O Princípio da Liberdade e o Parto Anônimo no Brasil: Aspectos Jurídicos Perante o Direito de Família

THE PRINCIPLE OF FREEDOM AND ANONYMOUS CHILDBIRTH IN BRAZIL: LEGAL ASPECTS UNDER FAMILY LAW

 

Silvia Letícia Sousa Moura [1]

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Prof. Ma. Francisca Juliana Castello Branco Evaristo de Paiva [2]

Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA

 

Resumo: O presente trabalho busca demonstrar o princípio da liberdade e o parto anônimo no Brasil, relacionando aspectos jurídicos do mesmo perante o direito de família. Analisa-se a conjuntura social na qual se deu a cristalização nos diplomas legais, sobretudo no mérito do Direito de Família, do instituto do parto anônimo, bem como sua repercussão em nosso país, dando ênfase a importância do princípio da liberdade no que se refere à proteção tanto do filho quanto da genitora interessada em aderir àquele instituto. O trabalho foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica com abordagem dedutiva, com o intuito da obtenção das informações necessárias à reflexão e construção textual.  Destaca-se que o parto anônimo apesar da legalização recente no Brasil, não constitui fato novo, sendo oriundo da pratica conhecida como roda dos expostos praticada na Europa durante a Idade Média. No âmbito do Direito de Família, o princípio da liberdade ganhou destaque no processo de desenvolvimento daquele instituto ao respaldar a genitora de possíveis sanções civis e penais, constituindo então opção legal e preventiva quanto a abandonos de incapazes de forma clandestina, preservando então o bem maior do ser humano, a vida.

Palavras-Chave: Parto Anônimo, Família, Liberdade.

 

Abstract: The present work seeks to demonstrate the principle of freedom and anonymous childbirth in Brazil, relating legal aspects of it to family law. It analyzes the social conjuncture in which the crystallization occurred in the legal diplomas, especially in the merit of Family Law, the institute of anonymous childbirth, as well as its repercussion in our country, emphasizing the importance of the principle of freedom in relation to the protection of both the child and the genitor interested in adhering to that institute. The work was developed through a bibliographic research with deductive approach, in order to obtain the necessary information for reflection and textual construction.  It is noteworthy that the anonymous birth despite the recent legalization in Brazil, is not a new fact, coming from the practice known as the wheel of the exposed practiced in Europe during the Middle Ages. In the context of Family Law, the principle of freedom gained prominence in the process of development of that institute by supporting the genitor of possible civil and criminal sanctions, thus constituting a legal and preventive option as to the abandonment of incapacitated people clandestinely, thus preserving the greater good of the human being, life.

Keywords: Anonymous Birth, Family, Freedom.

 

Sumário: Introdução 1. Direito de Família: Aspectos Gerais e Contexto Histórico 1.1 Princípios 1.1.1 Dignidade da pessoa humana 1.1.2 Paternidade responsável 1.1.3 Melhor Interesse da Criança 1.1.4 Liberdade 2 Direito de Família e Parto Anônimo 2.1 Da Roda dos Expostos ao Parto Anônimo nos Dias Atuais 2.2 Projeto de lei 2.747/2008 2.3 Projeto de lei 2.834/2008 2.4 Projeto de lei 3.220/2008 3 O Parto Anônimo em nosso Ordenamento Jurídico e o Princípio da Liberdade. Conclusão. Referências.

 

 INTRODUÇÃO

O estudo em tela tem como tema “o princípio da liberdade e o parto anônimo no Brasil: aspectos jurídicos perante o direito de família”. Traz como objetivos analisar a maneira como os princípios da dignidade da pessoa humana, paternidade responsável, melhor interesse da criança e, sobretudo, o da liberdade repercutem no instituto do parto anônimo no Brasil, perante o Direito de Família. Além disso, caracterizar a relação entre parto anônimo e Direito de Família, bem como demonstrar a cristalização do instituto citado em nosso ordenamento.

O trabalho foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica com abordagem dedutiva baseada na análise da literatura já publicada acerca dos temas de Direito de Família, princípio da liberdade, e o instituto do parto anônimo, em forma de livros, revistas, e publicações eletronicamente disponibilizadas na Internet, partindo-se de aspectos gerais da temática abordada para após abordarem-se os aspectos específicos da mesma e formular conclusões de maneira formal.

O artigo foi organizado de forma que em sua parte inicial contemplou aspectos gerais e contexto histórico do Direito de Família, trazendo questões sobre os princípios envolvidos com o instituto em estudo. Em seguida abordou-se o Direito de Família e sua relação com o parto anônimo percorrendo o caminho desde a roda dos expostos até os projetos de Lei da primeira década de 2000. Por fim demonstrou-se a cristalização daquele instituto em nosso ordenamento jurídico como fruto de toda a discussão dos anos anteriores.

