Os Juizados Especiais Itinerantes como Forma de Democratização da Justiça

Bruna Alessandra Costa Rossi de SousaAdvogada. (E-mail: [email protected]) 

Resumo: O presente trabalho analisa como a população passou a ter uma justiça mais acessível nas causas menos complexas, por intermédio dos Juizados Especiais Itinerantes. Foi abordada a questão da democratização da justiça por meio de uma justiça cidadã, ou seja, de uma justiça para todos. Também foi abordado no trabalho o acesso à justiça, que foi ampliado, principalmente, com a Constituição Federal de 1988. Analisou-se a questão dos Juizados Especiais Itinerantes, que trouxeram um acesso à justiça mais rápido, para as causas de menor complexidade, às pessoas que moram em regiões onde o acesso ao Judiciário era bem mais restrito. O objetivo geral do trabalho é examinar se os Juizados Especiais Itinerantes podem ser considerados um efetivo método de democratização do acesso à justiça, visto que este último encontra vários obstáculos, como os fatores jurídicos, sociais, culturais e econômicos. Assim, a forma encontrada, que foi por meio dos Juizados Especiais Itinerantes, é uma alternativa viável para que as diferenças existentes na sociedade do nosso país sejam diminuídas e, ainda, assegura que todos possam ser tratados de forma igual na hora de solucionar os seus litígios, desobstruindo o Poder Judiciário e diminuindo a morosidade da justiça. 

Palavras-chave: Democratização da Justiça. Acesso à Justiça. Juizados Especiais Itinerantes.   

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Abstract: The present paper analyzes how the population started to have more accessible justice in less complex cases, through the Itinerant Small Claim Courts. The issue of democratization of justice was addressed through citizen justice, that is, justice for all. Access to justice was also addressed in the paper, which was expanded, mainly, with the Federal Constitution of 1988. The issue of Itinerant Small Claim Courts was analyzed, which brought faster access to justice, for less complex cases, for people living in regions where access to Judiciary was much more restricted. The general objective of the paper is to examine whether the Itinerant Small Claim Courts can be considered an effective method of democratizing access to justice, since the latter encounters several obstacles, such as legal, social, cultural and economic factors. Thus, the way found, which was through the Itinerant Small Claim Courts, is a viable alternative so that the existing differences in the society of our country are reduced and, also, ensures that everyone can be treated equally when it comes to solving their problems litigation, unblocking the Judiciary and reducing the slowness of justice.  

Keywords: Democratization of Justice. Access to Justice. Itinerant Small Claim Courts 

 

SumárioIntrodução1. Democratização da Justiça. 2. Juizados Especiais Itinerantes. 3. Os Juizados Especiais Itinerantes como Forma de Democratização do Acesso à Justiça no Brasil. Conclusão. Referências.   

 

Introdução 

O acesso à justiça é o direito mais básico que há, pois ele é o direito que dá direitos. Com a promulgação da “Constituição Cidadã”, assim apelidada a nossa Constituição Federal de 1988, foi efetivamente assegurado o acesso à justiça, como direito fundamental, a todos os cidadãos brasileiros e residentes no Brasil, em seu art. 5º, XXXV. 

Visando dar um acesso à justiça a todos os cidadãos, inclusive àqueles que moram em áreas mais remotas do país, onde não há nem fóruns nas menores cidades, foi criada a figura da Justiça Itinerante com a Emenda Constitucional n. 45, de 2004. A intenção da criação desses Juizados Especiais Itinerantes era dar acesso ao Poder Judiciário para as pessoas menos favorecidas e mais isoladas, nos aspectos econômico e geográfico. 

Assim, deve-se fazer a seguinte pergunta: Os Juizados Especiais Itinerantes são um meio efetivo de democratização do acesso à justiça aos cidadãos brasileiros? 

Com essa pergunta em mente, o presente trabalho terá como objetivo geral demonstrar que os Juizados Especiais Itinerantes podem ser considerados um efetivo método de democratização do acesso à justiça, visto que o Estado poderá aperfeiçoar a prestação do serviço público, atendendo de maneira satisfatória os brasileiros, no que tange à distribuição de justiça.  

