As isenções ou imunidades nas contribuições previdenciárias das entidades de assistência social

Resumo: O Direito Tributário pátrio alberga algumas hipóteses de isenção tributária, cujo alcance atinge outros campos jurídicos, dentre eles o Direito Previdenciário, nas instituições de direito privado auxiliares do poder público, prestadoras de serviços nas áreas de assistência social, saúde e educação. Ao mesmo tempo em que o regramento constitucional trás a obrigação a toda a sociedade em financiar a Seguridade Social, também prevê as limitações constitucionais ao poder de tributar, consistentes na delimitação da competência tributária constitucionalmente conferida aos entes políticos em relação a estas entidades. Contudo para poderem valer-se da imunidade tributária, as pessoas jurídicas de direito privado, constituídas com o fim assistencial específico, devem adaptar-se taxativamente a condições reclamadas pela lei de custeio e de outras esparsas. A doutrina e a jurisprudência não cansam de aperfeiçoar seus entendimentos, contribuindo cabalmente para o avanço da legislação dobre a matéria.

Palavras-chave: Entidades. Tributário. Imunidade. Contribuição. Previdenciário.

1. Introdução

As entidades beneficentes de assistência social, educação e saúde gozam de isenções tributárias previstas em lei, dentre elas a imunidade das contribuições previdenciárias. O arcabouço legal circundando o assunto é extenso. A normatização constitucional e a legislação tributária/previdenciária tem se esforçado muito, e com pouco êxito, para desinquietar a doutrina especializada e os entendimentos dos tribunais superiores.

O presente trabalho tem a pretensão em esclarecer os caminhos legiferados que as entidades assistenciais percorrem para adquirirem o direito a imunizarem-se da obrigação de recolher o tributo chamado de contribuição previdenciária, os requisitos para sua concessão e os seus efeitos, bem como daquelas que, apesar de apresentarem contornos de imunidade, não fazem jus a este favor. Também tem o objetivo de analisar a incidência dos conceitos de isenção e imunidade tributária/previdenciária e a aplicação desses na seara do Direito Previdenciário.

Por fim, trar-se-á à lume as discussões jurisprudenciais sobre a quem não atinge a matéria, concluindo sobre a impossibilidade do direito adquirido diante da inexistência de direitos absolutos no ordenamento jurídico pátrio.

2 Custeio previdenciário

O custeio da Seguridade Social é contributivo (LAZZARI; CASTRO, 2011), e financiado por toda a sociedade, de forma direta e indireta pelo Governo, empresas e trabalhadores mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Depende de tributos com características ora de imposto, ora de taxa, chamados de contribuições sociais ou de previdência (MACHADO, 2013), com suporte fático incidente na folha de pagamento de salários e rendas de trabalho, vertidos a qualquer título à pessoa física que presta serviço a empregador, empresa ou entidade a ela equiparada, mesmo sem vínculo empregatício. Também sobre a receita de concursos de prognósticos e do importador de bens ou serviços do exterior.

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 195 incluiu as contribuições sociais da seguridade social no Sistema Tributário Nacional. Porém o seu artigo 195, § 7º, concedeu isenção de contribuição para a seguridade social às entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. No artigo 175 do Código Tributário Nacional a isenção ficou instituída com hipótese de exclusão de crédito tributário (previdenciário) e, a partir do artigo 176, passou a dispor da sua regulamentação, cujo objeto é o presente estudo.

2.1 Lançamento Tributário da Contribuição Previdenciária

Precedido de Processo Administrativo Tributário (MACHADO SEGUNDO, 2014), o lançamento tributário das contribuições sociais são, em regra, sujeitas à homologação (IBRAHIM, 2012). Nesta senda Machado (2013) afirma que a extinção do crédito não se verifica com o pagamento, mas com a homologação do lançamento que acontece em época posterior ao pagamento, em até cinco anos do fato gerador, sob pena de homologação tácita.

Destarte a doutrina, o STJ corrobora esse entendimento neste particular:

“TRIBUTÁRIO. QUOTA DE CONTRIBUIÇÃO SOBRE EXPORTAÇÃO DE CAFÉ. TRIBUTO SUJEITO AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRECEDENTE DO STJ. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRAZO PRESCRICIONAL. "CINCO MAIS CINCO". DEMANDA PROPOSTA EM 1997. […]

4. Em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, e não havendo, nos autos, notícia da ocorrência de expressa homologação pela autoridade fiscal, o termo inicial do prazo prescricional é a homologação tácita do lançamento, uma vez que a presente demanda foi proposta no ano de 1997, antes, portanto, da vigência da LC 118/2005” (REsp 1.269.570/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 4.6.2012). (grifou-se)  (REsp 1294666/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2015, DJe 04/08/2015)

Por isso que esse autolançamento, como denominam Castro e Lazzari (2011), opera-se pelo ato do sujeito passivo em antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa.