A massificação das mídias expôs problemas sociais que antes ficavam restritos ao conhecimento de pequena parcela da população. Dentre eles o abandono de crianças foi bastante evidenciado, trazendo consigo o imperativo por políticas públicas que viessem a solucionar a citada problemática sendo o parto anônimo uma das possíveis soluções.

O presente artigo é de grande relevância, pois constitui um arcabouço de informações tanto para futuras pesquisas por parte da sociedade, pesquisadores e acadêmicos, no que se refere ao desenvolvimento de atividades diversas como teses, artigos, trabalhos científicos, ou meramente a busca por conhecimentos embasados sobre a temática desenvolvida.

 

1 DIREITO DE FAMÍLIA: ASPECTOS GERAIS E CONTEXTO HISTÓRICO

“O conceito de família reveste-se de alta significação psicológica, jurídica e social” (GAGLIANO, 2017, p.1078), sendo ela o pilar em torno do qual se desenvolve a sociedade brasileira, gozando de proteção especial do Estado, fato presente em nossa Carta Magna, no artigo 226, caput, que diz claramente que a família é a base da sociedade. Cabe ressaltar que a nossa Constituição trouxe inovações de conceito familiar como a família plural podendo ser constituída por casamento, união estável, e monoparentalidade. Além disso, garantiu-se dentre outras coisas, a igualdade entre homens e mulheres (MADALENO, 2018). Diversas mudanças foram implementadas, adquirindo a família brasileira outras nuances como explanam Tartuce e Sartori:

“A família homoafetiva foi reconhecida pela jurisprudência. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade da união estável entre pessoas de mesmo sexo e o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a possibilidade do próprio casamento homo afetivo. Nesse sentido, foi aprovada a Resolução 175/2013 do CNJ, que veda aos responsáveis pelos cartórios recusar a “habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo” (2014, p. 298).

As inovações trazidas ao nosso ordenamento jurídico são, como em todos os ramos jurídicos, resultado puro e simples da evolução social que traz consigo novas conjunturas, culturas e anseios, o que fazem o direito estar em contínuo processo de metamorfose e adaptação perante a sociedade. Nesse contexto, o Direito de Família encontra-se intrinsecamente ligado a vivência de todos revestindo-se de importância peculiar, como assevera Gonçalves:

“O direito de família é, de todos os ramos do direito, o mais intimamente ligado à própria vida, uma vez que, de modo geral, as pessoas provêm de um organismo familiar e a ele conservam-se vinculadas durante a sua existência, mesmo que venham a constituir nova família pelo casamento ou pela união estável.” (2017, p. 351).

Configurado como um ramo jurídico dotado de tratamento diferenciado, até mesmo por envolver forte carga sentimental do seio familiar, é importante uma correta compreensão conceitual do Direito de Família, na busca de saber seu real alcance. Sendo o ramo jurídico mais facilmente percebido por cada pessoa em suas atividades sociais, perceber o seu raio de alcance torna-se tarefa essencial como bem explica Gonçalves:

“O direito de família regula exatamente as relações entre os seus diversos membros e as consequências que delas resultam para as pessoas e bens. O objeto do direito de família é, pois, o complexo de disposições, pessoais e patrimoniais, que se origina do entrelaçamento das múltiplas relações estabelecidas entre os componentes da entidade familiar” (2017, p. 352)

Uma breve análise da relação entre família e Estado em nossos diplomas legais, bem como nos trechos expostos acima provenientes de doutrinadores, nos permite em nosso estudo concluir que existe um entrelaçamento entre o protecionismo no que se refere ao interesse coletivo da sociedade, e ao mesmo tempo existe uma autonomia no seio da mesma, desde a sua constituição até, se for o caso, à dissolução.

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O estudo em tela trata a análise da relação entre o princípio da liberdade e o instituto do parto anônimo, na seara do Direito de Família. É uma questão que vem ao longo dos séculos ganhando uma nova roupagem na medida em que os anseios democráticos adquirem importância crescente na sociedade global. Historicamente o Direito de Família sofre mutações relativas ao contexto social de cada época, o que reflete em nossas diversas cartas magnas ao longo do tempo como assevera Madaleno:

“Como antes visto, o Direito de Família sofreu profundas mudanças com o advento da Constituição Federal de 1988, a ponto de ser defendida a prevalência de um Direito de Família Constitucional. No caminho inverso do Código Civil de 1916, formado no espírito da patrimonialização e matrimonialização das relações familiares, o novo texto civil está fincado no desenvolvimento da pessoa humana, princípio basilar da Carta Política vigente […]”

(2018, p.88)

Dessa forma inicia-se uma fase mais humanizada do entendimento das relações familiares. Os laços de afetividade, assim, ganham importância com a introdução de princípios gerais que vem a respaldar o bom convívio no seio familiar. Esta nova roupagem que atingiu o Direito de Família termina por nos apresentar questões sociais inovadoras pertinentes àquele ramo jurídico, como a ampliação do conceito familiar e de relações conjugais, direitos de descendentes, proteção à criança e ao adolescente, bem como às mulheres.

