Rodolfo Batista Lima[1]
Ewerton Leandro Felix da Silva [2]
Leandra Bento da Silva [3]
Resumo: A presente obra tratará de maneira minuciosa dos aspectos da privatização das penitenciárias brasileiras. Abrangendo desde os históricos das penas, aquelas que lograram êxito, bem como às que não saíram do campo imaginário, até o sistema adotado no Brasil atualmente, que é preponderantemente o progressivo. Ainda, contará com uma breve abordagem das penas brasileiras, informando ao leitor sobre suas espécies, tal qual das nuances da Lei de Execução Penal. Ademais, será discutido também acerca da constitucionalidade ou não de tal medida, combinado com as vantagens e desvantagens, tomando como base os países que adotaram a delegação à iniciativa privada, assim como os Estados da Federação brasileira que aderiram à inovação. Diante desta análise sistemática buscará levar o leitor a reflexão se a privatização é de fato a solução para a problemática que assola os presídio mundiais e principalmente brasileiros.
Palavras-Chave: Privatização; Penitenciárias; Penas; Tutela do Estado; Educação.
Abstract: This book will deal in detail with the aspects of the privatization of Brazilian penitentiaries. Covering from historical feathers, those that have succeeded, as well as those that have not left the imaginary field, to the system adopted in Brazil today, which is predominantly progressive. Still, it will have a brief approach to the Brazilian penalties, informing the reader about their species, as well as the nuances of the Penal Execution Law. In addition, it will also be discussed about the constitutionality or not of such measure, combined with the advantages and disadvantages, based on the countries that adopted the delegation to the private initiative, as well as the states of the Brazilian Federation that adhered to the innovation.
Keywords: Privatization; Penitentiaries; Feathers; Trusteeship of the State; Education.
Sumário: Considerações iniciais. 1. Histórico do cumprimento de penas. 1.1. Sistema Panóptico. 1.2 Sistema Filadélfico. 1.3. Sistema Auburniano. 1.4. Sistema Progressivo. 1.5. Sistema adotado no Brasil. 2. As penas brasileiras. 2.1. Noções gerais. 2.2. Espécies de pena. 2.2.1. Privativas de Liberdade. 2.2.2 Restritiva de direitos. 2.2.3. Multa. 2.3. Lei de execução penal. 3. Privatização. 3.1. Noções gerais. 3.2. Constitucionalidade da privatização. 3.3. Vantagens e Desvantagens. Considerações finais. Referências.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este trabalho acadêmico tem como ponto norteador analisar de maneira objetiva, concisa, mas completa a privatização dos presídios brasileiros, será esta a solução?
Desde o século XVI o ser humano busca a melhor forma de manutenção de penitenciárias. Estudiosos de diversos países buscam medidas punitivas, preventivas e ressocializadoras de estruturação de presídios. Uma das primeiras formas foi o sistema Panóptico que consiste num enorme centro de vigilância, todavia, não conseguiu a aplicabilidade desejada. Em seguida veio o sistema Filadélfico, com grande repercussão nos Estados Unidos, porém, diante da rigorosidade não logrou êxito, sendo substituído pelo sistema Auburniano, conhecido como o sistema do silêncio, e por fim foi instituído o predominante internacionalmente, o sistema Progressivo, no qual o detento por meio de sua conduta, trabalho e/ou estudo, conquista o direito de ser transferido do sistema mais rigoroso para o mais flexível.
Posteriormente trataremos das penas brasileiras, quais suas espécies e peculiaridades, eliminando dúvidas do tipo: o preso é obrigado a trabalhar? Como funciona a progressão de pena? Feitas as devidas anotações observar-se-á a privatização em si.
O termo “privatização das penitenciárias”, em primeira vista é a ideia da transferência do poder público para o privado, com o objetivo de solucionar todos os problemas atuais no sistema penitenciário brasileiro, ou seja, fazer uma mudança de administração e tirar da responsabilidade pública os erros que estão decorrendo da atividade e passar para iniciativa privada, para tentar alcançar uma melhoria, por diversos fatores, como por exemplo: O investimento, pois, esse será maior e o administrador terá mais possibilidade de focar apenas na situação da penitenciária, diferente do estado, que deve prestar sua atenção a tudo que é público. Porém, iria se tornar um meio de exploração de mão-de-obra barata, não se pensaria em ressocialização, tudo iria virar apenas um negócio sem interesse social. Essa é uma visão geral de primeiro impacto, parecendo um pouco tanto grosseira; mas diante de qualquer tipo de situação a primeira coisa a ser feita é observar e analisar sem nenhum tipo de pré-conceito, e assim a privatização passa de uma estratégia de lucro para a classe superior, para uma alternativa de melhora.
- HISTÓRICO DO CUMPRIMENTO DE PENAS
No início das relações humanas, envolvendo as questões de punições para aqueles que não obedeciam às regras, surgiu como principal instrumento de sanção, as penitenciárias, que até hoje são utilizadas em nosso ordenamento, porém, mais repressivo do que como punitivo. No entanto, nem sempre foi tão bem definido como é hoje, decorrência de inúmeras evoluções.
A pena privativa de liberdade é uma ideia aplicada a muitos anos atrás, sendo incluída definitivamente como pena a partir do Direito Canônico, na Idade Média, tendo em vista que anteriormente era apenas um meio de garantir que o culpado não se evadisse, a fim de evitar a pena. Logo, verifica-se que o encarceramento não era uma punição, e sim uma forma para garantir essa.
A primeira forma de penitenciária foram as casas de forças, bem no século XVI, por volta de 1550, onde combinava uma casa de acolhimento com um sistema penal de correção, lá eram colocados os mendigos, os vagabundos, as prostitutas, ou seja, todos aqueles que eram considerados inúteis socialmente e que necessitavam de uma recuperação, através da força dos trabalhos obrigatórios.
