Você pode protestar uma nota promissória para exigir o pagamento de forma rápida, pública e com reforço jurídico, desde que apresente o título original a um cartório de protesto competente, dentro do prazo prescricional e acompanhando todos os dados do devedor. A lavratura do protesto gera prova qualificada da mora, interrompe a prescrição, possibilita execução cambial mais célere e insere o nome do devedor em bancos de dados de inadimplentes até que a dívida seja quitada ou o protesto seja cancelado. A seguir, em cerca de 3 500 palavras, explico cada passo do procedimento, requisitos formais, prazos, custos, consequências práticas, formas de defesa, jurisprudência relevante e dicas de boas práticas para credores e devedores.
Conceito e finalidade do protesto
O protesto é um ato público e formal, praticado por tabelião de protesto de títulos, destinado a provar o atraso no pagamento ou aceite de títulos de crédito e outros documentos de dívida. Previsto na Lei 9.492/1997, ele serve para:
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constituir o devedor em mora;
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interromper a prescrição dos direitos cambiais;
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permitir a execução judicial do título sem mais discussão de causa;
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dar ciência pública do débito, dificultando crédito ao inadimplente;
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resguardar direitos contra coobrigados, avalistas e endossantes.
A nota promissória, título de crédito regulado pelo Decreto 2.044/1908 e compatibilizado com a Lei 14.195/2021, é ordem de pagamento emitida pelo próprio devedor (subscritor) em favor do credor (tomador), prometendo pagar valor certo em data determinada. Por ser típico título de crédito, admite protesto.
Requisitos de validade da nota promissória
Um cartório só pode aceitar para protesto a nota promissória que contenha todos os requisitos essenciais listados no art. 75 do Decreto 2.044/1908:
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Denominação “nota promissória” ou expressão equivalente no idioma do título;
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Promessa de pagar quantia certa e em dinheiro;
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Nome da pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga (tomador);
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Data de vencimento (ou indicação “à vista”, “a prazo” etc.);
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Lugar de pagamento;
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Data e lugar de emissão;
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Assinatura do emitente (subscritor).
Se faltar qualquer desses requisitos — exceto lugar de pagamento ou de emissão, que a lei supre de forma presumida — o cartório recusará o protocolo.
Prazo de apresentação e prescrição cambial
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Notas à vista: apresentáveis em até 1 ano contado da data de emissão; protesto por falta de pagamento pode ser feito dentro do mesmo prazo.
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Notas a certo prazo da vista: apresenta-se primeiro para aceite; após o vencimento (prazo anotado no próprio título) conta-se 3 anos para execução cambial.
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Notas a dia certo: vencem no dia fixado; inicia-se então prazo de 3 anos para execução cambial (art. 70 da Lei Uniforme).
O protesto deve ocorrer durante o prazo cambial: se o título prescrever, só resta ação monitória baseada em prova escrita, muito mais lenta. Ainda assim, muitos cartórios aceitam protesto até 5 anos do vencimento em notas não prescritas civilmente; verifique norma estadual.
Competência territorial e escolha do cartório
A Lei 9.492/1997 determina que o protesto seja lavrado:
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no domicílio do devedor; ou
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no lugar de pagamento indicado na nota.
Você pode escolher qualquer cartório de protesto dentro do município competente. Para títulos eletrônicos, use a Central de Remessa de Arquivos (CRA) da sua junta comercial ou entidade conveniada.
Documentos para protocolar o protesto
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Nota promissória original (ou duplicata de apresentação, para títulos eletrônicos);
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Requerimento preenchido com: dados do credor, devedor, CPF/CNPJ, endereço, valor atualizado, data de vencimento;
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Cópia de documento de identidade do apresentante (pessoa física) ou carta de preposto com firma reconhecida (pessoa jurídica);
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Comprovante de endereço do devedor, se disponível (facilita intimação);
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Procuração, caso o apresentante seja advogado ou despachante.
Passo a passo no cartório
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Protocolo: apresente o título e os documentos. O tabelião confere autenticidade visual, registra dados em sistema e calcula custas.
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Intimação: em até três dias úteis, o cartório expede intimação ao devedor no endereço indicado ou localizado em bancos de dados. Pode ser pessoal, postal com AR, e-mail certificado ou edital.
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Prazo legal: o devedor tem três dias úteis para pagar ou apresentar prova de quitação.
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Pagamento em cartório: se quitar, o cartório repassa o valor ao credor (TED ou cheque administrativo), descontadas custas; o protesto não é lavrado.
