Criminal compliance como instrumento de prevenção dos delitos econômicos

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Resumo: O Direito Penal tem sido muito convocado pela sociedade e, a todo tempo, sofrido significativas mudanças para responder à criminalidade contemporânea. Seu modelo clássico de atuação repressiva sempre se revelou adequado para tutelar bens jurídicos individuais. De outro lado, os delitos econômicos, que ofendem bens jurídicos universais, cujos danos são maiores e muitas vezes irreversíveis, não tem combate fácil para o Direito Penal em sua forma tradicional, e portanto, é desafiado a buscar instrumentos diversos para alcançar uma proteção efetiva. Assim, surgem propostas modernas que defendem um Direito Penal em um modo de atuação preventivo. Nesse contexto, uma política criminal de prevenção foi criada na Alemanha, denominada de Criminal Compliance, que parte de uma análise ex ante do delito, consubstanciada em desenvolver dispositivos de controles internos no âmbito empresarial, a fim de prever ou evitar crimes nesse meio, como fraude, corrupção e lavagem de dinheiro, protegendo empresas e instituições financeiras. Criminal compliance oferece meios alternativos de solução e mecanismos práticos de prevenção de delitos, estruturada de manuais, programas, diretrizes, códigos de conduta, regras e deveres para implantação, cumprimento e fiscalização. O tema merece reflexão porque visa a efetividade da tutela penal da ordem econômica.

Palavras-chave: Criminal Compliance. Prevenção. Ordem Econômica. Efetividade.

Abstract: Criminal law has been much sought by society and, at all times, has undergone significant changes to respond to contemporary criminality. Its classic model of repressive action has always proved adequate to safeguard individual legal assets. On the other hand, economic crimes, which offend universal legal goods whose damages are greater and often irreversible, do not have easy combat for Criminal Law in its traditional form, and therefore are challenged to seek diverse instruments to achieve effective protection. Thus, modern proposals arise that defend a Criminal Law in a preventive way of acting. In this context, a criminal prevention policy was created in Germany, called the Criminal Compliance, which starts with an ex ante analysis of the crime, consubstantiated in the development of internal controls in the business environment, in order to predict or avoid crimes in that environment, such as fraud, corruption and money laundering, protecting companies and financial institutions. Criminal compliance offers alternative means of solution and practical mechanisms of crime prevention, structured of manuals, programs, guidelines, codes of conduct, rules and duties for implementation, compliance and enforcement. The subject deserves reflection because it aims at the effectiveness of criminal protection of the economic order.

Keywords: Criminal Compliance. Prevention. Economic Order. Effectiveness.

Sumário: Introdução. 1. Função e Missão do Direito Penal. 2. Tutela Penal Preventiva do Bem Jurídico da Ordem Econômica. 3. Delitos Econômicos. 4. Corrupção, Fraude e Lavagem de Dinheiro. 5. Criminal Compliance. Conclusão. Referências.

Introdução

A sociedade está vivendo um tempo de profundas mudanças. As relações humanas têm se tornado mais dinâmicas em conjunto ao âmbito global. Evidentemente, o período pós-moderno sofre os efeitos da ordem econômica em todas as partes do mundo – a concorrência de mercado, a utilização e o desenvolvimento incessante da tecnologia, o alagamento de informações e os impactos no meio ambiente.

As mudanças e evoluções oriundas de um modelo globalizante, simultaneamente a outras causas ligadas à expansão, trouxeram novos riscos e proporcionaram à sociedade politizada uma nova categoria de antissocialismo que, às margens da criminalidade clássica, deram forma à uma nova criminalidade, definida como criminalidade moderna ou contemporânea.

Os novos conflitos resultantes da globalização passam a atingir vítimas indeterminadas e bens difusos, que pertencem a sociedade como um todo, não podendo o Direito Penal, que desempenha um papel delicadamente responsável dentro do ordenamento jurídico de proteger efetivamente os maiores valores da humanidade, fechar os olhos ou estar atrás dessa realidade social.

Nesse tipo de criminalidade, destaca-se os delitos contra a ordem econômica que notoriamente e velozmente crescem sem que o legislador e o Direito consigam perceber ou acompanhar esse fenômeno.

A dificuldade em proceder ao enfrentamento desse assunto persiste em razão das características e circunstâncias que revestem os delitos econômicos. Normalmente, os sujeitos ativos são pessoas poderosas e com forte influência econômica, política e financeira, tornando árdua a tarefa de identificá-los, investigá-los e condená-los.

Além disso, a cumplicidade, os sofisticados instrumentos empregados e a ausência de controle estatal ante as frágeis técnicas legislativas que regulam a matéria favorecem a impunidade, e enquanto isso, coletividade é gravemente agredida pelos extensos danos causados, muito maiores que os resultantes da criminalidade tradicional.

Assim, a busca por meios eficazes de controle dessa criminalidade não mais pode esperar, porque, infelizmente, no Brasil, ainda são insatisfatórios.

