Resumo: O presente trabalho visa determinar quais são as ações realizadas internacionalmente com vias a reprimir, prevenir e lidar com o tráfico humano de pessoas que vivem em situações críticas, que por sua situação de maior vulnerabilidade acabam sendo alvos fáceis de tal ato. Objetiva também observar as perspectivas acerca dessas atividades do ponto de vista dos direitos humanos de forma a demonstrar que a criminalização de tais atos são insuficientes frente a grave lesão a dignidade da pessoa humana, uma vez que não se trata apenas de vigiar e punir em escala nacional e internacional, mas também, de saber como estabelecer um contato cuidadoso com àquelas pessoas que são vítimas do tráfico, levando em conta que essas pessoas já possuem uma identidade cultural e que esta deve ser respeitada.
Palavras-chave: Tráfico internacional, refugiados, direitos humanos
Abstract: The present work aims to determine what the actions carried out internationally with roads are repressing, preventing and dealing with the human traffic of persons who live in critical situations, which for his situation of bigger vulnerability finish being easy targets of such an act. It aims to observe also the perspectives about these activities of the point of view of the human rights of form to be demonstrated that the criminalização of such acts they are insufficient in front of serious injury the dignity of the human person, as soon as it is not the question only of being on the lookout and of punishing in national and international scale, but also, of knowledge as it will establish a careful contact with to those persons who are victims of the traffic, taking into account that these persons already have a cultural identity and that this one must be respected.
key words: International traffic, taken refuge, human rights
Sumário: Introdução. 1. O contexto atual do tráfico internacional de pessoas. 2. Os canais de tráfico no mundo. 3. Os refugiados como alvos do tráfico internacional de pessoas. 4. A visão dos Direitos Humanos acerca do tráfico internacional de refugiados. Conclusão. Referências.
Introdução
O tráfico internacional de pessoas não é prática atual, realizada em todo o mundo. A história da humanidade sempre foi recheada de venda e exploração de pessoas para os mais diversos fins, sejam eles para o trabalho escravo, seja para a exploração sexual, ou para outros motivos. Homens, mulheres e crianças em situação de vulnerabilidade social são alvos fáceis para os traficantes, que se utilizam de diversos meios no contexto moderno para a realização de tal prática.
A Organização das Nações Unidas implementa políticas repressivas e preventivas no meio internacional com vias a impedir que pessoas sejam vítimas do tráfico humano, de forma a tentar manter o controle e a vigilância especialmente em países cuja a situação política e social são preponderantes para que traficantes com o ânimo de lucrar, façam vítimas nesses locais.
O ser humano como qualquer outro animal tem tendência a se estabelecer em ambientes favoráveis à sua sobrevivência, sendo que, sempre que há resistência do meio em relação a sua estadia, a migração é o primeiro ato a ser realizado, para se encontrar um outro ambiente que lhes seja possível sobreviver.
Muitos países no contexto atual vivem situações críticas de guerra, fome e miséria social, fazendo com que haja migração, para outros países, daqueles que estão em meio ao fogo cruzado, seja fugindo da guerra, seja em busca de melhores condições de vida. Ocorre que, essa migração em massa de pessoas faz com que surjam diversos riscos, os quais, as expõe em uma situação ainda pior, ferindo ainda mais sua dignidade.
Segundo últimas notícias acerca dos refugiados, a ONU denunciou práticas de tráfico de órgãos de pessoas que se encontravam em transição para outros países, sendo que em entrevista realizada, ficou constatado que pelo menos 6% dos refugiados são mantidos em cativeiro e obrigados a fornecer sangue e até mesmo órgãos aos contrabandistas como forma de pagamento para realizarem a transição até a Europa.
O presente trabalho visa em um primeiro momento discorrer sobre o tráfico internacional de pessoas de uma maneira geral, atentando para o contexto histórico e visualizar as medidas tomadas até o presente momento para tentar ao máximo extinguir essa prática.
Posteriormente irá se demonstrar como é a situação dos refugiados nos dias atuais, quais condições os expõe a essa situação e quais os riscos que a grande maioria deles sofrem em busca de melhores condições de vida, fazendo em um outro momento uma relação existente entre o tráfico de pessoas e a exposição/submissão dos refugiados às mais variadas formas de tráficos.
