O Direito à Jornada de Trabalho Reduzida do Representante Legal da Pessoa Com Deficiência na Administração Pública

Carina Aparecida Cervi

Professora Universitária da Faculdade de Tecnologia de Catanduva e advogada.

 

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Resumo

O objetivo do presente artigo é defender o direito à jornada de trabalho reduzida do representante legal da pessoa com deficiência na Administração Pública em cumprimento ao disposto nas normativas internacionais e nacionais sobre o assunto. O artigo visa demonstrar que a humanização e a flexibilização da jornada de trabalho possibilita benefícios de inclusão social e qualidade de vida não apenas à pessoa com deficiência, mas também permite ao representante legal a continuidade do seu exercício profissional. O trabalho é considerado um direito humano fundamental, vez que possibilita à pessoa humana a possibilidade de desenvolvimento de suas potencialidades; a inserção e convivência social, além de ser instrumento de realização pessoal. O artigo aborda diplomas internacionais dando destaque à Convenção da ONU dos direitos da pessoa com deficiência, norma esta com status constitucional e a possibilidade de se invocar  o controle de convencionalidade junto aos tribunais pátrios, além de destacar as legislações federais sobre o assunto e trazer um comparativo legislativo e jurisprudencial sobre o tema.

Palavra-chave: direito ao trabalho; representante legal; pessoa com deficiência; jornada reduzida.

 

Abstract

The purpose of this article is to defend the right to reduced working hours of the legal representative of persons with disabilities in Public Administration in compliance with the provisions of international and national regulations on the subject. The article aims to demonstrate that the humanization and flexibility of the workday allows benefits of social inclusion and quality of life not only for people with disabilities, but also allows the legal representative to continue their professional practice. Work is considered a fundamental human right, since it enables the human person to develop their potentialities; insertion and social coexistence, besides being an instrument of personal fulfillment. The article deals with international diplomas highlighting the UN Convention on the rights of persons with disabilities, a norm with constitutional status and the possibility of invoking the control of conventionality before the national courts, in addition to highlighting federal legislation on the subject and bringing a comparative legislation and jurisprudence on the subject.

Keywords: right to work; legal representative; disabled person; reduced journey.

 

Sumário: Introdução. 1 O Trabalho como direito humano fundamental. 2 O direito e garantia de trabalho com jornada reduzida ou horários flexíveis adaptados à realidade do representante legal de pessoa com deficiência na Administração Pública. 2.1 A dignidade da pessoa humana e a Efetividade do Sistema Constitucional. 2.2 Convenção da ONU dos direitos da pessoa com deficiência como norma Constitucional. 2.3 Controle de Convencionalidade. 2.4 Estatuto da pessoa com deficiência – Lei Federal nº 13.146/15. 3 Análise normativa e jurisprudencial da redução da Jornada de Trabalho do Representante legal da Pessoa com deficiência no serviço público estatutário. 3. 1 Lei federal nº 8112/91 – Estatuto do Servidor Público Federal. 3. 2 Proposta de Emenda à Constituição Estadual SP – PEC SP. 3. 3 Outros exemplos de normas Estaduais e Municípios dos entes federados brasileiros. 3. 4 Exemplos de Jurisprudência favorável. Conclusão. Referências.

 

Introdução

O direito ao trabalho é um direito humano fundamental. Previsto no ordenamento jurídico pátrio e também no âmbito internacional, deve proporcionar ao ser humano a satisfação de suas necessidades básicas de sobrevivência, mas também o desenvolvimento de suas potencialidades, habilidades, instrumento de crescimento e realização pessoal.

O direito a uma vida plena deve ser estendido a todos sem distinções de ordem social, cultural, de raça, credo, gênero, bem como às pessoas com deficiência possibilitando a quebra de barreiras sociais, arquitetônicas, atitudinais para a plena inserção social.

É cediço, todavia, que muitas pessoas com deficiência em razão de suas limitações necessitam de um tutor/curador que, muitas vezes, abdica de suas atividades laborais para se dedicar integralmente aos cuidados de seu tutelado/curatelado por razões várias, mas, principalmente, por ausência de políticas de Estado para plena inclusão da pessoa com deficiência.

Assim, o pai ou a mãe dessa criança ou adulto com deficiência grave muitas vezes precisa abandonar sua carreira profissional ou o exercício de uma atividade que lhe possibilite subsistência e a seu filho para proporcionar ao mesmo cuidado em tempo integral. A Administração Pública no âmbito federal já possibilita que seus servidores, consoante previsão na Lei federal 8112/91 diminuam sua jornada de trabalho em 6 horas, sem prejuízo da remuneração para possibilitar o exercício conjunto das duas funções exercidas. Todavia, essa ainda não é a realidade de todos os servidores ou empregados públicos do país, tampouco o é com relação à iniciativa privada que ainda precisa caminhar a largos passos para a melhoria das condições de vida de seus empregados.

No presente artigo, destaca-se o direito ao trabalho como instrumento de crescimento pessoal, o direito à jornada reduzida mediante condições especiais de vida e aponta tópicos da legislação pertinente e estudo analítico legislativo e jurisprudencial.