Existem eventualmente outras hipóteses do lançamento tributário previdenciário. É o que revela a leitura da Lei de Custeio da Previdência Social – Lei 8.212/91, em seu artigo 33, § 7º:

“Art. 33. À Secretaria da Receita Federal do Brasil compete planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, à fiscalização, à arrecadação, à cobrança e ao recolhimento das contribuições sociais previstas no parágrafo único do art. 11 desta Lei, das contribuições incidentes a título de substituição e das devidas a outras entidades e fundos. […]

§ 7º O crédito da seguridade social é constituído por meio de notificação de lançamento, de auto de infração e de confissão de valores devidos e não recolhidos pelo contribuinte.”

Ou seja: a) de ofício por meio de Notificação de Lançamento (NL); b) por Auto de Infração (AI), não havendo impropriedade em considerar a imposição de multa como espécie de lançamento tributário (RAMOS FILHO, 2012), decorrente de Sanção Tributária – artigo 44, Lei 9430/96; c) por confissão de valores devidos e não recolhidos pelo contribuinte (IBRAHIM, 2012), quando o lançamento não for realizado ou o for feito incorretamente.

3 Isenção ou imunidade das contribuições para a seguridade social

Não há divergência na doutrina especializada de que a isenção tributária, no qual se inclui a previdenciária, por força que trata o § 7º do artigo 195 da Constituição Federal, na verdade, se trata de uma limitação constitucional do poder de tributar. Segundo Castro e Lazzari (2011), frente ao artigo 175, inciso I, do Código Tributário Nacional, estamos diante de uma hipótese de exclusão do crédito tributário. “O crédito tributário existe, apenas a lei dispensa seu pagamento”. Não em sentido diferente Ibrahim (2012) critica que a aplicação errônea das expressões isenção e imunidade usadas como sinônimos.

Porém a obra de Machado (2013) espanca as dúvidas em relação à matéria. É incisivo ao afirmar que as hipóteses de exclusão, que pretende tratar o artigo 175, I, CTN, estariam mais bem colocadas junto ao artigo 156 do CTN, onde se trata da decadência, pois é esta que exclui o crédito tributário e evita que se constitua. Assevera o que o legislador muitas vezes trata como de não incidência casos de isenção, ensejando dúvidas intermináveis. Explica haver uma distinção entre isenção, não incidência e imunidade:

“Isenção é a exclusão, por lei, de parcela da hipótese de incidência, ou suporte fático da norma de tributação, sendo objeto da isenção a parcela que a lei retira dos fatos que realizam a hipótese de incidência da regra de tributação. A não-incidência, diversamente, configura-se em face da própria norma de tributação, sendo objeto da não incidência todos os fatos que não estão abrangidos pela própria definição legal da hipótese de incidência”. (MACHADO, 2013)

“Imunidade é o obstáculo criado por uma norma de Constituição que impede a incidência de lei ordinária de tributação sobre determinado fato, ou em detrimento de determinada pessoa, ou categoria de pessoas.” (MACHADO, 2013)

A CF/88 estabelece três casos de imunidade tributária destinadas às contribuições da seguridade social: 1ª- as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, prevista em seu art. 149, § 2º, I; 2ª- a contribuição previdenciária sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social, prevista no seu art. 195, II; e 3ª- prevista no seu art. 195, § 7º, onde determina que “são isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei”.

A jurisprudência constitucional do STF, de longa data, já identificou na cláusula inscrita no art. 195, § 7º, CF, a existência de uma típica garantia de imunidade, e não de simples isenção, estabelecida em favor das entidades beneficentes de assistência social.

“EMENTA Seguridade social. Contribuições sociais. Entidade beneficente de educação. Imunidade tributária. 1. As entidades que prestam assistência social no campo da educação gozam da imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º, da CF/88. 2. Precedentes desta Corte. 3. Agravo regimental não provido.” (grifou-se)

(RE 491538 AgR, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 23/03/2011, DJe-108 DIVULG 06-06-2011 PUBLIC 07-06-2011 EMENT VOL-02538-01 PP-00124)

As imunidades relativas às contribuições previstas no artigo 195, § 7, CF, não se configuram pelo nome que se da para a entidade, segundo Barreto (2012), mas “É dizer: pelos traços do seu respectivo regime jurídico é que se reconhece a natureza jurídica de uma entidade.”

