Sim, é possível fazer um acordo com a empresa no âmbito do direito trabalhista, tanto durante o contrato de trabalho quanto na rescisão contratual. Esses acordos podem envolver diferentes temas: jornada, férias, banco de horas, rescisão do contrato, pagamento de verbas, entre outros. A legislação brasileira, especialmente após a Reforma Trabalhista de 2017, passou a permitir acordos com maior flexibilidade, inclusive na demissão por acordo mútuo, desde que respeitados os direitos mínimos do trabalhador e que não haja vício de consentimento, coação ou fraude.
Neste artigo completo, vamos explicar passo a passo como fazer um acordo com a empresa de forma segura, legal e válida, quais são os tipos de acordos possíveis, quando eles podem ser feitos, quais cuidados o trabalhador deve ter, o que diz a CLT sobre o tema, como formalizar esses acordos e em que situações é melhor buscar auxílio jurídico. Também incluiremos exemplos práticos, dúvidas frequentes e uma conclusão com os principais pontos.
O que é um acordo trabalhista
Acordo trabalhista é qualquer entendimento formalizado entre empregado e empregador que tenha como objetivo definir regras sobre o contrato de trabalho ou suas consequências, de forma consensual. Esses acordos precisam respeitar a legislação vigente, inclusive os direitos constitucionais e os limites impostos pela CLT.
Existem dois grandes tipos de acordo:
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Acordo durante a vigência do contrato: altera condições de trabalho, jornada, salário variável, escalas, banco de horas, antecipação de férias, etc.
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Acordo na rescisão do contrato: define forma de desligamento, pagamento de verbas, quitação geral ou parcial, dispensa em comum acordo, entre outros.
O acordo deve refletir a vontade real das partes, ser documentado de forma clara e, de preferência, contar com assistência sindical ou judicial, especialmente nos casos que envolvam renúncia de direitos.
Quais são os tipos de acordo permitidos na legislação
A legislação permite diversos tipos de acordos entre empregado e empregador. Veja os principais:
Acordo para demissão por comum acordo (Art. 484-A da CLT)
Criado pela Reforma Trabalhista de 2017, permite que empregador e empregado rescindam o contrato de trabalho por mútuo consentimento, com pagamento parcial das verbas rescisórias.
Direitos pagos nesse tipo de acordo:
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Metade do aviso prévio (se indenizado)
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Metade da multa do FGTS (20%)
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Saldo de salário
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Férias vencidas + 1/3
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Férias proporcionais + 1/3
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13º salário proporcional
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Saque de até 80% do FGTS
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Sem direito ao seguro-desemprego
Esse tipo de acordo deve ser feito por escrito, de forma clara, e pode ser homologado no sindicato ou por advogado particular.
Acordo extrajudicial homologado no Judiciário (Art. 855-B da CLT)
Acordo formalizado entre empregado e empregador após o encerramento da relação de trabalho, com pedido conjunto à Justiça do Trabalho para homologação. Serve para dar validade judicial ao acordo e evitar futuras ações.
Características:
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Ambas as partes apresentam o acordo em petição conjunta
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Juiz analisa e pode homologar ou não
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O processo tem natureza voluntária (não contenciosa)
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As partes podem estar assistidas por advogados diferentes
Esse tipo de acordo resguarda a empresa contra futuras ações e garante segurança jurídica ao trabalhador, desde que os direitos mínimos tenham sido respeitados.
Acordo para compensação de horas ou banco de horas
É possível ajustar a jornada mediante acordo individual ou coletivo, criando um banco de horas. Nessa modalidade:
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As horas extras podem ser compensadas com folgas
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A compensação deve ocorrer no prazo de até 6 meses (se acordo individual)
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O banco de horas pode ser anual (se firmado por convenção coletiva)
Esse tipo de acordo precisa estar por escrito, com controle de jornada e registros em folha.
Acordo para redução de jornada e salário (medidas emergenciais)
Durante situações excepcionais, como a pandemia de COVID-19, o governo federal permitiu a redução de jornada e salário mediante acordo individual, com compensações por parte do governo. Esses acordos são permitidos por medida provisória ou lei específica em situações emergenciais.
Acordo para quitação de verbas após ação judicial
Durante o curso de uma ação trabalhista, empregado e empregador podem fazer acordo para encerrar o processo. Esse acordo pode ser:
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Total: encerra todo o processo, com pagamento acordado
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Parcial: encerra parte dos pedidos, mantendo outros em discussão
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Parcelado: pode prever pagamento em prestações, desde que com multa em caso de descumprimento
O juiz precisa homologar o acordo para que ele tenha força de sentença. Após a homologação, o processo é arquivado.
Acordo individual sobre temas permitidos pela Reforma Trabalhista
A Reforma Trabalhista permitiu que acordos individuais entre empresa e empregado prevaleçam sobre convenções coletivas em certos assuntos, como:
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Plano de cargos e salários
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Trabalho intermitente
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Teletrabalho
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Intervalo intrajornada (mínimo de 30 minutos)
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Banco de horas (até 6 meses)
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Compensação de jornada
Esses acordos devem ser documentados por escrito e, se possível, acompanhados por advogado.
Cuidados que o trabalhador deve ter ao fazer um acordo com a empresa
Antes de assinar qualquer acordo, é fundamental observar os seguintes cuidados:
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Leia o documento com atenção: jamais assine um acordo sem entender todos os termos.
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Não abra mão de direitos essenciais: salário, FGTS, férias, 13º, entre outros, são indisponíveis.