O século XXI caracteriza-se, dentre outras coisas, pela globalização informacional, o que traz à tona do meio jurídico diversas temáticas sociais, antes colocadas em segundo plano até por não haver tanta informação compartilhada ou colocada em forma de dados para análise dos órgãos competentes. Além disso, e na mesma esteira, o anseio democrático em expandir uma qualidade de vida digna a população é outro fator propulsor de estudos acerca de problemas sociais diversos.

A discussão acerca do parto anônimo surge com força na década passada, refletindo o novo contexto histórico brasileiro, onde existe maior exposição nas diversas mídias do abandono clandestino de crianças, que já vem de longa data. Além disso, os nossos diplomas legais, conforme supramencionados, assumem um papel mais protetivo acerca da constituição familiar, sobretudo no que se refere ao bem estar das crianças e seu desenvolvimento saudável com vistas a respeitar os princípios gerais do Direito.

 

1.1 Princípios

De forma geral o Direito como ciência é guiado, dentre outros elementos, por princípios, os quais constituem alicerces que dão corpo as normas nas diversas ramificações jurídicas, sendo que o entendimento sobre o conceito e a importância dos mesmos constitui fator fundamental para iniciar qualquer estudo jurídico. Melo conceitua princípios como:

“Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e sentido servido de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.”

(2009, p. 882-883)

Os princípios gerais de Direito podem tanto servir como base para as normas como podem servir de substrato para inovações das mesmas, e, além disso, suprir as lacunas da lei. No cerne do Direito de Família não é diferente, sendo a discussão de seus institutos, dentre eles aquele que é objeto de estudo do presente trabalho, o parto anônimo, escamoteados por vários deles.

 

1.1.1 Dignidade da pessoa humana

Dignidade deriva do latim dignitas, traduzindo-se em sinônimos como virtude, consideração e honra, entendendo-se como qualidade moral que uma pessoa possui e serve de base para a forma como é tida na sociedade (SILVA, 2014). Em nível global a dignidade como princípio ganhou força após o período da segunda guerra mundial, notadamente como reação ao nazismo e fascismo que trouxeram consigo escravidão, tortura e experiências que ultrapassavam o limite da razoabilidade, expondo então a dignidade humana ao ridículo. A partir da derrocada dos regimes citados as constituições em diversos países europeus incorporaram o mencionado principio dando um caráter mais humanizado aos respectivos diplomas legais. O princípio da dignidade da pessoa humana ganha importância crescente no direito brasileiro após a promulgação da carta magna de 1988. O artigo 1º, inciso III, preceitua que nosso país constitui-se em Estado Democrático de Direito tendo como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana. Novelino ressalta a importância desse princípio:

“Núcleo axiológico do constitucionalismo contemporâneo, a dignidade é considerada o valor constitucional supremo e, enquanto tal deve servir, não apenas como razão para a decisão de casos concretos, mas principalmente como diretriz para a elaboração, interpretação e aplicação das normas que compõem a ordem jurídica em geral, e o sistema de direitos fundamentais, em particular.”( 2016, p. 251)

Ressalte-se que a partir da incorporação e valorização dessa nova forma de encarar o ser humano, há uma passagem dos valores morais para o âmbito jurídico, traduzindo-se na  cristalização na norma. Novelino (2016) argumenta que a pessoa deve ser a razão do pensamento jurídico, sendo que o bem estar da pessoa deve ser o ponto central do esforço jurídico estatal, ou seja, a pessoa não deve ser rebaixada a mero reflexo da ordem jurídica, e sim seu objetivo máximo.

Dessa forma o parto anônimo surge como um dos institutos que consagram o princípio da dignidade humana na medida em que traz uma alternativa juridicamente legal na proteção daquelas crianças renegadas pela genitora, até então histórica e reiteradamente abandonadas de forma clandestina e em condições subumanas no nosso país.