Contudo não há que se confundir essa imunidade com a prevista no artigo 150, VI, “c”, CF.

“Primeiro, porque esta imunidade diz respeito a impostos, tão somente. Segundo, porque as entidades de assistência social, não beneficentes, são restritas a determinadas classes ou grupos, visando o auxílio mútuo – buscam garantir um padrão mínimo de vida dos associados, sem atender a pessoas estranhas ao grupo” (IBRAHIM, 2012).

Inobstante o debate doutrinário, no plano infralegal os artigos 9ª, IV, alínea “c”, e 14, I a III, CTN, vedam expressamente a cobrança de impostos às instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, bem como as subordinam a observar: I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

“Não ter fins lucrativos não significa, de modo algum, ter receitas limitadas aos custos operacionais. Elas na verdade podem e devem ter sobras financeiras, até para que possam progredir, modernizando e ampliando suas instalações. O que não podem é distribuir lucros. São obrigadas a aplicar todas as suas disponibilidades na manutenção dos seus objetivos institucionais” (MACHADO, 2013)

Por isso a “isenção” prevista no artigo 195, §7º, CF, diz respeito à hipótese de imunidade das contribuições previdenciárias. Porém para adquirirem o favor constitucional é preciso enfrentar os requisitos legalmente exigidos.

3.1 Entidades Tuteladas pela Isenção/Imunidade

Somente pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes de assistência social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de assistência social, saúde ou educação, e que atuem complementarmente ao poder público (SANTOS, 2015) podem obter a tutela da isenção das contribuições previdenciárias, pela leitura do artigo 1º, Lei nº 12.101/2009.

“Por isso, o conceito de entidade de assistência social não se aplica às entidades de previdência privada que recebam contribuições dos beneficiários, que, portanto, não são alcançadas pela imunidade.” (SANTOS, 2015)

Nesta senda a Suprema Corte publicou a Súmula 730:

“Súmula 730 STF: A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, "c", da Constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos beneficiários”.

A Súmula vem para cristalizar o entendimento de que não se pode confundir instituição assistencial com entidade fechada de previdência privada, de gênese contratual e que só concede benefícios a seus filiados desde que elas recolham as contribuições pactuadas. (ALVES, 2002) A entidade assim constituída não possui o caráter de universalidade que tem a assistência social oficial.

3.2 Os Requisitos Legais para a Isenção/Imunidade

As entidades beneficentes de assistência social têm por objetivo o auxílio de qualquer pessoa que não tenha condições de prover o seu próprio sustento e o da sua família. Tais entidades deverão obedecer ao princípio da universalidade do atendimento, sendo-lhes vedado dirigir suas atividades exclusivamente a seus associados ou à categoria profissional (IBRAHIM, 2012).

“A certificação é requisito elementar para usufruir da benesse fiscal prevista no art. 195, § 7º, da Constituição. Isso de modo algum contraria o texto constitucional, pois o próprio constituinte originário vislumbrou a importância de alguma disciplina legal e um mínimo de formalização para as entidades beneficentes” (IBRAHIM, 2012).

Adequando-se ao desejado pelo artigo 195, § 7º, CF, e sem contrariedade ou ampliação ao previsto no artigo 14, CTN, de acordo com a leitura de Castro e Lazzari (2011), os requisitos genéricos a serem observados cumulativamente para estas entidades obterem a dispensa das contribuições previdenciárias da Lei 8.212/91 e a sua certificação com validade para três anos, estão dispostos no artigo 29 da Lei 12.101/2009, que são:

“Art. 29. A entidade beneficente certificada na forma do Capítulo II fará jus à isenção do pagamento das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, desde que atenda, cumulativamente, aos seguintes requisitos:

I – não percebam seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores remuneração, vantagens ou benefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ou atividades que lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos, exceto no caso de associações assistenciais ou fundações, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuem efetivamente na gestão executiva, respeitados como limites máximos os valores praticados pelo mercado na região correspondente à sua área de atuação, devendo seu valor ser fixado pelo órgão de deliberação superior da entidade, registrado em ata, com comunicação ao Ministério Público, no caso das fundações;

