Resumo: A sociedade brasileira vive o drama do tráfico das drogas, e não é apenas quem está envolvido nesta problemática que conhece a dor, a angústia e o sofrimento que a droga acarreta. O presente artigo faz um breve estudo histórico da Justiça Militar da União, de sua estrutura constitucional, bem como, de sua atuação no atual contexto social e legal do combate e repressão aos entorpecentes. Analisa-se, no presente trabalho, o art. 290 do Código Penal Militar e a Lei nº 11.343/06, ambas, referentes ao assunto, juntamente com análise da Constituição Federal e seus princípios e finalmente examina-se a jurisprudência do Superior Tribunal Militar (STM), no importante papel de aplicar, dosar e interpretar da lei militar. Desta forma, o presente artigo, pretende elucidar sobre o assunto, supracitado, bem como, trazer propostas para uma melhor lei penal militar no atual contexto do combate às drogas na administração militar.
Palavras-Chave: Justiça Militar da União, Drogas, Código Penal Militar, Lei 11.343/06, Administração Militar.
Abstract: Brazilian society lives the drama of trafficking of drugs, many people lives this reality although those who are involved in this issue. They know the pain, the anguish and suffering that the drug carries. This article gives a brief historical survey of Brazilian’s Military Justice, its constitutional structure, and their actions in the current social and legal context of the fight against narcotrafic. This research was based on the art. 290 of the Military Penal Code and Law N°. 11.343/06, they both are referring to this subject, with analysis of the Federal Constitution and its principles and finally study the cases of the Superior Military Courthouse (STM – Superior Tribunal Militar), to understand how important is to implementing and apply military law. This article, wants to elucidate on this issue and bring proposals for better military criminal law in the current context of the fight against drugs in the military administration.
Keywords: Military Justice, Drug, Military Penal Code, Law 11.343/06, Military Administration.
Sumário: 1. Introdução 2. Justiça Militar 3. Código Penal Militar e a Lei de Entorpecentes – Lei 11.343/2006 4. Constituição Federal 5. Jurisprudência do art. 290 do Código Penal Militar 6. Conclusão. 7. Referências
1. INTRODUÇÃO
“A justiça das penas, mais que a sua severidade, faz a força da lei”(Montesquieu em “O espírito das leis”)
O presente artigo tem por objetivo analisar, investigar e conflitar os aspectos jurídicos e constitucionais, no âmbito do direito penal militar e comum, no que tange ao combate do tráfico, porte e uso de drogas em unidades militares. Examinar-se-á a Constituição Federal de 1988, a legislação referente ao assunto e a jurisprudência pátria.
Analisar-se-á, de igual modo, o conceito ventilado pelas legislações pertinentes à matéria, verificando se este é um conceito único ou se sofre alterações. Tal estudo se faz imprescindível quando se verifica uma lei penal nova e uma lei penal militar obsoleta, que tratam da matéria, e observa-se na perspectiva do jusnaturalismo e juspositivismo a melhor técnica entre o ser e o dever ser para o caso em análise. Deve-se contentar somente com o ser (lei positivada) ou buscar o dever ser (lei moral) para o caso ora estudado?
Este estudo terá como ponto de partida um breve histórico sobre a Justiça Militar da União, bem como sua atuação no atual contexto social e legal do combate e repressão do uso de entorpecentes. Num segundo momento analisar-se-á a legislação militar e, posteriormente, a legislação penal comum referente ao assunto, para depois tecerem-se comentários acerca de sua interpretação e diferenciação, juntamente com análise da Constituição Federal e seus princípios norteadores. Também se procurará examinar a jurisprudência das auditorias militares e do Superior Tribunal Militar (STM), no papel de aplicar, dosar e interpretar a lei militar.
Não há negar-se que as drogas representam, na atual sociedade, uma verdadeira chaga aos cidadãos do Estado Democrático de Direito e que este fenômeno ganha maior relevância, bem como periculosidade quanto ocorre dentro de unidades militares. Escohotado diz que: “O “O fenômeno contemporâneo do consumo de drogas ilícitas não tem precedentes na história da humanidade” [1], dado que seu alto desenvolvimento encontra-se profundamente atrelado ao elevado interesse econômico. Segundo Drug Money in a Changing World:
“É verdade que a história do consumo de drogas se mistura com a história da humanidade, mas em nenhum momento anterior o consumo de drogas foi estimulado como produto, com mercado e marketing estabelecidos, e com lucros que chegam à casa de 500 bilhões de dólares/ano.” [2]
Tais lucros, como em toda cadeia produtiva, vão crescendo do produtor até o distribuidor final. Interesses comerciais, industriais, políticos se associam à poderosa indústria de drogas, juntamente com a indústria de armas e o mercado financeiro, além de outros segmentos menos relevantes da sociedade. De acordo com Quaglia:
“O Brasil é parte deste fenômeno hoje completamente globalizado. De um país considerado de trânsito, ele tornou-se, paulatinamente, um grande consumidor de drogas ilícitas, além de conviver com intenso consumo de drogas lícitas.”[3]
O Brasil, por sua vez, enfrenta tal problema no âmbito legal, tanto com a lei penal comum como com a lei militar, integrando esforços com o fim de combater o uso, porte e tráfico de entorpecentes para poder consolidar o bem estar social previsto na Constituição Federal de 1988.
O Brasil tem regulamentação sobre as drogas desde 1938, inicialmente estabelecida pelo Decreto-Lei n 891/38, posteriormente incorporada ao artigo 281 do Código Penal. Desde o início, sua concepção foi criminalizadora. Diversas alterações legislativas, no curso da história, culminaram na Lei 6368/76, estabelecida durante a revolução militar de 64. Nascida com base no espírito da Segurança Nacional, a Lei 6368/76, embora trouxesse alguns avanços (por exemplo, o de não criminalizar o usuário), também era fundamentalmente criminalizadora (tinha como crime o porte de drogas, sem diferenciar usuário de traficante).
Na seqüência, o Decreto 85.110, em 2 de setembro de 1980, criou o Sistema Nacional de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes. Nele se estruturavam os chamados Conselhos de Entorpecentes (Conselho Nacional – CONFEN, Conselhos Estudais – CONENS e Conselhos Municipais – COMENS) que até 1998, de maneira diversificada, contribuíram para conduzir iniciativas sobre o tema ‘drogas’ no Brasil. Vale ressaltar as palavras de Fábio Mesquita[4], sobre o combate pela via legal e estatal que assevera:
“Com o fim da ditadura militar e da legislação de exceção, remanesceu um arcabouço de legislação excepcional dedicada ao fenômeno drogas, com a falaciosa sensação de que a legislação criminal, por si, poderia proteger a sociedade de todos os males. Violação de residências sem mandados judiciais, extração de pátrio poder de mães usuárias, internações hospitalares sem autorização dos pacientes em questão, e estabelecimento de penas iguais ou superiores aos de homicídio nos crimes relacionados às drogas ilícitas, são alguns dos exemplos deste pesado rescaldo e da necessidade de rediscussão da legislação do país concernente ao tema. Se não para colocar a questão das drogas no seu trilho, ao menos para evitar uma permanente ameaça ao Estado Democrático de Direito. “[5]
Percebe-se que o Código Penal Militar foi um dos dispositivos de combate ao porte, uso e tráfico de drogas de vanguarda no ordenamento jurídico nacional, contudo tal dispositivo carece de atualização. Frente a tal problema o presente trabalho pretende estudar a lei militar comparando-a a nova lei 11.343/06, juntamente com a Constituição Federal para pontuar eventuais conflitos e propor soluções.