O plano é apoiar-se em outros métodos que não a repressão porque esta seria tardia e não restauraria o equilíbrio social, uma vez que os danos são graves, atingem um número expresso de vítimas e, muitas vezes, irreparáveis, de modo que, uma atuação do Direito Penal em caráter preventivo, concentrado em evitar o delito, se apresentaria melhor e, possivelmente, mais eficiente.

1. Função e Missão do Direito Penal

Em uma concepção clássica, o Direito Penal se ocupa de regulamentar em lei a conduta humana desviada e cominar a ela uma sanção, visando a proteção da sociedade (HASSEMER; CONDE, 1989, p.114).

No decorrer da história, o Direito Penal contraiu outras perspectivas, não mais se limitando, apenas a um instrumento de controle social de repressão ao crime, mas de, ao mesmo tempo, proteção de bens jurídicos relevantes (ZAFFARONI, 1977, p.31).

A (árdua) incumbência do Direito Penal em salvaguardar os maiores valores da sociedade o desafia incessantemente a desenvolver, cada vez mais, mecanismo eficientes de tutela. Assim, alguns estudos jurídicos avançaram-se no sentido de acreditar que o Direito Penal, na verdade, cumpre funções ou missões.

De uma forma muito habilidosa, Winfried Hassemer e Munõz Conde definem função como os efeitos, as consequências reais, e missão como o fim, a verdadeira finalidade, as consequências perseguidas (HASSEMER; CONDE, 1989, p.99).

A distinção é pertinentemente necessária porque, em se tratando de Direito Penal, as terminologias técnico-jurídicas função e missão devem ser cautelosamente empregadas.

A preocupação do Direito Penal com as condutas humanas fez surgirem teorias para explicar as ações dentro da dogmática penal. Por muito tempo, em uma visão filosófica, adotou-se a teoria causal naturalística da ação de Franz Von Liszt e Ernst von Beling, sendo a ação toda conduta voluntária causadora de uma modificação no mundo exterior (ROXIN, 1997, p. 236-237).

Na década de 30, Hans Welzel sustentou que a ação não se consubstanciava apenas em uma movimentação corpórea que provocava alterações, mas se dirigia a uma finalidade. Há uma supervalorização da finalidade, na acepção de que somente mediante a referência de um determinado resultado é que se poderia estabelecer o que seria uma ação.

Em sua visão, a ação humana seria um exercício de atividade final e não puramente causal, baseando-se no fato de que o ser humano, munido de um saber causal pode prever as possíveis consequências de sua conduta e, assim, dirigir seus vários atos a ponto de orientar o suceder causal externo a um fim, dominando-o finalisticamente (WELZEL, 2001, p.27). Deste modo, denominou-se como finalismo o marco do surgimento das teorias social e finalista da ação.

Por sua vez, Claus Roxin, na década de 70, exprimiu que o finalismo conseguiu com sucesso aproximar a dogmática penal à realidade dada a construção lógico-conceitual da teoria finalista da ação. Acrescenta ainda que a proposição de Franz Von Liszt de que o Direito Penal é a “barreira intransponível da política criminal” atribuía-o um caráter dúplice a sua ciência: de um lado, como social e, de outro, como jurídica (ROXIN, 2000, p.1-2).

A partir disso, segundo Roxin, haveria a necessidade de se construir e ordenar: a sistemática-conceitual do Direito Penal, a partir dos pressupostos do delito, e as políticas criminais, sendo estas, os métodos racionais de combate à criminalidade como tarefa social do Direito Penal (ROXIN, 2000, p.27-28).

Na visão do autor, a jornada pela história da metodologia jurídico-penal revela que é possível a construção de um sistema fértil se atento à ordem e clareza conceitual, proximidade à realidade e orientação por fins político-criminais.

Portanto, o finalismo de Hans Welzel semeou o funcionalismo penal – o Direito Penal compreendido em razão de sua função. Daí, remonta-se às considerações iniciais de que o Direito Penal tem por finalidade–missão – proteger bens jurídicos e impedir danos sociais; e por função, construir políticas criminais.

A luta contra o crime e as políticas criminais que, por muitas vezes, se desencadeiam em dispositivos legais, apontam que não se trata de um problema tipicamente de Direito Penal, mas de Direito Constitucional (ROXIN, 2000, p.35-36).

Nesse contexto, a política criminal é um dos instrumentos efetivos do Estado na luta contra o crime porque seu precípuo objetivo é identificar os fins do Estado frente ao fenômeno do crime e criar meios para realizá-los (MAURA, 2001, p.107).

Aliás, a política criminal se aproxima das disciplinas políticas, porque ambas são políticas de meios e fins (FRAGOSO, 1985, p.18).

Inevitavelmente, Direito Penal e política criminal caminham juntos. Bem explica essa relação Claus Roxin:

“Um divórcio entre construção dogmática e acertos político-criminais é de plano impossível, e também o tão querido procedimento de jogar o trabalho dogmático-penal e o criminológico um contra o outro perde seu sentido: pois transformar conhecimentos criminológicos em exigências político-criminais, e estas em regras jurídicas, da lex lata ou ferenda, é um processo, em cada uma de suas etapas, necessário e importante para a obtenção do socialmente correto” (ROXIN, 2000, p.82).