II – aplique suas rendas, seus recursos e eventual superávit integralmente no território nacional, na manutenção e desenvolvimento de seus objetivos institucionais;

III – apresente certidão negativa ou certidão positiva com efeito de negativa de débitos relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS;

IV – mantenha escrituração contábil regular que registre as receitas e despesas, bem como a aplicação em gratuidade de forma segregada, em consonância com as normas emanadas do Conselho Federal de Contabilidade;

V – não distribua resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, sob qualquer forma ou pretexto;

VI – conserve em boa ordem, pelo prazo de 10 (dez) anos, contado da data da emissão, os documentos que comprovem a origem e a aplicação de seus recursos e os relativos a atos ou operações realizados que impliquem modificação da situação patrimonial;

VII – cumpra as obrigações acessórias estabelecidas na legislação tributária;

VIII – apresente as demonstrações contábeis e financeiras devidamente auditadas por auditor independente legalmente habilitado nos Conselhos Regionais de Contabilidade quando a receita bruta anual auferida for superior ao limite fixado pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.”

Impende notar que esses requisitos a serem cumpridos pela pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, ainda que reconhecidamente imune (IBRAHIM, 2012), deverão manter o encargo e repassar as contribuições devidas pelos segurados que lhe prestam serviço. Também deverão prever em seus atos constitutivos, em caso de dissolução ou extinção, a destinação do eventual patrimônio remanescente à entidade sem fins lucrativos ou entidades públicas.

3.3 Alcance das Isenções/Imunidades

Apesar de a isenção atingir todas as contribuições devidas pela empresa (CASTRO; LAZZARI, 2011), ser extensiva às dependências, estabelecimentos e obras de construção civil da pessoa jurídica de direito privado beneficente, não abrange as contribuições dos segurados que prestam serviços, como empregados, avulsos, empresários, trabalhadores autônomos, ou a estes equiparados.

Ressalta-se a não dispensa da observância das obrigações acessórias, não admite a exclusão de reter os 11% sobre contratos de prestação de serviço submetidos ao artigo 31, Lei 8.212/91. É assente na jurisprudência este entendimento, como já decidiu o STF:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ENTIDADE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS. INAPLICABILIDADE ÀS HIPÓTESES DE RESPONSABILIDADE OU SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS – ICM/ICMS. LANÇAMENTO FUNDADO NA RESPONSABILIDADE DO SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA – SESI PELO RECOLHIMENTO DE TRIBUTO INCIDENTE SOBRE A VENDA DE MERCADORIA ADQUIRIDA PELA ENTIDADE. PRODUTOR-VENDEDOR CONTRIBUINTE DO TRIBUTO. TRIBUTAÇÃO SUJEITA A DIFERIMENTO. […] A responsabilidade ou a substituição tributária não alteram as premissas centrais da tributação, cuja regra-matriz continua a incidir sobre a operação realizada pelo contribuinte. Portanto, a imunidade tributária não afeta, tão-somente por si, a relação de responsabilidade tributária ou de substituição e não exonera o responsável tributário ou o substituto. Recurso extraordinário conhecido, mas ao qual se nega provimento.” (RE 202987, Relator: Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-181 DIVULG 24-09-2009 PUBLIC 25-09-2009 EMENT VOL-02375-03 PP-01021) (grifou-se)

A entidade beneficente não é contribuinte dos tributos. Não são suas operações que se sujeitam à tributação. O fato jurídico tributário, na hipótese em tela, recai sobre o prestador de serviços, o contribuinte direto, descabendo-lhe, portanto, o favor constitucional da imunidade (BARBOSA, 2009, RE 202987-SP).

Também pacífico o entendimento no TRF4 de que a retenção de 11% sobre as faturas emitidas pelas cedentes de mão de obra é uma nova sistemática de arrecadação da contribuição previdenciária:

“EMENTA: TRIBUTÁRIO. CONSTITUIÇÃO FEDERAL ART. 195, § 7º. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ENTIDADE BENEFICENTE. PROGRAMA PRIMEIRO EMPREGO. CONTRIBUIÇÃO SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS. RETENÇÃO DE 11% SOBRE AS FATURAS DE SERVIÇOS. INCABIMENTO. – Se as entidades assistenciais fazem jus à imunidade de contribuições previdenciárias, na forma do art. 195, § 7º, da Constituição Federal de 1988, não lhes é aplicável a nova sistemática de arrecadação de tais contribuições estabelecida pelo art. 31 da Lei 8.212/91, com a redação da Lei 9.711/98. – Não podem incidir contribuições previdenciárias sobre a folha de salários pagos pela entidade assistencial a jovens beneficiados pelo programa "Primeiro Emprego Protegido", tendo em vista a imunidade conferida à referida entidade.” (TRF4, AMS 2001.71.00.001809-8, Segunda Turma, Relator João Surreaux Chagas, DJ 30/03/2005) (grifou-se)