Finalmente tratar-se-á acerca da posição que a ONU tem tomado de forma a incentivar tanto no meio internacional, quanto no âmbito nacional de diversos países, a implementação de medidas e políticas preventivas e repressivas quanto ao tráfico internacional de refugiados, atentando-se para as formas de lidar com àqueles que já foram vítimas dessa prática, bem como definir as perspectivas dos direitos humanos quanto a atual situação.
1. O contexto atual do tráfico internacional de pessoas
A comercialização de pessoas no mundo possui um grande aparato histórico, uma vez que, tal prática já é realizada a milhares de anos, com diversas finalidades, sejam elas para a exploração sexual, laboral ou até mesmo para a retirada e venda de órgãos. Ocorre que, apesar desse ato ser bastante antigo, ele só ganhou visibilidade com vias a recorrer a medidas inibitórias, no contexto atual, sendo que, ainda carece de meios e instrumentos para buscar a erradicação de tais práticas execráveis.
Dados internacionais demonstram que o tráfico internacional de pessoas é segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) o terceiro negócio mais rentável e realizado no mundo, perdendo somente para o tráfico de drogas e de armas. Em pesquisa não tão recente, a ONU demonstrou que tal negócio movimenta mais de 23 (vinte e três) milhões de euros todos os anos, perfazendo mais de 20 (vinte) milhões de vítimas.
Pesquisas tão assustadoras fizeram com que os olhares dos Estados internacionais se voltassem para a edição de projetos, medidas, tratados e outros meios gerais e restritos que buscassem encontrar os maiores focos do tráfico e através deles conseguissem detectar a extensão do problema.
Segundo consta, a Europa é o continente onde ocorrem as maiores incidências do tráfico de pessoas, possuindo países fins e países meios, sendo que, estes são considerados apenas países de caráter transitório em que as pessoas traficadas passam por uma estadia provisória até serem levados para àqueles, que são países onde serão exploradas de todas as formas, sendo escravizadas para a realização de serviços, abusadas sexualmente e vendidas como se fossem mercadorias.
Em matéria da United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC) é descrito uma iniciativa global realizada pela ONU com o fim de alcançar metas que viabilizem a luta contra o tráfico internacional de seres humanos. Essa iniciativa denominada UN.GIFT, conta com a ajuda de diversas organizações internacionais como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Internacional para as Migarações (OIM), que buscam entender como é realizado o tráfico e como funciona a sua natureza, para através desses resultados implementar medidas efetivas que combaterão essa prática (UNODC, 2017).
O discurso fraudulento instigado pelos traficantes ao induzir pessoas de diversos países a emigrarem para o exterior com o fim de alcançarem uma melhor condição de vida ou uma boa profissão, torna mais difícil a detecção do tráfico com vias a preveni-lo, uma vez que, se torna quase impossível identificar os autores do crime, sendo que, diversas vezes estes se passam por amigos ou conhecidos que induzem as vítimas a erro.
De outro lado, existe uma grande resistência acerca da aplicabilidade de políticas repressivas, vez que, além do parco conhecimento existente acerca da natureza do tráfico de pessoas em escala global, ainda existe insegurança por parte das vítimas que depois de serem traficadas são coagidas a permanecerem do lado de seus traficantes, sob a prática de violência e ameaças.
Calcado nestes dois pressupostos, preventivo e repressivo, que ainda carecem de meios eficazes, é que a UN.GIFT busca estudar e entender a natureza do tráfico, para através disso conseguir implementar medidas e políticas que facilitarão o exercício da sociedade nacional e internacional ao combate ao tráfico de seres humanos.
Essa busca traduz-se na esfera internacional através da existência de organizações gerais e especiais que unem suas forças para conseguirem reconhecer a prática. Ocorre que, além da dificuldade existente acerca da identificação do tráfico, outros fatores influem de forma negativa, como por exemplo o conflito existente entre os Estados como sujeitos internacionais, frente a diversidade de normas internas e até mesmo internacionais que impedem a existência de uma padronização legal que pudesse ser aplicada direta e imediatamente pelos países do globo.