Portanto, o Direito Penal, cumprindo seu papel funcional, se incumbe de construir as políticas criminais.

2. Tutela Penal Preventiva do Bem Jurídico da Ordem Econômica

Professor Heleno Cláudio Fragoso define que bem jurídico é um bem protegido pelo direito, logo, é um valor da vida humana que o direito reconhece, e a cuja preservação é disposta a norma (FRAGOSO, 1985, p.277-278).

À tutela do Direito Penal somente interessa os bens jurídicos com dignidade penal, ou seja, os essenciais ou fundamentais. As proibições penais apenas se justificam por absoluta necessidade – princípio da necessidade – e minimamente possíveis, bem como, por utilidade, somente aquelas condutas realmente reprováveis – princípio da utilidade. (FERRAJOLI, 2010, p.427-428).

A titularidade do bem jurídico pode ser individual ou coletiva (JESCHECK, 1993, p.234). No primeiro, as pessoas individualmente são afetadas diretamente, enquanto no segundo, toda a sociedade é atingida, de modo que, eventualmente, os danos são irreparáveis.

Para a tutela efetiva de bens jurídicos individuais e coletivos, ensina o mestre italiano Luigi Ferrajoli, percussor do garantismo penal, que o Direito Penal deve respeitar os direitos fundamentais e atuar forma mínima possível:

“Estes processos, estas lutas, não se exaurem apenas em ações individuais. Ao contrário, são sobretudo, processos e lutas coletivas, expressas pelos movimentos de massa, ou ainda, por todo o povo. Isto vale para os clássicos direitos de liberdade, mas vale também mais para os direitos sociais, do direito ao trabalho ou à saúde àquelas à tutela do ambiente, À paz, e à autodeterminação; e vale inteiramente para os direitos políticos e sindicais, da liberdade de reunião e associação ao direito de greve, que são direitos individuais exercitados coletivamente. Existe, a despeito disso, um nexo entre subjetividade individual, seja individual quanto coletiva, e luta pela defesa ou conquista de direitos fundamentais” (FERRAJOLI, 2010, p.870).

Os direitos fundamentais são os maiores valores do ser humano e, por isso, obrigatoriamente devem ser observados, afinal, justificam a existência do Estado e do próprio Direito. O garantismo valoriza o máximo respeito à Constituição Federal, seus princípios e a legalidade – a maior segurança jurídica dos cidadãos e das decisões estatais – de encontro a um Estado Democrático de Direito.

Lembra, igualmente, o professor Marco Antonio Marques da Silva, ao analisar a constitucionalização dos princípios processuais penais, que os princípios não podem ser desrespeitados por leis infraconstitucionais para que não sejam suscetíveis de eventuais artimanhas legislativas e a possibilidade de se macular ou pôr em risco a segurança do processo penal contra direitos e garantias pessoais.

Com efeito, Winfried Hassemer entende que a função do Direito Penal, em razão de sua estrutura, é modesta e se limita à proteção de bens jurídicos individuais. O Direito Penal em sua forma clássica, tradicional e repressiva é apto para responder à criminalidade individual (HASSEMER, 1999, p.20-21).

De seu turno, Roxin propõe um modelo de prevenção pelo Direito Penal ao invés de ostensiva repressão. O Estado, reduzindo seu controle estatal, mas fortalecendo sua vigilância, enfrentaria melhor a criminalidade, especialmente no que se refere à organizações criminosas e delitos econômicos (ROXIN, 2000, p.5-6).

Essa postura inclui, ainda, a redução de tipos penais, penas privativas de liberdades e suavização do Direito Penal. (ROXIN, 2000, p.16-20).

Nos bens jurídicos difusos e coletivos, a lesão é muito extensa, de difícil ou impossível reparação. Na mesma esteira, é impossível proteger delitos econômicos se não houver uma antecipação penal, porque, esperar pela lesividade ao bem jurídico, de nada resolveria o Direito Penal, nem mesmo se repreender:

“Referido princípio da ofensividade obriga, assim, ao legislador a evitar a criminalização de injustos meramente formais e ao intérprete a construção teórica de cada tipo penal integrado à concreta afetação do bem jurídico. Dessa forma, as funções administrativas do Estado na esfera econômica continuam a não poder ser objeto de proteção penal, em razão da sua violação não implicar ofensa efetiva aos interesses pessoais a elas indireta e eventualmente relacionados” (FRANCO; LIRA, 2011, p.57).

É certo que a ordem econômica pertence a uma categoria de bens jurídicos coletivos e precisa ser abrigada pelo manto penal porque os efeitos da criminalidade econômica excedem os interesses individuais (TIEDEMANN, 1975, p.65).

No Brasil, a intervenção penal no âmbito econômico é legítima quando da leitura dos artigos 3º e 170 da Constituição Federal vigente.

“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

I – soberania nacional;

II – propriedade privada;

III – função social da propriedade;

IV – livre concorrência;

V – defesa do consumidor;

VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII – redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII – busca do pleno emprego; IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”

Ademais, a cautela do legislador no artigo 173, §§4º e 5º dispondo que a lei reprimirá o abuso econômico, indica que existe a possibilidade de sanções administrativas ou não privativas de liberdade, se o objetivo for a efetividade da tutela penal da ordem econômica.