No estudo comparado das legislações será feita, em breves linhas, citação ao estudo de Norberto Bobbio, sobre a diferença entre validade e valor da norma. Procurar-se-á confrontar o estudo do autor citado com o escopo da presente monografia. Segundo Bobbio:
“Ora, a posição jusnaturalista sustenta que para uma norma ser válida deve ser valorosa (justa); nem todo o direito existente é portanto direito válido, porque nem todo é justo. Esta posição identifica o conceito de validade e o de valor, reduzindo o primeiro ao segundo”[6]
Tendo em vista o conflito acima citado, verificar-se-á na presente monografia, o conflito da lei militar que é válida, contudo com pouco valor. Seria possível melhorar tal lei com o fim de dar-lhe maior valor? Pretende-se mostrar a lei positiva e suas possíveis adaptações para melhor atender ao anseio social e aos objetivos do moderno direito penal, que não busca a vingança mais sim a reeducação e recuperação dos infratores.
Finalmente verificar-se-á o relevante papel da Justiça Militar na União frente a tal problema, bem como verificar-se-á os mecanismos usados para dirimir dúvidas e possíveis injustiças. Analisar-se-á a jurisprudência sobre a matéria e, principalmente, os votos dos ministros do Superior Tribunal Militar – STM.
2. Justiça Militar
“É pior cometer uma injustiça do que sofrê-la, porque quem a comete transforma-se num injusto e quem a sofre não.” – Sócrates
2.1 – Breve Histórico da Justiça Militar
Os Sumerianos, um curioso povo do Oriente Médio, começaram há 2.300 anos antes da nossa era a registrar seu passado glorioso por meio da escrita. Em seus códigos estavam previstas penalidades para todos que cometessem transgressões durante as guerras. Tal fato demostra que o direito penal militar e a justiça militar remontam os primórdios da civilização. Segundo José Barroso Filho:
“Nos mais antigos Códigos Sumerianos eram consignadas penalidades para todos que cometessem falhas no campo de batalha. Certo que normas penais próprias encontravam explicação na natureza peculiar da condição de militar, e na própria instituição das Forças Armadas, responsáveis pela defesa do Estado.”[7]
Ressalta-se, brevemente, que a justiça militar e o direito penal militar foi amplamente estruturado e amadurecido pelos romanos. O Império Romano conquistava os povos, primeiramente, pelo exército e posteriormente pelas leis. Vale citar Celso Ribeiro de Bastos que dissertou:
“Não se tem notícia do exato momento em que surgiu a Justiça Militar. O que se sabe é que ela existia na Grécia antiga e era exercida pelo Arconte, juiz sacerdote. Mais tarde, essa justiça foi aprimorada pelo direito romano. O conceito de crime militar elaborado em Roma mantém-se até os nossos dias. Após notável evolução trazida pelo direito romano, houve um período de declínio, durante a Idade Média, na época feudal, quando são perdidas as referências de pátria, inexistem aspirações nacionais campeia a indisciplina na tropa.” [8]
Percebe-se que a Justiça Militar tem um longo histório que não poderá ser exposto no presente trabalho com mais profundidade.
2.2 – Justiça Militar Nacional
Em 1763, com a aprovação dos “Artigos de Guerra”, do Conde de Lippe, Portugal organiza a sua Justiça Militar, e, a Justiça Militar no Brasil surge pela primeira vez em 1808, com a vinda da família Real para o Rio de Janeiro, em razão do bloqueio continental imposto por Napoleão Bonaparte. O nome do orgão responsável pela aplicação da jurisdição militar era o Conselho Supremo Militar. Tal órgão seguia as mesmas diretrizes do Conselho Supremo Militar de Portugal. Segundo livro de Paulo César Bastos:
“Saindo de Lisboa em 29 de novembro de 1807, a família real trouxe consigo uma esquadra composta de 15 navios, tendo como comandante em chefe o Vice-Almirante Manuel da Cunha Souto Maior, posteriormente Visconde de Cezimbra, que seria o 2º conselheiro de guerra a compor o Conselho Supremo Militar, cargo que já ocupava no Conselho Supremo Militar de Lisboa.” [9]
O Conselho Supremo Militar foi criado, pelo alvará 1 de 4 de abril de 1808. Tal alvará acumulava ao referido órgão duas funções: “uma de caráter administrativo, coadjuvando o governo em questões referentes a requerimentos, cartas-patentes, promoções, soldos, reformas, nomeações, lavratura de patentes, e uso de insígnias, sobre as quais manifestava seu parecer, quando consultado” [10]; e outra “de caráter puramente judiciário. Como tribunal superior da justiça militar, o conselho supremo militar julgava em ultima instância os processos criminais dos réus sujeitos ao foro militar.” [11]
Com a proclamação da República foi extinto o Conselho Supremo Militar e criado o Supremo Tribunal Militar, de acordo com o que dispunha o decreto legislativo n. 149, de 18 de julho de 1893, continuando este a exercer a dupla atividade – consultiva e judiciária – antes atribuída ao Conselho Supremo Militar.
A constituição do império não continha disposições expressas no tocante à jurisdição militar, cuja existência apenas a lei ordinária assegurava e não o texto constitucional.
A Constituição de 1891, na seção II do Título VI, traçou as diretrizes, dispondo seu artigo 77 o seguinte:
“Art 77 – Os militares de terra e mar terão foro especial nos delitos militares.
§ 1º – Este foro compor-se-á de um Supremo Tribunal Militar, cujos membros serão vitalícios, e dos conselhos necessários para a formação da culpa e julgamento dos crimes.
§ 2º – A organização e atribuições do Supremo Tribunal Militar serão reguladas por lei.” [12]
A partir da constituição de 1946, o Supremo Tribunal Militar passou a denominar-se Superior Tribunal Militar. A Justiça Militar da União foi inserida pela primeira vez na Constituição Federal, no ano de 1891, e a Justiça Militar dos Estados no ano de 1946.
2.3 – Justiça Militar e Regime Militar
Após a revolução de 1964, a justiça militar recebeu um oneroso encargo, quando passou a processar e julgar os civis acusados de delitos que atentassem contra a segurança nacional, interna e externa. Tem-se que em artigo de Renato Lemos, o autor disserta sobre o papel da Justiça Militar da União, no período de 1964-1968. Segundo Lemos:
“Justiça Militar representou um tríplice papel na dinâmica do regime. Foi, como se podia esperar de sua natureza institucional, um órgão central do aparato de coerção jurídica. Jogou um papel estratégico na condição de instrumento auxiliar no esforço de legitimação do regime, apresentando-se como espaço atenuador de práticas policiais e jurídicas tendentes a aprofundar o caráter ditatorial do regime. Por fim, constituiu uma arena de confronto entre correntes militares que disputaram a primazia nas diversas conjunturas que o regime atravessou.” [13](Grifo Nosso)
Verifica-se que nesse périodo o Brasil foi regido por um sistema ditatorial, onde a classe dos militares detinha o poder, e a Justiça Militar da União excerceu suas atividades e desempenhou papéis importantes como; (i) instrumento de legitimação do regime; (ii) espaço atenuador de práticas policiais e jurídicas do regime ditatorial ; (iii) e local de confronto entre correntes ideológicas dos militares durante o regime militar.