 

1 O Trabalho como direito humano fundamental

Como destacado, o trabalho é considerado tanto pela normativa internacional quanto nacional um direito humano fundamental.

Na Carta magna de 1988 em seu artigo 6º, elenca o direito ao trabalho como um direito social fundamental. É considerado como fundamento da República Federativa do Brasil (artigo 1º)  o valor do trabalho e a livre iniciativa.

O direito ao trabalho também é considerado como um dos fundamentos da ordem econômica (artigo 170 CF).

O parágrafo 1º do artigo 5º explana por sua vez que os direitos fundamentais detém aplicabilidade imediata, incluindo destarte, os direitos sociais.

Ainda, o mesmo artigo em seu inciso XIII preleciona: “é livre qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

Assim, Trabalho é um direito social. Realizador da dignidade humana. Não apenas no contexto de necessidade de subsistência, mas desde que num contexto criativo, realizador, transformador. Capaz de possibilitar crescimento, realização plena da potencialidade humana. Detém caráter agregador, comunitário, desde que livremente eleito e consoante às habilidades e desejos individuais. Possibilita, assim,  desenvolvimento em seu sentido pleno corporal, ético e político.

 

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2 O direito e garantia de trabalho com jornada reduzida ou horários flexíveis adaptados à realidade do representante legal de pessoa com deficiência na Administração Pública.

Mesmo havendo previsão na Convenção da ONU dos direitos da pessoa com deficiência e na Lei Brasileira de Inclusão, as políticas públicas voltadas para a pessoa com deficiência principalmente a intelectual nas fases adulta e idosa ainda são bem restritas, para não dizer quase nulas.

Os curadores/tutores assim, não tendo o apoio estatal, muitas abdicam de suas carreiras, trabalhos ou ofícios para cuidar integralmente da pessoa com deficiência sob seus cuidados.

A jornada reduzida possibilitaria conciliar o direito ao trabalho à missão honrosa de cuidados à pessoa com deficiência grave que necessita de outrem para as necessidades de sua vida diária.

 

2.1 A dignidade da pessoa humana e a Efetividade do Sistema Constitucional

A matriz axiológica do sistema jurídico global pós segunda guerra mundial é  pautado na DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ou seja, no valor do SER HUMANO como universal e finalístico. A escola hermenêutica do LEGALISMO ESTRITO, foi repensada no pós guerra em razão das atrocidades ocorridas em nome da “Lei” por um novo viés interpretativo denominado pela doutrina de NEOCONSTITUCIONALISMO E PÓS-POSITIVISMO que tem como fundamento de validade a força normativa da Constituição e os princípios fundamentais do ser humano. Assim, nada deve sobrepor-se ao ser humano e suas necessidades. Nem a lei, nem a legalidade, caso seja injusta e déspota.

A dignidade da pessoa humana é também um dos fundamentos da República Federativa do Brasil[1]. Todo ser humano possui direito a uma vida digna, inserção social e oportunidades igualitárias.

Se a justiça consiste em sua essência, como ressaltaram os antigos, em reconhecer a todos e a cada um dos homens o que lhes é devido, esse princípio traduz-se logicamente, no dever de integral e escrupuloso respeito àquilo que, sendo comum a todos os humanos, distingue- os radicalmente das demais espécies de seres vivos: a sua transcendente dignidade“(COMPARATO, Fábio Konder. Ética. 2008, p.622)

Estabeleceu-se um princípio geral de direito que deve resolver os conflitos sociais, a dignidade da pessoa humana. Em conseqüência, é norma jurídica cuja violação não pode ser permitida”. (BOBBIO, 1999, p. 158)

Nesta esteira, pode-se afirmar que respeitar a dignidade humana é considerar o ser humano como valor em si mesmo.

Portanto, a dignidade da pessoa humana pode ser traduzida como reconhecimento do direito de todo indivíduo a uma vida digna, de inserção social, respeito, pleno acesso à saúde, lazer, educação, segurança, trabalho, conduzindo-o à satisfação plena de suas necessidades e proporcionando bem-estar.

Mais até do que orçamento insuficiente, a MÁ GESTÃO PÚBLICA atrelada à falta de vontade política, conchavos para cargos de confiança, falta de capacitação técnica, organização e eficiência dificultam o Estado em efetivar direitos fundamentais já reconhecidos nos Tratados de Direitos Humanos e Constituição Federal.  Assim, muitas vezes a Administração Pública não consegue proporcionar e possibilitar o acesso a estes direitos nos casos concretos.

O Poder Judiciário assim, tem um papel ativo e fundamental no cumprimento das obrigações assumidas pelo Estado brasileiro até como uma mola propulsora de reflexão e ações efetivas pelo Executivo e Legislativo.

Tanto é que as decisões judiciais na área da saúde, educação, tem efetivado o direito de muitas pessoas na ausência de uma atuação mais eficaz do Executivo. As obrigações de fazer tem transformado a dinâmica do Estado e impondo à Administração Pública o ônus de repensar seu papel e solucionar as novas demandas. Mesmo nos casos de lacunas legais, o Poder Judiciário tem utilizado para integração da norma os princípios basilares constitucionais ( a força normativa da Constituição) e os tratados de direitos humanos para efetivar direitos e compromissos ASSUMIDOS pelo Estado.