“Art. 173 Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.[…]

§ 4º – A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

§ 5º – A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.”

A questão a indagar é se a proteção penal da ordem econômica constitui uma discricionariedade legislativa ou um mandado implícito de criminalização.

Entendendo a ordem econômica como opção legislativa, a efetividade de sua tutela bem se adequaria, hipoteticamente, à proposta de Jesus-Maria Silva Sánchez que defende um Direito Administrativo Sancionador.

Entende o jurista que no combate aos delitos socioeconômicos, não cabe outra forma senão flexibilizar regras de imputação e princípios de garantia, excluindo-se as penas corporais (SILVA SÁNCHEZ, 2002, p.146-147).

Tratando-se de um direito sancionatório, cujo ponto de partida é a relação existente entre as garantias contidas em um sistema de imputação e a severidade de suas sanções aplicadas, nem todas as garantias hão de ser exigidas já que as consequências jurídicas são substancialmente diversas (SILVA SÁNCHEZ, 2002, p.138).

As garantias dogmáticas do Direito Penal tradicional podem ser reduzidas desde que, em contrapartida, o mesmo fosse aplicasse às penas, prevalecendo as pecuniárias ou restritivas de direito, vedando-se as privativas de liberdade.

De outro lado, reconhecida a ordem econômica como um mandado implícito de criminalização, o Direito Penal deve a todo custo intervir e, por ser o ramo de maior segurança jurídica, deve ser efetivo, daí porque, exige-se uma atuação preventiva, diferente da forma tradicional repressiva.

Antônio Carlos da Ponte conceitua os mandados implícitos de criminalização:

“O reconhecimento aos mandados implícitos de criminalização sempre dependerá de uma análise contextual da Magna Carta; contudo, não se pode dar no campo meramente subjetivo, atrelado unicamente ao talante do intérprete. A eleição de critérios seguros mostra-se como imprescindível para que não haja violação ao corpo constitucional, sob o pretexto de preservá-lo.

Sob tal ótica, justifica-se o reconhecimento de um mandado implícito, quando o bem protegido ou que se busca a proteção, apesar de afigurar-se como preponderante dentro da ordem constitucional, não contar com previsão expressa e tampouco com a consequente proteção normativa; caso esta já se encontre no ordenamento, afigure-se como débil, insuficiente ou ineficaz. Em regra, situações extremadas justificarão seu reconhecimento” (PONTE, 2008, p.166).

Quando o assunto é proteção de bens jurídicos universais, as dificuldades a serem enfrentadas são maiores para manter o equilíbrio social e atender os objetivos da República Federativa do Brasil contidos no artigo 3º da Magna Carta, não podendo a ordem econômica ser ignorada pelo Direito Penal, assim como, não há violação em antecipar seu modo de atuação quando se fala em efetividade, desde que preservados os princípios constitucionais, a ultima ratio e os direitos fundamentais.

3. Delitos Econômicos

Nos delitos contra a ordem econômica é comum a associação ao termo "crimes do colarinho branco", assim denominado no século XX pela clássica doutrina de Sutherland. Tratam-se de crimes cometidos por pessoas muito respeitadas e com status social elevado na categoria específica de sua profissão, por exemplo, empresários, banqueiros, políticos, inclusive, por grandes elites econômicas-financeiras.

A criminalidade econômica consiste na atividade criminosa em matéria tributária e empresarial, com descumprimento às normas cambiais, fenômenos delinquenciais no campo societário e fatos relacionados aos procedimentos falimentares (CASTILHO, 1998, p.68).

Tais crimes podem ser associados à expressão macrocriminalidade econômica porque envolve o caráter difuso, múltiplo e indeterminado de vítimas e grave danosidade material e social, marcada por atributos de cunho patrimonial e abuso no exercício rotineiro das atividades empresariais, direcionados a afetar a ordem econômica e tributária.

A impunidade é uma marca forte nesse tipo de criminalidade. Muitos dos fatos criminosos escapam da investigação oficial, a que se denomina de cifra negra, e aqueles, estatisticamente, que não são identificados e permanecem impunes, são cometidos na classe alta, a que se denomina de cifra dourada (FELDENS, 2002, p. 135-136).

Os delitos praticados na esfera econômica atingem bens como a ordem tributária, financeira, o meio ambiente e as relações de consumo. Suas características são peculiares, pois, envolve não somente agentes relevantes, mas emprego de tecnologias e instrumentos habilidosos dentro de uma sistemática empresarial, ofendendo um número indeterminado de pessoas e causando graves danos.

4. Corrupção, Fraude e Lavagem de Dinheiro

Corrupção, fraude e lavagem de dinheiro são crimes que preocupam o Brasil e avançam no cenário internacional. Não há surpresa a presença desses delitos na rotina e atividades empresariais e bancárias, ocasionando prejuízo às organizações e impactos econômicos.