Como exemplo dar-se-á no período iluminista, nos casos em que os condenados tinham sua liberdade privada até o dia de seu julgamento, como também até a pena de morte. Porém, muitos deles acabavam morrendo antes mesmo dos devidos julgamentos, pelo fato das péssimas condições em que se encontravam, haja vista que a restrição de liberdade não tinha lugar nem nomes específicos, geralmente eram subterrâneas, em poços artesianos; esse tipo de prisão ficou conhecida como Prisão Custódia.
Outro exemplo de prisão anterior a que surgiu nos Estados Unidos foi, também, durante a idade média, onde os condenados eram colocados em mosteiros sob as normas do Direito Canônico; conhecida como Prisões Eclesiásticas.
E o último modelo de privação de liberdade anterior ao existente hoje foram as Prisões de Estados, que pela primeira vez, eram em locais já estabelecidos com uma finalidade determinada, as torres dos castelos, as casas de forças, cuja finalidade era recuperar pessoas “inúteis” através da força do trabalho e com a restrição da liberdade.
E logo após todos esses momentos, deu-se início a uma linha de evolução de diversos sistemas, que passaram de simples projetos de penalidade privando a liberdade dos detentos, para reais projetos de ressocialização humana.
1.1. Sistema Panóptico
De acordo com o Dicionário Priberam[4], Panóptico significa: “Que permite ver todos os elementos ou todas as partes.”
Foi este o termo utilizado pelo filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham, quando ele idealizou através de diversos estudos racionais o protótipo de penitenciária ideal, que tem como principal intuito, que um único vigilante possa vigiar todos os prisioneiros sem que esses saibam quando, quem, onde e se realmente estão sendo vigiados, fazendo com que eles próprios de forma indireta, passem a se policiar e assim adotar o comportamento que as penitenciárias e os sistemas de “punições” queiram que todos exerçam, através do medo e do receio de não saberem se estão sendo observados.
Bentham criou através de seus estudos sobre o sistema penitenciário, um projeto de prisão que tinha como base um edifício em formato circular dividido em pequenas celas, com uma entrada para o lado interior e uma para o lado exterior, assim deixando a cela extremamente luminosa e permitindo o vigilante observá-la atravessadamente e sem deixar nenhum ponto de sombra, a cela deve ser ocupada por um único prisioneiro e no centro do edifício uma grande torre, pois é lá que se encontra(m) o(s) observador(es), sendo esta torre feita por algumas salas e suas conexões em labirintos, isolamentos sonoros e uma espécie de “fumê” nas janelas, para que não houvesse a mínima possibilidade de quem está sendo observado ter a oportunidade de ouvir ou identificar sombras ou ruídos vindos da torre, pois, será essa a chave desse sistema, o vigilante deve ver todos de forma clara e total, e quem está sendo observado deve nem imaginar se lá tem ou não alguém posto.
Assim, afirma Michel Foucault em sua obra “Vigiar e Punir: Nascimento da prisão” que:
O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre: esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. (FOUCAULT, 2016, p. 194)
Ainda, Foucault cita o efeito mais importante de tal sistema, ao dizer:
O efeito mais importante é induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder. Fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontínua em sua ação; que a perfeição do poder tenda a tornar inútil a atualidade de seu exercício; que esse aparelho arquitetural seja uma máquina de criar e sustentar uma relação de poder independente daquele que o exerce: enfim, que os detentos se encontrem presos numa situação de poder de que eles mesmos são portadores. (FOUCAULT, 2016, p. 195)
Segundo o próprio autor do sistema, por ter certeza da eficácia e eficiência do seu projeto, o sistema seria totalmente aplicável não só a prisões, mas sim a qualquer tipo de sistema que possua a necessidade de uma hierarquia, alguém que tenha o poder de exigir um determinado comportamento e outro que tenha por obrigação exercer o comportamento esperado pela organização, por exemplo, fábricas, escolas, hospitais. Além de ser o sistema mais barato, comparado a todos já conhecidos de sua época, pois, não necessita de grandes números de vigilantes, podendo esse vigilante ser uma voz, um olho, uma sombra, basta ele ser onipresente e onisciente, o que não era difícil, pois era justamente o que esse modelo iria proporcionar.
Outro ponto observado e aplicado por Bentham, em sua forma “perfeita” de prisão e cumprimento de pena, é que para ele, a punição deve ser encarada como um espetáculo, pois, os efeitos da punição exercida em alguém que mereceu deve ser menos importante que os efeitos que aquela punição vai exercer para aqueles que estão vendo, e é por isso que dentro de seu sistema panóptico, escutava constantemente gritos horríveis, só que não dos prisioneiros, mas sim dos atores contratados justamente para esse serviço. Gerando um bem para todos, pois, essa punição fictícia, serviria de exemplo para os prisioneiros que iriam tomar como reais esses gritos, e logo associar que algum prisioneiro fez algo de errado e por isso foi punido fisicamente de forma severa, assim, instalando uma ordem sem exercer nenhuma violência física, mas sim um jogo psicológico.
Mas vale ressaltar que essa teoria quase não saiu do papel, poucas foram as penitenciárias que conseguiram implantar esse sistema.
1.2. Sistema Filadélfico
O sistema filadélfico surgiu por volta do século XVIII, com grande influência da religião, tendo como seus principais precursores Benjamin Franklin e Willian Bradford e tendo sua maior repercussão nos EUA.
Este sistema tem como base a religião e o Direito Canônico, pois foram através dos estudos e das tradições levantadas por elas que o sistema penal construiu sua forma, sua finalidade e por qual linha de raciocínio deveria utilizar para buscar os objetivos finais.