A figura do Estado e da Administração Pública, antes de cumprir o princípio da legalidade em sentido estrito,  preconizado pelo artigo 37 da CF/88 tem a obrigação Constitucional de seguir os preceitos fundamentais e princípios da República. Aliás, a figura do Estado existe JUSTAMENTE para conferir às pessoas o atendimento das necessidades públicas e o bem comum.

Ademais, o Regime Jurídico Administrativo é regido pelo Princípio basilar da SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O INTERESSE PRIVADO que confere fundamento às demais normas de direito administrativo.

“O intérprete constitucional deve ter compromisso com a efetividade da Constituição: entre interpretações alternativas e plausíveis, deverá prestigiar aquela que permita a atuação da vontade constitucional, evitando, no limite do possível, soluções que se refugiem no argumento da não auto aplicabilidade da norma ou na ocorrência de omissão do legislador” (Barroso, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional e a construção de um novo modelo. 2011, p. 329.)

Assim, não conceder ao servidor a diminuição de sua jornada de trabalho com fundamento na ausência de regra jurídica específica é desconstruir o arcabouço jurídico constitucional  e sistema jurídico firmado sob o fundamento do princípio da dignidade humana.

SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL. São Paulo. Pretensão à redução da jornada de trabalho para acompanhamento de filho autista. Ausência de previsão na legislação municipal. Julgamento à luz da proteção especial à pessoa com deficiência. Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência. Status de norma constitucional, com a capacidade de derrogar normas com ela conflitantes.

Direito já reconhecido aos servidores públicos da União. Interpretação sistemática do ordenamento que autoriza a concessão da medida. Ação julgada improcedente. Sentença reformada. Recurso provido. (Apelação n. 1008064-72.2016.8.26.0114, TJSP, Relator Ponte Neto, 21.08.2017)

Por fim, não se alegue violação ao princípio da legalidade, nem ao da separação dos poderes no reconhecimento do direito de redução de jornada pelo Poder Judiciário na ausência de previsão expressa em Lei Municipal, em decorrência da aplicação da interpretação sistemática e analógica dos dispositivos legais vigentes. Portanto, a autora faz jus à redução da carga horária para vinte horas semanais, sem necessidade de compensação e sem redução de remuneração”

Quanto a igualdade com relação aos servidores que não se encontram na mesma situação segue:

O respeito à igualdade reside justamente em distinguir coerentemente as diferenças e criar condições legislativas e políticas públicas para a promoção da igualdade material ou substantiva, cabendo lembrar a máxima Aristotélica de que igualdade é tratar os iguais de maneira igual e os desiguais na medida de suas desigualdades”.

A igualdade dos sujeitos na ordenação jurídica, garantida pela Constituição, não significa que estes devam ser tratados de maneira idêntica nas normas e em particular nas leis expedidas com base na Constituição. A igualdade assim entendida não é concebível: seria absurdo impor a todos os indivíduos exatamente as mesmas obrigações ou lhes conferir exatamente os mesmos direitos sem fazer distinção alguma entre eles, como, por exemplo, entre crianças e adultos, indivíduos mentalmente sadios e alienados, homens e mulheres. (KELSEN, Hans apud MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Conteúdo jurídico do Princípio da Igualdade. 2009, p. 11)

Há que se fazer a interpretação SISTEMÁTICA, TELEOLÓGICA  do SISTEMA JURÍDICO tendo como base o princípio da DIGNIDADE HUMANA, os princípios constitucionais fundamentais e tratados de direitos humanos com status de norma constitucional.

 

  1. 2 Convenção da ONU dos direitos da pessoa com deficiência como norma constitucional. (Decreto Legislativo 186/2008 ratificado pelo Decreto Presidencial nº 6.949/2009).

A Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi incorporada à legislação brasileira em 2008. O Brasil decidiu, soberanamente, ratificá-la com equivalência de emenda constitucional, nos termos previstos no Artigo 5º, § 3º da Constituição brasileira, e, quando o fez, reconheceu um instrumento de respeito constitucional às pessoas com deficiência integrando o denominado “bloco de constitucionalidade”.

Assim, a Convenção e seu Protocolo Facultativo são normas constitucionais que devem proporcionar um Brasil com acessibilidade, no sentido mais amplo desse conceito. Pelo conceito contemporâneo de pessoa com deficiência não é o limite individual que determina a deficiência, mas sim as barreiras existentes nos espaços, no meio físico, no transporte, na informação, na comunicação e nos serviços de determinada sociedade.

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A Convenção contém 30 artigos que contemplam direitos humanos universais, devidamente instrumentalizados para atender a necessidade do seguimento das pessoas com deficiência.

No tópico “definições”a Convenção estabelece acerca da ADAPTAÇÃO RAZOÁVEL:

 

Artigo 2º

“Adaptação razoável” significa as modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.

(…)

  1. A fim de promover a igualdade e eliminar a discriminação, os Estados Partes adotarão todas as medidas apropriadas para garantir que a adaptação razoável seja oferecida.

Com efeito, o conceito de Adaptação Razoável previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de 30 de março de 2007, não deve ser interpretado restritivamente, objetivando apenas o desembaraço ou adaptação física.