2.4 – Justiça Militar Contemporânea
No âmbito da União, a primeira instância da Justiça Militar são os juizes militares, também, conhecidos como auditores militares, a segunda instância é constituída pelo Superior Tribunal Militar – STM, com sede em Brasília. Com a aproximação do aniversário dos duzentos anos de Justiça Militar e advento da Constituição Federal de 1988, tem ocorrido uma maior divulgação da Justiça Militar, Federal e Estadual.
A Constituição de 1988, regulou a máteria de jurisdição militar. Segundo Celso Ribeiro de Bastos:
“Justiça federal especializada: Justiça Militar – é exercida pelo Superior Tribunal Militar e pelos Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei (CF, art. 122). À justiça militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei (CF, art. 124).”[14]
Observa-se que a Justiça Militar é um órgão com previsão no Texto Constitucional e nas Constituições dos Estados da Federação, com papel de exercer jurisdição, possuindo os juízes (auditores) militares as mesmas garantias asseguradas aos juízes dos demais órgãos jurisdicionais previstos na Carta Magna. Tais garantias são: inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de vencimentos, para que possam com fundamento na Lei e na Constituição terem sua livre convicção e proferirem os seus julgamentos.
Segundo Moreira Alvez:
“sempre haverá uma Justiça Militar, pois o juiz singular, por mais competente que seja, não pode conhecer das idiossincrasias da carreira das armas, não estando pois em condições de ponderar a influência de determinados ilícitos na hierarquia e disciplina das Forças Armadas”.[15]
Para encerrar esse breve histório, citou-se o Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, como ilustração de uma justiça que remonta ao passado da sociedade e deverá sempre existir para regular os crimes militares ou cometido por militares. Ressalta-se que o capítulo quarto tratará mais especificamente sobre a atual estrutura da Justiça Militar.
3. Código Penal Militar e a Lei de Entorpecentes – Lei 11.343/2006
“Quem decide um caso sem ouvir a outra parte não pode ser considerado justo, ainda que decida com justiça.” (Sêneca)
O presente capítulo fará uma análise do tipo penal posto pelo artigo 290, do Código Penal Militar, que trata do combate às drogas no âmbito militar. Será citada a lei 11.343/06 que, além de novo dispositivo normativo, rege atualmente o assunto na esfera da vida civil.
3.1 Conceito
Antes de adentrar no estudo das leis citadas, cabe uma breve definição dos termos que serão objeto de análise. Primeiramente o presente trabalho fez menção aos tipos mais importatoes que são uso, porte e tráfico de drogas, que a lei definirá por outros inúmeros verbos que representão a extensão das práticas do porte e tráfico de entorpecentes.
Em suma, o porte caracteriza o transporte da droga para consumo, enquanto o tráfico possue o veio especulativo, ou seja, visa o lucro nas práticas de vender, importar etc. Quanto à diferenciação entre o traficante e o usuário deu-se, por longo tempo, pela jurisprudência que definiu que a quantidade de droga apreendia era o elemento diferenciador entre o usuário e o traficante, contudo a Lei nº 11.323/06 traz novo entendimento, desda vez legal e não jurisprudencial (maior objetividade e segurança jurídica), a lei dispõe:
“§ 2o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.” [16]
Verifica-se que caberá o juiz distinguir o usuário do traficante, contudo a lei penal comum deu diretrizes para esse juízo de fato. Ressalta-se que o art. 290 do Código Penal Militar não prescreve tal diferenciação, pois todos os tipos estão inseridos em um único artigo, ou seja, deverá ser feita uma medida na quantidade da pena mais não uma diferenciação quanto ao crime.
O conceito de droga adotado no presente trabalho é o designado pelo Ministério da Saúde – Secretaria da Vigilância Sanitária – Portaria SVS/MS 344[17], de 1998, que foi recepcionado pela lei 10.409/02 e a lei 11.343/06. O artigo 2º, da lei 11.343, assevera:
“Art. 2o Ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a hipótese de autorização legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a Convenção de Viena, das Nações Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas de uso estritamente ritualístico-religioso.” (Grifo Nosso) [18]
Em nível internacional há muito vem sendo editadas listas de substâncias entorpecentes. As Nações Unidas e a própria Convenção contra Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, promulgada internamente através do Decreto n. 154, de 26 de junho 1991, que estabelecem que “por entorpecente ou droga” se entende qualquer substância, natural ou sintética, que figure na lista I ou na lista II da Convenção Única de 1961, sobre entorpecentes, emendada pelo Protocolo de 1972. Ressalta-se que a portaria 344, da Secretaria da Vigilância Sanitária, baseia-se, na citada Convenção Única de 1961.
3.2 – Estudo Comparado
O Código Penal Militar (CPM) surgiu com o Decreto-Lei n° 1001, de 21 de outubro de 1969, sendo contemporâneo ao regime militar. Verifica-se que no cerne da repressão ao uso, porte e tráfico de drogas o CPM é mais severo em alguns pontos e não está em consonância com o direito penal pátrio e seus valores.
O Código Penal Militar foi promulgado na decáda de 60, e desde então não sofreu as devidas modificações referente a matéria de combate ao uso, porte e tráfico de entorpecentes. Segundo Luciando Moreira Gorrilhas:
“Há muito que o tipo penal supradito está a merecer profunda reformulação para que se possa adequar à conjuntura atual. Neste sentido, vale lembrar que o Código Penal Militar (CPM) emanou do Decreto-Lei n° 1001, de 21 de outubro de 1969, em plena fase da ditadura. Recorde-se que, ainda durante o citado período, o tráfico de drogas no Brasil era incipiente, sem a dimensão e o alcance dos dias de hoje, em que, por vezes, quando não tangenciam, ingressam na órbita da vida da caserna (lugar sujeito à Administração Militar).
Ressalto, em letras garrafais, que não sou saudosista da época da ditadura, muito pelo contrário. No entanto, é fato que naquele período os traficantes não encontraram e não encontrariam terreno fértil para semear suas atividades ilícitas. Em decorrência disso, temos, presentemente, uma norma penal incriminadora capenga, a qual, tanto seu preceito primário quanto o secundário, resultam em descompasso com os fatos, diga-se de passagem, repugnantes, reinantes nas sociedades civil e militar. Refiro-me ao tráfico de drogas, notadamente, em lugar sujeito à Administração Militar (inclusive com a utilização de aviões militares)”.[19]
Em contrapartida a lei 11.343 de 23 de agosto de 2006, institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad e prescreve medidas, sanções e normas para prevenção do uso indevido de drogas. Trata-se de lei penal comum recente que pretende melhor atender a atual sociedade moderna.
