Considerações sobre a teoria geral do processo com enfoque no novo Código de Processo Civil Brasileiro

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Resumo: O texto aborda didaticamente a teoria geral do processo pela visão do novo CPC que aguarda a sanção presidencial. Há alterações sensíveis sobre o conceito de imparcialidade do juiz, a participação das partes e, ainda, sobre a finalidade do processo e métodos de interpretação das normas processuais e de composição da lide. Enfim, o vindouro CPC é um diploma neoprocessualista.

Palavras-chaves: Teoria Geral do Processo. Direito Processual Brasileiro. Doutrina contemporânea. Novo Código de Processo Civil. Neoprocessualismo.

Résumé: Le texte aborde didactique la théorie générale du processus par le nouveau CPC de vision en attente d'approbation présidentielle. Il ya des changements importants sur le concept de l'impartialité du juge, la participation des parties et aussi sur la finalité du processus et méthodes d'interprétation des règles de procédure et la composition du différend. Enfin, la venue PCC est un diplôme neoprocessualiste.

Mots-clés: Théorie générale du processus. Dollars droit procédural. Doctrine contemporaine. Nouveau Code de procédure civile. Neoprocessualismo.

A Constituição Federal Brasileira vigente é o ponto de partida para a compreensão mais adequada da essência do processo civil[1]. Está nas normas constitucionais onde se pode extrair a finalidade e a forma do processo em um Estado Democrático de Direito.

Especificamente do Processo Civil, isso significa que as normas do CPC ou da legislação processual extravagante, como um todo, somente podem ser satisfatoriamente integradas e interpretadas com atenção e observância às normas constitucionais (que não se bastam isoladamente). Enfim, é a própria Lei Fundamental que orienta todo o dever-ser do processo e de todos os seus temas e institutos.

Os princípios constitucionais representam o núcleo do sistema jurídico e orientada toda a lógica mínima do processo. Dentro os principais princípios, tradicionalmente classificados pela doutrina como fundamentais, encontram-se o do acesso à justiça, do devido processo legal, do contraditório, da isonomia, da ampla defesa, do juiz natural, da publicidade, da motivação das decisões, da vedação de provas ilícitas ou obtidas por meios ilícitos, da assistência integral e gratuita aos necessitados, da duração razoável e da efetividade do processo[2].

Para os procedimentos jurisdicionalmente diferenciados entendemos aqueles necessários a atender situações diferenciadas, como é o caso do mandado de segurança (Lei 12.016/2009), da ação direta de inconstitucionalidade, da súmula vinculante, do regime precatório, entre outros.

O Direito Processual[3] é ramo do direito público e, é composto de princípios e normas que regulam a jurisdição, a ação e o processo. Tanto que já fora chamado outrora de Direito Jurisdicional.

A jurisdição como atividade estatal de aplicação do Direito aos casos submetidos à apreciação do Judiciário; a ação como direito subjetivo público que dá acesso à justiça, seus pressupostos e consequências do exercício do direito de ação; e o processo que corresponde pelo qual a parte pede justiça e o Estado dela se desincumba.
Eis, portanto, a famosa trilogia do direito processual[4]. As normas processuais tratam dos institutos da ação, da jurisdição e do processo e seus consectários. Ao regular a jurisdição[5], enfoca-se a competência que é a repartição daquela função e, a coisa julgada que representa a imutabilidade o seu resultado. As normas que versam sobre a competência e a coisa julgada são, portanto, normas processuais.

Por sua vez ação implica na análise de sua bilateralidade por meio de defesa, da existência de pressupostos processuais e de sujeitos que devem manejá-la preenchendo todos os requisitos necessários para se obter a decisão de mérito.

Por derradeiro, o processo que corresponde ao instrumento veiculador da pretensão das partes e da solução judicial do processo que em parêmia com a vida, que tem início, meio e fim. Portanto, forma-se, desenvolve-se, suspende-se, e, por fim, extingue-se.

O processo possui sentido genérico, a teoria do processo[6] é comum apesar de que o objeto é dividido em três grandes grupos: o penal, o civil e o especial. O processo penal versa sobre o conflito entre o Estado e o réu, sustentando aquele uma pretensão punitiva e o último uma pretensão de liberdade. Tal campo é ocupado pela lide penal.

Curial é frisar que o processo não é penal ou civil, o que se cuida é das lides, como por exemplo, as lides especiais tais como as trabalhistas, eleitorais e penal-militares.

A nomenclatura “direito processual” é relativamente pacífica no estudo das ciências jurídicas embora até o momento se registre os doutrinadores que surgiram outras denominações.

É ramo jurídico que goza de plena autonomia e tem como finalidade disciplinar a forma em que o Estado (em sentido lato) presta a atividade jurisdicional por meio de um instrumento denominado processo, após ter sido provocado pelo litigante por meio do exercício do direito de ação.

O processo é, portanto, o instrumento pela qual o Estado presta a jurisdição[7] e que é regulado, desde o seu nascedouro até o seu encerramento por meio de normas que compõem o direito processual.

Porém, dependendo da matéria disciplinada, tal como penal, trabalhista, ou as demais, pode ocorrer a necessidade da disciplina mais específica para atender às peculiaridades de cada uma.

As normas processuais civis estão previstas no CPC, ou seja, a Lei 5.869/73, já as normas processuais penais estão previstas no CPP, ou seja, DL 3.689/41 e, dispõe o art. 3º que, diante de eventuais omissões, autoriza-se a interpretação extensiva e as normas processuais trabalhistas que se encontram compendiadas na CLT que, também permite a aplicação do CPC, como fonte subsidiária, conforme prevê o art. 769 da CLT.

Pois a importância ímpar do estudo do direito processual civil dentro da teoria geral do processo[8].

O tratamento dado ao processo pelos doutrinadores unitaristas, para os quais o processo é um só, tenha como pressuposto uma lide penal ou não penal, como afirmam os teóricos da Teoria Geral do Processo.