A referida Convenção, também destaca em seu artigo 4º que o Estado Brasileiro deve adotar TODAS as medidas necessárias que constituírem discriminação contra pessoas com deficiência.

Vejamos:

Artigo 4º
b) Adotar todas as medidas necessárias, inclusive legislativas, para modificar ou revogar leis, regulamentos, costumes e práticas vigentes, que constituírem discriminação contra pessoas com deficiência;

No artigo 28, os Estados partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência a um padrão de vida adequado e se obrigam a tomar as providências necessárias para salvaguardar e promover a realização desse direito.

Artigo 28 – Padrão de vida e proteção social adequados

  1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência a um padrão adequado de vida para si e para suas famílias, inclusive alimentação, vestuário e moradia adequados, bem como à melhoria contínua de suas condições de vida, e tomarão as providências necessárias para salvaguardar e promover a realização desse direito sem discriminação baseada na deficiência.

Ainda, no que diz respeito a vida independente e inclusão na comunidade, destaca-se o artigo 19 que impõe aos Estados-partes a tomada de medidas efetivas para facilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo desse direito e inclusão e participação social, incluindo serviços de apoio em domicílio, atendentes pessoais etc.

Os Estados Partes desta Convenção reconhecem o igual direito de todas as pessoas com deficiência de viver na comunidade, com a mesma liberdade de escolha que as demais pessoas, e tomarão medidas efetivas e apropriadas para facilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo desse direito e sua plena inclusão e participação na comunidade, inclusive assegurando que:

  1. a) as pessoas com deficiência possam escolher seu local de residência e onde e com quem morar, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, e que não sejam obrigadas a viver em determinado tipo de moradia;
  2. b) as pessoas com deficiência tenham acesso a uma variedade de serviços de apoio em domicílio ou em instituições residenciais ou a outros serviços comunitários de apoio, inclusive os serviços de atendentes pessoais que forem necessários como apoio para que vivam e sejam incluídas na comunidade e para evitar que fiquem isoladas ou segregadas da comunidade;
  3. c) os serviços e instalações da comunidade para a população em geral estejam disponíveis às pessoas com deficiência, em igualdade de oportunidades, e atendam às suas necessidades”.

Como já ressaltado, a referida Convenção é norma Constitucional e deve ser respeitada como tal, sob pena de responsabilidade internacional do Estado-parte.

Assim, proceder a diminuição da jornada do servidor evita custos adicionais ao Estado, ao solicitar um cuidador para sua família, já que o melhor cuidador dos filhos são os próprios pais. A Convenção com status de emenda constitucional deve ser efetiva, uma vez que o Brasil assumiu tais compromissos internacionais e, portanto deve criar mecanismos de inclusão. O poder judiciário tem a finalidade de zelar pela guarda da Constituição e seus princípios fundamentais. A interpretação há de ser sistemática e analógica para efetivar a dignidade humana. Não é por menos, que o novel Código de Processo Civil, inovando acerca do tema, dita ao Juiz a proceder o julgamento da causa com base no ordenamento jurídico como um todo, ao dispor:

Art. 8o Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

E mais:

Art. 13. A jurisdição civil será regida pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte.

 

2.3 Controle de Convencionalidade

Por ter a citada Convenção STATUS de norma constitucional, é de rigor que o Poder Judiciário exerça o controle de convencionalidade na fiscalização do cumprimento dos Tratados Internacionais incorporados pelas normas internas brasileiras.

Segue trecho de julgamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil em que o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos pelo desaparecimento forçado de integrantes da Guerrilha do Araguaia durante as operações militares ocorridas na década de 1970.

No trecho abaixo, fica explicitado o importante e ativo papel do Poder Judiciário na fiscalização e imposição de medidas efetivas para se fazer cumprir as obrigações internacionais assumidas pelo Estado brasileiro.

Dever do Poder Judiciário de exercer controle de convencionalidade ex officio:

Este Tribunal estabeleceu em sua jurisprudência que é consciente de que as autoridades internas estão sujeitas ao império da lei e, por esse motivo, estão obrigadas a aplicar as disposições vigentes no ordenamento jurídico. No entanto, quando um Estado é Parte de um tratado internacional, como a Convenção Americana, todos os seus órgãos, inclusive seus juízes, também estão submetidos àquele, o que os obriga a zelar para que os efeitos das disposições da Convenção não se vejam enfraquecidos pela aplicação de normas contrárias a seu objeto e finalidade, e que desde o início carecem de efeitos jurídicos. O Poder Judiciário, nesse sentido, está internacionalmente obrigado a exercer um controle de convencionalidadeex officio entre as normas internas e a Convenção Americana, evidentemente no marco de suas respectivas competências e das regulamentações processuais correspondentes. Nessa tarefa, o Poder Judiciário deve levar em conta não somente o tratado, mas também a interpretação que a ele conferiu a Corte Interamericana, intérprete última da Convenção Americana. [Corte IDH. Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 24-11-2010. Sem grifos no original] [Resumo oficial] [Ficha técnica]

No mesmo sentido, segue trecho de julgamento do STF RE 592.581 – tema de repercussão geral sob a relatoria do Min. Ricardo Lewandowski:

Vale sublinhar, nesse passo, que, a partir do momento em que o Brasil adere a um tratado ou a uma convenção internacional, sobretudo àqueles que dizem respeito aos direitos humanos, a União assume as obrigações neles pactuadas, sujeitando-se, inclusive, à supervisão dos órgãos internacionais de controle, porquanto somente ela possui personalidade jurídica no plano externo. (…) A própria possibilidade de federalização de violações aos direitos fundamentais, introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Emenda Constitucional 45/2004, tem como escopo evitar a impunidade no combate às ofensas mais graves a esses valores, ao mesmo tempo em que reafirma o primado da dignidade humana como um dos pilares da República. (…) A hipótese aqui examinada não cuida, insisto, de implementação direta, pelo Judiciário, de políticas públicas, amparadas em normas programáticas, supostamente abrigadas na Carta Magna, em alegada ofensa ao princípio da reserva do possível. Ao revés, trata-se do cumprimento da obrigação mais elementar deste Poder que é justamente a de dar concreção aos direitos fundamentais, abrigados em normas constitucionais, ordinárias, regulamentares e internacionais. [STF, RE 592.581, rel. min. Ricardo Lewandowski, P, j. 13-08-2015, DJE de 01-02-2016 – tema 220]

 

2.4 Estatuto da pessoa com deficiência – Lei Federal nº 13.146/15

Na mesma linha e embasada na Convenção citada, a Lei brasileira de Inclusão, também conhecida como Estatuto da pessoa com deficiência foi instituída para assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e liberdades fundamentais da pessoa com deficiência, visando sua inclusão social e cidadania. (Artigo 1º)

Art. 3o Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se: […]

VI – adaptações razoáveis: adaptações, modificações e ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional e indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que a pessoa com deficiência possa gozar ou exercer, em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais;

XII – atendente pessoal: pessoa, membro ou não da família, que, com ou sem remuneração, assiste ou presta cuidados básicos e essenciais à pessoa com deficiência no exercício de suas atividades diárias, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas;

XIV – acompanhante: aquele que acompanha a pessoa com deficiência, podendo ou não desempenhar as funções de atendente pessoal.

Mais adiante estabelece:

Art. 4o Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação.

  • 1o Considera-se discriminação em razão da deficiência toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas. (Sublinhei )

Quanto à moradia digna, segue artigo 31:

Art. 31. A pessoa com deficiência tem direito à moradia digna, no seio da família natural ou substituta, com seu cônjuge ou companheiro ou desacompanhada, ou em moradia para a vida independente da pessoa com deficiência, ou, ainda, em residência inclusiva.

  • 1° O poder público adotará programas e ações estratégicas para apoiar a criação e a manutenção de moradia para a vida independente da pessoa com deficiência.
  • 2° A proteção integral na modalidade de residência inclusiva será prestada no âmbito do Serviço Único de Assistência Social SUAS à pessoa com deficiência em situação de dependência que não disponha de condições de autossustentabilidade, com vínculos familiares fragilizados ou rompidos.

O artigo 31 traz dois direitos: à moradia e à convivência familiar e comunitária, ambos direitos humanos fundamentais.

A moradia digna não se resume a um teto e quatro paredes, mas ao direito de toda pessoa de ter acesso a um lar e uma comunidade seguros para viver em paz, dignidade e saúde física e mental[2].

Junto com o direito de moradia está o direito à convivência familiar e comunitária.

O Estado precisar  fornecer os meios para promover a educação, a saúde a moradia de seus habitantes.

O direito à moradia é um direito humano social previsto no art. 6º da Constituição Federal:

Segundo a Associação Paulista dos Defensores Públicos:

O direito à moradia é um direito humano reconhecido desde 1948 pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e reiterado por vários tratados internacionais. Ele não se resume ao direito de ter uma casa, mas deve garantir um padrão de vida adequado e condições para se viver com dignidade”.[3]

 

3 Análise normativa e jurisprudencial da redução da Jornada de Trabalho do Representante legal da Pessoa com deficiência no serviço público estatutário

  1. 1 Lei federal nº 8112/91 – Estatuto do Servidor Público Federal

A lei nº 8.112/91 já concede há muito tempo um horário especial ao servidor federal que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência sem prejuízo da remuneração.

Recentemente, o dispositivo sofreu alteração legislativa ampliativa explicitando em seu parágrafo 1º e 2º do artigo 98 que tal benesse independe da compensação de horário pelo servidor.

Art. 98.  Será concedido horário especial ao servidor estudante, quando comprovada a incompatibilidade entre o horário escolar e o da repartição, sem prejuízo do exercício do cargo.

  • 1oPara efeito do disposto neste artigo, será exigida a compensação de horário no órgão ou entidade que tiver exercício, respeitada a duração semanal do trabalho.
  • 2oTambém será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário.
  • 3o  As disposições constantes do § 2o são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência.(grifos nossos).