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Recusa ou silêncio: se não houver pagamento, o tabelião lavra o protesto, registra informações, emite certidão e comunica entes de proteção ao crédito (Serasa, SPC, Central Nacional de Protesto).
Custos e emolumentos
Os valores variam por estado, regulados por leis estaduais e corrigidos anualmente. Exemplo (São Paulo/2025):
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Títulos até R$ 432,00: taxa fixa de R$ 36,20;
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De R$ 432,01 a R$ 2 170,00: R$ 36,20 + 1,10% do excedente;
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Acima de R$ 2 170,00: teto de R$ 156,00 + R$ 1,50 por R$ 1 000.
Custas são pagas inicialmente pelo credor, mas reembolsadas se o devedor quitar no prazo. Nos protestos eletrônicos via CRA, as custas baixam até 30%.
Consequências jurídicas do protesto
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Constituição em mora: art. 42 da Lei 9.492/1997.
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Interrupção da prescrição: reinicia contagem dos prazos cambiais.
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Execução imediata: com protesto e nota original, você ajuíza ação de execução de título extrajudicial (art. 784, I, do CPC).
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Responsabilidade solidária de avalistas: protesto dispensa intimação direta de avalista.
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Negativações: cartório informa Birôs de crédito; devedor terá restrição até cancelamento.
Protesto por caixa postal não localizada
Se o devedor não for encontrado, o cartório publicará edital em mídia local ou em seu site, contando-se o prazo da intimação da data da publicação. A jurisprudência entende ser suficiente para validade do protesto.
Protesto parcial
Admite-se quando o devedor paga parte do valor antes da lavratura ou quando o título é avaliado em moeda estrangeira e parte já foi convertida. O cartório registra o saldo.
Sustação e cancelamento
Sustação (liminar)
O devedor, alegando ilegalidade ou abuso (ex.: nota paga, duplicidade), pode ingressar com pedido de tutela inibitória junto ao juiz de direito, apresentando caução. O juízo oficia o cartório, que “congela” o protesto por até 30 dias (prorrogáveis).
Cancelamento definitivo
Após pagamento, acordo ou decisão, é necessário:
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Declarar “pago” no verso da nota promissória e reconhecer firma do credor; ou
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Apresentar carta de anuência do credor com firma reconhecida; ou
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Juntar certidão judicial com a determinação de cancelamento.
O devedor paga taxas de cancelamento (cerca de 50% das custas iniciais). O cartório comunica automaticamente aos birôs.
Responsabilidade do tabelião
Se protestar título prescrito, falsificado ou sem requisitos, o tabelião pode responder civilmente por perdas e danos, além de processo administrativo na Corregedoria (art. 38, §1.º, Lei 8.935/1994). Entretanto, a lei presume boa-fé do apresentante; o tabelião não examina causa subjacente.
Danos morais por protesto indevido
STJ pacificou: cabe indenização se protesto de dívida inexistente ou já paga (Súmula 385). A jurisprudência fixa valores entre R$ 5 000 e R$ 20 000, minorados se já houver anotações negativas válidas.
Protesto eletrônico via CRA
Empresas podem remeter lote de notas promissórias digitalizadas ou emitidas eletronicamente:
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Gera arquivo-padrão (layout Febraban CNAB 400 ou 240).
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Envia à Central de Remessa de Arquivos estadual via certificação digital ICP-Brasil.
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Cartórios recebem, distribuem e processam em 24 h, enviando retorno de andamento.
Isso reduz custo logístico e agiliza intimações. Para microempresas, existem plataformas de protesto digital simplificado.
Protesto de nota promissória sem vencimento certo
Se o título indica “a vista” ou “pagável sob apresentação”, o credor deve apresentá-lo ao devedor; se não pagar, protestar dentro de um ano da emissão. Cartórios exigem declaração de apresentação infrutífera, mas muitos aceitam apresentação simultânea no balcão.
Nota promissória prescrita: ação monitória
Se o prazo de 3 anos expirar, a nota perde a “força executiva”, mas ainda vale como prova escrita. O credor ingressa com ação monitória (art. 700 CPC) em até 5 anos do vencimento. Não se faz protesto; usa-se certidão de distribuição para pressionar.
Boas práticas do credor
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Exija assinatura de avalista e autorização para protesto no verso.
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Guarde comprovantes de entrega de mercadorias ou contratos vinculados.