Por detrás das funções estatais há sempre o Estado e, ao fundo, a jurisdição de qualquer natureza está o processo como veículo que se apresenta a todos os sub-ramos as mesmas linhas mestras e postulados (é o pensamento, por exemplo, de Vicenzo Miceli, citado por Luiz Fux).

O Direito Processual é justamente, este conjunto de normas jurídicas que permitirão regular o início deste processo, bem como o seu desenvolvimento e encerramento.

Há de se entender e distinguir o direito material e o direito processual que constitui uma das formas de classificar os diversos ramos de Direito e das normas jurídicas.

O direito material em regra geral é constituído de regras jurídicas definindo o que é lícito e pode ser feito, e aquilo que é ilícito e não deve ser feito.

Em resumo, as normas de direito material[9] regulam as relações jurídicas em geral. Já as normas de direito processual, da forma como se fará a veiculação da pretensão, com o fito à solução da lide, têm conteúdo nitidamente vinculado àquilo que acontece em juízo, isto é, quando o litígio chega ao Judiciário.
Tais normas processuais proporcionam a criação, modificação e extinção de direitos e obrigações. A diferença entre as normas de direito material e as normas de direito processual, pois nas primeiras há disciplina das relações jurídicas travadas nos mais diversos âmbitos tais como familiar, negocial, empresarial, trabalhista e tributária. Ao passo que as normas processuais são disciplinadas os fenômenos endoprocessuais e a própria relação jurídica em que consiste o processo.

O relacionamento do direito material com o direito processual caracteriza-se pela instrumentalidade do segundo diante do primeiro, na medida em que o processo da materialidade à norma de direito material.

O direito material deve ser visto sob o prisma de sua própria finalidade, cuida apenas das relações jurídicas em que o cumprimento da norma se dá espontaneamente por aqueles que estejam a isso, obrigados seja por força de lei, seja em razão do contrato.

Vários critérios existem por meio dos quais é possível classificar as normas jurídicas em geral. Tal classificação nos facilita compreender o que seja o direito processual civil, é o que divide as regras jurídicas segundo o grau de obrigatoriedade que as caracteriza. Por tal critério podemos classificar as regras jurídicas em cogentes e dispositivas.

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São cogentes, imperativas ou de ordem pública, as normas jurídicas que se caracterizam pela circunstância de que devem ser cumpridas, sempre independentemente da escolha daquele que lhes deva cumprimento e, mesmo, independentemente da escolha daquele que em princípio será beneficiado por tal cumprimento.

Trata-se de regras inderrogáveis pela vontade das partes. Portanto, são cogentes as regras relativas ao casamento. Aqueles que pretendam casar devem necessariamente observar o conjunto de regras que disciplinam a matéria, não havendo qualquer possibilidade de dispor diferentemente do que prevê, a respeito, o comando imperativo da lei.

Já as normas facultativas, ou dispositivas, embora também devam ser cumpridas, podem ser afastadas, nos limites permitidos pela própria lei, pela vontade das partes.  Por exemplo: a rega relativa ao casamento prevê que, se não houver prévia manifestação de vontade em contrário, no sentido da escolha do regime de bens desejados por aqueles que vão se casar, o regime legal será o da comunhão parcial de bens prescrito no art. 1.640, caput do C.C de 2002.

De sorte que desejado o casal pela adoção de outro regime de bens poderão dispor por meio de pacto antenupcial, e optar por outro regime matrimonial de bens; lembrando-se que é possível a alteração mediante autorização judicial.

Quanto à natureza das posições subjetivas por estas geradas. À luz deste critério, é possível classificar as regras jurídicas como geradoras de deveres, que em sentido lato, inclui as obrigações, estado de sujeição e ônus.

O dever jurídico é imposição jurídica de se observar determinado comportamento ativo ou omissivo, passível de ser resguardada por sanção. Então é possível impor uma prestação positiva ou negativa.

E se distingue do estado de sujeição (contraface dos direitos potestativos[10]) e corresponde a simples submissão do sujeito a efeitos extintivos, modificativos ou constitutivos de direito que se produzam em sua esfera jurídica – independentemente de conduta sua.

Lembre-se que o dever jurídico é ditado em favor de interesse (titularizado pela coletividade, o Estado, um ou vários particulares etc.).

A obrigação em sentido técnico é apenas uma das categorias do dever jurídico, e a rigor se compõe de uma das quatro tradicionais categorias de relações jurídicas de direito privado, ao lado dos direitos reais, dos direitos de família e dos direitos de sucessão.

 

Seu núcleo principal caracteriza-se pela instauração de prestações consistentes em condutas humanas devidas, originadas de negócios jurídicos, do regime da responsabilidade civil ou da rejeição ao enriquecimento sem causa.

As características das normas processuais dizem respeito a atividades que ocorrem no ambiente da prestação do serviço jurisdicional pelo Estado, o que equivale a dizer, em sentido amplo, que se trata de atividades que acontecem no processo.

Depois, conclui-se que se trata de normas de direito público, e normas de direito privado, posto que digam respeito ao regramento da relação jurídica (de natureza processual).

Quanto ao grau de obrigatoriedade das normas, temos que o direito processual é composto preponderantemente por regras cogentes, imperativas ou de ordem pública, isto é normas que não podem ter sua incidência afastada pela vontade das partes.

Quando as partes optam pela arbitragem[11] (Lei 9.307/1996), estão escolhendo um mecanismo alternativo ao processo desenvolvido perante o Judiciário, mas nem por isso, restam afastando as regras processuais que regulam a atividade voltada a resolver a lide. O que fazem, nessa hipótese, é, apenas e tão somente, servir-se das regras processuais próprias do sistema arbitral, que também não podem afastar por sua vontade.