As Nações Unidas já entendiam a corrupção como um comportamento contrário à ética, à moral, à tradição e à lei, e previam no 10º Princípio do Pacto Global das Nações Unidas que as empresas deveriam combater todos os modos de corrupção, como a extorsão e a propina. (SANTOS, 2011, p.11).

Wells apud Santos, um dos maiores estudiosos de fraude e corrupção mundial, conceituava fraude como tudo aquilo concebido pela engenhosidade humana e assim utilizado pelo indivíduo para auferir vantagem sobre o outro através da supressão da verdade, seja por qualquer meio injusto, como a surpresa, o engano, a esperteza e a dissimulação.

Na concepção do autor, a "corrupção" é uma categoria de fraude que, junto com a "apropriação indébita" e as "demonstrações fraudulentas", formam o The Fraud Tree (SANTOS, 2011, p.23).

Já a expressão "lavagem de dinheiro" surgiu nos EUA na década de 20. Na Europa, se diz "branqueamento de capitais", expressão para designar o dinheiro ilícito com aparência de lícito, ou, em outras palavras, “dinheiro sujo" transformado em "dinheiro limpo"(SILVA, 2001, p.33).

É possível, ainda, a lavagem de dinheiro estar ligada a bancos internacionais e o crime organizado, que foram avantajados pela globalização e a evolução do mercado financeiro internacional.

O Brasil optou por fazer uso do termo "lavagem de capitais", conforme a Lei nº 9.613/98. O objetivo da lei foi combater a criminalidade organizada transacional e proteger a ordem econômico-financeira do país contra as múltiplas condutas que afetam a coletividade.

A corrupção, a fraude e a lavagem de dinheiro são uma das causas do enfraquecimento do sistema legal porque embaraça o crescimento econômico, afetando a transparência a que são obrigados os setores públicos e, assim, expande cada vez mais a evasão fiscal. Sem dúvidas, afronta diretamente a ordem jurídica e desencadeia uma quebra do Estado Democrático de Direito.

Alberto Silva Franco e Rafael Lira associam, inclusive, o terrorismo ao crime de lavagem de dinheiro e ressaltam a importância de serem combatidos por meio de um Direito Penal preventivo:

“À guia de conclusão, ratifica-se que o terrorismo é a forma mais leviana de exteriorização das crenças e desavenças observadas entre os povos ou entre os seres humanos de uma mesma sociedade. A manifestação do terror como forma de contestação e ou expiação das controvérsias havidas entre as pessoas apresenta-se como uma moléstia grave e própria da globalização.

Com o avanço das tecnologias e com o surgimento da chamada criminalidade moderna (que se aproveita das facilidades advindas do êxito na área das comunicações, das relações entre os países, das criações e invenções no ramo da computação, dos sistemas bancários interligados dentre outros vetores), o terrorismo também assumiu feição internacional e com grande poderio, forçando as nações trabalharem duro no campo da prevenção e da repressão dessa forma atroz de oposição” (FRANCO; LIRA, 2011, p.479).

Em algumas situações a lavagem de capitais pode também estar envolvida com organizações criminosas devido as características específicas desse grupo: o caráter transacional, os múltiplos meios de disfarces e dissimulação, o modo organizado de operar semelhante a uma empresa, o número expressivo de delitos perpetrados contra vítimas difusas e o fenômeno cambiente, que se altera de acordo com os mercados nacionais ou internacionais.

Assim, no cenário da macrocriminalidade, medidas cautelares e sanções patrimoniais surtem melhores efeitos porque retiram a força dos entes e organizações criminosas que atuam por trás desses crimes, devendo direcionar o Direito Penal à rota e perseguição dos capitais circulados, que financiam os atos, com a recuperação de bens e ativos oriundos dos delitos, do que, preocupar-se, propriamente, em punir o agente com uma pena privativa de liberdade, sendo que, o problema maior, está no sistema, não na pessoa.

5. Criminal Compliance

Criminal Compliance se insere no enredo da acepção de que o Direito Penal tem a missão de proteger bens jurídicos, individuais e coletivos, entre eles, a ordem econômica, que convenientemente, requer um modo de atuar preventivo e que inevitavelmente se atenta a uma funcionalidade, a de formular políticas criminais.

O assunto é de berço alemão, estudado pela Escola Clássica de Frankfurt como proposta de combate efetivo contra delitos de fraude, corrupção e lavagem de capitais.

Criminal Compliance é uma política criminal alicerçada a uma prevenção, proposta a otimizar controles internos, boas condutas e boas práticas no âmbito corporativo, a serem respeitadas e executadas por seus integrantes durante o exercício rotineiro de suas atividades, a fim de prevenir ou diminuir o risco de delitos, bem como, a persecução criminal.

Um dos percussores do tema no Brasil é o professor Giovanni A. Saavedra que esclarece que criminal compliance faz uma análise ex ante do crime, ou seja, avalia as condutas humanas antes de atingirem o bem jurídico, se afastando do modelo do Direito Penal clássico que espera a ocorrência do delito (SAAVEDRA, 2011, p.11-12).

O desenvolvimento do compliance é paradoxal, porque tem a intenção de prevenir a responsabilidade penal e formar, dentro da própria empresa, uma cadeia de responsabilização legal (BENEDETTI, 2012, p.72).