Conforme preleciona Bitencourt:
Os cidadãos da Filadélfia, com sua contínua e incisiva opinião pública, fez com que autoridades iniciassem, em 1790, a organização de uma instituição na qual o isolamento em uma cela, a oração e a abstinência total de bebidas alcoólicas deveriam criar os méis para salvar tantas criaturas infelizes. (BITENCOURT 2006, p. 160)
Com isso, o objeto a ser trabalhado é o isolamento absoluto, baseando-se nos isolamentos nas celas dos mosteiros ou conventos, que a igreja aplicava como pena aos infratores, e lá eram “obrigados” a orar e praticarem penitências para que só assim se reconciliassem com Deus. Pois bem, assim foi aplicado o sistema penal, os condenados considerados perigosos eram colocados isolados em celas únicas, não tendo qualquer tipo de contato com o mundo exterior, sendo proibida qualquer tipo de visita, a fim de que refletisse sobre sua conduta, sendo-lhe garantido apenas um pequeno lapso temporal para caminhar em um pátio redondo e a obrigação de trabalhar isoladamente dos demais, gerando renda para as prisões. Já os indivíduos de baixo nível de periculosidade poderiam trabalhar em conjunto com os demais.
Como explica Cezar Roberto Bitencourt (2006, p. 160): “impôs-se o isolamento em celas individuais somente aos mais perigosos, os outros foram mantidos em celas comuns; a estes, por sua vez, era permitido trabalhar conjuntamente durante o dia.”
Ademais, tinham os momentos em que os prisioneiros eram obrigados a refletir as palavras da Bíblia, pois como nos mosteiros, só através da oração que há a possibilidade de encontro com o divino, adquirindo, assim, a recuperação.
Dito isso, tem-se como características primordiais do sistema filadélfico a obrigação ao silêncio estrito, o isolamento celular dos internos, a meditação e a oração.
Assim, Luiz Regis Prado leciona o seguinte:
Em verdade, esse sistema penitenciário visava a organização do caos existente nos estabelecimentos prisionais da época. Consistia em uma tentativa de sistematização da execução da pena privativa de liberdade, com vistas a superação de inúmeros problemas (promiscuidade, fuga, rebeliões, higiene deficitária, entre outros). Apesar de simbolizar um efetivo avanço, são muitas as objeções feitas a esse sistema, que, colocado na segregação e no silêncio, não proporcionava a reinserção social do condenado. (PRADO, 2006, p. 543)
Com essa forma de trabalhar a reinserção dos condenados, não demorou muito para que o sistema filadélfico fosse criticado e alterado, dando origem para um novo sistema, pois muitos estudiosos começaram a especular que esse tipo de tratamento só propicia para a insanidade dos condenados, e jamais a ressocialização.
1.3. Sistema Auburniano
Após todas as críticas feitas ao sistema filadélfico, ocasionando o seu fracasso, foi necessária uma evolução de um sistema extremamente cruel para um sistema em que seu objetivo fosse mais humanizado, é assim que surge o Sistema Auburniano. Tal nomenclatura foi empregada por ter sido relacionado à construção do presídio de Aurbun, nos Estados Unidos.
Conforme relatos de Mirabete e Fabbrini:
No sistema auburniano, mantinha-se o isolamento noturno, mas criou-se o trabalho dos presos, primeiro em suas celas e, posteriormente, em comum. Característica desse sistema penitenciário era a exigência de absoluto silêncio entre os condenados, mesmo quando em grupos, o que levou a ser ele chamado de silent system. Sua origem prende-se à construção da penitenciária na cidade de Auburn, do Estado de New York, em 1818, sendo seu diretor Elam Lynds. (MIRABETE E FABBRINI, 2013, p. 236)
Segundo Bitencourt (2001, p. 86-87), o principal personagem desse sistema dizia que o sistema Auburniano era a melhor solução para corrigir os erros dos sistemas anteriores, pois era de total humanização possível. De acordo com uma ordem, os prisioneiros entregues a esses sistemas eram divididos em três categorias: os primeiros eram aqueles que para o direito tinha maior dificuldade de correção, os delinquentes persistentes, esses eram submetidos a um isolamento absoluto todos os dias; o segundo eram aqueles mais fáceis de correção, já que esses tinham suas penas mais flexíveis, eram levados às celas de isolamento absoluto 3 dias da semana e tinha a permissão do trabalho; por fim, os terceiros, eram aqueles com certeza de correção, submetidos de forma mais simples a uma pena de isolamento noturno e trabalho “coletivo” durante o dia.
Porém, ainda assim não foi o suficiente, mesmo com essas divisões em categorias, os números de positividade foram extremamente baixos e os números de insanidade continuaram aumentando, logo, foi necessário um novo reajuste e o trabalho coletivo foi concedido a sua totalidade, assim, todos teriam contados com outros humanos, mas no lugar do isolamento surgiu o silencio absoluto, ou seja, todos poderiam trabalhar no mesmo local, entretanto, devem se manter em silêncio sem nenhum tipo de comunicação, apenas o trabalho e durante a noite não existia mais o isolamento individual, agora o isolamento solidário.
Com isso, não surtiu os efeitos desejados, pois não visava a recuperação, mas a obediência dos condenados, os quais eram incomunicáveis. E esse foi o principal marco desse período, tendo em vista que o sistema auburniano passou a ter como finalidade utilitária a mão de obra. Diferente do sistema celular que a produção era inviável, haja vista, que a prisão era individual, dificultando muito a produção, e ainda não havia a utilização de máquinas. Em Auburn todos trabalhavam juntos, podendo assim utilizar maquinas coletivas, agilizando a produção e consequentemente gerando mais economia.
Foi justamente esse interesse econômico que provocou o fracasso de tal sistema, pois esse interesse excessivo de apenas lucrar com o trabalho dos prisioneiros fez com que as associações sindicais fossem contrárias a ele. Diante disso, surgiu outra problemática, os trabalhos nas prisões representavam uma competição injusta e um problema à livre iniciativa, haja vista que as prisões saiam na frente com suas mãos de obras extremamente baratas e seu regime abusivo.
Ainda hoje é possível ver reflexo do que foi introduzido no sistema auburniano, exemplo disso, são as comunicações de presos por meio de gestos, espécies de alfabetos, mais recorrentes em prisões de segurança máxima, cujo regime penitenciário é mais rígido.