Paralelamente a existência de organizações gerais como a ONU e a OEA e especiais como a Convenção Americana de Direitos Humanos, a Corte Interamericana e a Convenção Europeia de Direitos Humanos, formam grupos localizados de combate ao tráfico humano que facilitam a convergência legal entre os países através de edição de planos que se enquadrem nos Estados componentes. Nas palavras da advogada e pesquisadora Bruna Pinotti Garcia e do professor Rafael de Lazari:
“A intenção do sistema global de proteção de direitos humanos é a crescente efetividade de tais direitos, independentemente do instrumento utilizado para que se atinja tal pretensão. Por isso mesmo, tem-se a chamada característica da complementariedade, que se relaciona com a necessidade de coexistência de sistemas regionais de proteção internacional de direitos humanos ao lado de um sistema global.” (GARCIA, LAZARI; 2015, p. 492)
Diante disso, importa dizer que, o tráfico internacional de pessoas representa uma grave lesão e violação aos direitos humanos, e a existência de sistemas globais e regionais ao figurarem em uma relação de complementariedade e como dito, de coexistência, temos que independentemente de haver conflito entre norma interna e internacional, prevalecerá àquela ordem que alcançará a maior proteção dos direitos humanos, vez que, o objetivo primordial é a proteção desses direitos.
Pontos positivos se instalam na existência desses sistemas, global e regional, uma vez que, promove uma maior área de atuação de políticas antitráfico que são implementadas tanto pela ONU em escala internacional, quanto por convenções no plano regional.
Como dito anteriormente, o tráfico internacional de pessoas é uma realidade histórica podendo ser visualizado em diversos momentos da antiguidade, como no tráfico de escravos, de índios, mais recentemente no tráfico de “mulheres brancas” (termo utilizado pelos franceses), constituindo maior importância somente no contexto atual. A contemporaneidade é a chave de discussão acerca dessa atividade, concretizando a realização de medidas de forma a aviltar, prevenir, reprimir e punir o exercício desse crime.
Dito isto, a ONU elaborou uma Convenção Internacional, com vias a tratar os mais variados aspectos do tráfico de pessoas no mundo, sendo aprovado no ano de 2000 o Protocolo de Palermo, que instituiu a definição de tráfico de pessoas, bem como daqueles que podem ser considerados traficantes. Consta da definição de tráfico de pessoas no capítulo I, artigo 3º, alínea “a”, que diz o seguinte:
“A expressão "tráfico de pessoas" significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos;” (Planalto, 2004).
O decreto em questão determina a promulgação do Protocolo de Palermo no Brasil no ano de 2004, incluindo o Brasil tanto nacional quanto internacionalmente na política de prevenção, repressão e punição da prática de tráfico de pessoas.
Nesse sentido, outro instrumento paralelo a questão do tráfico humano foi elaborado em 1999, sendo denominado de Padrões de Direitos Humanos – PHD, o qual não tem como objetivo direto a prevenção ou repressão ao tráfico, mas sim, impor medidas que demonstram como lidar com as vítimas, de forma a tratá-las com vias a ressocialização e/ou reinclusão dessas pessoas à sociedade novamente, aplicando uma política de não discriminação, de forma a devolver a elas a dignidade que lhes foi tirada.
2. Os canais de tráfico no mundo
Conforme explanado anteriormente, o caráter subjetivo que dá amparo para a ocorrência do tráfico de pessoas é pautado na vulnerabilidade destas frente as mais diversas situações desumanas que são provenientes das mazelas sociais enfrentadas por diversos países do globo, bem como das fraudes que diversos planos de emprego e de garantias
Dito isso, faz-se importante demonstrar a existência de meios objetivos, com os quais os traficantes se utilizam para tornar sua prática eficaz. Dentre esses meios, pode-se citar os projetos feitos por empresas fantasmas de concursos de beleza, a disseminação de lojas cibernéticas, dentre outras.
Dentre os diversos meios que contribuem para que o tráfico de pessoas se trone uma prática eficaz, nos atentaremos àquelas supramencionadas, vez que, são as formas mais recorrentes e visíveis no contexto mundial.
Primeiramente, a definição de empresas fantasmas é fator de extrema importância que demonstra de forma bem clara como ocorre o tráfico. Quando uma empresa é registrada, mas na prática ela não existe, ou seja, ela não possui existência fática, no que concerne a produção e circulação de bens e serviços, diz-se que esta empresa é “fantasma”, vez que todos os fatores que rodeiam sua criação e seu desenvolvimento, não passam de fachada, sendo seus envolvidos meros “laranjas”.