No primeiro capítulo do trabalho, busca-se falar sobre a democratização da justiça, ou seja, como a justiça se tornou mais democrática e passou a atingir um maior número de pessoas, incluindo aquelas menos favorecidas economicamente.  

No segundo capítulo, fala-se dos Juizados Especiais Itinerantes de uma forma geral, como a sua conceituação e para que eles nasceram no Brasil.  

No terceiro capítulo, há a discussão sobre o fato de os Juizados Especiais Itinerantes poderem ser considerados como uma forma de democratização do acesso à justiça no Brasil, ou seja, se eles são, realmente, eficazes na hora de fornecer uma justiça a todas as pessoas do país. 

O tema em questão no presente estudo é de suma importância nos dias de hoje pois a população brasileira está cada vez mais atenta a seus direitos e mais interessada em buscar, na justiça, a efetivação desses direitos. Porém, o Judiciário brasileiro está mais e mais abarrotado de processos a cada dia e, com isso, a justiça acaba se tornando mais ineficaz se houver um número processual muito maior do que ela pode suportar.  

Assim, foram criados os Juizados Especiais Itinerantes. O objetivo deles é, justamente, fornecer um acesso à justiça mais célere e ao maior número de pessoas no país, principalmente àquelas que são mais carentes e moram em lugares distantes das grandes cidades e dos fóruns. 

 

  1. Democratização da Justiça 

Quando se fala em Justiça Cidadã, estamos falando de uma justiça que é para todos. Ela busca universalizar e democratizar o direito de acesso à justiça procurando a promoção da paz social e a construção de uma sociedade mais justa, que pode ser por meio de ações educativas direcionadas. Ela ainda incentiva a utilização de órgãos públicos para vigiar e proteger os interesses dos cidadãos.  

Conceber um Poder Judiciário novo, em que a cidadania encontre um Direito que esteja concretamente desenvolvido em direção a uma ordenação congruente com o bem-comum, nas suas várias singularidades plurais, passa, inelutavelmente, pela ampliação do acesso ao Judiciário, que é a primeira etapa até se alcançar a verdadeira Justiça. 

O direito de acesso à justiça nasceu com os novos direitos sociais e se tornou um verdadeiro direito social, que, depende da atuação positiva do Estado para ser plenamente concretizado.  

Com o passar do tempo, as ações e os relacionamentos não tinham mais o caráter individualista que predominava nos séculos XVIII e XIX, dessa forma, podia-se perceber um interesse maior de juristas e legisladores em torno do acesso efetivo à justiça. (CAPPELLETTI E GARTH, 1988, p. 168).  

Assim, levou-se a três posições básicas, como mostram Cappelletti e Garth: Podemos afirmar que a primeira solução para o acesso – a primeira “onda” desse movimento novo – foi a assistência judiciária; a segunda dizia respeito às reformas tendentes a proporcionar representação jurídica para os interesses “difusos, especialmente nas áreas da proteção ambiental e do consumidor; e o terceiro – é o que nos propomos a chamar simplesmente “enfoque de acesso à justiça” porque inclui os posicionamentos anteriores, mas vai muito além deles, representando, dessa forma, uma tentativa de atacar as barreiras do acesso de modo mais articulado e compreensivo (1988, p. 168). 

A Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988, que foi apelidada por Ulisses Guimarães de “Constituição Cidadã”, por falar sobre o Estado Democrático de Direito, deu uma maior valorização à justiça, assim como a afirmação da cidadania como delimitadora do poder do Estado.  

O acesso à justiça está previsto na nossa Constituição Federal atual no art. 5º, inciso XXXV: “Art.5° – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito 

O direito de acesso à justiça tem sido reconhecido aos poucos, e é considerado o mais básico dos direitos humanos.  

De acordo com Cappelletti e Garth: “A expressão “acesso à Justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. […]O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos (1988, p. 168). 

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Porém, para que se possa garantir a todos os brasileiros o efetivo acesso à justiça, faz-se necessário superar alguns obstáculos, dentre os quais, os de natureza financeira; cultural; psicológica e temporal.  

Os obstáculos de natureza financeira são sobre os altos valores demandados em custas judiciais, honorários advocatícios e ônus de sucumbência, no caso da pessoa vencida. Dependendo do caso, esses valores são praticamente iguais aos do valor da causa. 