1.4. Sistema Progressivo
Após o fracasso total dos sistemas penitenciários anteriores, foi a vez de um novo surgir, um ao qual não tem espaço para regimes extremistas a ponto do número de insanidade dos condenados ser maior que o número de positividade da eficácia do sistema. O Sistema Progressivo.
O sistema progressivo surgiu no ano de 1840, pelo capitão Alexandre Maconochie, na Austrália, com o objetivo totalmente contrário ao sistema filadélfico e o sistema auburniano, que propunham a ideia de isolamento e silêncio, respectivamente, enquanto que a finalidade desse sistema é a real busca pela ressocialização, recuperação e obediência dos detentos.
Nesse sistema a pena dos condenados eram divididas por períodos, e esse foi a principal evolução, pois a cada período passado o detento recebia um privilégio em sua pena, mas seriam concedidos através das metas que os presos recebiam em forma de marcações, que dependiam da gravidade do crime cometido, como também, através de seus bons comportamentos e do trabalho, marcações eram dadas e assim quando atingia a quantidade necessária tinha seu privilégio garantido. Em resumo o período dos detentos não tinha um tempo exato, o tempo era dependente de 3 requisitos: primeiro a gravidade do crime, em segundo o trabalho exercido pelo condenado e em terceiro o comportamento. Explica Prado:
A princípio o condenado passava pelo isolamento celular (período de prova), para depois, segundo sua conduta, trabalhar em comum dentro da penitenciária, em silêncio, recolhendo-se ao isolamento durante a noite. O estágio seguinte consistia na semiliberdade, culminando, ao fim, com a liberdade sob vigilância até o término da pena. (PRADO, 2006, p. 544)
Ao longo do tempo, o sistema progressivo teve diversos pontos positivos, mas ainda foi passivo de uma nova transformação simples, pelo diretor da prisão irlandesa Walter Crofton, que acrescentou um quarto período conhecido como “Período Intermediário”, que tinha como objetivo uma adaptação do preso com a liberdade definitiva, ou seja, era o período que o preso deveria provar, que após seu tempo detido, realmente estava apto a vida em liberdade definitiva.
Conforme ensina Prado:
A primeira, abrangendo um período de isolamento celular de nove meses de duração; a segunda, consistindo no trabalho em obras públicas; já a terceira etapa destinava-se ao trabalho externo, com pernoite em estabelecimento penal; a quarta e última fase, por sua vez, era a liberdade provisória (livramento condicional), que poderia ser revogada ou convertida em definitiva através do bom comportamento. (PRADO, 2006, p. 544)
Ademais, também houve muitas críticas à essa teoria, dentre elas ressaltamos a de Bitencourt:
A efetividade do regime progressivo ser uma ilusão, diante das poucas esperanças sobre resultados que se podem obter de um regime que começa com um controle rigoroso sobre toda a atividade do recluso, especialmente no regime fechado; O sistema progressivo alimentar a ilusão de favorecer mudanças que sejam progressivamente automáticas. O afrouxamento do regime não pode ser admitido como um método social que permita a aquisição de um maior conhecimento da personalidade do interno. (BITENCOURT, 2005, P. 171)
Apesar das demasiadas críticas, é notável que tal sistema ainda é o mais utilizados pelos países que visam a ressocialização do indivíduo.
1.5. Sistema adotado no Brasil
O Brasil, após observar o sucesso do sistema progressivo não encontrou outro melhor para aplicar em suas penitenciárias, e assim está até os dias atuais.
O sucesso do sistema e o favoritismo pelos diversos países mundiais, veio através da sua finalidade para alcançar seus objetivos, por exemplo: o estímulo a boa conduta do preso e objetivo de recuperar os detentos fazendo uma reforma moral, dando a eles a chance de sair da pena antes do tempo condenado e assim ressocializar-se com mais eficácia, haja vista que caso não mantivessem o bom comportamento teria o seu privilégio retirado e não poderiam mais ter o direito novamente.
Por razão de todo esses objetivos e meios envolvendo o sistema progressivo, os pontos positivos passaram a serem detectados, o principal foi o aumento no número de recuperação moral por vontade própria dos detentos, tendo em vista, pela gratificação dada a quem exercer seu bom comportamento e se manter nele e assim ter sua pena reduzida, todos os detentos passíveis a querer mudar se esforçavam ao máximo para poderem ser reingressos na sociedade. Cumprindo o teor da sua pena, desde que não seria encarcerado na inteireza penal.
Art. 33 – A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.
- 1º– Considera-se:
- a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;
- b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
- c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.
- 2º– As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
- a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;
- b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;
- c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto
- AS PENAS BRASILEIRAS
2.1. Noções Gerais
Para conceituação de tal instituto jurídico, valemo-nos das palavras do professor Rogério Sanches Cunha:
Pena é espécie sanção penal, isto é, resposta estatal ao infrator da norma incriminadora (crime ou contravenção), consistente na privação ou restrição de determinados bens jurídicos do agente. Sua imposição depende do devido processo legal, através do qual se constata a autoria e materialidade de um comportamento típico, antijurídico e culpável não atingido por causa extintiva da punibilidade. (CUNHA, 2018, p. 443)
Para Cernicchiaro:
A pena pode ser encarada sobre três aspectos: substancialmente consiste na perda ou privação do exercício do direito relativo a um objeto jurídico; formalmente está vinculada ao princípio da reserva legal, e somente é aplicada pelo Poder Judiciário, respeitado o princípio do contraditório; e teleologicamente mostra-se, concomitantemente, castigo e defesa social. (CERNICCHIARO, 1970, p. 161)
Já Mirabete (2005, p. 246) afirma que “na pena deve existir várias características como legalidade, personalidade, proporcionalidade e inderrogabilidade.”