Numa análise preliminar dos dispositivos legais do Código Penal Militar e a Lei 11.343/06, mostrar-se-á a falta de diferenciação no CPM entre uso, porte e tráfico de drogas. Segundo o artigo 290 do CPM:
“Tráfico, posse ou uso de entorpecente ou substância de efeito similar.
Art. 290. Receber, preparar, produzir, vender, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, ainda que para uso próprio, guardar, ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, em lugar sujeito à administração militar, sem autorização ou em desacôrdo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, até cinco anos.” [20]
Observa-se que o legislador que elaborou o citado artigo, tratou da mesma forma, colocando aquele que porta pequena porção de entorpecente para uso próprio (usuário) como o que conserva em seu poder grandes quantidades do mesmo produto (características do tráfico) todos no mesmo tipo e consequentemente com a mesma sanção do Estado.
Entretanto a Lei 11.343/06, em seu artigo 33, abaixo citado, estabelece pena de reclusão de cinco a quinze anos para o tráfico de drogas.
“Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.” [21]
Já a penalidade para uso da droga o art. 28 da lei 11.343/06 assevera:
“Art 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I – advertência sobre os efeitos das drogas;
II – prestação de serviços à comunidade;
III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”(grifo nosso)[22]
Verifica-se com os dispositivos legais uma disparidade entre as penas na lei 11.343/06 e o Código Penal Militar. Vale ressaltar outro ponto que salienta GORRILHAS:
“Outro tópico que demanda reflexão é quanto a inserção topográfica do art 290 do CPM no capítulo dos crimes contra a saúde (Bem jurídico tutelado). Nos parece, salvo melhor entendimento, que o supracitado tipo penal estaria melhor encartado no capítulo destinado aos crimes contra à Administração Militar. De fato, sobressai-se dentre as elementares do delito em discussão a locução “em lugar sujeito à Administração Militar”. Ou seja, os diversos comportamentos descritos nos tipos (onze verbos) somente serão reprimidos se executados em lugar sujeito à Administração Militar. De observar-se que esta é a nota marcante do artigo 290 do CPM. Assim, fica nítido que o legislador realçou com cores fortes o aspecto do locus delicti commissi, enquanto que a saúde pública ficou, ao que nos parece, relegada a plano secundário.” [23]
De fato o entendimento supracitado seria deveras importante, pois além de uma maior adequação legal, ter-se-ia tanto as grandes como as pequenas apreensões efetuadas na Administração Militar se enquadrariam no tipo e seria afastada a possibilidade do uso do princípio da insignificância. No quinto capítulo do presente trabalho será exposta à jurisprudência militar referente ao assunto.
Cabe ressaltar que a lei 11.343/06 é uma das inúmeras legislações referente ao combate de drogas que já vigoraram e que deverá sofrer constantes modificações ao longo do tempo. Não cabe ao presente trabalho traçar tais legislações e suas inovações ao direito pátrio, contudo a lei a lei 11.343/06 aboliu a privação de liberdade para o agente que adquire, guarde ou traga consigo, para uso próprio, substância entorpecente (usuário). O legislador inovou na referida lei, adotando, como modalidade de pena a Advertência, medida sócio-educativa prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Conclui-se que o dispositivo militar (Art. 290 do CPM), além de defasado, verifica-se, em comparação com a lei penal comum, em desproporção entre o uso e o tráfico para com os sujeitos que serão punidos. Verifica-se que lei penal comum sanciona com maior rigor o tráfico e com menor rigor o uso e porte moderado da droga, enquanto o CPM não traz tal diferenciação. Segundo Sérgio Ricardo de Souza no tocante a lei 11.343/06:
“O que fez o legislador brasileiro foi seguir a tendência internacional e reconhecer ser o usuário ou viciado uma vítima na cadeia produtiva e econômica em que se acham inseridas as drogas, entendendo por bem que essas pessoas não devem punidas com rigor máximo do Estado, a ponto de ser possível aplicar a elas as sanções mais fortes, como a prisão.”[24]
A citação demonstra o espírito seguido pelo legislador na busca do aprimoramento do direito frente à demanda social que a muito exigia modificação na lei de combate aos entorpecentes. O Código Penal Militar, além de não sofrer mudanças, pune o traficante no âmbito militar com bem menos rigor que a lei 11.343/06, sendo este o maior perigo na Administração Castrense, pois a denigre sobremaneira.
No âmbito da lei 11.343/06, o legislador preocupou-se, com a questão relativa à reinserção social dos usuários e dependentes de droga. Assim a lei visa proporcionar, com do desempenho de um conjunto de atividades, para que estes indivíduos e seus respectivos familiares tenham uma melhor recuperação e dêem a este coletivo humano uma melhoria na sua qualidade de vida.
Já a lei militar não se preocupa com tais aspectos tendo em vista que a realidade histórica em que foi promulgado o Código Penal Militar não se vislumbrava um cenário como o de hoje, onde a droga, em todos os meios sociais, representa uma questão de saúde pública. A norma penal militar concernente ao combate de drogas não sofreu as devidas adaptações e por conta disso tornou-se obsoleta e de certa forma injusta.
3.3 – A validade da norma à luz do art. 290 do CPM
Como dissertado na introdução far-se-á um breve paralelo entre o dispositivo penal (art. 290) do CPM com o estudo de Noberto Bobbio sobre validade e valor da norma. A validade de uma norma indica se ela efetivamente existe no mundo jurídico, “dizer que uma norma jurídica é válida significa dizer que tal norma faz parte de um ordenamento jurídico real […]”[25]. Já o valor de uma norma “indica a qualidade de tal norma, pela qual está é conforme o direito ideal” [26], ou seja, se uma norma é justa frente a todos os valores nos quais o direito se fundamenta.
Tal distinção é importante na formação da ciência do direito segundo o positivismo, e no caso concreto, do presente estudo, ajuda a mostrar que a norma esculpida no art. 290 do CPM é válida, mas carece de valor, pois está longe do ideal, ou seja, do que deveria ser.
Por tais motivos explanados neste capítulo é que devemos propor uma inovação com intuído de aperfeiçoar a lei penal militar no que tange ao combate do uso, porte e tráfico de drogas.
3.4 – O Problema do Uso de Drogas nas Organizações Militares
A Administração Militar se divide em OM, ou seja, em organizações militares e com o crescente índice de criminalidade na atual sociedade moderna, nem mesmo, as OM estão imunes aos mais variados atos de violência e cometimentos de ilícitos. Segundo Informativo da Associação dos Magistrados Brasileiros:
“Com os crescentes índices de criminalidade, o perfil dos crimes julgados pela Justiça Militar da União (JMU) foi ampliado. Antes, os crimes de deserção, por exemplo, eram os mais comuns.
Atualmente, é freqüente a tramitação, nas instâncias da JMU, de crimes relacionados ao tráfico e ao uso de drogas, ao roubo de armas e ao estelionato, entre outros.