Desta forma, a coisa julgada material havida no processo judicial, obriga as partes à sua estrita observância, esse efeito que se agrega à sentença também ocorre no juízo arbitral, não podendo as partes, porque se trata de juízo arbitral, dispor a respeito das regras processuais a estes pertinentes. Em resumo, é optar entre as regras de ordem pública do processo judicial e as regras de ordem pública do processo arbitral.

No que tange às posições subjetivas, pode dizer-se a grande maioria das normas processuais, notadamente aquelas que regem as atividades das partes, consistem ônus.

Existem poucos deveres para as partes no âmbito das leis processuais civis, onde se destacam a lealdade e de urbanidade, previstos, respectivamente nos arts. 14 e 15 do CPC

Alguns doutrinadores reputam que as normas processuais civis igualmente dão origem as obrigações. A guisa de exemplificação, temos a obrigação do vencido ou sucumbente de pagar honorários; a obrigação de indenizar danos gerados pela efetivação de medida cautelar posteriormente revogada; a obrigação de ressarcir prejuízos derivados da litigância de má-fé.

Aliás, a Lei 10.358/2001 reformulou o teor do art. 14 do CPC prevendo que os deveres então definidos não incumbem apenas às partes e aos seus procuradores, mas todos os que de qualquer formam vierem participar do processo.

É enorme a relevância de se reconhecer a identidade das normas processuais principalmente no que tange ao direito intertemporal, em princípio se aplica a norma processual em vigor no momento da prática do ato processual, ao passo que, quando à norma de direito material, incide aquela que vigorava quando ocorreram os fatos da causa.

No direito internacional, em princípio se aplica a norma processual brasileira ao processo em trâmite no Brasil; quanto à norma de direito material, nem sempre é assim.

Afora isso, com a Emenda Constitucional 32/2001, surgiu outro ponto relevante para a identificação das normas de direito processual civil, proibiu-se a edição de medida provisória nesse campo ex vi o art. 62, primeiro parágrafo, I, b da CF/1988.

Em geral, no direito processual são aplicáveis as normas que estão em vigor no momento da prática dos atos processuais – e não as que vigoravam na época em que se passaram os fatos da causa. Surgindo uma regra processual nova, esta será aplicável, em princípio, aos atos processuais ainda não realizados.

Tal diretriz geral não esgota a possível solução de todos os problemas de direito intertemporal na esfera do processo civil. Mais alguns, esclarecimentos são dados, ainda que em caráter meramente exemplificativo.

Assim, no que se refere aos requisitos da petição inicial, importa saber quais as regras que vigem no momento da propositura da demanda. O que é válido, aliás, para todas as normas que fixem os requisitos para a prática de atos processuais.

Já referentemente aos títulos executivos extrajudiciais, vale a regra do momento do ajuizamento da ação executiva – e não a que vigorava quando o ato extrajudicial foi praticado.

No que tange aos recursos, quanto ao seu cabimento, é aplicável a regra que está vigente no momento em que é publicada a decisão que se pretende impugnar. As sentenças e decisões interlocutórias emitidas por escrito são publicadas no momento em que o juiz entrega o documento que as formaliza em cartório. As decisões e sentenças prolatadas oralmente, assim como os acórdãos dos tribunais tornam-se públicas no momento em que o órgão judicial competente as prolata.

Quanto à natureza dos efeitos das decisões, vale também a regra vigente no momento em que a decisão é publicada. Já quanto às hipóteses de rescisão de sentença, impende saber que as que estavam em vigor no momento do trânsito em julgado. O referido momento é igualmente relevante para definir quais as regras aplicáveis relativamente à configuração da coisa julgada.

Quando a lei aumentar determinado prazo processual, tal majoração incidirá apenas nos casos em que o prazo anterior ainda não tinha decorrido integralmente. Exemplificando, se a lei previa o prazo de cinco dias para o gravo e passou então a prever o prazo de dez dias, e se o referido prazo já estava no seu quarto dia, quando entrou em vigor a nova lei processual, a parte passará a dispor de prazo de dez dias (terá, portanto, mais seis dias de prazo).

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Já se o quinto dia do prazo[12] deu-se um dia antes da entrada em vigor da nova lei, prazo encerrou-se naquele quinto dia, operando-se, caso não tenha sido interposto o recurso, a preclusão temporal. Sendo nesse caso, irrelevante a superveniência da lei ampliadora do prazo processual.

Por outro viés, quando a lei reduzir o prazo processual e, o referido prazo já se encontrava em curso no caso concreto, caberá verificar quanto faltava fluir o prazo antigo. Se o remanescente, de acordo com a lei antiga, é menor do que o total do novo prazo computa-se apenas o remanescente.


Caso contrário, computa-se o total do novo prazo. Tal fato ocorreu, por exemplo, quando o CPC de 1973 reduziu o prazo da ação rescisória de cinco para dois anos. A jurisprudência[13] pacificou-se no sentido de que, se de acordo com o prazo antigo (cinco anos), a parte, no caso concreto dispunha de um saldo inferior a dois anos, considerar-se-ia esse saldo. Todavia, caso o saldo remanescente fosse superior a dois anos, computar-se-iam apenas mais de dois anos.

Quando a lei suprimir determinado tipo de processo, a regra não se aplica àqueles processos desse tipo que já estejam em curso. Essa noção é aplicável ao processo de execução por quantia certa fundado em sentença judicial civil, substituído pela Lei 11.232/2005 por uma fase de “cumprimento” interna ao processo em que se proferiu a sentença.

Ressalte-se que as inovações trazidas pela Lei 11.382/2006 que reformou o processo de execução, mas não instituíram nova modalidade processual e nem suprimiram um tipo de processo. Apenas limitou-se a dar novas disciplinas a atos e institutos peculiares da execução e dos embargos de executado.

Portanto, as novas disposições são aplicáveis a cada caso específico, mesmo que ainda não tenha ocorrido no curso da execução ou dos embargos. Já os atos havidos antes do início de sua vigência, permanecem regulados pelas normas anteriores a Lei 11.382.