Já os obstáculos temporais são aqueles sobre a morosidade processual. E, por causa da lentidão e despreparo de alguns serventuários, os cidadãos ficam desacreditados em recorrer ao Judiciário.  

Por fim, temos os obstáculos psicológicos e culturais, que podem caracterizar embaraços ao acesso à justiça, como a falta de confiança por parte da população em geral para com os profissionais do direito, que, geralmente, estão inacessíveis e distantes da realidade da maior parte da população. E ainda, na intimidação que as pessoas sentem diante do formalismo do sistema jurídico.  

A Carta Magna de 1988 consagrou a igualdade material, em que foi garantido a todos os brasileiros a diminuição da desigualdade social, além da assistência judiciária gratuita às pessoas que necessitam, da criação dos Juizados Especiais para as causas de menor complexidade e para os crimes de menor potencial ofensivo, de reestruturação e fortalecimento do Ministério Público e da reorganização da Defensoria Pública. 

O direito ao acesso à justiça se relaciona com o princípio do devido processo legal, pois, o direito ao processo não é suficiente, ou seja, também é necessário realizar-se em contraditório, com todas as garantias essenciais para que as partes se defendam e acusem para que, ao final, recebam uma sentença justa dada por um juiz imparcial.  

Dessa forma, a atuação judicial, quando se fala da concretização dos direitos fundamentais, é, além de legítima, também dever do órgão jurisdicional. Ou seja, a atuação judicial, indo em direção ao devido processo legal, é feita visando a implantação dos direitos fundamentais. Isso significa que é legítima, necessária e essencial pois a concretização de tais direitos é a finalidade do Estado Democrático de Direito.  

A Emenda Constitucional n. 45, de 2004, realizou mudanças em alguns dispositivos da Constituição Federal e ficou conhecida como “Reforma do Judiciário”. Trouxe melhorias para o Poder Judiciário e uma delas foi a Justiça Itinerante, que está prevista nos arts. 107, §2º, 115, §1º e 125, §7º da Carta Magna. Com a criação da Justiça Itinerante, o campo de atuação desse modelo de justiça foi ampliado, em que se compreende os âmbitos da Justiça Federal e da Justiça Estadual, e passou-se a permitir mais agilidade do Judiciário ao garantir o total acesso à justiça do jurisdicionado em todas as fases do processo.  

 

2. Juizados Especiais Itinerantes 

Como dito, a Emenda Constitucional n. 45, de 2004 criou a Justiça Itinerante na Constituição Federal de 1988 em seus arts. 107, §2º, 115, §1º e 125, §7º, in verbis: 

Art. 107. Os Tribunais Regionais compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco anos, sendo: 

[…] 

  • 2° Os Tribunais Regionais Federais instalarão a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.

[…] 

Art. 115. Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de trinta e menos sessenta e cinco anos, sendo: 

[…] 

  • 1° Os Tribunais Regionais do Trabalho instalarão a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções de atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários. 

[…]  

Art. 125. Os Estados organizarão sua justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.  

[…]  

  • 7° O Tribunal de Justiça instalará a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.

Com a reforma constitucional do Judiciário, a Justiça Itinerante deixou de ter somente experiências isoladas dos tribunais e passou a ter uma exigência constitucional no âmbito da Justiça dos estados, da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho, o que prova o sucesso da iniciativa. Ampliar o campo de atividade jurisdicional itinerante faz com que se aumente a garantia do acesso à justiça para as pessoas mais carentes e ainda traz eficiência e aproximação do Judiciário a esse tipo de comunidade. 

A Justiça Itinerante é um modelo diferente de prestação jurisdicional, cuja característica principal é a mobilidade, ou seja, o deslocamento dos serviços judiciários até as localidades onde estejam os cidadãos que precisam do Poder Judiciário para resolver seus conflitos. 

No sistema da Justiça Itinerante, os atores judiciais, como, por exemplo, os juízes, promotores, defensores públicos e servidores da justiça, vão até a população mais carente que, por diversas razões, não conseguem vencer as barreiras que encontram no caminho até as portas do Judiciário. 

Esses atores judiciais se utilizam da estrutura de escolas, quadras de esporte, prefeituras, e outros locais possíveis. Esse modelo de justiça torna possível a solução de diversas ações judiciais e que são julgadas em poucos dias.  