A legalidade decorre do princípio da legalidade, que consiste na existência de lei prévia, para a aplicação ao caso concreto. A personalidade trata da impossibilidade da pena ser transmitida a terceiros. A proporcionalidade garante que o condenado não será punido além da pena que seja adequada a sua infração. E por fim, tem-se a inderrogabilidade que é o cumprimento da pena, a certeza da punição, ressalvados as exceções previstas no código penal, como por exemplo o livramento condicional, a suspensão condicional do processo, o perdão judicial, dentre outros.
Mirabete em sua obra: “Execução Penal” afirma que:
No Brasil a primeira tentativa de uma codificação a respeito das normas de execução penal foi o projeto do código penitenciário da República, de 1923, elaborado por Cândido Mendes, Lemos de Brito e Heitor Canilho, que veio a ser publicada no diário do poder legislativo, Rio de Janeiro, edição de 25 de fevereiro de 1937. Estava ainda em discussão ao ser promulgado o Código Penal de 1940. (MIRABETE, 1997, p. 28)
Ademais, diante da abstenção do Código Penal acerca de qual teoria adotou, sobre a finalidade da pena no Brasil, a doutrina tem entendido que a tríplice finalidade foi a teoria adotada, haja vista que a pena brasileira possui a finalidade retributiva; preventiva; e reeducativa.
Tem como finalidade ser retributiva, haja vista que com afirma Rogério Sanches Cunha (2018, p.446): “visa retribuir com o mal o mau causado”; é preventiva, pois tem como pretensão demonstrar para os demais da sociedade que quem descumprir determinada norma, será punido de acordo com os atuais condenados; e por fim, tem-se o objetivo da reeducação, isto é, visa ressocializar o indivíduo à sociedade, para que o mesmo tenha uma vida normal sem cometimento de infrações.
2.2. Espécies de pena
O artigo 32 do Código Penal afirma que o Brasil adotou três espécies de penas, são elas: (1) Privativas de liberdade; (2) Restritiva de Direitos; e (3) Multa.
Tem-se também como pena prevista no artigo 47 do Código Penal, a interdição temporária de direitos, a saber:
Art. 47 – As penas de interdição temporária de direitos são
I – proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo;
II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público;
III – suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo.
IV – proibição de frequentar determinados lugares.
V – proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos.
Contudo, há também outros tipos de penalidades previstas no Código Penal Militar, como também no Código de Trânsito Brasileiro, dentre outros estatutos normativos. Todavia, para o nosso estudo vamos focar apenas no artigo 32 do código penal.
2.2.1. Privativas de liberdade
Rogério Sanches Cunha (2018, p. 459) afirma que a pena privativa de liberdade é a “forma mais drástica de punição (sem esquecer as hipóteses em que se admite a pena capital), as penas privativas de liberdade podem ser reclusão, detenção ou prisão simples, variando principalmente no grau de institucionalização do indivíduo.”
A pena de reclusão é reservada para os crimes mais graves e deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. Enquanto, que a pena de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência para o regime fechado, conforme o artigo 33 do código penal. A prisão simples é destinada apenas para as contravenções penais, cumprida exclusivamente em regime semiaberto ou aberto, não cabendo o regime fechado nem por regressão, devendo ser cumprida em local distinto dos apenados por crimes, sem os rigores penitenciários (art. 6º da Lei de contravenções penais).
Ademais, o mesmo artigo 33 em seus parágrafos, estabelece como regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média, cujo condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá cumpri-la, como também os indivíduos que tenham sido condenados por crime superior a 4 (quatro), desde que sejam reincidentes. Já o regime semiaberto a execução da pena dá-se em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar e será cumprida por condenados cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda 8 (oito), desde que seja primário, isto é, não reincidente, há também a possibilidade de o reincidente condenado a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos cumprir em tal regime. Tem-se ainda, o regime aberto, em que a execução da pena dar-se-á em casa de albergado ou estabelecimento adequado, que deverá ser cumprida pelos condenados à pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos, desde que não reincidentes.
2.2.2. Restritiva de direitos
Previstas nos artigos 43 a 48 do código penal, tem como características serem autônomas e substituírem as penas privativas de liberdade, logo não podem ser cumuladas com essa.
O código penal classifica tais penas como de: prestação pecuniária; perda de bens e valores; prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; interdição temporária de direitos; e limitação de fim de semana.
A prestação pecuniária, consiste, conforme ensina Mirabete e Fabbrini:
no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz da condenação. Por disposição expressa, não pode ser ela inferior a um salário mínimo nem superior a 360 vezes esse salário. (MIRABETE E FABBRINI, 2013, p. 261)
A pena restritiva de direitos de perda de bens e valores tem respaldo constitucional, mais precisamente no artigo 5º, XLVI, b, que dispõe:
Art. 5º, XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: […]
- b) perda de bens; […]
De acordo com Mirabete e Fabbrini:
constitui-se ela, nos termos do art. 45, § 3º, no confisco em favor do Fundo Penitenciário Nacional de quantia que pode atingir até o valor referente ao prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro, em consequência da prática do crime, prevalecendo aquele que for maior. (MIRABETE E FABBRINI, 2013, p. 261–262)
Segundo o artigo 46, § 1º, da Lei nº 9.714/98: “A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado.”
Já a interdição temporária de direitos consiste na proibição de realizar determinadas funções ou atividades, como está prescrito no art. 47 do CP, essas proibições são: (1) proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; (2) proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; (3) suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo; (4) proibição de frequentar determinados lugares; e (5) proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos.
E por fim tem-se a limitação de fim de semana, que consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por 5 (cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado (art. 48, CP).
2.2.3. Multa
A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será no mínimo de 10 e, no máximo 360 dias-multa (art. 49, CP).