 

1.1.2 Paternidade Responsável

            A Constituição Federal Brasileira de 1988 trouxe diversas inovações, dentre elas a consagração do dever estatal de dar atenção especial à proteção da família, que é a instituição-base da sociedade. No bojo dessa responsabilização diversos princípios ganham força dentre eles o princípio da paternidade responsável como vemos no artigo 226 da nossa carta magna:

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

[…]

  • 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas”

(BRASIL, 2019)

  O Código Civil, da mesma forma, reitera o princípio supracitado, na medida em que o artigo 1.666, inciso IV, aduz ser dever de ambos os cônjuges o sustento a guarda e a educação dos filhos. Os artigos 3º e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente trazem, também, diversas obrigações relativas à paternidade responsável:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

[…]

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

(BRASIL, 2019)

De forma geral depreende-se que a paternidade responsável traduz-se na obrigação dos pais em prover assistência em todas as instâncias aos filhos. Uma breve análise dos diplomas legais citados anteriormente nos permite ver que o legislador vislumbrou como fim, o respeito a todos os princípios fundamentais como a filiação, vida, dignidade da pessoa humana e saúde.

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A paternidade responsável encontra ligação intrínseca com o instituto do parto anônimo, haja vista o caráter protetivo deste para com a criança e a própria genitora que opta pelo trâmite legal de desfazer o laço familiar com o filho. Fazendo isso ela garante que aquela criança possa ter acesso a cuidados que certamente não teria numa família onde é indesejada, e posteriormente poderá vir a ser adotada por outra família que deverá, então, prover todos os meios previstos legalmente às pessoas que querem se responsabilizar por uma criança.

 

1.1.3 Melhor interesse da criança

            Ao longo do tempo a criança passou a ter maior destaque perante a lei, deixando de fazer parte meramente do corpo familiar para ser tratada de forma individualizada em diversas searas. Em um olhar global tal fato é perceptível quando a ONU profere a Declaração Universal dos Direitos da Criança em 1959. Já em âmbito interno, podemos perceber num breve olhar sobre o caput do artigo 227 da nossa Constituição Federal:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” (BRASIL, 2019).

Embora o melhor interesse da criança como princípio geral não esteja expresso claramente nos nossos diplomas, percebe-se em um breve exercício hermenêutico que ele encontra-se diluído nos mesmos. No artigo citado acima, por exemplo, se identifica no legislador a intenção de realmente priorizar a criança no que se refere ao acesso às garantias fundamentais, colocando então os interesses das mesmas em posição privilegiada.

O Estatuto da Criança e do Adolescente também merece destaque no que se refere àquele principio, como por exemplo, em seus artigos 3º, 4º e 5º, que em linhas gerais trazem a prerrogativa que nenhuma criança será objeto de prejuízo quanto a seus direitos fundamentais, atribuindo a família, ao Estado e a sociedade como um todo a responsabilidade de resguardá-los.

O instituto do parto anônimo vem a se relacionar claramente com o princípio do melhor interesse da criança já que o legislador busca uma opção juridicamente legal para remediar a problemática secular referente ao abandono infantil. Dessa forma se o melhor interesse da criança visa à proteção das garantias fundamentais, sendo que a legalização do parto anônimo vai no mesmo sentido, prevenindo então o abandono clandestino e dando uma segunda chance à criança de encontrar uma família onde possa desenvolver-se conforme os parâmetros esperados por nossos legisladores.

 

1.1.4 Liberdade

Historicamente as normas foram criadas para que o Estado condicionasse a liberdade das pessoas aos padrões desejados, porém o próprio Estado não tira a mesma de seus cidadãos, somente impede que um desrespeite a liberdade do outro, visando o bem estar da coletividade. Em outras palavras ela deve ir de encontro à liberdade coletiva. O cidadão é livre para agir conforme suas escolhas, porém se vier a agir de forma nociva causando danos a outros cidadãos sofrerá punição proveniente do poder de imperium do Estado.

O princípio da liberdade vem a garantir que qualquer um escolha livremente seu par, assim como decidir de forma autônoma como pretende constituir, manter ou dissolver a entidade familiar no qual se insere (MÜLLER, 2017). Este mesmo princípio assume relevante papel quando vamos analisar o instituto do parto anônimo, já que a relação entre a genitora, o filho rejeitado, e a atuação do Estado se entrelaçam de forma intrínseca, conforme o caput do artigo 227 da Constituição Federal de 1988 já supracitado anteriormente.

Visto que, percebemos no legislador a intenção de distribuir em todos os níveis da sociedade a responsabilidade sobre as garantias fundamentais relativas às crianças. Nesse sentido, o princípio da liberdade é percebido como um dos norteadores do instituto do parto anônimo, na medida em que se garante à mãe que sua vontade seja respeitada ao optar por este método sem, no entanto, sofrer com a coerção estatal, e dessa forma ela garante ao filho a rejeitado, que possa ter acesso a cuidados necessários ao desenvolvimento saudável.