Exemplificando, se já tinha havido a nomeação de bens a penhora pelo devedor, com a Lei 11.382 que suprimiu essa faculdade não afetará a penhora já realizada sobre o bem nomeado, no entanto, se no momento em que passou a vigorar a nova lei ainda não tinha surgido à oportunidade de embargos do executado, os embargos que agora vierem a ser opostos não terão automaticamente o efeito suspensivo (vide o art. 739-A do CPC), sendo irrelevante o fato de que, quando se iniciou a execução, vigorava lei que conferia sempre efeito suspensivo aos embargos.

Após aproximadamente cem anos ainda são sustentadas teorias de qua jurisdição possui a função de atuar a vontade concreta da lei (segundo Chiovenda) relacionada com a justa composição da lide (Carnelutti).

A lei, no entanto, decaiu de seu trono de supremacia[14] e, hoje é subordinada à Constituição. De sorte que é patente o slogan de que as leis devem estar em conformidade com os direitos fundamentais.

É reconhecível que o Estado Constitucional[15] imprimiu novo conteúdo ao princípio da legalidade. Em verdade, o princípio da legalidade[16] substancial significa uma transformação que afeta as próprias concepções de direito e de jurisdição e, assim, consigna uma ruptura de paradigma.

O que fez surgiu um positivismo crítico[17] que defende dar ao juiz a real possibilidade de afirmar o conteúdo da lei comprometido com a Constituição. Dentre deste diapasão, temos a teoria dos direitos fundamentais; a teoria dos princípios que enfim confere ao julgador a função proativa e produtiva.

Na idealização do Estado Liberal a burguesia cunhou o conceito de lei que repousa na tradição europeia, herdeira da filosofia grega, tendo passado à Idade Moderna através da escolástica, a lei não é voluntas, mas ratio.

Portanto, nesse contexto o princípio da legalidade acabou por ser um critério de identificação do direito que estaria contido apenas na norma jurídica, e cuja validade não dependeria de sua correspondência com a justiça, mas somente por ter sido produzida por uma autoridade dotada de competência normativa.

Ferrajoli aponta o princípio da legalidade como metanorma de reconhecimento das normas vigentes. Contudo, o positivismo jurídico não apenas adotou a ideia de que o direito deveria ser reduzido à lei, mas foi causador de uma simplificação das tarefas e responsabilidades dos juízes, promotores, advogados, professores e juristas, limitando-as a aplicação mecânica das normas jurídicas[18].

Apesar de o positivismo jurídico originariamente concebido para manter a ideologia do Estado Liberal[19], o que permitiu o desenvolvimento de asséptico e indiferente sistema legal.

A teoria que afirmava que o juiz atua a vontade concreta do direito que fora compartilhada por Chiovenda. O direito era nada mais que a lei, ou seja, a norma geral a ser aplicada aos casos concretos.

Ao juiz caberia tão-só aplicar a norma geral já criada pelo legislador (que foi escolhido e eleito pelo povo). Então, a aplicação e criação se separavam nitidamente.

Supunha essa teoria que o ordenamento jurídico seria completo. Assim o processo não pode ser visto apenas como relação jurídica, mas sim como algo que tem fins de grande importância para a democracia e, por isso, deve ser legítimo, através da participação e da adequada tutela dos direitos e aos direitos fundamentais e, ainda, produzir uma decisão legítima.

A legitimidade da decisão segundo a teoria de Luhmann, não é uma questão autônoma. Desta forma, o busilis da legitimidade da decisão judicial é consumido pelo da legitimação através do procedimento.

É inegável que uma das mais relevantes para a teoria contemporânea[20] é a da legitimidade da decisão jurisdicional, especialmente quando o juiz confronta a lei infraconstitucional diante dos direitos fundamentais (que é a tarefa precípua do Estado Constitucional).

Lembremos que a decisão é o ato máximo de positivação do poder jurisdicional, ou seja, a razão do seu acontecimento e desenvolvimento.

Enxergar o processo apenas como mero instrumento para a atuação da lei não permite realmente perceber que o exercício da jurisdição depende realmente do modo pelo qual o procedimento é fixado em abstrato pelo legislador e, ainda como é aplicado e construído no caso concreto e, assim, compreendido pelo juiz.

O processo[21] bem como a jurisdição não pode então ser entendido como tão distante dos valores do Estado e da sociedade onde está inserido. Tanto a jurisdição, como a ação, a defesa e o processo obviamente se compromete com os valores imanentes de seu momento histórico.

Desta forma, a jurisdição no Estado Constitucional caracteriza-se a partir do dever estatal de proteger os direitos. Onde há prevalência de dever de proteger os direitos fundamentais, seja através de normas, atividades fáticas administrativas ou da jurisdição.

Enfim, o Estado Constitucional contemporâneo, tem o dever de proteger todas as espécies de direitos, o que justifica que o juiz vai além de aplicar a lei, tem o dever de compreendê-la a partir dos direitos fundamentais, no caso concreto.

A relevância do procedimento para a proteção de direitos vai além tanto que o legislador instituiu normas processuais abertas (tanto no CPC como também no CDC e quiçá no C.C. de 2002). Conferindo ao julgador ampla latitude de poder para uso da técnica processual adequada (promovendo a arquitetura de um processo idôneo e adequado ao caso concreto).

Além do fato de o processo não estar mais atrelado à limitada a função de atuar a lei. O processo, além de outorgar à jurisdição a possibilidade concreta de proteger direitos, deve ser legítimo, espelhando claramente os valores que fazem do Estado uma democracia, ou conferem ao exercício do poder de natureza democrática.

Basicamente o processo deve ser francamente aberto ao contraditório, ou seja, estar aberto à participação[22] dos particulares que a ele recorrem e são afetados em suas esferas jurídicas pelos atos de positivação de poder do Estado-juiz.