Para Marco Antonio Azkoul, o conceito de Justiça Itinerante é o seguinte: “[…] o conceito de Justiça Itinerante no seu sentido formal, adjetivo ou processual, que se resume com a prestação de serviço da tutela jurisdicional do Estado, que se efetiva juridicamente com a sentença ou acórdão, ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa em outros espaços que não os fóruns, ou seja, unidades móveis, em colégios, estádios de futebol, locais comunitários e em repartições públicas em geral, devidamente equipadas, preferivelmente, com sistema informatizado e de telecomunicações. Quando este ato jurisdicional transita em julgado torna-se terminativo, quer dizer com força de lei entre as partes (2006, p. 175). 

Não há qualquer precedente histórico de uma Justiça itinerante semelhante à que existe no Brasil. Esse tipo de Justiça é uma criação genuinamente brasileira e que foi pensada para vencer as grandes distâncias, tanto geográficas quanto sociais, que existem entre os jurisdicionados e o Judiciário do nosso país. 

A verdadeira Justiça itinerante, que se torna diferente dos outros modelos, é aquela que percorre diversos lugares em suas unidades móveis, colhe as provas, os pedidos iniciais e realiza audiências. Além disso, o juiz ainda retornará ao local do pleito ou da demanda, ou seja, ele profere a sentença fora do fórum ou tribunal. 

Podemos perceber que o fato de a Justiça Itinerante ser instrumentalizada “fora do fórum ou tribunal” é o seu diferencial, é o seu traço marcante para considerá-la, como lhe é peculiar, uma verdadeira Justiça Itinerante.   

Justiça Itinerante pode ser vista como sendo a justiça disponibilizada através de unidades móveis, geralmente, por meio de ônibus adaptados, para trazer a atividade jurisdicional do Estado aos lugares mais longínquos e necessitados. É composta por um juiz, defensores públicos e conciliadores, que visam solucionar os conflitos utilizando a conciliação. Assim, pode ser definida, basicamente, como sendo um “pequeno fórum ambulante”, que percorre as cidades, levando o Poder Judiciário às pessoas mais carentes.  

 

3. Os Juizados Especiais Itinerantes como Forma de Democratização do Acesso à Justiça no Brasil  

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A Justiça itinerante não é um meio para incentivar a instauração de processos e sobrecarregar ainda mais as varas judiciárias permanentes. Na realidade, ela tem como finalidade primordial a conciliação e mediação de conflitos. E ela atua em conflitos nas áreas dos direitos de família e sucessões, por exemplo.  

Nas palavras de Roberta Kelly Silva Souza: “A participação popular na Justiça Itinerante está na sua essência, pois fortalece o Poder Judiciário, enquanto instituição destinada a pacificar os conflitos sociais, ressaltando seu compromisso democrático na promoção da justiça. Sem essa participação, a Justiça Itinerante não produziria tantos resultados satisfatórios. Assim, a Justiça Itinerante resgata compromissos socais, de cidadania plena e de dignidade da pessoa humana no Estado Democrático de Direito, uma vez que favorece a atuação inclusiva e participativa dos cidadãos. Com isso, deve ser fortalecida a participação popular, para que as pessoas busquem soluções alternativas ao processo judicial, evitando eventuais resistências ou desconfiança na utilização da Justiça Itinerante. Portanto, é necessário que as suas vantagens sejam amplamente divulgadas perante a sociedade. Quando a Justiça se desloca até o cidadão e busca solucionar os conflitos existentes, a probabilidade de se obter resultados satisfatórios é enorme, pois cada vez mais o Judiciário se encontra sufocado em face da grande quantidade de processos ali existentes, não sendo possível aos Juízes e aos auxiliares da Justiça conferir a devida importância para a conciliação e a mediação no dia-a-dia forense. Dessa forma, a aproximação da sociedade com o Estado constitui pressuposto fundamental, para que a crise do acesso à justiça seja superada e que seja garantido a todos os cidadãos o tratamento igualitário perante o Judiciário, principalmente por aqueles desfavorecidos economicamente, geograficamente e culturalmente (2012, p. 12) 