A empresa tomadora de serviços prestados sob o regime de cessão de mão de obra, ao pagá-los à empresa cedente, deve reter 11% do valor bruto da nota fiscal e recolhê-los aos cofres da Previdência em nome desta.

3.4 Direito Adquirido à Isenção/Imunidade

Até antes da vigência da Constituição Federal de 88, várias entidades beneficentes, por terem, em algum momento, atendidos aos requisitos da lei vigente, pretenderiam ter direito eterno à imunidade constitucional (IBRAHIM, 2012). Tal pretensão era baseada no revogado art. 55, § 1º, Lei 8.212/91.

A Súmula 352 do STJ, porém, sepultou essa aspiração, não antes da sua jurisprudência ter mudado a sua interpretação, afirmando que “[…] por mais tradicional que seja, a entidade que deseja ver renovado seu certificado de entidade beneficente de assistência – CEBAS/CEAS – tem que se adequar aos novos requisitos introduzidos pela Lei n. 8.212/1991” (ZAVASCKI, 2006).

“Súmula 352/STJ – A obtenção ou a renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) não exime a entidade do cumprimento dos requisitos legais supervenientes”. (Súmula 352, primeira seção, julgado em 11/06/2008, DJe 19/06/2008)

Ainda que a entidade tenha sido reconhecida como de caráter filantrópico, não há direito adquirido a regime jurídico-tributário. Porém nada impede que a legislação superveniente estabeleça novos requisitos para o gozo da imunidade fiscal e obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS (MEIRA, 2008).

O STF também afirma não haver direito adquirido à imunidade tributária, conforme decisão julgada.

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE DE ENTIDADE BENEFICENTE. CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICENTE – CEBAS EMITIDO E PRETENSAMENTE RECEPCIONADO PELO DECRETO-LEI 1.752/1977. DIREITO ADQUIRIDO. ART. 195, § 7º DA CONSTITUIÇÃO. DISCUSSÃO SOBRE O QUADRO FÁTICO. ATENDIMENTO OU NÃO DOS REQUISITOS LEGAIS. 1. Nenhuma imunidade tributária é absoluta, e o reconhecimento da observância aos requisitos legais que ensejam a proteção constitucional dependem da incidência da norma aplicável no momento em que o controle da regularidade é executado, na periodicidade indicada pelo regime de regência.

2. Não há direito adquirido a regime jurídico relativo à imunidade tributária. A concessão de Certificado de Entidade Beneficente – Cebas não imuniza a instituição contra novas verificações ou exigências, nos termos do regime jurídico aplicável no momento em que o controle é efetuado. Relação jurídica de trato sucessivo.

3. O art. 1º, § 1º do Decreto-lei 1.752/1977 não afasta a obrigação de a entidade se adequar a novos regimes jurídicos pertinentes ao reconhecimento dos requisitos que levam à proteção pela imunidade tributária. […]” (RMS 26932, Relator: Ministro Joaquim Barbosa. Segunda Turma, julgado em 01/12/2009, DJe-022 DIVULG 04-02-2010 PUBLIC 05-02-2010 EMENT VOL-02388-01 PP-00015 LEXSTF v. 32, n. 374, 2010, p. 178-183) (grifou-se)

Nada impede, porém, que a legislação superveniente estabeleça novos requisitos para o gozo da imunidade fiscal e obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social. O tema ficou superado com a revogação total do art. 55, Lei 8.212/91 (IBRAHIM, 2012).

4 Conclusão

As imunidades das contribuições previdenciárias previstas no artigo 195 da Constituição Federal são matéria tratadas sob a faculdade do direito tributário, sujeitas ao regramento complementar constitucional e aos institutos do Código Tributário Nacional – Lei 5.172/66, combinado com a Lei de Custeio Previdenciário – Lei 8.212/91.