É o manual de compliance o documento-guia da empresa, direcionado e aplicado a todos seus integrantes, desde os sócios, diretores e administradores até os funcionários e colaboradores contratados, e nele conterá, todos os direitos e deveres, as atribuições e funções de cada um, suas responsabilidades e consequências. 

O manual de compliance deve ser um regulamento, obrigatoriamente, minucioso, a fim de se evitar casos omissos e, rigorosamente, cumprido, já que a finalidade essencial (embora de muita valia na organização da atividade da empresa) é prevenir-se de delitos ou mitigar a responsabilidade criminal.

Nessa linha, Enrique Bacigalupo elenca alguns elementos que deve conter um Sistema de Gestão de Compliance (Compliance Management System), utilizando-se por base o projeto de Compliance-Prüfungsstandar (EPS 980) proposto pelo IDW (Institut der Wirtschaftsprüfer in Deutschland e.V) para as empresas de primeira linha na Alemanha, que pode ser também aplicado a outros tipos de empresas. São eles:

“A) Cultura do Cumprimento: existência de códigos de integridade de comportamento, comunicação entre os representantes legais e diretores da empresa com os empregados e trabalhadores, cursos de informação e esclarecimento sobre a legislação vigente, aplicação e regras de integridade e um sistema de sanções em caso de descumprimento;

B) Fins do Cumprimento: segurança e prevenção de infrações;

C) Organização do Compliance: funções e responsabilidade dentro do sistema de compliance, designação de encargos e de uma comissão especial provida de meios necessários para o cumprimento das funções;

D) Individualização de Riscos: prever critérios para valorizar os mesmos e seu pronto reconhecimento;

E) Programa de Compliance: princípios e medidas para limitar os riscos e orientar os comportamentos conforme os direitos de todos os integrantes das empresas;

F) Comunicação: dever de informação de risco e do cumprimento das regras dentro de das instâncias competentes;

G) Vigilância e Correção: implantação de medidas de supervisão e vigilância e procedimentos de revisão interna que conduzam, em caso de comprovada a violação, à rescisão do contrato de trabalho ou com terceiros” (BACIGALUPO, 2012, p.142-143).

Com efeito, os códigos de conduta de um Sistema de Gestão de Compliance deve abarcar algumas matérias como a exclusão de conflito de interesses; corrupção; os direitos da competência; observância aos direitos humanos; ética e proteção contra discriminação; confidencialidade e proteção de dados; correção a contabilidade, faturamento e direito fiscal; segurança na disponibilidade, integridade, autenticidade e confidencialidade das informações; cumprimento de exigências de proteção ao meio ambiente e à saúde; e canal interno de denúncia de irregularidades (BACIGALUPO, 2012, p.146).

À vista disso, a fixação de diretrizes mínimas em um regulamento interno da empresa, de cursos de informação, conhecimento e treinamento das regras impostas, de programas de cumprimento, de controle e monitoramento de execução das atividades, é o primeiro passo a ser dado antes de se estabelecer, individualizar e demarcar as condutas de cada indivíduo e suas respectivas responsabilidades.

O programa ou manual de compliance é o primeiro pressuposto da imputação penal no âmbito corporativo dentro de um modelo de Direito Penal prospectivo.

De um ponto de vista prático, uma das propostas para a primeira exteriorização de atuação do criminal compliance seria no contrato assinado entre a empresa e o profissional contratado, cujos termos devem prever as regras de compliance, as condutas a serem adotadas, as atividades desenvolvidas e as responsabilidades (BENEDETTI, 2012, p.79).

Esse conhecimento prévio dos indivíduos no ato de sua contratação é imprescindível, todavia não é suficiente para lhes atribuírem uma imputação penal, na hipótese da prática de um delito, sequer fundamentá-la, porque facilmente recorreriam ao erro de proibição ou ao erro de tipo, fragilizando ainda mais o Direito Penal.

Daí a obrigação da empresa de promover periodicamente cursos para conhecimento das regras e responsabilidade, treinamentos, monitoramento das atividades e auditorias, inclusive, por segurança, aplicar avaliações e emitir relatórios mensais, ciente a empresa de que, se quer se proteger, deverá documentar sua rotina ao máximo possível.

De outro lado, é vital ao Direito Penal tomar uma postura cautelosa no enfrentamento deste assunto para coibir injustiças.

Não podemos nos afastar da possibilidade dos próprios donos, sócios, diretores ou administradores das empresas se aproveitarem da hipossuficiência, do posto ou da condição de seus funcionários ou colaboradores para praticarem crimes, blindando-se da responsabilidade penal e transferindo-a aos inocentes.

Nesses casos, para evitar uma punição seletiva, o Direito Penal deve delimitar critérios precisos de conduta, responsabilidade e imputação.

O tema compliance deu seus primeiros passos no Brasil com a Lei de Lavagem de Capitais (Lei n.º 9.613/98 que já sofreu alterações pela Lei n.º 12.683/12) que obriga as instituições financeiras e empresas de capital aberto a criarem controles internos e, para tanto, prescreve deveres de compliance, com o intuito de evitar crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e outros, ou, ao menos, facilitar a investigação.