Segundo Mirabete e Fabbrini:
A pena de multa […] aponta-se como maior vantagem da pena pecuária, em confronto com a pena privativa de liberdade, não ser levado o criminoso à prisão por prazo de curta duração, privando-o do convívio com a família e de suas ocupações, mesmo porque não seria suficiente para a recuperação do sentenciado e apenas o corromperia e o aviltaria. Assinala-se, também, que a pena de multa não acarreta despesas ao Estado e que é útil no contraimpulso ao crime nas hipóteses de crimes praticados por cupidez, já que ele atinge o núcleo da motivação do ato criminoso. (MIRABETE E FABBRINI, 2013, p. 278)
Ademais, a doutrina aponta como falha principal a injustiça social de sua aplicação, já que afeta o pobre de maneira mais árdua que o rico.
2.3. Lei de Execução Penal
A Lei de execução penal – Lei nº 7210/84 – dispõe em seu artigo 1º sua finalidade e seus objetivos, a saber:
Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.
Ademais, aplica-se ao processo de cumprimento de pena, os seguintes princípios constitucionais: ampla defesa, contraditório, igualdade, duplo grau de jurisdição, legalidade e publicidade.
Vale ressaltar uma peculiaridade trazida pelo legislador e incorporada no art. 4º da referida lei. Tal dispositivo informa que “o Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança.” Isto é, compete também a sociedade a reinserção do indivíduo no meio coletivo, como salienta Mirabete (2007, p. 45): “outro ponto inovador da lei é o de que o Estado deve recorrer a cooperação da comunidade como condição essencial para que seja alcançado o objetivo de facilitar a futura reinserção do condenado na vida social.”
A Constituição Republicana destaca em seu artigo 5º, inciso XLVI que a lei assegurará a individualização da pena. Decorrente dessa premissa, o art. 5º da Lei de execução penal – LEP – afirma que os condenados serão classificados segundo os antecedentes, dentre outros meios de individualização da pena.
Art. 5º Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal.
Quanto ao trabalho do preso, cumpre destacar que a Carta Magna proíbe a propositura de trabalhos forçados, conforme exposto no art. 5º:
XLVII – não haverá penas:
[…]
- c) de trabalhos forçados; […]
No entanto, há uma obrigação por parte da Lei de execução penal, para que o preso trabalhe, tal imposição é decorrente das normas mínimas da ONU. Note que tal regramento vem de forma expressa nos seguintes artigos da LEP:
Art. 31. O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade.
Art. 39. Constituem deveres do condenado:
[…]
V – execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas;
Portanto, cumpre notar que a obrigação, por parte da legislação infraconstitucional, do condenado trabalhar, não afronta a norma constitucional que proíbe o trabalho forçado, haja vista que este distingue-se daquele, pois forçar é impor-lhe por meio de coação física a trabalhar, enquanto que a obrigação decorre apenas como meio para adquirir um recurso financeiro, dentre outros, que caso seja negligenciado por parte do preso, esse terá um cerceamento de direitos.
Importante observar o comentário de Mirabete:
Preveem as regras mínimas da ONU que todos os presos devem ser submetidos a obrigação de trabalho, tendo-se em conta sua aptidão física e mental, e o art. 31 da Lei de Execução Penal, além de confirmar o dever de trabalhar do preso, refere-se às aptidões e capacidade do condenado, remetendo-se, evidentemente, às condições físicas, mentais, intelectuais e profissionais do condenado. (MIRABETE, 2007, p. 95)
Os trabalhos prisionais podem ser das mais diversas formas, tanto industriais, como agrícolas e intelectuais. No entanto, vale destacar que a jornada de trabalho do preso deve ser de no mínimo 6 horas e máximo de 8 horas diárias.
Ademais, o indivíduo terá prestação acidentária, como também previdenciária, entretanto, não se sujeitará ao regime da CLT, sendo, portanto, regime de Direito Público. Ensina Capez (2007, p. 38) que em decorrência disso “o preso não tem direito a férias, 13º salário e outros benefícios que decorrem do contrato de trabalho livremente firmado.”
De acordo com as regras mínimas da ONU, compete ainda aos Estados, garantir a educação dos prisioneiros. Como está preceituado no artigo 17 do referido instituto normativo: “A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado.” Logo, o ensino de 1º grau passa a ser obrigatório, viabilizando uma maior probabilidade de reingresso do delinquente à vida social.
Salienta Mirabete que:
É ainda preceito das Regras Mínimas da ONU que a instrução aos analfabetos e aos reclusos jovens será obrigatória e a ela deve a Administração prestar particular atenção, esclarecendo-se que a ação educativa deverá coordenar-se, enquanto possível, com o sistema de instrução pública, a fim de que os presos, ao serem postos em liberdade, possam continuar sem dificuldade sua preparação. (MIRABETE, 2007, p. 76)
Diante disso, verifica-se que o condenado tem como obrigatório o ensino do 1º grau, bem como tem, de acordo com a ONU e a LEP, a obrigação de trabalhar, importante lembrar que a obrigação do trabalho não fere a Constituição no que tange a sua cláusula que proíbe o trabalho forçado.
- PRIVATIZAÇÃO
3.1. Noções Gerais
O termo “privatização das penitenciárias”, em primeira vista é a ideia da transferência do poder público para o privado, com o objetivo de solucionar todos os problemas atuais no sistema penitenciário brasileiro, ou seja, fazer uma mudança de administração e tirar da responsabilidade pública os erros que estão decorrendo da atividade e passar para iniciativa privada, para tentar alcançar uma melhoria, por diversos fatores, como por exemplo: O investimento, pois, esse será maior e o administrador terá mais possibilidade de focar apenas na situação da penitenciária, diferente do estado, que deve prestar sua atenção a tudo que é público. Porém, iria se tornar um meio de exploração de mão-de-obra barata, não se pensaria em ressocialização, tudo iria virar apenas um negócio sem interesse social. Essa é uma visão geral de primeiro impacto, parecendo um pouco tanto grosseira; mas diante de qualquer tipo de situação a primeira coisa a ser feita é observar e analisar sem nenhum tipo de pré-conceito, e assim a privatização passa de uma estratégia de lucro para a classe superior, para uma alternativa de melhora.