A legitimidade do exercício do poder, nas democracias, se dá através da abertura a participação.  Portanto, é a participação no procedimento que é legitimadora que permita a adequada proteção ao direito material.

Convém sublinhar que a vigente Constituição brasileira prestigiou a técnica representativa em vários instrumentos para a participação direta do cidadão no processo de decisão, prevendo o referendo popular e reafirmando o instituto da ação[23] popular que bem viabiliza que o cidadão aponte diretamente os desvios da coisa pública dentre outros fins.

No entanto, o exercício do poder jurisdicional não depende da técnica representativa e não se assenta nos fundamentos da democracia participativa, ou seja, nas ideias voltadas a permitir a participação direta do cidadão no poder.

Porém, não há dúvida de que o juiz profere atos de positivação de poder, posto que suas decisões sejam impostas, pouco importando a vontade do particular, que não pode se subtrair ao poder do juiz.

É sabido que o juiz não é eleito, e sua participação no processo e da parte no processo não deriva do fato de que ele está aí preocupado diretamente do poder. Então o princípio político da participação se estende a qualquer sujeito que se capaz de expressar a participar de um processo que afete sua esfera jurídica dando efetividade ao contraditório presente como direito fundamental.
E endossa a imprescindível publicidade de atos do juiz, e a relevante fundamentação de suas decisões. O contraditório na ótica contemporânea[24] importa não apenas as garantias de assistência judiciária gratuita, a oferta de pagamento de provas sem o pagamento de despesas, mas inclui também as normas processuais que objetivam garantir efetiva participação da parte segundo as necessidades do direito substancial.

Portanto tanto legislador e o juiz estão obrigados a estabelecer as discriminações necessárias para garantir e preservar a participação igualitária das partes, seja em face de dificuldades econômicas, seja atentando para as peculiaridades do caso concreto segundo o direito material.

A noção de igualdade de condições segundo parte da doutrina, sobretudo a italiana que cogita em participação com paridade de armas[25].

Conclui-se que não é legítimo o poder exercido em um processo em que as partes não podem efetivamente participar, ou que apenas uma das partes tivera efetivas condições de influir seriamente sobre o convencimento do juiz.

Pois um processo desta forma não corresponde a um processo justo e nem mesmo democrático. Salienta Mario Chiavario que a referida paridade de armas não implica numa identidade absoluta entre os poderes reconhecidos às partes num mesmo processo, nem significa uma perfeita simetria de direitos e obrigações.

É possível o tratamento diferenciado sempre que for justificável racionalmente, à luz de critérios de reciprocidade e com o fito de evitar o desequilíbrio global em prejuízo de uma das partes. É o caso do art. 6º do CDC que possibilita a projeção dinâmica da prova. Basta a verossimilhança sobre o defeito ou acidente de consumo.

Apesar de expressamente prevista a inversão do ônus da prova somente na legislação protetiva ao consumidor. Isso não implica que não existam outras situações de direito material que exijam a mesma coisa, ou até a atenuação do rigor na aplicação da regra sobre a aplicação da regra sobre o ônus da prova, contentando-se com a verossimilhança.

O processo autenticamente democrático e fundado na isonomia substancial exige uma postura proativa do magistrado. O que influencia na produção provatória que deixou de ser monopólio das partes.

O que pode determinar provas ex officio com o objetivo de elucidar os fatos. O juiz deve participar para garantir que a participação[26] das partes seja igualitária e, assim, para que eventual falha nessa participação possa ser suprida.

Assim, nesse contexto, a participação do juiz ocorre em razão da participação das partes, e ipso facto, para legitimar a sua própria participação.

Logo não há como supor, conforme aludiram alguns doutrinadores que o contraditório será violado ao revés, acredito juntamente com o grande jurista Marinoni que este será reforçado e fortalecido pela postura ativa do juiz. Ultrapassando as barreiras do contraditório meramente formal[27].

Também a imparcialidade[28] do juiz não se erige como óbice para a participação ativa na instrução. E, acredita-se que há o julgador parcial, quando sabendo que a prova é fundamental para o esclarecimento fático, queda-se inerte e indiferente.
Em face da evolução observada no processo civil brasileiro, percebe-se que o princípio do dispositivo não tem ligação com a instrução da causa, mas apenas com as limitações impostas ao juiz em razão da disponibilidade do direito material.

Porém, existem doutrinadores que sustentam que só cabe a prova de ofício no caso de direito indisponível e, não de direito disponível. Porém, tal visão desvalorizaria as demandas incidentais sobre direitos disponíveis.
Ademais, o procedimento passa a ser visualizado diante das normas que conferem às partes o poder de utilizar as técnicas processuais necessárias à tutela de direito material.

O motivo de se ligar a técnica processual com as tutelas pretende informar que o processo não pode ser pensado de uma forma isolada ou neutral, posto que só tenha sentido quando puder atender as tutelas prometidas pelo direito material, para o que é imprescindível compreender a técnica processual e o processo a partir dos direitos fundamentais e da realidade concreta do caso sub judice.

Há de se sublinhar que já existe expressivo número de procedimentos judiciais destinados a permitir ou viabilizar a participação do cidadão e no poder na vida social. As ações coletivas e ação popular são autênticas vias ativas de participação popular. Seja voltada à tutela dos direitos difusos ou coletivos produzindo ipso facto a coisa julgada erga omnes[29] ou ultra partes[30].

As ações coletivas além de objetivarem a tutela dos direitos fundamentais que exigem positivas prestações sociais e proteção normativa e fática[31].

O debate sobre a legitimidade da jurisdição constitucional ou a respeito do controle de constitucionalidade da lei circunscreve-se ao problema da legitimidade do juiz para controlar a decisão da maioria parlamentar. Porque a lei encontra respaldo na vontade popular que elegeu o seu elaborador, isto é, na técnica representativa.