Portanto, a referida lei privilegia a prevenção por meio dos deveres de compliance, conforme a redação do artigo 10:

“Art. 10. As pessoas referidas no art. 9º:

I – identificarão seus clientes e manterão cadastro atualizado, nos termos de instruções emanadas das autoridades competentes;

II – manterão registro de toda transação em moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários, títulos de crédito, metais, ou qualquer ativo passível de ser convertido em dinheiro, que ultrapassar limite fixado pela autoridade competente e nos termos de instruções por estas expedidas;

III – deverão adotar políticas, procedimentos e controles internos, compatíveis com seu porte e volume de operações, que lhes permitam atender ao disposto neste artigo e no art. 11, na forma disciplinada pelos órgãos competentes; (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

IV – deverão cadastrar-se e manter seu cadastro atualizado no órgão regulador ou fiscalizador e, na falta deste, no Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), na forma e condições por eles estabelecidas; (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012)

V – deverão atender às requisições formuladas pelo Coaf na periodicidade, forma e condições por ele estabelecidas, cabendo-lhe preservar, nos termos da lei, o sigilo das informações prestadas. (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012).

§ 1º Na hipótese de o cliente constituir-se em pessoa jurídica, a identificação referida no inciso I deste artigo deverá abranger as pessoas físicas autorizadas a representá-la, bem como seus proprietários.

§ 2º Os cadastros e registros referidos nos incisos I e II deste artigo deverão ser conservados durante o período mínimo de cinco anos a partir do encerramento da conta ou da conclusão da transação, prazo este que poderá ser ampliado pela autoridade competente.

§ 3º O registro referido no inciso II deste artigo será efetuado também quando a pessoa física ou jurídica, seus entes ligados, houver realizado, em um mesmo mês-calendário, operações com uma mesma pessoa, conglomerado ou grupo que, em seu conjunto, ultrapassem o limite fixado pela autoridade competente.

Art. 10A. O Banco Central manterá registro centralizado formando o cadastro geral de correntistas e clientes de instituições financeiras, bem como de seus procuradores. (Incluído pela Lei nº 10.701, de 9.7.2003)”

Portanto, no Brasil, os deveres de compliance são: identificação de clientes, criação, manutenção e atualização de cadastros, criação de um programa de controle interno, registro de transações financeiras realizadas e comunicação de operações suspeitas.

Identificar o cliente é a primeira medida a ser tomada pelas empresas e principalmente das instituições financeiras. Consiste no conhecimento e detalhes necessários da vida pessoal e profissional do cliente para maior segurança às informações oferecidas na Ficha Cadastral.

Em uma discussão iniciada no Comitê de Compliance da Associação Brasileira dos Bancos Internacionais (“ABBI”), percebeu -se a necessidade da consolidação em um único documento das melhores práticas com relação ao assunto Prevenção e Combate às Atividades de Lavagem de Dinheiro.

Entre algumas medidas está o Conheça seu Cliente, que visa identificar e conhecer a origem da formação do patrimônio e dos recursos financeiros do cliente. Essa ferramenta é importante para a prevenção de riscos e crimes financeiros.

O cadastro, a manutenção e a atualização dos dados do cliente é o procedimento e dever de compliance a ser observado após o cumprimento do primeiro. Naturalmente, os dados e atos do cliente devem ser acompanhados e atualizados e, quando necessário, comunicados às autoridades e órgãos competentes e fiscalizadores.

Por sua vez, os programas de compliance e controles internos, com as observações já feitas, são elaborados conforme a realidade particular da organização, suas circunstâncias específicas, sua cultura, sua área de atuação, o tipo de atividade desenvolvida e o local de sua operação (COIMBRA; MANZI, 2010, p.20 e ss).

Sugere-se, nesse contexto, a criação de Códigos de Ética a fim de relatar documentalmente os valores e princípios da empresa, bem como, as ações, comportamentos e compromissos que defende, a que deve aderir, da mesma forma, seus funcionários.

Por fim, o registro das transações financeiras e a comunicação de operações suspeitas devem ser comunicadas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF). Tais deveres compliance nos traz a impressão (correta) de dever de comunicar operações suspeitas de crime.

No entanto, esses deveres são mais voltados às instituições financeiras, tendo em vista que são as maiores cúmplices e vítimas de lavagem de dinheiro.

O COAF tem origem no Ministério da Fazenda através da Lei n.º 9.613/98, cujo artigo 14 explica que sua finalidade é “disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar ocorrências suspeitas de atividades ilícitas, podendo requerer aos órgãos da administração pública as informações cadastrais, bancárias e financeiras de pessoas envolvidas em atividades suspeitas". Através do SISCOAF há um eficiente intercâmbio de informações entre o COAF e os organismos nacionais e internacionais.