Para Cappelletti e Garth, a criação de mecanismos judiciais que tornem mais próximo o Judiciário da população é sim um ponto positivo: Há, no entanto, necessidade real de remédios acessíveis e efetivos para pequenas causas, sem grandes (é altamente improváveis) subsídios estatais. Está claro que, em regra geral, as pequenas causas não serão trazidas aos tribunais regulares para serem tratadas consoante o procedimento comum, entre outras coisas porque isso não é economicamente possível. O resultado, consequentemente, é que, sem algum tipo especial de procedimento para as pequenas causas, os direitos das pessoas comuns frequentemente permanecerão simbólicos. O desafio é criar foros que sejam atraentes para os indivíduos, não apenas do ponto de vista econômico, mas também físico e psicológico, de modo que eles se sintam à vontade e confiantes para utilizá-los, apesar dos recursos de que disponham aqueles a aquém eles se opõem. Sem dúvida, parece que a força das críticas mencionadas acima não desencorajou os reformadores de pequenas causas; ao contrário, elas deram a partida para um novo e notável esforço – utilizando aquilo que chamamos de novo enfoque de acesso à justiça – com vistas a uma significativa reforma das pequenas causas (1988, p. 168). 

Ainda podemos frisar a diferença entre os Juizados Especiais Itinerantes Estaduais e os Federais. Os Estaduais acontecem em uma unidade móvel adaptada e interligada à rede do Tribunal de Justiça. Primeiramente, são elaboradas as petições iniciais e o respectivo Tribunal de origem estipula um prazo para que a unidade móvel retorne ao mesmo local para que sejam realizadas as sessões de conciliação. Caso haja um acordo, a cópia da homologação pelo juiz é fornecida no mesmo dia. Caso não haja acordo, as partes vão para as audiências com o juiz. 

Assim, o objetivo dos Juizados Itinerantes Estaduais é dar um acesso digno à justiça a todos os cidadãos que moram afastados de fóruns, solucionando os conflitos de menor complexidade em um curto período e privilegiando a conciliação entre as partes. 

Já os Juizados Itinerantes Federais possuem algumas diferenças em relação aos Estaduais no que se refere às fases para a realização dos Juizados Itinerantes. Os Federais têm três fases básicas de implementação, quais sejam: a) divulgação; b) instalação e atermação; e c) realização de audiências e julgamentos.  

As três fases dos Juizados Itinerantes Federais podem ser explicadas da seguinte forma: O juiz ou diretor de secretaria dele, na fase da divulgação, vai até a localidade onde será instalado o juizado para explicar às lideranças locais a relevância do evento para os cidadãos e garantir publicidade para as fases posteriores através de todos os meios possíveis disponíveis, por exemplo, rádio, estrutura dos sindicatos de trabalhadores e panfletos. Ainda nessa fase, são efetuados convênios com as prefeituras para que sejam disponibilizados espaços públicos, para ser realizado o evento, e se preparem para administrar a demanda de pessoas que vão até a cidade em busca da justiça. Assim, é importante que sejam conquistadas parcerias para garantia de alguma refeição às pessoas que ficarão nas longas filas esperando atendimento. Na segunda fase, apelidada atermação, uma equipe composta de juízes federais e auxiliares do juízo vão até o local previamente divulgado na data que foi marcada para a realização do atendimento às pessoas. Elas exprimem oralmente seus pedidos e os atermadores reduzem a escrito as suas solicitaçõesvisto que a maioria dessas pessoas não possui advogados. No entanto, se tiver sido feita alguma petição por advogado, ela também será recebida caso se enquadre na competência da justiça itinerante. Por fim, é marcado o dia da audiência e a citação do réu, no prazo mínimo de trinta dias. Na fase finalsão realizadas as audiências e a efetivação de procedimentos complementares, como, por exemplo, a oitiva de testemunhas e realização de perícias. 

A Justiça Estadual acaba tendo uma maior aproximação com o cidadão, existindo comarcas e juizados mais afastados dos grandes centros urbanos, o que acontece em menor escala com a Justiça Federal. Por isso, é muito importante que sejam realizados os Juizados Especiais Federais Itinerantes nas áreas que não possuem varas e juizados federais. 