Os juízes que não são eleitos pelo povo são investidos no poder jurisdicional através do procedimento traçado pela Constituição que prevê a necessidade de concurso público para ingresso na magistratura de primeiro grau de jurisdição – de lado de outros critérios e requisitos para o ingresso, por exemplo, no STF.

Diante da deficiência de legitimidade de origem pelo juiz, boa parte da doutrina contemporânea indo além da dogmática do processo civil, afirma que a legitimidade do juiz para controlar a decisão do parlamento advém do procedimento.

Assim, desloca-se o referencial de legitimidade do sujeito para o procedimento. A legitimação por meio do procedimento supõe que a observância dos parâmetros fixados pelo legislador para o desenvolvimento do procedimento que acarreta à edição da decisão é a melhor maneira para se dar legitimidade ao exercício do poder[32].

Há de se distinguir a legitimação e legitimidade. A legitimação está relacionada ao fato de uma decisão ser tomada por seus destinatários como dotada de autoridade. Diversamente, a legitimidade exige que uma determinada decisão se apresente em conformidade com algum padrão de justiça ou correção. Num caso se avalia um juízo fático; noutro, um juízo normativo.

A atual doutrina processual mesmo a mais contemporânea[33] não se preocupa com a legitimidade da relação juiz versus legislador. Quando Fazzalari enunciou seu conceito de legitimidade pelo procedimento, focou-se no contraditório, ou ainda, na efetividade da participação igual das partes no procedimento judicial, o que seria suficiente para democratizar o exercício da jurisdição.

Resvala-se numa ideia de processo dotado de forte conotação política posto que voltada a assegurar a participação igualitária das partes, distanciando-se da concepção de relação jurídica processual.

Fazzalari afirma que os direitos fundamentais e os princípios constitucionais de justiça diante da ação legislativa, objetiva legitimar o exercício da jurisdição. Procura a dar legitimidade[34] apenas à atuação da lei, e não, ao controle de constitucionalidade.

Já a teoria de Luhmann[35] afirma que a observância racional do procedimento legitima o resultado do exercício do poder e, além disso, que o procedimento tem o valor social de enfraquecer o confronto e reduzir o conflito.

Luhmann é relacionado à teoria sistêmica, vendo o procedimento como um subsistema social. Para tal doutrinador, a função da decisão é absorver a insegurança[36] e o objetivo do procedimento é proporcionar a aceitabilidade das decisões.

A concepção de Luhmann sobre a fundamentação da jurisdição constitucional se distancia da conexão com o regime democrático ou valores axiológicos. O doutrinador a baseia nos procedimentos judicias, autônomos em relação aos outros subsistemas e busca a aceitação dos cidadãos de forma autopoiética[37].

A teoria procedimental dessa jurisdição elaborada por ele sua legitimação, mesmo que seus posicionamentos tragam grande repercussão social.

Enfim, para gerar aceitação, a decisão deve resultar de um procedimento neutro ou alheio aos influxos do meio ambiente, realizado com base em normas previamente conhecidas, que circunscrevem as atuações dos atores processuais.

A força motriz do procedimento é, porém, a incerteza quanto aos resultados. Tal incerteza constitui a força impulsionadora do procedimento, sendo fator efetivo de legitimação.

Enquanto a doutrina de Fazzalari tem cunho normativista dando destaque a necessidade do princípio político na participação através do contraditório, mas não trata da legitimidade da decisão diante dos direitos fundamentais.

Por outro viés, Luhmann esboça tese que é explícita em negar qualquer ligação com a ideia de que a decisão judicial deve concretizar os direitos fundamentais e compreender e controlar a lei a partir desses direitos.

Se a tese de Fazzalari busca a legitimidade do exercício da jurisdição pelo procedimento realizado em contraditório, não entra na seara da legitimidade da decisão pelos direitos fundamentais.

Já a tese de Luhmann ao absorver a questão de legitimidade da decisão na legitimação pelo procedimento, afirma que o procedimento, por si, é suficiente para garantir a legitimação da jurisdição, entendendo ser equivocado relacionar a legitimidade da jurisdição com os direitos fundamentais.

A lei processual é aplicável como regra de conduta no exercício da atividade jurisdicional do Estado-juiz e das partes.

Infelizmente ao legislador escapa as novas realidades, fazendo surgir o dilema da integração da lacuna[38] da lei processual. Como exemplo, citamos a Lei de Juizados Especiais que proíbe expressamente as pessoas jurídicas, com personalidade judiciária apenas, como o condomínio, a herança jacente, a massa de bens do devedor civil insolvente e o espólio.

Desta forma, em caso de omissão da lei esta deve ser haver seu suprimento pela analogia, pelos costumes e pelos princípios gerais de Direito. Tal é a previsão no art. 4º da LICC que é reprisado no art. 126 CPC (que indica como deve o juiz agir no julgamento de questão substancial não regulada pela lei material).

Tem grande relevo na heterointegração[39] a praxe judiciária e os princípios processuais. Desta forma, é de extrema significância a preciosa gama de princípios processuais, em particular, o contraditório, atualmente constitucionalizado.

É bom frisar que a hermenêutica processual não difere das demais, é o caso concreto o indicador do mais recomendável método exegético, vale dizer, se o liberal, o histórico, o sociológico e, etc.

Em todos os métodos de interpretação[40] será o juiz que há de vislumbrar o fim social a que se destina a norma. Também existe a questão espacial sobre os limites territoriais em que a norma incide e o momento em que o regramento surge, posto que destinado a regular as relações processuais em curso. Trata-se da eficácia da lei processual no espaço e no tempo.

O busilis mais delicado é referente à eficácia do CPC que tem aplicação imediata conforme dispõe o art. 1.211 e, cujas disposições aplicam-se desde logo, aos processos pendentes.