Observe-se no entanto que não se trata de aplicação da norma federal a servidor estadual, uma vez que tal pedido feriria o pacto federativo. Porém, é importante citar o arcabouço legislativo federal para evitar incoerências interpretativas e como norteamento lógico, além de ressaltar que as normas estaduais e municipais não podem ferir os princípios sensíveis preconizados pelo artigo 34 da CF/88 – dentre eles a alínea b do inciso VII que se refere aos direitos da pessoa humana.

 

  1. 2 Proposta de Emenda à Constituição Estadual SP – PEC SP

Está em trâmite na Assembleia Legislativa de São Paulo uma proposta de Emenda à Constituição Estadual (PEC 15/2011) que possibilita a redução da jornada de trabalho ao servidor público que cuide diretamente de pessoa com necessidade especial, sem prejuízo da remuneração.

Artigo 1º – Inclua-se na Constituição do Estado o artigo 137-A com a seguinte redação:

Artigo 137-A – O servidor público que seja responsável legal e cuide diretamente de portador de necessidade especial que, comprovadamente, necessite de assistência permanente, independentemente de estar sob tratamento terapêutico, terá redução de 50% (cinquenta por cento) de sua carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração.

  • 1º Para fins de concessão do benefício de que trata este artigo, considera-se portador de necessidade especial, a pessoa de qualquer idade portadora de deficiência física ou mental comprovada e que tenha dependência sócio-educacional e econômica do servidor público.
  • 2º A redução da carga horária de que trata este artigo perdurará enquanto permanece a necessidade de assistência e a dependência econômica do portador de necessidade especial.
  • 3º Nos casos em que a deficiência for confirmadamente considerada irreversível, a concessão de que trata este artigo será definitiva, devendo o servidor comprovar anualmente, apenas a dependência econômica.

Infelizmente, por desinteresse do legislativo e executivo, tal proposta está “congelada” na Assembleia legislativa de SP.

 

  1. 3 Outros exemplos de normas Estaduais e Municípios dos entes federados brasileiros

Seguem outros exemplos de Estados e Município que já aderiram à DIMINUIÇÃO DA JORNADA nestes casos:

  • CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ)

CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

SEÇÃO III

DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS

Art. 83 – Aos servidores públicos civis ficam assegurados, além de outros que a lei estabelecer,

os seguintes direitos:

XXI – redução em cinqüenta por cento de carga horária de trabalho de servidor

estadual, responsável legal por portador de necessidades especiais que requeira

atenção permanente;

  • CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS)

Estado do Rio Grande do Sul

LEI COMPLEMENTAR Nº 10.098, DE 3 DE FEVEREIRO DE 1994.

Seção II

Da Assistência a Filho Excepcional

Art. 127 – O servidor, pai, mãe ou responsável por excepcional, físico ou mental, em

tratamento, fica autorizado a se afastar do exercício do cargo, quando necessário, por período de até 50% (cinqüenta por cento) de sua carga horária normal cotidiana, na forma da lei.(grifos nossos).

  • CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE RONDÔNIA (RN) (desde 2006)

CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE RONDÔNIA

Seção III

Dos Servidores Públicos Civis

Art. 22. O servidor público que seja responsável legal e cuide diretamente de portador de necessidade especial que, comprovadamente, necessite de assistência permanente, independentemente de estar sob tratamento terapêutico, terá redução de 50% (cinqüenta por cento) de sua carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração. (grifos nossos)

  • 1°. Para fins de concessão do benefício de que trata este artigo, considera-se portador de necessidade especial, a pessoa de qualquer idade portadora de deficiência física ou mental comprovada e que tenha dependência sócio-educacional e econômica do servidor público.
  • 2°. A redução da carga horária de que trata este artigo perdurará enquanto permanecer a necessidade de assistência e a dependência econômica do portador de necessidade especial.
  • 3º. Nos casos em que a deficiência for confirmadamente considerada irreversível, a concessão de que trata este artigo será definitiva, devendo o servidor comprovar anualmente, apenas a dependência econômica.
  • Município de Campo Grande (MS)

Campo Grande-MS

Consolidação das Normas que Regem as Relações entre a Administração Pública Municipal e seus Servidores (Leis Complementares n. 10, de 12 de março de 1997; n. 14, de 3 de julho de 1997, n. 15, de 1º de setembro de 1997 e n. 19, de 15 de julho de 1998).

Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial de

Campo Grande – DIOGRANDE n. 246, de 11/1/1999

Art. 1 – Ao servidor público municipal que tenha filho portador de necessidades especiais, em tratamento junto à entidade pública ou particular, fica garantida jornada de trabalho especial, de duração máxima de 04 horas diárias.

  • 1º – A concessão de jornada especial, de que trata o “caput” deste artigo, dependerá de requerimento do servidor ao órgão da administração que estiver lotado e deverá ser instruído com:
  1. a) certidão de nascimento do portador de necessidades especiais;
  2. b) laudo médico, certificando a necessidade de tratamento médico, expedido por junta médica do Município;
  3. c) declaração de que outro servidor não se beneficia da jornada especial, em caso de ser o pai e a mãe do portador de necessidades especiais, servidores públicos municipais.
  • 2º – A jornada especial durará enquanto perdurar o tratamento do portador de necessidades especiais, devendo ser semestralmente comprovada esta condição sob pena de suspensão da jornada especial.
  • 3º – O período de trabalho em jornada especial será considerado como efetivo exercício para todos os efeitos legais.
  • Município de Itaguaí (RJ)

Lei Orgânica do Município de Itaguaí

Seção II

Dos Servidores Públicos

Art. 23 – O Município instituirá regime jurídico único e plano de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

……………………………………………………………………

  • 3º – Redução de 50% (cinqüenta por cento) da carga horária de trabalho de serviço

municipal, sem prejuízo da remuneração integral, responsável legal por portador de necessidades especiais que requeira atenção permanente, ou ainda, cônjuge, ascendente ou descendente que venha a sofrer acidente ou acometido de doença grave que requeira acompanhamento devidamente comprovado por órgão médico.