As ocorrências mais comuns são de militares encontrados com porções de maconha nos quartéis.” (Grifo Nosso)[27]
Percebe-se que o uso de drogas na Administração Castrense, assim como na sociedade e na família, tende a deturpar e desorganizar tais estruturas. No caso da caserna tal fato torna-se ainda mais relevante tendo em vista que o militar drogado tende muito mais facilmente afligir os pilares das forças armadas, ou seja, contrariar a hierarquia e disciplina, reinantes no meio militar.
Observa-se que nas OM os soldados, em conseqüência de suas funções e responsabilidades, têm a sua disposição armas e outros equipamentos bélicos, o que torna o uso de entorpecentes um fator de perigo e risco não só ao usuário, mais aos demais militares. Segundo João Rodrigues Arruda, “O Exército é uma organização permanente baseada na hierarquia e na disciplina, porém mesmo assim, a Justiça e o Direito devem imperar em nossa Organização, por que em caso contrário seria o império do arbítrio que fatalmente levaria a dissolução.” [28]
Com base nos argumentos, acima expostos, é que o militar deve ser punido pela Justiça Militar, contudo tal punição poderia se amoldar a atual conjuntura social e aos Princípios Constitucionais previstos na Constituição Federal de 1988.
No atual contexto histórico verifica-se que alguns jovens escolhem a carreira militar por falta de opções ou para tentar fugir da criminalidade das ruas. Assim deve-se procurar penas que visem a recuperação do militar infrator, principalmente, no caso de usuários de drogas que além de vítimas do vício podem ser punidos severamente sem a devida recuperação social.
O Estado deve ter estratégias adequadas para coibir que determinados indivíduos, motivados pelo consumo de drogas, levem a cabo comportamentos patológicos e/ou anti-sociais. Nada virá a substituir a responsabilidade do Estado, em grau de tolerância zero, de adotar todos os meios necessários e eficazes para que possamos formar parte de uma sociedade na qual impere a segurança, a liberdade e a garantia de direitos e proteção a todos aqueles que, por essa razão, se encontram na parte mais escura da vida – “no pior de todos os mundos possíveis”, para usar a expressão de Schopenhauer[29].
4. Constituição Federal
“O homem, quando ético, é o melhor dos animais, mas separado da lei e da justiça, é o pior de todos”. – Aristóteles
4.1 – Estrutura Constitucional da Justiça Militar da União
Integrando a chamada Justiça Federal Especial, a Justiça Militar é exercida pelos seguintes órgãos: o Superior Tribunal Militar; os Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei.[30] Segundo Fernando Capez, “A justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares previstos e definidos em lei. Exerce, portanto, jurisdição exclusivamente penal.”[31]
A Justiça Militar não constitui foro especial para julgamento dos crimes militares. Na lição de Sahid Maluf:
“é princípio universalmente aceito o da distinção necessária entre justiça comum e a justiça militar. Correspondem as duas organizações, a duas legislações distintas: comum e militar. A separação das duas legislações penais firmou-se em nosso país, em meados do século XVIII, com base nas velhas ordenanças de 1708 e nos Artigos de Guerra, de Conde Lipe, de 1763” [32]
Assim, é fundamental esclarecer que a justiça militar não constitui privilégio das classes militares, mas atende à necessidade de se punirem, com rapidez e rigor, os crimes que, por sua natureza, envolvam a segurança e a integridade da pátria. Não existe um critério constitucional para a conceituação de crime militar, de vez que a própria Constituição Federal deixa a sua definição para a lei ordinária (art. 124 caput). Predomina o critério ratione materiae para a definição do crime militar. Segundo José da Silva Loureiro Neto:
“Nosso legislador, no decreto-lei nº 1.001 (Código Penal Militar) adotou o critério ratione materiae, isto é, não o definiu, apenas enumerou taxativamente as diversas situações que definem esse delito, ao contrário do que já sucedeu em situações anteriores como, por exemplo, com o código militar de 1891 (Código Penal Militar da Armada), ampliado ao Exército pela lei nº612, de 12-9-1899, e aplicado à Aeronáutica pelo decreto-lei nº 2.961, de 20-1-1941. Dispunha seu artigo 5º desse estatuto militar:
“É crime toda ação ou omissão contrária ao dever marítimo e militar, prevista por este código, e será punido com as penas nele estabelecidas.”
“Já a legislação subseqüente (Código Penal Militar, Decreto-lei nº 6.227,de 24-1-1944) optou pelo critério ratione legis, enumerando em seu artigo 6º as inúmeras situações que definem o critério militar. Esse critério motivou a seguinte crítica por parte de Amador Cysneiro (1974:74): “Desdobrando-se o artigo 6º do projeto Cardoso de Castro, deu-se uma amplitude jamais encontrada na tradição do nosso Direito ao conceito do crime militar. Longe, ficamos, portanto, da velha e própria conceituação do crime militar que o Digesto, de re militare, citava como uma exceção do jus civile, nascido como foi ele em razão de se manter intangível a disciplina dos exércitos com a formação dos Conselhos de Disciplina e a aplicação de “bastonadas”.[33]
O Superior Tribunal Militar é órgão de cúpula da Justiça Militar, tem sede na capital federal e jurisdição em todo o território nacional, compondo-se de 15 (quinze) Ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de devidamente sabatinados pelo Senado Federal. Do total três são almirantes (Marinha), quatro generais (Exercito), três brigadeiros (Aeronáutica), todos da ativa e de maior posto carreira, e cinco civis (art. 123 CF).
A Justiça Militar de primeiro grau é exercida pelos Conselhos de Justiça e tem as seguintes categorias[34]: Conselho especial de justiça (julgam oficiais, exceto generais) e Conselho Permanentes de Justiça (acusados não oficiais) e o Conselho de Justiça nos corpos, formações e estabelecimentos militares (processam e julgam a deserção de praças e insubmissos). Funcionam nas Auditorias e são compostos de um juiz civil togado e vitalício, chamado auditor, e quatro oficiais, sorteados e com investidura temporária, sendo que os Conselhos Especiais são constituídos para cada processo e dissolvidos após a conclusão dos trabalhos. Os Conselhos Permanentes, uma vez constituídos, funcionarão durante três meses consecutivos. Os generais gozam de prerrogativas de foro e são julgados pelo STM.
4.2 – O art. 290 do CPM e a Constituição Federal de 1988
O papel das Forças Armadas brasileiras, em sua destinação constitucionalmente, está inserido no contexto de um Estado Social e Democrático de Direito. Como instrumentos de força deste mesmo Estado, exercem papel fundamental na continuidade da estabilidade das instituições, no equilíbrio do pacto federativo, bem como, subsidiariamente, em atividades de segurança pública e humanitária. Nas relações internacionais do Estado brasileiro, contribuem para a busca incessante da paz, como instrumentos de afirmação dos ideais pacifistas do presente momento.