 

2 DIREITO DE FAMÍLIA E PARTO ANÔNIMO

O Direito de Família, como qualquer ramo jurídico não tem passado imune à evolução humana. A complexidade crescente das relações sociais apresenta novos institutos à doutrina, e sendo o ramo jurídico mencionado aquele que trata dos assuntos mais comumente ligados a nossa vivência cotidiana, o parto anônimo encaixa-se perfeitamente no olhar dos estudiosos da área. Nesse sentido Madaleno diz que:

“O Direito de Família tem presenciado importantes transformações no campo da procriação sem nenhuma função parental. Sentimentos frios e distantes encontram nos ordenamentos jurídicos da França, Espanha e Itália a admissão dos partos discretos e anônimos, outorgando à mulher que tenha dado à luz a uma criança o direito de manter em segredo sua identidade, a ponto de impedir uma futura ação de investigação de filiação e vetar o acesso aos documentos que identifiquem a genitora.” (2018, p.688).

O Brasil é palco histórico do abandono de crianças de forma clandestina, fato causado por diversos fatores, todos ligados a ineficiência de políticas públicas direcionadas a garantir que os direitos fundamentais sejam respeitados e atinjam a sociedade de forma erga omnes. Nem sempre é da vontade dos genitores a existência daquele filho, porém tal fato não justifica o abandono do recém-nascido em local ermo expondo-o a condições subumanas.

Através da massificação das mídias de comunicação, sobretudo nas últimas décadas, a exposição dos mais diversos tipos de problemas sociais alcançou a maioria dos lares brasileiros, adquirindo então um apelo maior por políticas públicas que viessem a saná-los. Em meio a esse contexto, solucionar o grave problema do abandono de crianças assumiu papel de relevância no imperativo de tornar o Brasil um país que respeite os direitos e garantias fundamentais.

Uma breve análise do nosso Código Civil antes das alterações dos últimos anos, nos permite perceber que ao longo do tempo ele foi omisso quanto à questão do enfoque no parto anônimo, muito influenciado pela configuração social persistente na maior parte do século XX, que tinha no caráter patriarcal e patrimonialista como dois de seus pilares, forçando então às mães com filhos indesejados, e com medo da reprovação social, a se utilizarem de diversos meios ilícitos para se livrarem dos mesmos. A exemplo disso, o Código Civil de 1916 possuía 290 artigos da parte destinada ao Direito de Família, sendo 151 tratando de relações patrimoniais (LÔBO, 2008).

Somente no século XXI essa problemática ganhou nova discussão a partir da nova roupagem social com maior destaque à figura materna e da criança, terminando por desencadear diversos projetos de lei com vistas a introduzir o parto anônimo, de fato, no Código Civil vigente. Já a nossa Constituição Federal, lançou as bases para tal ação, por exemplo, no caput do artigo 5º que garante a liberdade e o direito à vida, além da proteção especial à criança no artigo 227. O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 7º também preceitua o nascimento e desenvolvimento sadio e condições dignas de existência. Ante o exposto, é importante percebermos, além da dimensão jurídica dos diplomas legais, como se dá os pormenores procedimentais do parto anônimo atrelados a direitos assegurados, conforme explica Madaleno:

“Com a aprovação do parto anônimo é assegurado à mulher, durante o período da gravidez ou após o parto, a possibilidade de não assumir a maternidade da criança por ela gerada, podendo manter o seu anonimato, com direito à realização de pré-natal e do parto, de forma gratuita em todos os postos de saúde e hospitais da rede pública e em todos os demais serviços que tenham convênio com o Sistema Único de Saúde (SUS) e mantenham serviços de atendimento neonatal. Essa lei assegura à mulher todas as garantias de sigilo da sua maternidade e bem assim sobre as informações que ela deverá prestar acerca de sua saúde e a do genitor, cujos dados somente serão revelados a pedido do nascido de parto anônimo e mediante ordem judicial, no que se denominou chamar de direito ao conhecimento da origem, regulamentado pelo artigo 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente.”

(2018, p. 689 – 690).

A análise conceitual exposta nos permite perceber que o parentesco e a ligação genética já não são fatores preponderantes no que se refere à constituição familiar. “O parentesco é o vínculo existente entre pessoas que pertencem à mesma família. O parentesco será natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”. (TARTUCE; SARTORI, 2014. p. 324). Atualmente o simples ato de vontade já é fator decisivo para que a mãe desfaça qualquer ligação de parentesco com o recém-nascido.

 

2.1 Da Roda dos Expostos ao Parto Anônimo nos Dias Atuais

A leitura do artigo 227 da nossa carta magna, citado anteriormente no presente trabalho, nos permite verificar que a prática clandestina secular de abandonar crianças, conhecida como roda dos expostos e que deu origem ao instituto do parto anônimo, foi abarcada pelo legislador citando garantias fundamentais e atribuindo deveres de todos para com as crianças, jovens e adolescentes.