  • Município de Santa Maria Madalena (RJ)

Lei Orgânica do Município de Santa Maria Madalena

SEÇÃO III

DOS SERVIDORES PÚBLICOS

Art. 55 – Aos servidores públicos civis ficam assegurados, além de outros que a lei estabelecer, os seguintes direitos:

XXI – redução em 50% (cinqüenta por cento) da carga horária de trabalho de Servidor Municipal, responsável legal por portador de necessidades especiais que requeira atenção permanente;

  •  Município de Lavras (MG)

PREFEITURA MUNICIPAL DE LAVRAS

ESTADO DE MINAS GERAIS

Art. 66 – Poderá ser concedida autorização especial para licença por motivo de doença em pessoa da família, mediante relatório original da junta médica e autorização do Secretário Municipal de Administração e Recursos

Humanos.

…………………………………………………………………….

  • 3º – remunerada ao servidor que for legalmente responsável por portador denecessidades especiais em tratamento especializado comprovado, em sistema de redução de 50% (cinqüenta por cento) da carga horária de trabalho até o limite de 20 (vinte) horas semanais, dirigido à Secretaria Municipal de Administração e Recursos Humanos, sem prejuízo do cargo efetivo. O benefício tem duração de seis meses, renováveis por iguais períodos, quando solicitado.

 

  • Município de Nova Iguaçu (RJ)

LEI Nº 4.058, DE 31 DE AGOSTO DE 2010.

“DISPÕE SOBRE LICENÇA À GESTANTE E À ADOTANTE, LICENÇA-PATERNIDADE E REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA DE TRABALHO DE SERVIDOR RESPONSÁVEL LEGAL POR IDOSO OU PESSOA PORTADORA DE NECESSIDADES ESPECIAIS.”

A CÂMARA MUNICIPAL DE NOVA IGUAÇU, POR SEUS REPRESENTANTES LEGAIS, DECRETA E EU SANCIONO A SEGUINTE LEI:

……………………………………………………………………

Art. 5º – Ao servidor público responsável legal por idoso ou por pessoa portadora de necessidades especiais fica assegurado direito à redução, em 50% (cinqüenta por cento), da carga horária de trabalho.

Parágrafo Único. A redução prevista no caput depende da comprovação de que o idoso ou o portador de necessidades especiais requer atenção permanente por parte do responsável legal.

Art. 6º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu, 31 de agosto de 2010.

  • Município de Biguaçu (SC)

LEI COMPLEMENTAR 47/2011

Art. 27 Também será concedido horário especial ao servidor detentor de cargo de provimento efetivo portador de deficiência, que tenha jornada fixada em no mínimo 30 (trinta) horas semanais, quando comprovada a necessidade por Junta Médica Funcional, independentemente de compensação de horário, mantida sua remuneração integral.

  • As disposições do caput são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, companheiro ou filho de qualquer condição ou idade portador de deficiência física ou mental.

 

  1. 4 Exemplos de Jurisprudência favorável

6ª Câmara de Direito Público do TJ/SP – j. 16/04/2018

Apelação no 1016460-36.2017.8.26.0071 Apelante: Monica Aparecida Gregorio Felix Apelado: Prefeitura Municipal de Bauru Comarca: Bauru

Voto no 30.640

Apelação cível – Servidora pública municipal Pretensão de redução de jornada de trabalho sem redução de vencimentos para cuidar de filha portadora de necessidades especiais Sentença de improcedência – Recurso da autora Provimento de rigor Análise da mens legis da Lei Municipal nº 5.227/04

Princípios da razoabilidade e proporcionalidade, que se aplicam a toda função administrativa desempenhada pelo Estado.

  1. Sentença reformada. Recurso provido.

13ª Câmara de Direito Público do TJ/SP – j. 4/07/2018

Agravo de Instrumento nº 2049547-48.2018.8.26.0000

Agravante: Município de Lençóis Paulista

Agravado: Marcia Rosana Carpanezi Bueno Comarca: Lençóis Paulista

Juiz: José Luis Pereira Andrade RELATOR: Djalma Lofrano Filho

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDORA PÚBLICA MUNICIP AL. Professora de educação infantil. Pretensão de ver reduzida sua carga horária de trabalho para 25 horas semanais, sem necessidade de compensação ou corte remuneratório, a fim de que possa se dedicar aos cuidados do filho portador de autismo (F84.0). Tutela de urgência concedida na origem. Insurgência da Municipalidade. Descabimento. Os elementos de convicção coligidos aos autos são suficientes para demonstrar a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do art. 300, §§1o a 3o do CPC/2015. Em que pese a omissão legislativa, afigura-se possível a redução da jornada de trabalho, sem prejuízo da remuneração e necessidade de compensação, diante da interpretação do sistema normativo. Precedentes. Decisão mantida. Recurso não provido.