A primeira e principal lei que rege as forças armadas no Brasil é a Constituição da República, seguida pelas seguintes leis: Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de Outubro de 1969), Código de Processo Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de Outubro de 1969), Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880, de 09 de Dezembro de 1980), e as diversas leis que versam sobre direitos e vantagens dos militares. Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho:
“A justiça militar é o primeiro dos ramos especializados da justiça federal. Sua existência é uma imposição de natureza peculiar da disciplina e da vida militares, que não permitem sejam os militares julgados pelos tribunais comuns, segundo a lei comum,…”[35]
No presente trabalho tratou-se da Justiça Militar da União no âmbito histórico e estrutural. No âmbito constitucional verifica-se que ela foi devidamente disciplinada e as normas militares devem ser postas por intermédio de lei ordinária. Contudo será que o art. 290 do Código Penal Militar está em consonância perfeita aos preceitos constitucionais da Constituição Federal de 1988, que é dispositivo normativo superveniente?
Segundo Eliezer Pereira Martins:
“Em países de tradição democrática, berço dos ideais liberais-burgueses ou legatários destes valores, a exemplo os EUA, da França, da Itália entre outros, não encontramos distinção de direitos, garantias e deveres entre civis e militares. Todos são amparados pelo Império da Lei e dos princípios Cívicos. O que se encontra é a determinação da criação de uma espécie de estatuto próprio para a organização do contingente, com direitos e deveres interna corporis.” [36]
A Constituição Federal de 1988, prescreveu os direitos individuais e coletivos conforme citação, ou seja, nos moldes de uma tradição democrática, berço dos ideais liberais-burgueses e não verifica-se distinção de direitos, garantias e deveres entre civis e militares nem aos princípios penais que incidiram tanto no direito penal comum como no militar.
Antes de tratar dos princípios constitucionais penais frente ao Código Penal Militar, faz-se necessária a observação de Samantha Meyer-Pflug que dissertou: “Há que se considerar que a Constituição Cidadã (CF/88) é bastante extensa, analítica e até mesmo casuística o que dificulta a sua adaptação às realidades e a sua aplicação”[37]. Assim, a Constituição Federal carece de aplicação perfeita em inúmeros ramos de regulação no Estado brasileiro.
No tocante ao princípio da legalidade não há que se falar em afronta a Constituição Federal tendo em vista o Código Penal Militar CPM) ter sido recepcionado pelo legislador constituinte, assim como, o Código Tributário Nacional e inúmeras leis que posteriormente foram readaptadas ao novo contexto constitucional. Contudo será que não carece o Código Penal Militar de atualizações? Principalmente, no tocante ao combate às drogas?
Frente ao princípio da individualização da pena, previsto no inciso XLVI, do art. 5º da Constituição Federal:
“XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;”
Segundo Ney Moura Teles a individualização da pena caracteriza-se por:
“Individualizar significa particularizar, adaptar a pena ao condenado. A cada indivíduo, uma pena. Para particularizar a pena, a lei haverá, evidentemente, de balizar-se em parâmetros que, como não poderia deixar de ser, são o homem que violou a norma e o fator por ele praticado, cada qual, com suas particularidades, …”(Grifo Nosso)[38]
No primeiro momento cabe ao legislador tal individualização que será expressa na lei penal. No caso concreto da art. 290 do CPM, observa-se uma individualização da pena entre traficante e usuário de drogas nula tendo em vista ser cominada uma pena igual aos dois casos supracitados e a utilização de apenas um tipo de sanção das cinco previstas na Carta Magna. No segundo momento caberá ao juiz militar atender mais satisfatoriamente o princípio constitucional da individualização da pena, como será demonstrado no capítulo subseqüente.
No tocante ao princípio do respeito ao preso previsto no art. 5º, XLIX, que afirma, “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”, ou seja, deve-se dar um mínimo de respeito ao cidadão preso. Contudo no caso de um militar viciado seria interessante sua recuperação ou apenas uma punição, onde seu estado de saúde sofrerá inúmeras crises de abstinência? Assim, volta-se a ressaltar a importância da individualização das penas para que cada pena melhor reintegre o criminoso ao meio social e realmente faça com que o militar preso possa ter sua devida integridade física e moral respeitada durante o cumprimento da pena.
Assim num primeiro momento compararam-se a lei penal comum ao Código Penal Militar, no âmbito do combate às drogas, e posteriormente aos princípios constitucionais e verificou-se defasamento da lei militar ao atual contexto social, econômico e político. Tendo em vista a importância dos militares no Estado Democrático de Direito cabe uma revisão no tocante ao art. 290 do CPM frente ser uma norma defasada.
5. Jurisprudência do art. 290 do Código Penal Militar
“Há quatro características que um juiz deve possuir: escutar com cortesia, responder sabiamente, ponderar com prudência e decidir imparcialmente”. – Sócrates
A jurisprudência militar no tocante ao combate do tráfico de drogas e uso pelos militares assevera:
A legislação ordinária dispensa ao usuário e ao traficante tratamentos diferenciados. Enquanto o primeiro (usuário – art. 16 da Lei nº 6.368/76) é considerado como doente, na sua acepção vulgar, e fica sujeito a penas relativamente brandas (6 meses a 2 anos de detenção, mais dias-multa), não raramente substituídas por tratamento ambulatorial, o segundo (traficante – art. 12 da mesma lei) recebe penas bastante severas (3 a 15 anos de reclusão, mais dias-multa).
Como as elementares do art. 290 do Código Penal Militar englobam ambas situações, a quantidade de substância encontrada em poder do infrator servirá apenas para distinguir o dependente do traficante e definir o quantum da pena a aplicar, no momento da aferição das circunstâncias judiciais (art. 69 do CPM). Recurso da Defesa provido parcialmente. Decisão unânime.[39]
Observa-se que o princípio da individualização da pena será efetivado mais pela Justiça Militar do que pelo dispositivo legal. A Jurisprudência militar e do Supremo Tribunal Federal afastam a incidência do princípio da insignificância segundo ela:
“EMENTA: Apelação; Posse de entorpecente por militar no interior da OM. Comete o crime tipificado no art. 290 do CPM o militar que, no interior da OM, guarda consigo a substância entorpecente, vulgarmente conhecida como maconha. Não descaracteriza a prática do delito em tela a circunstância de ser pequena a quantidade de maconha apreendida em poder do Acusado, uma vez que, consideradas as especiais relações que caracterizam a vida orgânica das Forças Armadas, o uso e a difusão de entorpecentes traduzem níveis especiais de prejuízos, de tal modo que, avançando além do bem juridicamente tutelado da incolumidade da saúde da coletividade militar, alcançam outros igualmente vitais para a sua própria sobrevivência, dentre eles, destacadamente, o da segurança de seu funcionamento, o da operacionalidade de seus efetivos e o da disciplina interpessoal. Inaplicação, pois, do princípio da insignificância, eis que, em razão do antes exposto, extrapola os limites do razoável colocar em pé de igualdade e conseqüentemente de consideração penal a conduta de um militar, com suas responsabilidades de ter à sua disposição armas e outros petrechos bélicos e de ter sob sua guarda instalações sensíveis de segurança, e o proceder de um civil, que, sem tais responsabilidades, “curte” o seu “cigarrinho de maconha” em um pacífico convescote. Improvimento ao Apelo, com a mantença da Sentença condenatória de 1º grau. Decisão unânime.”[40](Grifo Nosso)
O STF entende:
“EMENTA: – DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME MILITAR DE POSSE E USO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE (ART. 290 DO CÓDIGO PENAL MILITAR). PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA OU CRIME DE BAGATELA. “HABEAS CORPUS”. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não abona a tese sustentada na impetração (princípio da insignificância ou crime de bagatela). Precedentes. 2. E não é desprezível a circunstância de o militar ter sido preso em flagrante, quando fumava cigarro de maconha em área sujeita a administração militar. 3. “H.C.” indeferido.”[41]
Nota-se que a jurisprudência já está consolidada frente à não aplicação do princípio da insignificância. Contudo a nova lei anti-drogas – 11.343 – por intermédio de inovações sabe tratar desde o traficante com toneladas de cocaína até ao usuário com uma grama que seja, aplicando devidamente penas proporcionais o que não se verifica com o art. 290 do CPM. Em recente jurisprudência constatou-se:
“DECISÃO
Trata-se de Recurso Extraordinário interposto pelo ex-At Ex DIEGO CÉSAR
VIRGÍLIO DA SILVA, […] O ex-At Ex DIEGO CÉSAR VIRGÍLIO DA SILVA encontra-se assistido judicialmente pela Defensoria Pública da União.