No art. 109, § 3º da Constituição Federal está previsto que se tenha a possibilidade de que os processos em que a União figure como parte, haja uma tramitação na seção judiciária onde for o domicílio da outra parte, ou seja, esses processos serão processados e julgados na Justiça Estadual, quando não tiver sede da Justiça Federal na comarca. 

Porém, em muitas comarcas dos interiores dos Estados ainda não há a figura do juiz, do defensor público nem do promotor de justiça, o que faz com que a previsão constitucional seja ineficaz, pois as pessoas dessas comarcas terão que se deslocar até as capitais para solucionar seus conflitos. Esse fato torna mais difícil o acesso à justiça para aqueles que não possuem condições financeiras para tanto. 

Assim, pode-se notar que os Juizados Federais Itinerantes são importantes como meio de garantir às pessoas um efetivo acesso à justiça, porque ainda existem poucas varas e juizados federais no Brasil, especialmente nas cidades dos interiores dos Estados, onde, dependendo do caso, não existem nem varas nem juizados estaduais.  

Dessa forma, os Juizados Itinerantes garantem aos cidadãos o efetivo acesso à justiça, pois eles diminuem as diferenças existentes na sociedade e facilitam o acesso ao Poder Judiciário. Eles têm o papel de desburocratizar o Judiciário, com a intenção de proporcionar uma Justiça social, pois, assim, será possível uma justiça menos formal e mais humana.  

Justiça Itinerante tem trazido benefícios incalculáveis pois ela assegura aos cidadãos a celeridade no trâmite processual, além do amplo e indistinto acesso das pessoas ao judiciário. Ou seja, ela é um método de democratização do acesso à justiça no nosso país, pois assegura que a atividade jurisdicional possa ser prestada pelo Estado, fora dos fóruns, possibilitando, assim, que essa prestação seja cada vez mais próxima daquelas pessoas tidas como “excluídas”. 

É possível observar que Justiça Especial Itinerante é de suma importância para o julgamento de processos no Brasil. Assim, temos uma decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal para observar. Essa decisão fala sobre a Justiça Itinerante ter competência para atuar em todas as Circunscrições Judiciárias do Distrito Federal 

JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. LEGITIMIDADE. DANO MATERIAL COMPROVADO. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ITINERANTE PARA FATOS OCORRIDOS EM TODAS AS CIRCUNSCRIÇÕES DO DISTRITO FEDERAL. PROVA TESTEMUNHAL DISPENSADA ANTE A INUTILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA, NA ESPÉCIE, NÃO VERIFICADA. SENTENÇA FUNDAMENTADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I. Trata-se de recurso inominado interposto pelas partes rés face de sentença que julgou procedente o pedido deduzido na inicial para condená-las ao pagamento de R$ 1.113,00 (um mil, cento e treze reais), a título de indenização por danos materiais derivados de acidente de veículo. Nas razões do recurso, aduzem as partes recorrentes a incompetência do Juízo, ao argumento de que o feito se refere a reparação de dano e não acidente de veículo e cerceamento de defesa, haja vista alegada indeferimento na oitiva de testemunha. II. Recurso próprio, tempestivo e dispensado de preparo ante pedido formulado de concessão da gratuidade de justiça (ID 8059367). Contrarrazões não apresentadas (ID 8059371). III. No caso, restou incontroverso que as partes se envolveram em acidente de trânsito com colisão dos veículos conduzidos pelo autor (FIAT PALIO WEEKEND) e pela primeira parte ré (CITROEN C3), em que o veículo da parte autora foi atingido na parte lateral traseira esquerda pelo automóvel da parte ré. Dos documentos colacionados aos autos conclui-se pela dinâmica do evento, em que o veículo Citroen C3 atingiu o veículo Palio Weekend ao mudar de faixa da direita para a esquerda. Assim, a frente lateral direita do Citroen C3 abalroou a parte traseira lateral esquerda do Palio Weekend, quando os veículos trafegavam na Av. Águas Claras, próximo à entrada da Vereda da Cruz (ID 8059319). IV. Suscitam as partes rés a ilegitimidade da parte autora, ao afirmarem que para a restituição de franquia paga à seguradora de veículo, somente esta teria legitimidade para figurar no pólo passivo da presente demanda. No entanto, a prova dos autos demonstra o dano material suportado pela parte autora (ID 8059317). Assim, é parte legítima a pretender a indenização do valor dispensado para o cumprimento da franquia e, de consequência, ter o veículo reparado. V. Alegam também os recorrentes a incompetência do Juizado Itinerante do Distrito Federal, ao sustentarem que a demanda deveria ser conhecida e julgada pelo Juízo de Águas Claras, haja vista se tratar de reparação de dano. Registre-se, contudo, que o fato gerador do dano, frise-se, extracontratual, é acidente de veículo. Assim, não se pode falar em descumprimento do disposto no art. 53, IV, do CPC. Além disso, destaque-se, o art. 3º da Resolução 3, de 08/07/2004, do Conselho da Magistratura do e. TJDFT, expressa que O Juizado Especial Itinerante tem competência para atuar em todas as Circunscrições Judiciárias do Distrito Federal. Com efeito, a norma regulamenta situação de competência territorial e, portanto, relativa, o que autoriza o e.Tribunal de Justiça, para fins de melhor aplicação de política judiciária, estabelecer os critérios de distribuição de competência, não havendo falar-se em nulidade no presente caso, com fundamento em alegada incompetência do Juízo. VI. No que se refere à arguição de cerceamento de defesa, melhor sorte não acompanha as partes recorrentes. Denota-se que, intimados a esclarecer o objetivo da prova testemunhal pretendida (ID 8059341), as partes recorrentes afirmaram que (…) As testemunhas não presenciaram os fatos (…)”. Diante de tal informação, tem-se por não relevante a oitiva, ao passo que nada poderiam esclarecer acerca da dinâmica do evento que ocasionou o dano. Não é demais dizer que contradita diversa teria de ser apresentada por meio de documentos, a exemplos de orçamentos ou croquis, dentre outros. VII. Por fim, afirma-se que a prova é direcionada à convicção do julgador acerca do fato alegado. Na espécie, a sentença encontra-se fundamentada com indicação adequada e suficiente das razões formação do convencimento, nos termos do disposto no art. 371, do CPC.. VIII. Nesse quadro, não lograram as partes rés demonstrar razão para a reforma da sentença. Frise-se, por fim, que o objeto do recurso limitou-se às questões preliminares, não obstante o oportuno esclarecimento do fato que ocasionou o dano material indenizável. IX. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. Condeno a parte recorrente vencida ao pagamento das custas processuais, contudo suspendo a exigibilidade na forma do art. 98, § 3º, do NCPC, em razão da gratuidade de Justiça, que ora defiro. Deixo de arbitrar honorários advocatícios ante a ausência de contrarrazões. X. A Súmula de julgamentos servirá de acórdão, na forma do art. 46 da Lei nº 9.099/95. 

(Acórdão 1169074, 07504756920188070016, Relator: ALMIR ANDRADE DE FREITAS,  Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 8/5/2019, publicado no DJE: 13/5/2019. Pág.:  Sem Página Cadastrada.)”. 

Tal acórdão foi trazido para leitura e análise pois é necessário sabermos que o Judiciário no Brasil está cada vez mais se aprimorando e querendo chegar a mais e mais pessoas. Infelizmente, muitos cidadãos ainda não têm o acesso digno à justiça que todos merecem, mas, a Justiça Especial Itinerante está cada vez ganhando mais espaço para poder fornecer a todos um acesso ao Judiciário de qualidade. 

Por fim, para que possamos ter ainda mais certeza que a Justiça Itinerante agiliza processos em todo o território nacional, inclusive em locais onde nunca se imaginaria que o Judiciário poderia chegar, o Tribunal de Justiça do Pará (TJPA) publicou uma notícia em que mostra como a Justiça Itinerante acelerou a movimentação de muitos processos em regiões que só conseguem ser acessadas através de rios.  