Tal prática remonta ao período da idade média na Itália e na França, onde surgiu a roda dos expostos, onde foram lançadas as bases para que o parto anônimo pudesse depender somente da vontade da mãe, no que se refere ao desfazimento dos laços familiares com o recém-nascido. Sobre aquela prática Madaleno explica que:

“[…] não é revelada a identidade materna e nem o hospital onde foi realizado o parto, e tampouco é revelado o nome materno no registro de nascimento. É a roda dos expostos, em cujo dispositivo de madeira instalado em hospitais, conventos e mosteiros, o bebê era depositado, girando o tabuleiro para o interior do prédio, tocando-se uma sineta puxada por um cordão para avisar a quem estivesse de plantão que uma criança havia sido abandonada. Depois de batizada a criança era entregue a uma ama de leite para ser criada e amamentada, cujas atividades se fizeram fundamentais para a difusão da prática de abandono das crianças.”

(2018, p. 688).

Atualmente o instituto do parto anônimo encontra respaldo no ordenamento jurídico brasileiro, o que será explicitado nos tópicos seguintes. Sobretudo no âmbito do Direito de Família, e a exemplo da roda dos expostos mencionada anteriormente, garante de modo mais amplo que o princípio da liberdade seja respeitado assegurando à mãe, autonomia para se desfazer do recém nascido, sem sofrer penalidades impostas pelo Estado, desde que o faça dentro dos rigores das normas vigentes.

2.2 Projeto de lei 2.747/2008

No dia 11/02/2008, o Deputado Eduardo Valverde, do partido dos trabalhadores de Rondônia, apresentou a câmara dos deputados o Projeto de Lei 2.747/2008.  A ênfase era criar um instrumento que impedisse o abandono de crianças, que sempre foi frequente no país, tratando-se então de legalizar o Instituto do Parto Anônimo no Brasil.

Os pontos principais desse Projeto de Lei previam que, independentemente de classe, raça, etnia, idade e religião, qualquer mulher ao fazer o parto no Sistema Único de Saúde, teria sua identidade mantida em sigilo, sendo que essa informação só poderia ser revelada em esfera jurídica.

Previa-se também que na hora da entrega da criança, isentava-se a responsabilidade civil e criminal da genitora, tendo a mesma um prazo de até oito semanas para manifestar desistência da entrega, podendo então reassumir a guarda do filho. Podemos perceber os pontos principais do referido projeto em alguns dos artigos abaixo:

Art. 1° Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir o abandono materno de crianças recém nascidas, e instituí no Brasil o parto anônimo nos termos da presente lei.

Art. 2º Toda mulher, independente de classe, raça, etnia, idade e religião, será assegurado as condições para a realização do “parto anônimo”

Parágrafo Único – Todas as unidades gestoras do Sistema Único de Saúde, obrigam-se a criar um programa especifico com a finalidade de garantir, em toda sua rede de serviços o acompanhamento e a realização do parto anônimo.

[…]

Art. 9º A criança só será levada à adoção após oito semanas da data em que chegou ao Hospital, período em que a mãe ou parentes biológicos poderão reivindicá-la. Parágrafo único. Quando o parto ocorrer no Hospital, sob sigilo de identidade da mãe, a criança será levada à adoção após oito semanas de seu nascimento.

A análise dos artigos expostos nos permite inferir que já havia preocupação com a temática do parto anônimo, bem como, buscavam-se mecanismos de proteção a todos os agentes diretamente envolvidos no procedimento legal.  A justificativa apresentada para o referido projeto de lei refere-se a uma preocupação com o problema do abandono de crianças, visto como consequência de questões sócio-econômicas. Além da proteção da criança, busca-se amparar as mulheres que se encontram desestabilizadas por uma gravidez indesejada, podendo inclusive tirar a própria vida recorrendo a métodos abortivos duvidosos.

 

2.3 Projeto de lei 2.834/08

No dia 19/02/2008 foi apresentado pelo deputado Carlos Bezerra do partido do Movimento Democrático Brasileiro de Mato Grosso, o Projeto de Lei 2.834/08. O mesmo propunha a instituição do Parto Anônimo no Brasil, objetivando alterar o Código Civil.

Como mencionado, a idéia do parto anônimo surge nesta abordagem, condicionada à flexibilização do Código Civil, o qual trazia em seu artigo 1.638, as condições em que pai ou mãe perderiam o poder familiar perante os filhos. O objetivo era de que a lei disponibilizasse que o consentimento formal da genitora, exteriorizado através da assinatura de um termo de responsabilidade, amparasse todos os meios de se concretizar o ato de vontade para que o instituto do parto anônimo pudesse enfim ser aplicado, conforme podemos ver no artigo 2º do projeto supramencionado:

Art. 2º. O art. 1.638 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil, passa a vigorar acrescido do inciso V e do parágrafo único, com a seguinte redação:

“Art.1.638 […]

V – Optar pela realização de parto anônimo.