Em suas razões recursais de fls. 03 usque 10 o Recorrente sustenta, em essência, seu inconformismo acerca do decisum atacado, conquanto não atendeu a pretensão formulada acerca da aplicação da Lei nº 11.343/2006 no julgamento da quaestio, entendendo que as disposições ali elencadas melhor se adequariam ao caso concreto, e que, por conseguinte, beneficiariam o então apelante.
Sustenta, ainda, que o Julgado desta Corte violou o art. 5º, inciso XL e o art. 227, § 3º, inciso VII, da Constituição Federal.
Em conclusão, requer: “… seja conhecido o presente recurso extraordinário, bem como seja inteiramente reformado o v. acórdão proferido pelo Superior Tribunal Militar, declarando-se a inconstitucionalidade (afronta ao artigo 5º, XL e 227, § 3º, VII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988), da
condenação do recorrente por porte de substância entorpecente para consumo próprio, reconhecendo a aplicabilidade da Lei 11.343/2006 nos crimes de porte de entorpecente cometidos dentro de estabelecimento militar, determinando:
a) a aplicação de pena alternativa ao recorrente, nos termos do artigo 28 da citada lei, ou,
b) a anulação da decisão proferida pelo Superior Tribunal Militar, determinando nova instrução do presente feito, respeitado o procedimento da Lei 11.343/2006″ (fl. 09).
[…] Em sua manifestação, o Órgão Ministerial que atua junto a esta Justiça Castrense, por Parecer da lavra da Dra. ARILMA CUNHA DA SILVA, Subprocuradora-Geral da Justiça Militar, pronunciou-se desfavoravelmente ao presente Recurso, sintetizando:
“Na hipótese dos presentes autos, nem mesmo de forma reflexa e acidental se poderia reconhecer ofensa à Constituição da República, uma vez que o assunto ventilado não avança além de qualquer limite previsto para o exercício pleno da ação penal militar. Portanto, o recurso é inconsistente. E como tal, incognoscível”. O presente Recurso Extraordinário foi interposto em 11/04/07, contendo em anexo as razões recursais. Com esse breve relato, passo à
Decisão.
O presente Recurso Extraordinário cumpre o requisito da tempestividade, considerando a data da intimação da Defensoria Pública da União, quanto aos termos da Decisão recorrida (fls. 29 e 29v), e a data de protocolização na Secretaria do Tribunal da peça concernente a sua interposição (fl. 02). A matéria constitucional que se alega violada não foi objeto de prequestionamento na apelação atacada. A Suprema Corte já pacificou a matéria no sentido de que o prequestionamento há de se aflorar explícito.
Nesse sentido, veja-se o seguinte precedente:
Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 598.482/MG.
Relator: Ministro CELSO DE MELLO
Órgão Julgador: 2ª Turma do STF. Julgado em 21/11/06.
Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.
“EMENTA: Agravo de Instrumento – Alegada violação a preceitos inscritos na Constituição da República – Ausência de prequestionamento explícito da matéria constitucional – Recurso improvido.
A ausência de efetiva apreciação do litígio constitucional, por parte do Tribunal de que emanou o acórdão impugnado, não autoriza – ante a falta de prequestionamento explícito da controvérsia jurídica – a utilização do recurso extraordinário”.
O Recorrente insurge-se contra a Decisão do Tribunal, com a nítida pretensão de ver aplicada na Justiça Militar da União as disposições da Lei nº 11.343/2006 (revogadora da Lei nº 6.368/76). O Tribunal, por seu turno possui inúmeros precedentes firmando a aplicação do contido no art. 290 do CPM, quando se tratar de crime de uso, tráfico, porte, depósito, etc. de substâncias havidas por entorpecentes, por militares nas condições que guardam identidade com a que envolveu o Recorrente.
Desse modo, caso houvesse infringência à Constituição Federal essa seria reflexa, indireta e oblíqua. Nesse sentido: AI 161.239 AgR, Relator Ministro ILMAR GALVÃO.
Portanto, não se verificou afronta ao texto constitucional.
O presente Extraordinário tem por foco matéria de índole meramente infraconstitucional. Nem ao menos se identifica, in casu, a incidência da recente exigência para admissão do Recurso Extremo expressa na Lei nº 11.418/2006, alusiva à repercussão geral, que consiste na existência de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos da demanda (art. 543-A do CPC), conforme os critérios balizadores da citada Lei. Portanto, data venia, a pretensão aduzida no vertente Recurso Extremo não ultrapassa a estreitíssima análise admissional. A recusa de admissibilidade se apresenta acorde com as regras contidas no Regimento Interno do Excelso Pretório, especialmente aquelas introduzidas pela emenda aprovada em sessão administrativa de 23 do mês em curso.
Isto posto, não admito o Recurso Extraordinário e, por conseguinte, nego-lhe seguimento para o Excelso Pretório.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Providências pela Diretoria Judiciária.
Brasília-DF, 26 de abril de 2007.
Ten Brig Ar HENRIQUE MARINI E SOUZA” (Grifo Nosso)[42]
Observa-se que a citada jurisprudência abre novas portas para uma melhor técnica penal com fim de melhor sancionar o usuário de drogas. O presente trabalho mostrou as precariedades do art. 290 do CPM em comparação com a lei 11.343/06 e à luz dos princípios Constitucionais.
Além da elaboração de uma nova lei penal militar que substitua o art. 290 do CPM, pode o juiz militar afastá-la para melhor sancionar o usuário para que este se reabilite. Segundo José Renato Nalini:
“Qualquer preceito subalterno que infrinja ditame constitucional explícito ou implícito padece de desvalia e desmerece observância. É regra impostergável e saneadora. Garante a permanência da normatividade hígida, aquela que hauriu fôlego de validez do pacto fundamental e permite a eliminação de tudo o que vulnera conteúdo e alcance da lei constitucional.” [43]
Tanto a elaboração de uma nova lei penal militar de combate às drogas quanto a utilização da lei 11.343/06, para os militares, podem contribuir para que a lei penal militar esteja em maior consonância com a Constituição Federal de 1988.