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Atualize endereço do devedor na nota ou no requerimento (evita nulidade de intimação).
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Utilize protesto eletrônico para volume alto.
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Após pagamento, forneça carta de anuência em até 10 dias úteis (art. 26 Lei 9.492/97) para evitar multa.
Estratégias de defesa do devedor
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Negociar pagamento direto com o cartório: paga-se valor principal + custas, obtém cancelamento imediato;
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Verificar se a nota contém vícios formais (assinatura, valor em algarismos e extenso divergentes);
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Alegar prescrição em sustação judicial, juntando cálculo de prazos;
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Propor consignação em pagamento se há controvérsia de valor;
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Pleitear dano moral só se demonstrar inexistência da dívida.
Comparativo protesto x execução direta
| Critério | Protesto | Execução direta |
|—|—|—|
| Custo inicial | baixo (custas cartorárias) | alto (custas judiciais 1% a 2%) |
| Tempo para resultado | 3-5 dias para protesto | 30-90 dias para citação |
| Impacto reputacional | alto | médio |
| Necessidade de advogado | não | sim |
| Prescrição | interrompe e reinicia | conta prazo já corrido |
Usar o protesto antes da ação executiva é considerado “etapa saudável” de cobrança, ainda que não obrigatório.
Jurisprudência recente
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STJ, AgInt no AREsp 1.996.456/RS (2024): protesto de nota prescrita configura ato ilícito, gera dano moral presumido.
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TJ-SP, Ap. Cív. 101XXXX-07.2023: cartório responde solidariamente por protesto de nota falsificada se não exigir assinatura reconhecida.
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STJ, AgInt no REsp 1.612.834/DF: avalista responde pelo protesto ainda que não tenha sido intimado; intimação de um coobrigado aproveita aos demais.
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TJRJ, Ap. Cív. 002XXXX-36.2022: protesto eletrônico é válido mesmo sem apresentação física do título, desde que certificado digital assegure integridade.
Perguntas e respostas
Qual o prazo máximo para protestar uma nota promissória vencida em 10/02/2024?
Três anos após o vencimento: até 10/02/2027 para execução e protesto.
Perdi o original. Posso protestar cópia autenticada?
Não. Precisa do original. Se houver extravio, ajuíze ação de revalidação de título para emitir segunda via judicial.
Avalista pode pagar direto no cartório e se exonerar?
Sim. Quem paga recebe o título quitado e pode buscar regresso contra o devedor principal.
Cartório me intimou e eu paguei, mas protesto apareceu no Serasa. E agora?
Solicite certidão de pagamento e protocole reclamação; o cartório deve regularizar bancos de dados em 5 dias úteis.
Dá para protestar nota promissória emitida no exterior?
Sim, desde que cumpridos requisitos formais e tradução juramentada; competência no domicílio do devedor no Brasil.
O cartório pode protestar com endereço errado?
Sim, se não houver outro endereço; a intimação por edital supre ausência, mas devedor pode discutir nulidade se provar má-fé.
Quanto tempo o protesto fica ativo?
Indeterminado até cancelamento; birôs privados mantêm registro por 5 anos se não houver baixa.
Pessoa jurídica pode obter justiça gratuita para sustar protesto?
Somente se comprovar hipossuficiência financeira.
Posso protestar só para fins de garantia sem exigir pagamento imediato?
Sim. Protesto facultativo dispensa prova do vencimento, mas não gera execução se a dívida não venceu.
Título vinculado a contrato com cláusula compromissória ainda pode ser protestado?
Pode. A cláusula arbitral não impede protesto extrajudicial; discussão de mérito corre na arbitragem.
Conclusão
Protestar uma nota promissória é procedimento poderoso e econômico para credores que desejam pressionar devedores, interromper prescrição e pavimentar caminho para execução. Ao seguir rigorosamente os requisitos formais — posse do título original, observância dos prazos cambiais, escolha do cartório territorialmente competente e correta identificação das partes — o credor obtém instrumento robusto, respeitado pelos tribunais. Devedores, por sua vez, devem reagir prontamente: pagar, negociar, demonstrar quitação ou buscar sustação judicial se houver abuso. O protesto, longe de ser mera burocracia cartorária, é peça central no sistema de crédito brasileiro, equilibrando celeridade extrajudicial com segurança jurídica. Conhecer seus meandros, custos, prazos e efeitos é essencial para qualquer pessoa ou empresa que lida com títulos de crédito, seja para receber com eficiência, seja para defender-se de cobranças indevidas.