Muitas empresas são registradas com o fim de realizar um determinado serviço, mas sua finalidade originária não passa de uma camuflagem de sua verdadeira função. Este aspecto é muitas vezes visualizado nas agências de modelo que abrem empresas com o fim de promover eventos relacionados a moda, a beleza e a inclusão de belas jovens no mercado da moda. Acontece que muitas meninas iludidas com os planos utópicos apresentados por essas agências, acabam sendo vítimas de suas práticas.
Além das agências de modelo, outras empresas com promessas de melhores condições de vida e de uma melhor remuneração, faz com que empresas de verdade se envolvam na exploração de mão de obra estrangeira e barata, vez que, aparentemente torna-se um negócio rentável para essas pessoas jurídicas.
Investigações realizadas pela Polícia Federal no Brasil, demonstrou que grandes empresas de moda estavam fomentando suas atividades com a inclusão de pessoas estrangeiras provenientes do tráfico internacional sul-americano, vindas de diversos países como Bolívia, Peru e Paraguai, conforme demonstra matéria do site Brasil de Fato, 2013:
“Na Bolívia, Peru e Paraguai, empresas de costura que atuam de fachada seriam as principais aliciadoras para fornecer mão de obra à rede de exploração nas oficinas clandestinas em São Paulo. (…) Um contrato verbal no país de origem, entre aprendizes e donos das firmas de costura, acordaria um salário de 150 dólares por mês em São Paulo, além da garantia de alimentação e moradia sem custo ao trabalhador. Assim, uma vez instalados nesses locais de trabalho na chegada em São Paulo, os imigrantes estariam contidos à cadeia de produção de grandes marcas da moda e do ramo do varejo.” (Zonta, 2013, p. n.p)
Outro meio bastante utilizado atualmente são os sites das redes de internet, que agem de forma ativa e passiva na realização do tráfico humano. Age ativamente no que concerne a recrutar pessoas desinformadas em sites de oferta a se inscreverem em planos de moda e serviços; e passivamente na compra e venda de pessoas mantidas em cativeiro depois de terem sido vítimas primárias do tráfico.
A internet é hoje o meio de comunicação mais eficaz no mundo, e com o advento da globalização se tornou também um dos meios mais utilizados para a realização de negócios, legais e ilegais. O que as pessoas geralmente conhecem sobre os sites e redes de internet é uma percentagem extremamente pequena perto do que realmente existe nesta.
Alguns estudiosos das redes compraram a internet como se fosse um iceberg em que, o conhecido comumente utilizado pelas pessoas perfaz apenas a ponta desse iceberg, sendo o desconhecido muito maior e muito mais profundo. Na parte conhecida temos sites como: Yahoo, Google, Bing, Facebook; enquanto que, na parte desconhecida existem sites como: PedoPlanet, 2channel, 4chan, dentre vários outros.
O tráfico internacional de pessoas age nessas duas áreas da internet. Na primeira, os traficantes montam redes de planos e projetos falsos que levam as pessoas a participarem e se inscreverem em sites que não possuem confiança, levando estas a serem conhecidas pelos traficantes, que as convencem a participar desses planos, sendo por fim, vítimas do tráfico.
Posteriormente, a utilização da segunda área da internet, também conhecida como Deep Web, é utilizada para os mais diversos fins, alguns conhecidos e outros até hoje desconhecidos pela humanidade, como tráfico de órgãos, tráfico de crianças para serem abusadas tanto sexualmente, quanto laboralmente, venda de pessoas pelos mais variados preços, ou seja, uma comercialização clandestina sem fim, ilimitada e impossível de se mensurar.
Diante disso, pode-se olvidar que existem diversos canais pelos quais os traficantes de pessoas promovem a comercialização e exploração destas da forma que lhes é mais rentável, sento estes meios visíveis tanto no mundo físico com a criação de empresas que escondem sua real finalidade, quanto por vias virtuais, sendo este um dos meios mais crescentes e utilizados no mundo atualmente, devido sua maior segurança.
3. Os refugiados como alvos do tráfico internacional de pessoas
Atentando-se ao tema deste trabalho propriamente dito, é visível que diversos países do globo enfrentam diversos problemas, sejam eles políticos, sociais e/ou econômicos, gerando vários efeitos maléficos, como conflitos internos e externos, guerras e até mesmo movimentos revolucionários e extremistas.