Em geral o problema da eficácia temporal da lei tem solução uniforme respeitado seu prazo de vacatio legis, terá aplicação imediata e geral, respeitados, os direitos adquiridos o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Fux elencou didaticamente as diversas situações jurídicas geradas pela incidência da lei nova aos processos pendentes às seguintes regras:

“1. A lei processual tem efeito imediato e geral, aplicando-se aos processos pendentes; respeitados os direitos subjetivo-processuais adquiridos, o ato jurídico perfeito, seus efeitos já produzidos ou ase produzir sob a égide da nova lei, bem como a coisa julgada;

2. As condições da ação regem-se pela lei vigente à data de propositura;

3. A resposta do réu, bem como seus efeitos, rege-se pela lei vigente na data do surgimento do ônus da defesa pela citação, que torna a coisa julgada.

4. A revelia, bem como os efeitos, regulam-se pela lei vigente na data do escoar do prazo da resposta;

5. A prova do fato ou do ato quando ad solemnitatem, rege-se pela lei vigente na época da perectibilidade deles, regulando-se a prova dos demais atos pela lei vigente na data da admissão da produção do elemento da convicção conforme o preceito mais favorável à parte beneficiada pela prova;

6. A lei processual aplica-se aos procedimentos em curso, impondo ou suprimindo atos ainda não praticados, desde que compatível com o rito seguido desde o início da relação processual e eu não sacrifique os fins de justiça do processo;

7. A lei vigente na data da sentença é a reguladora dos efeitos e dos requisitos da admissibilidade dos recursos;

8. A execução e seus pressupostos regem-se pela lei vigente na data da propositura da demanda, aplicando-se o preceito número seis aos efeitos e de procedimentos executórios em geral;

9. Os meios executivos de coerção e de sub-rogação regem-se pela lei vigente na data de incidência deles, regulando-se a penhora, quanto aos seus efeitos e objeto, pela lei em vigor no momento em que surge o direito à penhorabilidade, com o decurso do prazo para pagamento judicial;

10. Os embargos e seus requisitos de admissibilidade regem-se pela vigente na data de seu oferecimento;

11. O processo cautelar, respeitado o cânone maior da irretroatividade, rege-se pela lei mais favorável à conjuração do periculum in mora quer em defesa do interesse das partes, quer em defesa da própria jurisdição.”

Por fim, cabe esclarecer que os famosos pressupostos processuais[41], ainda que não venham inferir sobre o julgamento do mérito, deve ser avaliados no processo quando da apresentação da petição inicial e da contestatória, conforme sejam pressupostos relativos ao autor ou ao réu.

Deixa-se claro que quando o juiz não tem condições de verificar se o autor o réu tem razão em relação ao mérito, porque ainda é necessária a complementação do processo, com a prática de atos processuais voltados para influir no convencimento judicial, cabe-lhe determinar a extinção do processo sem resolução do mérito, conforme os termos do art. 267, IV, do CPC.

O processo só deve prosseguir quando tiver as condições que prestigiem os direitos fundamentais à tutela jurisdicional efetiva[42] e à duração razoável do processo. Portanto, é imperiosa a compreensão dos pressupostos processuais a partir de suas funções e dos direitos fundamentais e preocupada com a tutela jurisdicional efetiva e com o significado do processo jurisdicional no Estado Constitucional.

 

Referências:
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FELICIANO, Guilherme Guimarães. O modelo de Stuttgart e os poderes assistenciais do juiz: origens históricas do processo social e as intervenções intuitivas no processo do trabalho. Disponível em: http://www.idb-fdul.com/uploaded/files/2014_04_02717_02752.pdf   Acesso em 26/12/2014.
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WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil. Volume 1., 12.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
 
Notas:
[1] A teoria geral do processo representa conjunto de conceitos sistematizados e organizados que serve como instrumento para melhor conhecer os diferentes ramos do direito processual. Registram-se três principais correntes: a empírica que alega que os conceitos são elaborados a partir da própria realidade; a corrente racionalista que defende que a fonte do conhecimento é a razão e, portanto tais instrumentos teóricos são usados para interpretação da realidade. Desta forma, o conceito sai do abstrato (da teoria) para o concreto (realidade). A terceira corrente é a chamada de paradigma linguístico-pragmático, que coloca em destaque o fato de o conhecimento da realidade é linguisticamente mediado, pois a linguagem é o único canal de acesso do ser humano à realidade. Somente através do diálogo chegamos à verdade. Habermas fora um dos seus maiores expoentes.

[2] Portanto, no bojo de um processo, haverá: – quanto à adequação do instrumento utilizado e das regras a serem observadas no trâmite processual: aplicação do direito processual; – quanto à solução do conflito levado à apreciação do juiz (critérios para julgamento da causa, para saber “quem tem o direito” ao que se discute): aplicação do direito material. Fora de um processo judicial não haverá aplicação de normas processuais (no máximo, um parecer de como deveria ser solucionada a questão): aplicação do direito processual é exclusiva do Poder Judiciário, por meio do juiz.

[3] O conceito do Direito Processual Civil é controvertido e diverge quer na doutrina nacional como também na estrangeira. Hernando Devis Echandia (processualista latino-americano de grande prestígio e considerado por alguns como o maior processualista contemporâneo) define como “o ramo de Direito que estuda o conjunto de normas e princípios que regulam a função jurisdicional do Estado em todos os seus aspectos e que, portanto, fixam o procedimento que se há de seguir para obter a atuação do direito positivo nos casos concretos, e que determinam as pessoas que devem submeter-se à jurisdição do Estado e os funcionários encarregados de exercê-las.” (Hernando Devis Echandia, Teoria General Del Processo, tomo I, Buenos Aires: Editorial Universidad, 1984, p.6).
Já o doutrinador mexicano Jose Becerra Bautista conceituou o Direito Processual inspirado em Paolo D`Onofrio, propugnando ser esse "o conjunto de normas que têm por objeto e fim a realização do direito objetivo através da tutela do direito subjetivo, mediante o exercício da função jurisdicional.".
Sergio Bermudes define o Direito Processual Civil como o ramo da ciência jurídica que trata do complexo de normas reguladoras do exercício da jurisdição civil. Segundo Humberto Theodoro Junior funciona o direito processual civil então, como principal instrumento do Estado para o exercício do Poder Jurisdicional. (In: LEITE, Gisele. Direito Processual Civil em perspectiva, Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/anexos/17081-17082-1-PB.htm, acesso em 23/12/2014).

