação, mas autores citados mostram que delas duas são consideradas as mais importantes para o mercado, onde Holacanthus ciliares e Pomacanthus paru chegam às marcas em torno de 90% de presença nos estoques de fornecedores. HHEntre 1995-2000, foram exportados somente pelo estado do Ceará 22.969 indivíduos da espécie Pomacanthus paru.
Verificando as relações quantitativas e comparando-as com as informações qualitativas que temos em termos de pesquisas, não se é possível afirmar se a quantidade de exemplares de espécies para fins de comercialização é favorável à manutenção do estoque natural, mas se observa um ganho quanto algumas espécies, onde o famoso Cavalo Marinho foi contemplado. Em 2001, a cota anual era de 5.000 exemplares, mas quando H. reidi entrou na Lista Vermelha do MMA, ou Lista de Espécies de Peixes e Invertebrados Aquáticos Ameaçadas de Extinção, Sobre-explotadas ou Ameaçadas de Sobre-explotação em 2004, o número despencou para 250 exemplares.
É um ganho, mas uma vez a mesma sendo ameaçada de extinção por sobre-explotação, seria interessante suspender a comercialização da mesma, uma vez que de acordo com dados do CITES foi exportado somente em 2008 entre 1.000 e 1.500 exemplares somente da espécie em questão, além de realizar a manutenção da quantidade das demais espécies encontradas na lista da IN 202/2008, pois as informações científicas são ínfimas perante o montante explotado.
No ano de 2012, até a presente data, o IBAMA teve em seu cadastro 10 empresas que realizaram exportação de POMs, sendo 5 no estado do Ceará (Fortaleza), 1 no Pará (Belém), 1 na Bahia (Salvador) e 3 no Espírito Santo (Vitória), mas não foram fornecidos dados sobre quantitativo por espécies e exemplares direcionados ao mercado. Desta forma, o Brasil pode explotar valores extraordinários de 12.500 exemplares de Pomacanthus paru, 17.500 de H. ciliares, 7.500 Centropyge aurantonotus e 1.250 indivíduos de cada espécie de Hippocampus, além de 5.000 indivíduos das demais espécies consideradas POMs, levando em consideração apenas as empresas que realizaram exportações no estado do Ceará no ano de 2012. Se todas as empresas que tiveram suas exportações registradas neste ano utilizassem seus potenciais de quotas ao máximo, que são garantidos pela IN 202/2008, teremos explotado um valor de 35.000 H. ciliares, 25.000 P. paru e outros 5.000 Hippocampus, além das demais espécies (levando em consideração que as citadas são as mais explotadas).
Uma das características do Direito Ambiental está na relação de que na inobservância de dados e informações que façam tal fato/matéria ser conhecida como correta ou válida, é dever dos órgãos impedir ou minimizar ao máximo a utilização dos recursos naturais até que se tenha certeza de que a explotação do mesmo não venha causar prejuízos tanto ao meio ambiente quanto às gerações atuais e futuras. Existe uma relação de precaução, também chamada de cautela jurídica, quando falamos no uso de recursos naturais, sendo necessário observar que a natureza além de ser tratada como res nullius, deve ser preservada para que as futuras gerações tenham condições de acesso a um ambiente saudável e biodiverso. Logo, a explotação de POMs sem informações científicas que tornem relevante o uso do termo “controlado” pode se tornar perigoso devido ao não conhecimento das quantitativas do estoque natural das espécies, bem como suas informações ecológicas.
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Informações Sobre o Autor
Rafael Cruz Lima
Especialista em Gestão Ambiental, Análise Ambiental e Perícia e Auditoria Ambiental, graduado em Biologia e Acadêmico de Direito na Faculdade da Indústria – IEL