Diante dessas situações degradantes e incoerentes com a paz social que vários povos estão submetidos, a migração é efeito social fático que impõe às diversas pessoas um estado de vulnerabilidade muito maior do aquele apresentado por vítimas de crimes internacionais provenientes de uma fraude ou até mesmo de uma informação errada.
Fato este vivenciado diariamente pelos refugiados, dá origem a um problema bastante recente, que a humanidade ainda está aprendendo a lidar. Apesar das diversas medidas e programas implantados por várias organizações internacionais de forma a reprimir o tráfico de pessoas, o contexto que os refugiados se encontram e o impacto que causam em diversas sociedades é um fenômeno que ainda carece de medidas, vez que é quase impossível controlar a quantidade de pessoas que entram em um país e as que estão em transição.
Na busca pela sobrevivência e na fuga da guerra, pessoas desesperadas tomam medidas desesperadas frente ao grande estado de necessidade que se encontram, vindo a aceitar propostas que não compreendem, e se submeter a atos desumanos com a esperança de salvar suas famílias.
Antes de adentrar aos refugiados como vítimas do tráfico internacional de pessoas, faz-se mister compreender quem podem ser considerados refugiados, sendo esta questão respondida pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), descrevendo-os como sendo as pessoas que estão fora de seu país em decorrência de temor proveniente de perseguição política, de raça, de religião e que não possa voltar para seu país de origem ou que não o queira (ACNUR, 2016).
Veja que, a definição de refugiados dada pela ACNUR se restringe a todas aquelas pessoas que em decorrência de perseguição, seja qual for sua espécie, saiam de seu país de origem, não podendo nele ficar devido a perseguição e nem querendo para ele voltar.
Ocorre que, esse conceito de refugiado parece um tanto inadequado frente a realidade social desses grupos, que diariamente é mostrado pelos diversos canais de informação. Ao analisar a definição de refugiado dentro do contexto significativo da palavra, qualquer pessoa que busca um lugar ou uma situação compatível com sua sobrevivência e segurança, tendo que migrar de seu país de origem em decorrência de fatores que tornaram insustentáveis sua estadia nele, considerar-se-á um refugiado.
Cada país possui responsabilidade quanto a preservação da paz social e coexistência pacífica de seus indivíduos, devendo velar pela repressão de qualquer tipo de perseguição que exponham seus integrantes a situações incompatíveis com a vida em sentido amplo, bem como à vida digna.
Países como a Síria, Iraque e vários outros são os maiores geradores de refugiados do mundo, tendo em vista a situação de total calamidade que se estabelece diariamente em suas sociedades. Guerras, conflitos terroristas, intolerâncias de todas as formas, especialmente religiosa, no caso do oriente médio, faz com que milhares de pessoas, em situação de desespero, com vias a buscar a sobrevivência, se aventurem em rotas extremamente perigosas, sem nenhuma segurança.
O estado de necessidade que essas pessoas vivem diariamente, faz com que o grau de vulnerabilidade que se sobrepõe a elas, se localize em um patamar mais elevado que o próprio tráfico internacional de pessoas de forma geral.
Primeiramente, o desespero dessas pessoas que estão em busca de saírem das guerras e conflitos localizados faz com que elas se arrisquem a tomar medidas extremas, como se aventurar em alto mar e em rotas desconhecidas, além de se submeterem a situações desumanas para que consigam alcançar seus objetivos.
De outro lado, a vulnerabilidade é a palavra-chave do tráfico internacional de pessoas, vez que, a maior incidência de casos, são provenientes de lugares, regiões e até mesmo de comunidades em que as pessoas estão sob essa situação.
A fórmula do tráfico de refugiados é a soma desses dois fatores: desespero social pautado pela ânsia de sobrevivência e segurança em conjunção com a transformação dessas pessoas em alvos fáceis para os traficantes, em decorrência dessa situação subjetiva (vulnerabilidade).