5ª Câmara de Direito Público do TJ/SP – j. 24/10/2016

RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. FILHO MENOR PORTADOR DA SÍNDROME DE DOWN. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. PRETENSÃO À REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA SEM A MODIFICAÇÃO DOS VENCIMENTOS. POSSIBILIDADE. 1. Presença dos requisitos do artigo 300 do NCPC. 2. Inobstante a omissão da Lei Complementar Municipal nº 31/13, tem-se que é possível a redução da jornada de trabalho, sem prejuízo da remuneração e necessidade de compensação. 3. Interpretação analógica da legislação pertinente e princípios constitucionais. 4. Precedentes da jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. 5. Decisão agravada, reformada, para antecipar os efeitos da tutela provisória de urgência. 6. Recurso de agravo de instrumento, apresentado pela parte autora, provido. (TJSP 5a C. Dir. Público AI no 2195270-69.2016.8.26.0000 Rel. Francisco Bianco j. 24.10.2016).

 

8ª Câmara de Direito Público do TJ/SP – j. 25/07/2018

Agravo de Instrumento nº 2096586-41.2018.8.26.0000, da Comarca de Embu das Artes,

Agravante MUNICÍPIO DE EMBU DAS ARTES

Agravada JOSEFA GONÇALVES DE OLIVEIRA MARTINS.

Comarca: Embu das Artes

Relator: Paulo Dimas Mascaretti

Voto 23.501

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO
concedida em primeiro grau para o fim de reduzir a carga horária da autora, servidora pública, sem diminuição de sua remuneração ou necessidade de compensação, em razão de possuir filho com deficiência Flexibilização da jornada de trabalho de responsáveis legais de portadores de necessidades especiais que encontra fundamento em normas federais constitucionais e infraconstitucionais, passíveis de aplicação, em princípio, no âmbito local Proteção à família e da pessoa portadora de deficiência que sobreleva na espécie Recurso não provido.

 

Conclusão

Muito ainda a ser feito no que tange à inclusão efetiva da pessoa com deficiência. A flexibilização da jornada de trabalho aos representantes legais é um benefício intangível já que possibilita o convívio e responsabilidades familiares conciliando-as com o exercício profissional dos tutores/curadores.

Não é crível que haja tratamento diferenciado a servidores públicos dependendo do Estado ou Município que esteja lotado. Contraria a sistemática constitucional, fere os princípios sensíveis e destoa da igualdade e dignidade da pessoa humana apontados como valores fundamentais da República.

A aplicabilidade das normas e direitos fundamentais deve ser imediata e o papel do poder judiciário deve ser  ativo nesse mister. Ademais, o poder judiciário detém obrigação constitucional de aplicação do Controle de convencionalidade sobre normas do direito interno que contrariem os tratados de direitos humanos com status constitucional.

 

Referências

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BARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional e a construção de um novo modelo. 2011, p. 329.

BRASIL. Vademecum Jurídico. São Paulo: Saraiva, 2010.

COMPARATO, Fábio Konder. Ética. São Paulo: Cia das Letras, 2006.

CORTE IDH. Corte IDH. Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 24-11-2010. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf. Acesso em:

DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e seus efeitos. São Paulo: Saraiva, 1989.

FÁVERO, Eugênia Augusta Gonzaga. Direitos das Pessoas com Deficiência: Garantia de Igualdade na Diversidade. Rio de Janeiro: WVA, 2004.

GOYOS, Celso. ARAÚJO, Eliane (Orgs.). Inclusão Social: formação do deficiente mental para o trabalho. São Carlos: Rima, 2006.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade, 3. ed. 6ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 2009.

MORAES, Alexandre, Jurisdição constitucional e tribunais constitucionais. São Paulo, Atlas, 2000.

NAMBA, Edison Tetsuzo. Manual de Bioética e Biodireito. São Paulo: Atlas, 2009.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. O princípio da dignidade da pessoa humana e a exclusão social. Palestra proferida na XVII Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Rio de Janeiro, 29 de agosto a 2 de setembro de 1999.

SARLET, Ingo Wolfang. A eficácia dos direitos fundamentais. 5ª ed., Livraria do Advogado. Porto Alegre: 2006.

SILVA, de Plácido. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, ª edição, 1997.

WANDELLI, Leonardo Vieira. O direito ao Trabalho como direito humano e fundamental: Elementos para sua fundamentação e concretização. Tese apresentada ao curso de pós-graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná como requisito para à obtenção do grau de doutor em Direito. Curitiba, 2009.

 

 

[1] Artigo 1o, III da C.F: “ A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…) III – a dignidade da pessoa humana”.

[2] Sítio MORADIA é um Direito Humano – Relatoria Especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o direito à moradia adequada.

[3] Disponível em: http://www.apadep.org.br/revista/edicao-31-maiojunho-2014/moradia-e-um-direito-humano/.

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