Parágrafo único. Considera-se parto anônimo aquele em que a mãe, assinando termo de responsabilidade, deixará a criança na maternidade, logo após o parto, a qual será encaminhada à Vara da Infância e da Adolescência para adoção.”

O projeto justifica-se no fato de seu propositor enxergar no instituto do parto anônimo uma saída legal e eficaz, para que a situação do abandono infantil e exposição das crianças a condições insalubres ocasionada por famílias desestruturadas ou mesmo situações inconvenientes, possa ser atenuada ou mesmo solucionada.

 

2.4 Projeto de lei 3.220/08

No dia 09/04/2008 o deputado Sérgio Barradas, do Partido dos Trabalhadores da Bahia, propôs a implementação e a regulamentação do parto anônimo no Brasil, e em relação aos projetos de lei anteriores, tratou a temática de forma mais ampla e completa.

Desta vez trata-se com maior riqueza de detalhes sobre o direito da gestante que deseja entregar o filho como podemos inferir dos artigos seguintes:

“Art. 2º Toda mulher, independente de classe, raça, etnia, idade e religião, será assegurado as condições para a realização do “ parto anônimo”.

[…]

Art. 8° A mulher que se submeter ao parto anônimo será informada da possibilidade de fornecer informações sobre sua saúde ou a do pai, as origens da criança e as circunstâncias do nascimento, bem como, sua identidade que será mantida em sigilo, e só revelada nas hipóteses do art. 11º desta lei.

[…]

Art. 12º A parturiente, em casos de parto anônimo, fica isenta de qualquer responsabilidade civil ou criminal em relação ao filho.”

É sempre importante frisar que apesar do parto anônimo prezar pelo sigilo da identidade da genitora, a possibilidade de quebra do sigilo dessa informação era sempre consagrada por força judicial. Desta forma possíveis distorções futuras ou até problemas congênitos poderiam ser corrigidos de forma mais célere. Outro ponto importante a se destacar era o prazo de oito semanas para a criança nascida no hospital ser levada a adoção, não podendo a mãe, que deixou claro no ato do parto a vontade de aderir ao parto anônimo, voltar atrás.

Assim como nos projetos de lei anteriores demonstrados no presente trabalho, este se justificou pela busca da segurança da criança recém-nascida, na medida da constatação do abandono em condições subumanas frequentes na história do Brasil e outros lugares do mundo. Além disso, concomitantemente buscou-se dar o respaldo jurídico para que as mães que desejassem abrir mão do poder familiar não sofressem sanções civis ou criminais, desde que seguissem os preceitos legais do instituto do parto anônimo.

Os dois projetos de lei anteriores, números 2.747/2008 e 2.834/2008, foram apensados a este último, sendo encaminhados à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Segundo o parecer do relator, Deputado Luiz Couto, os projetos de lei foram considerados inconstitucionais e contrários aos preceitos jurídicos sendo declarados injurídicos (explanou-se que os projetos de lei iam ao desencontro do chamado sistema de proteção integral à criança e ao adolescente, bem como não poderia se responsabilizar hospitais e médicos pela guarda das crianças nascidas pelo parto anônimo), sendo então rejeitados e arquivados. O mesmo alegou que o anonimato da mãe afeta os direitos constitucionais da criança a exemplo da proteção integral, a garantia do acesso à informação, e o direito à herança. Além disso, a não responsabilização civil e criminal da mãe violaria a Constituição Federal que proíbe no artigo 5º, XXXV, a exclusão da apreciação do poder judiciário quando se tratar de ameaça ou lesão a direito individual. O relator por fim entendeu que os projetos de lei poderiam representar uma volta à época da roda dos expostos representando então um retrocesso na visão do mesmo, posicionando-se então contrário as proposições (BRASIL, CÂMARA, 2009).

 

3 O PARTO ANÔNIMO EM NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO E O PRINCÍPIO DA LIBERDADE

Obedecendo aos preceitos constitucionais de proteção integral à criança e adolescente, a lei 8.069/90 privilegia, em relação aos mesmos, um sistema de garantias, direitos e obrigações a serem implementados em âmbito familiar e por políticas públicas.