Alguns fatores objetivos, agem de forma a demonstrar a dificuldade em estabelecer um controle adequado das transições, chegadas e partidas de refugiados, como por exemplo, a carência de sistemas organizacionais gerais e regionais, capazes de realizar um policiamento eficaz. Em 2017, a ACNUR liberou dados que demonstram a quantidade de refugiados, que estão e que não estão sob seus cuidados, sendo que, só no período 2016-2017, foram registrados mais de 65,5 milhões de refugiados, que destes, cerca de 22,5 milhões estão cadastrados, e apenas 17,2 milhões, dentro do segundo valor, estão sob sua responsabilidade. (ACNUR, 2017)
Dito isso, o questionamento paira sobre o restante desses números, vez que, a grande maioria não possui nenhum controle de segurança e nenhuma vigilância, estando sujeitos a todas as adversidades de uma sociedade doente e capitalizada, como por exemplo, o próprio tráfico de pessoas.
O tráfico internacional de pessoas de uma forma geral, não é prática recente, conforme já mencionado, por sua vez o tráfico internacional de refugiados é fenômeno recente, sendo uma prática ainda carecedora de muitas atenções especialmente em reuniões internacionais.
Apesar de diversas iniciativas, até mesmo por parte de órgãos especializados, como a UNODC, o tráfico de uma forma geral é marcado por uma substância que define sua essência, e é exatamente a descoberta dessa substância que daria mais respaldo para identificação dos pontos certos a se combater.
4. A visão dos Direitos Humanos acerca do tráfico internacional de refugiados
Os direitos humanos são marcados por diversas características, como universalidade, essencialidade, irrenunciabilidade, dentre várias outras que todo ser humano é merecedor, além de merecer verem esses direitos respeitados pelos demais.
A base de todo ordenamento jurídico é a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental incrustado na essência de cada pessoa, sendo que, tal valor espiritual possui uma estrita relação com os direitos humanos, sendo que este não praticamente não “existiria” sem aquele. A universalidade dos direitos humanos faz dele, em uma perspectiva geral, tutor dos valores mais básicos e imprescindíveis para que todo ser humano tenha sua dignidade resguardada. Assim dispõe Benevides:
“(…) o que significa discutir direitos humanos como um “tema global”? Significa, no plano das ideias, a adesão a um campo comum de valores que – independentemente de quaisquer variáveis, individuais ou coletivas, decorrentes de sexo, raça, etnia, nacionalidade, religião, nível de instrução, julgamento moral, opção política e classe social – definem a humanidade, a dignidade de todo ser humano.” (BENEVIDES; 1994, p. 181)
A humanidade de uma forma geral sempre criou regras e normas a serem seguidas especificamente por seus Estados, vindo através da necessidade de se manter relações internacionais, a criar normas que regulamentassem as relações jurídicas e condutas, no sistema internacional. Organizações como a OIT (Organização Internacional do Trabalho), OMC (Organização Mundial do Comércio), foram criadas com este intuito, regulamentando as relações interestatais no contexto internacional, de forma especializada, tratando de assuntos como trabalho e comércio, respectivamente.
Ocorre que, antes mesmo dessas organizações surgirem, via-se a necessidade de existir um conjunto de regras essenciais que protegem os ser humano, enquanto gente, enquanto povo e enquanto cidadão. Tal rol normativo foi aprovado logo após a revolução francesa, com a incorporação no seio da Constituição Francesa de 1791, da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, dando abertura para começar a se discutir sobre direitos humanos.
Considerando que a dignidade da pessoa humana é valor imprescindível para os direitos humanos, deve-se tecer algumas considerações sobre este valor, tais como características básicas deste.
A proteção age de forma a tutelar os direitos básicos daqueles que possuem autonomia de vontade e podem mover esforços para resguardar seus direitos, bem como os direitos básicos daqueles que não conseguem por conta própria possuir autodeterminação suficiente, que lhes dê capacidade de velar pela proteção de seus direitos.
Lado outro temos a dignidade da pessoa humana vista como tarefa, vez que, a preservação desta é dever do Estado, bem como de todos os cidadãos, que de forma altruísta é merecedor de respeito.