A ideia de privatização iniciou nos Estados Unidos na década de 80 (oitenta), como forma de ajudar o país a sair da crise na qual se encontrava. Como salienta Minhoto:
A partir de meados da década de 80, primeiramente nos EUA, e a seguir em outros países industrializados, como Inglaterra, França, Canadá e Austrália, a política de privatização de prisões torna-se uma realidade no combate à crise generalizada do sistema penitenciário das sociedades capitalistas avançadas do Ocidente. (MINHOTO, 2000, p. 25)
Logo, verifica-se que além dos Estados Unidos, outros países também aderiram à onda de privatização, todos como meio de saída a superlotação penitenciária.
Diante do cenário carcerário brasileiro, a privatização tomou uma posição de solução, a ideia de transferir a administração do poder estatal para a iniciativa privada, passa a ser a melhor de todas as alternativas. Pois assim, os problemas comuns de superlotação nas cadeias, miserabilidade na condição de vida dos presos, a falta de ressocialização, a ausência de investimentos e a falta do devido cumprimento da lei, seriam solucionados; pois, diferente do que vem colaborando para que todos estes problemas continuem a existir, com a privatização, os administradores iriam investir muito mais em construções de cadeias, para extinguir a superlotação; iriam cuidar muito bem da vida de seus presos, pois assim colaboraria para um bom desempenho nos trabalho prestados pelos presos; a ressocialização seria mais certa, pois, lá dentro todos eles iriam ser obrigados a exercer um trabalho e assim adquirir experiência para vida externa, e como toda atividade privada, essa também seria fiscalizada pelo estado, ou seja, a lei deveria ser cumprida.
3.2. Constitucionalidade da privatização
A doutrina brasileira muito tem debatido acerca da constitucionalidade da privatização das penitenciárias, fato é que só o Supremo Tribunal Federal é que poderá determinar se de fere ou não a Carta Magna. Enquanto isso alguns Estados brasileiros já privatizaram, no todo ou em parte seus presídios, no entanto, vamos aprofundar na matéria no tópico específico.
Apesar do guardião da Constituição não ter posicionado acerca da privatização, vale salientar que já se posicionou acerca do estado atual dos presídios. No informativo nº 798[5] de 2015 a Suprema Corte declarou que o Sistema Carcerário está no estado de coisa inconstitucional e violação de Direitos Fundamentais.
A Constituição em seu artigo 5º incisos XLVII, XLIX e LXII enuncia os direitos dos presos a saber:
Art. 5º […]
XLVIII – a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
LXII – a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.
Portanto, verifica-se que a Magna Carta não trata em nenhum momento acerca da possibilidade de privatizar ou não, haja vista que todas as premissas constitucionais podem ser seguidas tanto pela Administração Pública quanto pelo particular. Todavia, vale pontuar que a Administração Pública tem como princípio constitucional a Legalidade, que restringe a atuação do Gestor Público apenas ao que a lei permite, não podendo agir ao que ela não prevê, como preleciona Alex Muniz Barreto:
Como o Direito Administrativo disciplina a gestão dos interesses coletivos expressos em normas constitucionais e infraconstitucionais, a regularidade da atividade administrativa estatal está condicionada ao estrito cumprimento dos preceitos legais vigentes. Isso implica dizer que o administrador público deve pautar-se pelo princípio da legalidade estrita (ou da restritividade) e, por consequência, só poderá fazer o que a lei expressamente permitir. Em suma, o gestor público, além de estar proibido de agir contra (contra legem) ou além da lei (extra legem), só poderá atuar de acordo com ela (secundum legem). (BARRETO, 2008, p. 44)
Assim, não compete ao administrador essa decisão, e sim ao legislador, esse que deve criar uma norma federal que regule essas privatizações. Contudo, muitos doutrinadores defendem que há a possibilidade, no ordenamento jurídico pátrio, de haver essa desestatização, ao menos que em parte, como afirma Assis:
A possibilidade de se privatizar as prisões brasileiras encontra seu primeiro obstáculo em nosso ordenamento jurídico. Embora não haja um consenso entre os doutrinadores, a maioria deles tem interpretado que a atual legislação, da forma como está, não permitiria a delegação do serviço penitenciário à iniciativa privada. Da mesma forma, os doutrinadores também entendem que a privatização das prisões subdivide-se em várias modalidades, sendo que algumas dessas espécies poderiam ser aplicáveis a curto prazo, sem que fosse exigidas profundas reformas legislativas, como uma reforma constitucional por exemplo, bastando a criação de uma lei federal que dispusesse de maneira específica sobre o assunto. (Assis, p. 2008)
Diante disso, nota-se que o nosso compêndio legislativo não proíbe tal adoção, havendo a possibilidade de que ocorram algumas delegações parciais, entretanto, não há a possibilidade de que o Chefe do Executivo simplesmente privatize, essa alternativa deve ser autorizada pelo legislador, frente ao princípio constitucional da Legalidade, encontrado no artigo 37 da Constituição.
3.3. Vantagens e desvantagens
Muito se tem discutido no acerca das vantagens e desvantagens das privatizações das penitenciárias. Com uma breve análise nos cárceres brasileiros nota-se que temos um sistema falido e que necessita de alterações, e muitos apostam na privatização como ferramenta de solucionar ou amenizar a problemática.
Os defensores trazem como pontos positivos que o estado iria abolir o ônus de sustentação dos presos, bem como as rebeliões diminuiriam, haja vista que quem arcaria com os prejuízos seriam as empresas privadas e essas buscariam ao máximo evitar os gastos. De outra monta, os subornos também diminuiriam, tendo em vista que há traficantes que possuem mais dinheiro que os diretores de presídios, podendo suborna-los, sendo assim, seria muito mais difícil que houvessem as propinas.