6. Conclusão
“Salvar uma pessoa é salvar o mundo todo” – Talmude
Atualmente a sociedade brasileira vivência o drama de usuários de drogas, e não é apenas quem está envolvido nesta problemática que conhece a dor, a angústia e o sofrimento que a droga acarreta. O processo de recuperação de um dependente químico leva-o a enfrentar as incertezas, desânimos, culpas, dúvidas e medos que sempre acompanham ele, os familiares e toda a sociedade brasileira durante o processo de recuperação. Segundo Moisés Naim:
“Em Yunnan(China), onde, a cada operação, costuma-se aprender cerca de 500kg de drogas, o vício em heroína expandiu-se rapidamente, e as adolescentes oferecem sexo por cinco yuan (seis centavos de dólar). Rússia, Japão, Índia, África do Sul, Brasil e México são alguns países nos quais o uso de drogas e seus efeitos se tornaram um problema emergencial de saúde pública”[44]
No atual contexto global o Brasil não pode se abater pelas conseqüências devastadoras das drogas. A recuperação de um viciado não é só um alívio a seus familiares e a segurança das ruas, mas também significa a reabilitação de um cidadão brasileiro. Nas palavras de Telma Angélica Figueiredo:
“Enquanto o Direito Penal se constitui em um meio regulador da vida humana na sociedade, o Direito Penal Militar tutela comportamentos dentro da ordem exigida aos fins essenciais das forças armadas, tanto na sociedade militar como nas relações entre militares, no exercício de suas funções, e a sociedade civil. Escola, religião e cultura exercem, em uma primeira fase, o controle social visando à manutenção da ordem na sociedade; um segundo momento, cabe ao Estado e ao Direito essa tarefa.”(Grifo Nosso)[45]
Verifica-se que o Direito é uma das inúmeras armas que os cidadãos brasileiros possuem para combater as chagas sociais, sendo uma dessas as drogas que geram inúmeras conseqüências prejudiciais ao tecido social.
A presente monografia fez um estudo de um breve histórico sobre a Justiça Militar da União, bem como sua atuação no atual contexto social e legal do combate e repressão do uso de entorpecentes. Num segundo momento analisou-se a legislação militar e a legislação penal comum referente ao assunto, juntamente com análise da Constituição Federal e seus princípios e finalmente examinou-se a jurisprudência do Superior Tribunal Militar (STM), no papel de aplicar, dosar e interpretar a lei militar.
Após tal estudo retorna-se a questão elaborada na introdução, “Deve-se contentar somente com o ser (lei positivada) ou buscar o dever ser (lei moral) para o caso ora estudado?” Para responder satisfatoriamente a tal questionamento apontam-se, abaixo, os pontos conclusivos do trabalho e a devida resposta.
Conclui-se que o art. 290 do Código Penal Militar, além de defasado, verifica-se, em comparação com a lei 11.343/06, em desproporção entre o uso e tráfico para com os sujeitos que serão punidos, pois a lei penal comum – lei 11343/06 – sanciona com maior rigor o tráfico e com menor rigor o uso e porte moderado da droga, enquanto o CPM não traz tal diferenciação.
O Código Penal Militar, não vislumbrava um cenário como o de hoje onde a droga, em todos os meios sociais, representa uma questão de saúde pública. A norma penal militar concernente ao combate de drogas não sofreu as devidas adaptações e por conta disso tornou-se obsoleta, pois segundo Moises Naim, “a força econômica do mercado das drogas desafia os governos e também é capaz de derrubá-los.”[46], e não prevê e combate o real potencial ofensivo do tráfico e do uso das drogas no âmbito da administração militar.
O uso de drogas na Administração Castrense tende a deturpar e desorganizar tal instituição, pois confrontam os princípios hierarquia e disciplina conforme palavras de Aníbal Bruno, em sua obra:
“no sistema hierárquico militar, quando não por força de expressa manifestação da lei, pelas condições de rígida subordinação nas forças armadas, a obediência há de ser absoluta e imediata”.(Grifo Nosso) [47]
No caso da caserna, a utilização e o tráfico de drogas tornam-se ainda mais relevantes, tendo em vista as palavras acima citadas e que o militar drogado tende muito mais facilmente minar a hierarquia e disciplina, princípios basilares das Forças Armadas.
Na comparação da lei 11.343/06 com o Código Penal Militar verificaram-se o defasamento da lei militar e posteriormente observou-se a falta de uma consonância perfeita do CPM aos princípios constitucionais no atual contexto social, econômico e político brasileiro.
Assim, numa primeira resposta, ao problema lançado na introdução e acima citado, conclui-se que cabe uma revisão no tocante ao art. 290 do CPM, frente ser uma norma defasada, ou a aplicação da lei 11.343/06, para os militares, no caso de usuários de droga (Lei Nova Mais Benéfica). Tais ações podem contribuir para que a sanção aplicada pela justiça militar esteja em maior consonância com a Constituição Federal de 1988.
Sintetizando o trabalho percebe-se que a norma esculpida no art. 290 do CPM é válida, mas carece de valor, pois está longe do ideal, ou seja, do que deveria ser o art. 290 do CPM.[48]
Finalmente verificou-se o relevante papel da Justiça Militar na União frente a tal problema através da análise da jurisprudência sobre a matéria e, principalmente, votos dos ministros do STM. Observou-se que o princípio da individualização da pena é efetivado mais pela Justiça Militar do que pelo art. 290 do CPM, pois é o auditor militar que irá apenar o infrator na medida de seus atos, conforme o dizer de Telma Angélica Figueiredo:
“[…]o julgador deve agir com discernimento para evitar exageros e afastamento, por completo, da previsão legal. Alcança-se a valoração do ilícito penal com análise da realidade jurídica como um todo, conforme o momento histórico-social e de acordo com a ética, visando-se à realização da Justiça, como o fim precípuo, uma vez que existe um descompasso evolutivo da sociedade e a elaboração das leis.”[49]
Com isso verificou-se no presente trabalho o papel da Justiça Militar da União e do dispositivo normativo de repressão às drogas finalizando com conclusões e propostas para melhoria do art. 290 do CPM. Tais propostas nos obrigam a rever certas atitudes simplistas que reduzem o problema a uma questão individual, fechando os olhos para a complexidade do tema multidisciplinar e com conseqüências para todos os brasileiros militares.
Nunca é demais lembrar os malefícios provenientes do narcotráfico, sobretudo nas periferias, pensar nos gastos públicos com o tratamento de saúde dos viciados, ou ainda no custo social e tudo o que ele acarreta.
Diante da magnitude do mundo das drogas, hoje, a necessidade de compartilhar as responsabilidades se tornou mundial e o presente trabalho além de estudar a importância da Justiça Militar da União tenta propor a elaboração de uma nova lei penal militar referente ao combate às drogas.
Informações Sobre o Autor
Vitor Eduardo Tavares de Oliveira
Cursa a especialização em Direito Internacional Ambiental da United Nation Institute For Training And Research – UNITAR, graduando em Direito pelo Uniceub, pesquisador bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, membro dos grupos de pesquisa: A internacionalização dos Direitos, Mercosul e Novas Tendências do Direito Público, todos do Uniceub