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Peça cópia do acordo assinado: mantenha o documento em arquivo pessoal.
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Consulte um advogado trabalhista: especialmente se houver dúvida sobre os termos ou risco de prejuízo.
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Evite acordos verbais: exigem prova e podem gerar problemas futuros.
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Exija formalização por escrito: com datas, valores, cláusulas claras e assinaturas de ambas as partes.
Como fazer um acordo de demissão com a empresa
Se o empregado e a empresa desejam encerrar o contrato de trabalho por comum acordo, o procedimento ideal é:
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Conversar abertamente com o setor de RH ou com o empregador
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Formalizar por escrito a intenção de rescisão mútua
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Detalhar no acordo os valores devidos, datas de pagamento e forma de cálculo
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Assinar o documento com testemunhas (opcional) ou assistência de advogado
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Solicitar ao RH que o termo de rescisão especifique que se trata de art. 484-A da CLT
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Realizar o pagamento das verbas em até 10 dias corridos após o fim do contrato
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Entregar guias de FGTS e a chave de movimentação para saque de até 80%
O acordo não exige homologação sindical, mas a presença de advogado é recomendada.
Como fazer um acordo judicial ou extrajudicial com validade legal
Caso o contrato já tenha sido encerrado, e as partes queiram formalizar um acordo para pagamento de verbas ou quitação de obrigações, é possível seguir dois caminhos:
1. Acordo extrajudicial (art. 855-B da CLT)
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Contratar advogados distintos para cada parte
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Redigir petição com os termos do acordo e assinar
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Ingressar com pedido conjunto na Justiça do Trabalho
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Aguardar a homologação judicial (prazo médio de 10 a 30 dias)
2. Acordo em processo trabalhista
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Durante uma audiência ou por petição
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Propor pagamento de valores, com renúncia parcial ou total de pedidos
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O juiz homologa e encerra o processo
Esses acordos devem sempre respeitar os direitos mínimos assegurados pela CLT, salvo se o juiz entender que há abuso ou desvantagem excessiva.
Exemplo prático: acordo por comum acordo
Situação: João trabalha há 3 anos em uma empresa, mas deseja sair por razões pessoais. A empresa não quer demiti-lo, e ele não quer pedir demissão, pois perderia direitos. Eles optam por uma rescisão por comum acordo.
Procedimento:
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RH prepara termo de rescisão com base no art. 484-A da CLT
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João recebe saldo de salário, férias vencidas e proporcionais, 13º proporcional, 50% do aviso prévio e 20% da multa do FGTS
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João pode sacar 80% do saldo do FGTS, mas não tem direito ao seguro-desemprego
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Ambos assinam o termo
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A empresa paga as verbas dentro do prazo legal
O procedimento é legal, vantajoso para as partes e evita futuras disputas.
Perguntas e respostas
É legal fazer acordo para o trabalhador abrir mão do FGTS?
Não. FGTS é direito indisponível. Nenhum acordo pode excluir esse pagamento, sob pena de nulidade.
Posso ser demitido por acordo e ainda assim sacar o seguro-desemprego?
Não. No acordo de rescisão do art. 484-A da CLT, o trabalhador não tem direito ao seguro-desemprego.
É necessário ter advogado para fazer um acordo?
Não é obrigatório, mas é fortemente recomendado, especialmente em acordos extrajudiciais ou que envolvam renúncia de valores.
Posso fazer acordo para receber minhas verbas em parcelas?
Sim, desde que isso esteja registrado no acordo e o pagamento seja homologado judicialmente, com cláusula penal em caso de atraso.
Empregador pode forçar o trabalhador a assinar acordo?
Não. Qualquer tipo de coação anula o acordo. É direito do trabalhador recusar e acionar a Justiça se for pressionado.
Posso fazer um acordo e depois entrar com ação na Justiça?
Depende. Se o acordo for judicial ou extrajudicial homologado, e contiver quitação geral, é mais difícil reverter. Se o acordo for informal ou incompleto, pode haver espaço para ação posterior.
É possível fazer acordo verbal com a empresa?
Pode até ser feito, mas não é recomendável, pois será difícil provar os termos caso surja um litígio.
Acordo por comum acordo conta para aposentadoria?
Sim. O tempo de contribuição e o FGTS depositado continuam valendo normalmente para fins previdenciários.
O acordo extrajudicial pode ser negado pelo juiz?
Sim. O juiz pode recusar a homologação se verificar fraude, coação ou prejuízo evidente ao trabalhador.
O sindicato precisa participar do acordo?
A Reforma Trabalhista retirou a obrigatoriedade de homologação no sindicato, exceto onde houver convenção coletiva exigindo.
Conclusão
Fazer um acordo com a empresa é uma alternativa válida e eficaz para resolver questões trabalhistas de forma consensual, rápida e menos conflituosa. A legislação brasileira, especialmente com a Reforma Trabalhista, ampliou as possibilidades de acordos diretos entre empregado e empregador, tanto durante quanto após o vínculo de trabalho.
Entretanto, é essencial que o trabalhador tenha plena ciência dos seus direitos, leia com atenção os documentos que assina e, sempre que possível, conte com a orientação de um advogado. Acordos mal redigidos ou feitos sob pressão podem gerar prejuízos irreparáveis ou dificultar ações futuras.
Acordos bem formulados ajudam a garantir segurança jurídica, evitam litígios e proporcionam soluções adequadas para ambas as partes. Respeito, clareza, legalidade e equilíbrio são as palavras-chave de qualquer bom acordo trabalhista.