Tal ação dos Juizados Especiais ocorreu em Bagre e Curralinho, na região da ilha do Marajó. A Justiça Itinerante Fluvial movimentou 336 processos, com 43 sentenças e 293 despachos e decisões. A ação aconteceu entre os dias 10 e 14 de fevereiro de 2020.  Esse projeto foi desenvolvido pela Coordenadoria dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), em parceria com a Caixa Econômica Federal e levou a prestação jurisdicional a localidades de difícil acesso da região. Uma equipe de três servidores do TJPA, coordenada pelo juiz Prócion Barreto da Rocha Klautau Filho, se deslocaram até o Termo Judiciário de Bagre e à Comarca de Curralinho no navio da Caixa Econômica, com a intenção de dar agilidade e andamento aos processos, através de prolatação de sentenças, despachos, decisões interlocutórias, realização de audiências e orientação jurídica aos jurisdicionados.  

Os Juizados Especiais são importantes como forma de apoiar as Comarcas mais distantes da capital do estado na prestação jurisdicional.   

 

CONCLUSÃO 

O acesso à justiça é o direito mais básico, pois ele é o direito que dá direitos. Os Juizados Especiais Itinerantes vieram para democratizar o acesso à justiça, visto que trazem a atividade jurisdicional do Estado para todas as pessoas, inclusive as mais pobres e as que moram em lugares remotos do país, onde não existem fóruns, por exemplo.  

Dessa forma, os Juizados Especiais Itinerantes diminuem as diferenças existentes na sociedade brasileira e asseguram a todos, sem discriminação, o tratamento igualitário na solução de conflitos, desobstruindo o Poder Judiciário e diminuindo a morosidade da justiça.  

O acesso à justiça melhorou muito, com a criação dos Juizados Especiais Itinerantes, para aquelas pessoas que vivem em lugares distantes das grandes cidades e distantes de algum fórum. Porém, ainda há mais a ser feito quando o assunto é dar acesso à justiça aos cidadãos, principalmente àqueles menos favorecidos econômica e geograficamente.   

Com a criação dos Juizados Itinerantes, foi possível proporcionar às pessoas o acesso digno à justiça, pois é um elemento essencial à promoção plena da cidadania e da dignidade da pessoa humana. Além disso, supera a crise da justiça e contribui para diminuir as limitações de seu acesso.  

Dessa maneira, é de suma importância que o trabalho com os Juizados Especiais Itinerantes continue, pois eles ajudam a Justiça do nosso país conseguir cumprir o seu papel na democracia republicana, que é o de distribuir justiça para as pessoas mais carentes e que vivem em áreas mais remotas do Brasil. 

 

Referências 

Acórdão 1169074, 07504756920188070016, Relator: ALMIR ANDRADE DE FREITAS,  Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 8/5/2019, publicado no DJE: 13/5/2019. Pág.:  Sem Página Cadastrada. Disponível em: https://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj Acesso em: 28 mai. 2020. 

 

AZKOUL, Marco AntonioJustiça itinerante. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006. 175 p.  

 

BASSETTO, Maria do Carmo Lopes Toffanetto RossitoDemocratização do acesso à justiça: análise dos Juizados Especiais Federais itinerantes na Amazônia Legal brasileira/ Maria do Carmo Lopes Toffanetto R. Bassetto – Brasília:Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, 2016. 219 p.  

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 

 

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Frabis, 1988. 168 p. 

 

GAULIA, Cristina. Justiça Itinerante – Ampliação Democrática do Acesso à justiça. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rdc/article/view/10970/8681 Acesso em: 28 mai. 2020. 2 p.  

 

MAIA, Luciana Andrade. Justiça Itinerante: Um meio de levar a justiça aos mais necessitados, possibilitando a ampla prestação jurisdicional pelo Estado. 2006. Disponível em: https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/6550/Justica-itinerante. Acesso em: 28 mai. 2020. 

 

MONTENEGRO, Will. Justiça Itinerante agiliza processos. Disponível em: http://www.tjpa.jus.br/PortalExterno/imprensa/noticias/Informes/1049111-justica-itinerante-movimento-336-processos.xhtml Acesso em: 28 mai. 2020. 

 

SOUZA, Roberta Kelly Silva. Juizado Especial Itinerante: Um Método de Democratização do Acesso à Justiça no Brasil. 2012. Disponível: http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=a9d34fb66d813675 Acesso em: 28 mai. 2020. 12 p. 

 

SOUZA, Roberta Kelly Silva. Juizados especiais itinerantes: ampliação do direito ao acesso à justiça – recorte nacional regional./Roberta Kelly Silva Souza./ Curitiba: Juruá, 2018. 75 p. 

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