Evidentemente, é um eficiente e preventivo órgão no combate aos crimes de lavagem de dinheiro. Desde 1999, é integrante do Grupo Egmont, um organismo internacional sem secretariado ou sede permanente, desenvolvido por unidades de inteligência financeira, para troca de informações, recebimento e tratamento de comunicações de transações suspeitas ligadas à lavagem de dinheiro que se concentra em descobrir a rota percorrida pelo dinheiro do narcotráfico e outros delitos graves para capturar os reais criminosos (COIMBRA; MANZI, 2010, p.124).

Outrossim, Pacífico Rodríguez Villar e Nateo Germán Bermejo, à luz do Comitê da Basileia, ressaltam a importância do dever de comunicar e o sigilo como fundamentos da segurança jurídica para a prevenção de crimes:

“La Declaración de Principios del Comitê de Basilea sobre el Lavado de Dinero trata sobre la colaboración de los bancos com las autoridades estatales encargadas de diseñar las políticas de prevención.[…]

Privilegiar las atividades preventivas sobre las repressivas és uno de los objetivos regulatórios básicos.”…“El deber de informar – La coluna vertebral del sistema de instigación para la prevención y represión del branqueo de capitales – operraciones sospechosas – mayor seguridade jurídica. Las prácticas se rutinizan y ello confierenpredictibilidad y estabilidade a la organización, possibilitando la detección de errores y su corrección” (VILLAR; BERMEJO, 2001, p.75-121).

Respeitados os deveres de compliance, verifica-se que as empresas e instituições financeiras estão mais asseguradas de crimes de fraude, corrupção e lavagem de dinheiro. Ainda que na hipótese da prática de qualquer delito, a observação aos deveres podem facilitar as investigações e mitigar a responsabilidade penal.

É oportuno observar que o custo é caro para implantar um programa de compliance com todas as considerações expostas. Todavia, estamos tratando de instituições financeiras e grandes empresas, que possuem muitos recursos e geram alta renda financeira logo, as expostas a esses delitos, já que os danos que se pretendem causar são extensos, e necessariamente, prescindem agentes dessa magnitude. Portanto, os riscos que as organizações correm por não aderirem a uma política de prevenção e um manual de controles internos ou boas práticas, são muito maiores.

Por fim, Criminal Compliance é uma proposta não aplicada no Brasil, mas ganha respeito e avança à aderência. A recente Lei nº 12.846/13 – a "lei anticorrupção" – já prevê a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas e responsabilidade individual dos diretores, administradores ou funcionários nos âmbitos cível e administrativo por atos de corrupção, alertando às empresas, assim, que estar em compliance é eminente, tão logo, uma exigência.

Conclusão

A finalidade mais relevante do Direito Penal é tutelar bens jurídicos. Ao longo do tempo, o Direito Penal se ocupou de interesses individuais e bem cumpre sua missão em seu modo repressivo de atuar. Com a evolução social, bens jurídicos pertencentes a uma categoria universal passaram a ser expostos a perigo ou a lesão. Questiona-se, assim, se o Direito Penal clássico é capaz de responder a altura da criminalidade moderna.

O Direito Penal é o último dos ramos do Direito a ser convocado para manter o equilíbrio social. Por tratar-se da mão mais pesada do Estado, sua intervenção obrigatoriamente precisa ser efetiva, do contrário, não há salvação.

Quando se fala em criminalidade contemporânea, a ordem econômica se destaca, senão, como a mais agredida por delitos nas mais diversas modalidades financeiras. E prezando por sua tutela efetiva, não é possível manter um Direito Penal que reage diante de um fato após a lesão ao bem jurídico.

A ideia de olhar diferente para o Direito Penal à um modelo de prevenção de delitos, visando a preservação dos bens jurídicos, é uma proposta sólida de redução de criminalidade.

Um Direito Penal prospectivo que enxerga o futuro e se antecipa dos danos que podem sofrer a sociedade como um todo está mais bem preparado para enfrentar a macrocriminalidade. Nesse contexto, criminal compliance é apenas uma política criminal que parte de um Direito Penal prospectivo e vem com boas intenções porque visa a tutela efetiva da ordem econômica.

Por se tratar de uma análise ex ante do crime, por não esperar que um delito aconteça e por não se valer de meios repressivos, o compliance traz benefícios a todos, seja ao Estado, a sociedade e a própria empresa.

Além prevenção de riscos, da corrupção, da fraude e da lavagem de dinheiro, as imputações são melhores definidas, pois, forma-se uma cadeia uma cadeia de responsabilidade de cada indivíduo no âmbito interno da empresa, identificando efetivamente o agente penalmente responsável.

De outro lado, em razão da antecipação Direito Penal, é possível a mitigação da persecução criminal, inclusive, aplicação de outras penas diversas das privativas de liberdade.

Por fim, é possível pensarmos no assunto dentro de um modelo de Direito Penal mínimo e em um Estado Democrático de Direito que se atente à Constituição Federal, os princípios, as garantias e direitos fundamentais, valorizando um Direito Penal de mínima prevenção imprescindível ao invés da máxima eficácia possível.

 

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Informações Sobre o Autor

Guilherme Lopes Felicio

Advogado em Presidente Prudente – SP. Mestrando em Direito Penal PUC-SP. Pós-graduando em Direito Empresarial UEL-PR. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal PUC-SP


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