“A dignidade é protetiva e promocional. É protetiva no sentido de garantir a todo ser humano um tratamento respeitável, não degradante, tutelando a sua integridade psicofísica. É promocional, no sentido de viabilizar as condições de vida para que uma pessoa adquira a sua liberdade e possa projetar a direção que queira conceder a sua existência.” (FARIAS; 2017, p.39)
O tráfico internacional de pessoas, bem como o de refugiados, agride e lesiona diversos direitos fundamentais ligados à dignidade da pessoa humana, como o direito a integridade física, violado pela exploração sexual, laboral; o direito a integridade psíquica; o direito a liberdade, visto que, uma grande maioria de pessoas traficadas é mantida em cativeiro; o direito a segurança, violado pelo repressão ao sentimento de tranquilidade; o direito de propriedade, que cada pessoa possui em relação ao seu próprio corpo; o direito a própria autonomia de vontade, que segundo Kant é pressuposto essencial de uma pessoa, para que esta possua dignidade, dentre vários outros.
O tráfico humano, bem como o de refugiados é prática desumana que retira do homem toda sua dignidade, tratando-o como objeto, coisificando e instrumentalizando-o. Diante disso, os direitos humanos, e quando se refere a estes, quer-se dizer organizações internacionais e a ONU, movidos pela defesa desses direitos, tentam atuar em três momentos, no que se refere ao tráfico de refugidos:
Em um primeiro momento, a ação se concentra nos países de origem dessas pessoas, antes destas migrarem, agindo de duas formas: repressivamente quanto ao Estado, que tem a obrigação de zelar pela segurança, dignidade, coexistência pacífica, de todos os seus indivíduos, para evitar a migração; e preventivamente, para proteger e dar apoio para àqueles que estão ingressando em rotas de fuga para outros países, tentando policiar ao máximo essa transição.
De outro lado, as ações das organizações internacionais, incidem no momento da transição, de forma a proteger as pessoas que estão migrando, tentando dar o máximo de segurança a estas pessoas, bem como, agem repressivamente, de forma a vigiar todos os atos suspeitos de tráfico, buscando identificar e prender eventuais traficantes de pessoas.
Em um terceiro momento, os direitos humanos agem nos países receptores desses imigrantes, com vias a dar a estas pessoas o mínimo existencial, regulamentando a estadia destas no país receptor, de forma a evitar confrontos entre esses imigrantes e o povo de origem do país. Agem de forma a devolver-lhes a dignidade que lhes fora tirada diante das condições que tiveram de se submeter, bem como, cautelosamente sobre questões culturais, para evitar o choque de identidade desses povos ao ingressarem em um novo país.
Os direitos humanos também atuam de forma a recuperar ao máximo as pessoas que foram vítimas do tráfico humano, de humilhações, de pessoas que as colocaram em uma situação desumana e degradante, tentando também devolver essas pessoas aos seus países de origem, e se não puderem e nem quiserem voltar, como no caso dos refugiados, tentar colocá-las em um outro lugar, que será compatível com o estabelecimento de uma vida digna.
Conclusão
O tráfico internacional de refugiados é prática recente que carece de muitas medidas que visem a proteção dos direitos básicos destas pessoas. Iniciativas internacionais como a UN.GIFT e organizações como a UNODC e ACNUR agem de forma a reprimir máximo essas práticas, no entanto enfrentam muitas dificuldades relacionadas a questões regionais e até mesmo estatais, vez que, muitos Estados são omissos quanto a prática, além de, muitas vezes dificultarem a introdução de iniciativas em seu seio.
A situação de vulnerabilidade que se encontram os refugiados fazem deles alvos fáceis de traficantes que almejam lucrar com a exploração sexual, laboral e até mesmo com a extração de órgãos para a venda no mercado negro.
Tal prática desumana, viola enormemente a dignidade da pessoa humana, tendo em vista que, submete essas pessoas às condições mais insustentáveis e degradantes, humilhando-as de forma imensurável, retirando dessas pessoas a própria identidade.
A busca por combater essa atividade ainda é muito extensa e demorada, necessitando de várias medidas de cooperação entre os Estados Soberanos, com vias a defesa dos direitos humanos, tendo em vista que, esses são universais e essenciais, fazendo de tal prática não só violadora desses direitos em um determinado país, pois ainda que seja visualizada de forma recorrente em alguns deles, é cabalmente uma agressão a toda a humanidade.
Nota
Informações Sobre os Autores
Queila Paula Rosa
Graduada em História pela Universidade de Patos de Minas – UNIPAM e acadêmica do 6º período do curso de direito da Faculdade do Noroeste de Minas – FINOM
Carlos Henrique Costa Tavares
Acadêmico de Direito na Faculdade do Noroeste de Minas – FINOM