No entanto, no ano de 2017, o Brasil passou por uma demonstração prática que desmonta a argumentação que diminuem as rebeliões, se houver a privatização. O fato aconteceu no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (COMPAJ), na qual tem como empresa responsável pela gestão prisional privada a Umanizzare. A rebelião foi muito comparada com a de Carandiru de 1992. Com isso, nota-se que a tutela prisional está ou não com a iniciativa privada não influencia na possibilidade de rebelião.
Em contrapartida, encontram-se como desvantagens, que o estado perderia sua tutela de coerção, cabível apenas a ele, que subsiste até a execução da pena, o que acarretaria em fragilização do poderio estatal. Outras preocupações ocorrem no caso de a empresa responsável vir a falir, bem como na possibilidade das gestoras serem entregues às mãos dos criminosos, e por fim, questiona-se se há de fato a preocupação com a reabilitação dos indivíduos.
Outro ponto primordial dar-se quanto aos gastos, com as poucas experiências que o Brasil teve, já é notório que a quantia supera a média mensal do país. No 4º Encontro do Pacto Integrador de Segurança Pública Interestadual e da 64ª Reunião do Colégio Nacional de Secretários de Segurança Pública (Consesp), em Goiânia/GO, a, então, Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Cármem Lúcia, afirma que o Brasil gasta 2,4 mil por mês com cada preso [6]. Dito isso, cumpre informar os gastos dos presídios privados brasileiros, de acordo com a Folha de São Paulo[7], no presídio do Amazonas, supracitado, os gastos chegam a quase o dobro do gasto nacional, uma média de 4,1 mil mensal, por detento. Logo, com o gasto de maneira tão exacerbada e a não garantia de soluções, como a ressocialização e com a possibilidade de rebeliões, a privatização perdeu a sua efetividade, deixando assim de ser uma necessidade.
Portanto, parafraseando o antropólogo Darcy Ribeiro, nos anos de 1982 afirmou em uma conferência[8], que os governadores deveriam investir em escolas, caso contrário nos últimos 20 (vinte) anos faltaria dinheiro para a construção de presídios. Dito isso, verifica-se que a solução não está na privatização e sim com o investimento da educação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Perante o exposto, constata-se que a delegação dos presídios a iniciativa privada não encontra barreiras no ordenamento jurídico pátrio, nem nos tratados internacionais cujo os quais o Brasil seja signatário, diante disso resta informar que diferentemente do Direito Privado, no qual o indivíduo pode tudo que não é proibido por lei[9], na Administração Pública isso não ocorre, fato é que esta é regida por princípios e dentre eles encontra-se o da Legalidade, no qual o administrador está restrito a fazer apenas o que a lei regula, caso aja quando não houver previsão legislativa estará violando a ordem principiológica constitucional. Assim, há a possibilidade da privatização, todavia não poderá fazê-lo sem uma lei (lato sensu) que a regulamente.
Com uma vivencia prática de que a privatização não surte os efeitos desejados, como a diminuição de subornos, a mínima probabilidade de rebelião, que foi o caso do motim ocorrido no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (COMPAJ), no ano de 2017, tragédia muito comparada a de Carandiru. Constata-se que o pequeno passo que a nação deu a tal caminho já foi marcado pelo derramamento de sangue humano, no qual a sociedade mais uma vez falha, seja na Tutela do Estado ou em delegações para a iniciativa privada.
Diante disso, verifica-se que o repasse ou não para o particular não tira o ônus de falha do sistema carcerário, fato é que isso pouco muda na problemática atual, na qual o planeta se encontra. Como dito anteriormente, o problema não será resolvido com essas peculiaridades, e sim com a educação, a impossibilidade de gerir as penitenciárias aumentam à proporção que a nação age com barbárie perante seus cidadãos, negligenciando e abstendo-se da educação que deve guiar um povo. É sensato dizer que Darcy Ribeiro[10], bem como outros ilustres personagens e estudiosos, previu o futuro, fato é que não é magia ou poderes sobrenaturais, e sim algo que é de grande notoriedade, basta analisarmos a evolução da lotação penitenciária combinado com o fracasso da educação base, são inversamente proporcionais, à medida que um diminui ou outro aumenta. Portanto, é necessário que os olhos sociais se voltem à criança e a educação, a primeira para prevenir que esta seja no futuro mais um cidadão a compor os presídios, e a segunda como meio de garantir que a prevenção ocorra.
REFERÊNCIAS
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BARRETO, Alex Muniz. Direito Administrativo Positivo.1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
___________. Tratado de Direito Penal: parte geral. 10ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2006.
___________. Tratado de Direito Penal: parte geral. 2ª ed. rev. São Paulo: Editora Saraiva, 2005.
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__________. Constituição Federal. Brasília, DF: Senado, 1988.
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[1] Acadêmico do Curso de Direito pelo Centro Universitário Uninassau de Campina Grande-PB (Unidade II). E-mail: [email protected].
[2] Acadêmico do Curso de Direito pelo Centro Universitário Uninassau de Campina Grande-PB (Unidade II). E-mail: [email protected].
[3] Orientadora. Licenciada, bacharel, mestre e doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. E-mail: [email protected].
[4] DICIONÁRIO, Priberam. Disponível em: < https://priberam.pt/dlpo/pan%C3%B3ptico >. Acesso em 04 de jul. de 2018.
[5] http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo798.htm#Sistema%20carcer%C3%A1rio:%20estado%20de%20coisas%20inconstitucional%20e%20viola%C3%A7%C3%A3o%20a%20direito%20fundamental%20-%206
[6] http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/83819-carmen-lucia-diz-que-preso-custa-13-vezes-mais-do-que-um-estudante-no-brasil
[7] https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/01/1847345-custo-de-preso-em-cadeia-privada-no-am-e-quase-o-dobro-da-media-nacional.shtml
[8] http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/83819-carmen-lucia-diz-que-preso-custa-13-vezes-mais-do-que-um-estudante-no-brasil
[9] “Art. 5º (…)
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”
[10] Darcy Ribeiro foi educador, político, etnólogo, antropólogo e escritor brasileiro.