Destarte este entendimento estes tributos devem ser recolhidos pelas pessoas jurídicas que atuem complementarmente ao poder público, contratantes de mão de obra, em regra por meio do lançamento tributário chamado por homologação. Nessa espécie o sujeito passivo calcula o tributo e antecipa o seu pagamento, sem prévio exame da administração previdenciária, Segue-se a ratificação, ou não, do recolhimento em até cinco anos de seu fato gerador sob pena de homologação tácita e a prescrição da pretensão em corrigir o respectivo lançamento.

A doutrina, porém, tem se debelado em um debate estéril, debruçada em desvendar a natureza do favor da isenção, cujo resultado pouco contribui: se de uma não incidência ou imunidade, em que pese os tribunais superiores sentirem-se mais à vontade em falar dessas últimas nas suas decisões.

As pessoas jurídicas de direto privado, sem fins lucrativas, regularmente constituídas e reconhecidas, de acordo com a lei como entidades beneficente de assistência social, saúde ou educação, embora imunes do recolhimento da parcela patronal, não estão dispensadas das obrigações acessórias, nem de repassar as contribuições previdenciárias retidas em função do pagamento de salários e sobre as faturas emitidas por outras pessoas físicas ou jurídicas cedentes de mão de obra. Também devem preencher cumulativamente todos os requisitos da Lei 12.101/2009 para lhe ser concedida a isenção/imunidade, devendo manter as características de beneficência, sob pena de serem afastadas as benesses previstas no art. 195, § 7º, da Constituição Federal.

Não obstante a certificação necessária para a obtenção da imunidade tributária/previdenciária, esta não é concedida em caráter vitalício. Ainda que tenha sido concedida antes da vigência da CF/88, nenhuma imunidade é absoluta. Nada impede novas exigências legais para estas entidades renovarem suas certificações

Referências
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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/>. Acesso 30 set 2015.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Informativo de Jurisprudência nº 0302 Período: 23 de outubro a 3 de novembro de 2006. Precedente citado: MS 10.558-DF, DJ 19/9/2005. MS 10.758-DF, Rel. originário Min. João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 25/10/2006. Disponível em <https://ww2.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo>. Acesso em 30 set 2015.
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BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental no Mandado de Segurança nº 10.757 – DF. Agravante Associação Jesuíta de Educação e Assistência Social. Agravado União Federal. Ministro Relator Castro Meira. Brasília, 13 fev 2008. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia> Acesso 20 ago 2015.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário 360.500-3/MG. Recorrente Fundação de Seguridade Social de Minas Gerais – PREVIMINAS. Recorrido Município de Belo Horizonte. Ministro Relator Moreira Alves. Brasília, 26 nov 2002. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia> Acesso 20 ago 2015.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso de Revista RE 491538 AgR /SC. Agravante União Federal. Agravado Instituto Maria Auxiliadora. Ministro Relator Ministro Dias Toffoli. Brasília, 23 mar 2011. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia> Acesso 20 ago 2015.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso em Mandado de Segurança 26932/DF – Distrito Federal. Recorrente Província Brasileira da Congregação da Missão – PBCM. Recorrido União Federal. Relator Ministro Joaquim Barbosa. Brasília, 01 dez 2009. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia> Acesso 20 ago 2015.
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação em Mandado de Segurança nº 2001.71.00.001809-8/RS. Apelante Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Apelado Pequena Casa da Criança. Relator Desembargador Federal João Surreaux Chagas. Porto Alegre, 30 mar 2005. Disponível em <http://www2.trf4.jus.br/trf4>. Acesso 20 ago 2015.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 17ª Edição.Editora  Impetus. Niterói. 2012.
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Processo Tributário. 7ª edição. Editora Atlas. São Paulo. 2014.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 34ª edição. Editora Malheiros, São Paulo. 2013.
RAMOS FILHO, Carlos Alberto de Moraes. Remissão e Anistia em Matéria Tributária – Determinação do Conteúdo e Alcance dos Institutos à Luz do Direito Positivo Brasileiro. Revista Tributária e de Finanças Doutrinas. 2012. Essenciais de Direito Tributário. Jul/2014. Disponível em <http://www.revistadostribunais.com.br>. Acesso em 20 ago 2015.
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Coordenador Pedro Lenza. Direito Previdenciário Esquematizado. 5ª Edição. São Paulo. 2015.

Informações Sobre o Autor

André Alberto Johann

Graduado em Direito e Pós Graduando em Direito Previdenciário e Processo – UNIVATES – Servidor Público do Município de Lajeado na área de execução de tributos


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