Porém a crescente discussão a partir da década passada em relação ao instituto do parto anônimo, inclusive com a proposição de alguns projetos de lei, trouxeram acréscimos importantes ao nosso ordenamento. Mesmo com tais projetos sendo arquivados, a discussão acerca da temática permaneceu viva, desencadeando alterações em nossas normas jurídicas.   A lei 13.059 de 2017 alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente acrescentando no artigo 19-A o mecanismo de funcionamento do instituto do parto anônimo, do qual destacamos os principais pontos:

“Art. 19-A. A gestante ou mãe que manifeste interesse em entregar seu filho para adoção, antes ou logo após o nascimento, será encaminhada à Justiça da Infância e da Juventude

[…]

  • 9oÉ garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei
  • 10. Serão cadastrados para adoção recém-nascidos e crianças acolhidas não procuradas por suas famílias no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir do dia do acolhimento.”

A análise do artigo nos permite perceber que o instituto do parto anônimo contempla em seu viés uma série de direitos e deveres relativos aos três agentes envolvidos que são a genitora, a criança e o Estado. A genitora, contemplando-se o princípio da liberdade, poderá exercer seu livre arbítrio na escolha, tendo a garantia de que não será penalizada civil e criminalmente se optar pelo trâmite legal do instituto em estudo. Já a criança terá suas garantias fundamentais respeitadas, deixando de estar sujeita aos perigos de um abandono clandestino, podendo ser encaminhada a outra família.  Por fim o Estado cria uma alternativa legal para evitar o grave problema social do abandono de crianças, o qual acontece reiteradamente na história do Brasil e vários lugares do mundo. Destarte, representa um avanço necessário para um estado democrático que almeja um dia garantir uma alta qualidade de vida a sua população e respaldar todos os direitos, deveres e garantias dos nossos diplomas legais.

 

CONCLUSÃO

Ao longo do tempo o Direito sofre um processo de metamorfose dinâmica, relacionado ao contexto social à época de sua vigência. Nessa esteira o Direito de Família, ramo jurídico no qual foca o presente estudo, não foge à regra adquirindo nova roupagem, discussões e institutos no decorrer histórico, sendo que a abordagem em torno do instituto do parto anônimo ocorre no bojo de todo esse processo.

A discussão acerca deste instituto surgiu com força na primeira década dos anos 2000, refletindo o novo contexto da sociedade brasileira, onde passou então a existir maior exposição nas diversas mídias do abandono clandestino de crianças, o que na realidade já vem de longa data, inclusive com o nome de roda dos expostos no continente europeu.

Além disso, os nossos diplomas legais, sobretudo a partir da Constituição Federal de 1988, passaram a assumir um papel mais protetivo acerca da constituição familiar, sobretudo no que se refere ao bem estar das crianças e seu desenvolvimento saudável com vistas a respeitar os princípios gerais do Direito.

Esse contexto foi de grande relevância para o presente estudo caracterizar os princípios da dignidade da pessoa humana, da paternidade responsável, do melhor interesse da criança, e da liberdade como verdadeiros norteadores no caminho da cristalização do parto anônimo em nossos diplomas legais.

Dessa forma buscou-se através dos pilares supracitados, respectivamente, que o bem estar da pessoa fosse visto como o ponto central do esforço jurídico estatal, que haja por parte dos pais o provimento da assistência em todas as instâncias aos filhos, que a criança deixasse de fazer parte meramente do corpo familiar passando então a ser tratada de forma individualizada na seara jurídica, e por fim que fosse respeitada a liberdade de escolha em todo o trâmite legal do instituto em análise.

Em meio à discussão sobre o parto anônimo na primeira década dos anos 2000 destacaram-se os três Projetos de Lei (2.747/08, 2.834/08, 3.220/08) propostos com o fim principal de consolidar aquela via como o meio legal para as genitoras que manifestavam intenção de não ficar com seus filhos. Muito embora os mesmos tenham sido rejeitados e arquivados pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, serviram para acender a chama dos debates acerca da temática, terminando assim por desencadear alterações em nossas normas jurídicas, destarte culminando com a lei 13.059 de 2017 que veio a alterar o estatuto da Criança e do Adolescente acrescentando no artigo 19-A o mecanismo de funcionamento do instituto do parto anônimo.

Importante ressaltar que esse tema é de grande relevância para os dias atuais, onde existe grande anseio social pela proteção às crianças, haja vista o viés assumido pelo instituto supracitado de constituir opção legal para as genitoras que não desejam sua prole, prevenindo o abandono clandestino dos mesmos em condições subumanas. O estudo é de suma importância para um país que almeja proporcionar uma maior qualidade de vida à sua população, sobretudo para as crianças, e, além disso, as garantias individuais provenientes de uma república democrática de direito.

 

REFERÊNCIAS

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1 Graduanda do curso de Bacharelado em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA.

E-mail: [email protected]

2 Orientadora. Professora do curso de direito do Centro Universitário Santo Agostinho. Ma. Francisca Juliana Castello Branco Evaristo de Paiva. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). E-mail: [email protected]

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