[4] Jurisdição, ação e processo são institutos que se interligam para formar o que em doutrina se denomina trilogia estrutural do processo. O Estado tem o poder e a obrigação de realizar o Direito, resolvendo os conflitos de interesses e preservando a paz social.  A essa função estatal dá-se o nome de jurisdição.
Ocorre que a jurisdição só age se provocada (uma de suas características é justamente a inércia).  O meio de se provocar a jurisdição é a ação, direito público subjetivo a um pronunciamento estatal que solucione o litígio. O resultado da atividade jurisdicional é alcançado com a edição da norma reguladora do caso concreto, ou seja, com a sentença ou acórdão que, com característica de imutabilidade, vai reger o conflito de interesses.  Ocorre que o estabelecimento dessa lei de regência do caso concreto não se dá aleatoriamente, ao talante do juiz.  A outorga da prestação jurisdicional, isto é, a resposta à provocação da parte cujo direito afirma ter sido ferido ou ameaçado, deve seguir um método previamente estabelecido, composto por regras e princípios frutos de um debate democrático.  A esse meio, método ou sistema que deve ser observado para o exercício da jurisdição dá-se o nome de processo.

[5] A teoria que primeiro expôs a trilogia estrutural do direito processual surgiu dentro da processualística moderna foi a tese de Carnelutti. Onde se definia a jurisdição é um poder-dever ou atividade ou função do Estado para compor a lide. O cerne da tese de Carnelutti sobre a jurisdição era a lide. Chiovenda criticava a tese de Carnelutti, na medida em que não se identificava em todos os processos a efetiva presença da lide. E, o ponto nevrálgico na tese de Carnelutti era a questão de jurisdição voluntária. Posto que na visão carnelutiana a jurisdição voluntária não era nem jurisdição e nem voluntária, mas apenas uma atividade do Estado-juiz para validar determinados negócios jurídicos ou atos jurídicos. Afinal representava um controle estatal de interesses particulares, sendo uma função atípica do Judiciário.

[6] A teoria geral do processo é admitida por grande parte dos processualistas, dentre os quais podemos citar: Liebman, Dante Angelotti, Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Calmon de Passos, Fredie Didier Jr., José de Albuquerque Rocha, J. E. Carreira Alvim, Daniel Francisco Mitidiero, Fernando de La Rua, dentre outros. Dentre os autores que não admitem a existência de uma Teoria Geral do Processo estão: Luis Eulálio Bueno de Vidigal, José Rogério Lauria Tucci e Manoel Arruda Alvim.

[7] Secundariedade é característica da jurisdição posto que seja o derradeiro recurso (ultima ratio), a última trincheira na busca da solução dos conflitos.  Normalmente se espera que o Direito seja realizado independentemente da atuação da jurisdição, sobretudo em se tratando de direitos patrimoniais.  Em geral, o empregador paga o salário sem que seja acionado para tanto; o locatário paga o aluguel sem que o locador tenha que recorrer à Justiça para fazer valer seu direito; o pai paga alimentos ao filho, independentemente de qualquer ação de alimentos.  Prevalece, portanto, o convencionado pelas partes, o ato jurídico perfeito.  Somente quando surge o litígio (conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida) é que o Judiciário é provocado a prestar a tutela jurisdicional. É nesse contexto que se diz que a jurisdição é secundária, que ela tem a característica da secundariedade.

[8] A Teoria Geral do Estado é disciplina que estudo os fenômenos do Estado, desde sua origem, formação, estrutura, organização, funcionamento e suas finalidades, compreendendo-se no seu âmbito tudo que considera existindo no Estado ou sobre este influindo. Essa teoria sistematiza conhecimentos jurídicos, sociológicos, políticos, históricos, geográficos, antropológicos, econômicos e psicológicos. Em parte corresponde à parte geral do Direito Constitucional que é a base fundamental do ramo do Direito Público.

[9] Já o direito material (ou substancial) é o conjunto de normas e princípios que buscam o regramento da vida em sociedade, regulando as diversas relações jurídicas, atribuindo os bens aos indivíduos. Assim, o direito civil (material) é que vai regular como se dá uma compra e venda, uma locação, a reparação de um prejuízo, o que acontece com os bens de um morte ou qualquer situação própria das relações civis. Já o direito do trabalho vai regular as regras referentes a uma relação de trabalho. E, assim por diante (direito tributário, eleitoral, administrativo, penal etc).

[10] Referem-se à prerrogativa jurídica de impor a outrem, unilateralmente, a sujeição ao seu exercício. O direito potestativo atua na esfera jurídica de outrem, sem que este tenha algum dever a cumprir. Não implica, por outro lado, num determinado comportamento de outrem, nem é suscetível de violação.

[11] Existe no Congresso um projeto de lei tramitando sobre conciliação, para regulamentar mediação é o Projeto de Lei (PL) n. 7.169/2014 reflete um movimento pela consensualização da Justiça adotado por magistrados desde a década de 1990 e consolidado como política pública com o Movimento pela Conciliação do CNJ.  O professo Humberto Dalla tem um livro sobre este projeto. Ele chama de teoria geral da mediação.

[12] Os prazos processuais serão unificados para quinze dias, com exceção dos embargos de declaração, cujo prazo permaneceu de cinco dias. Outra novidade do vindouro CPC é que a contagem de todos os prazos passa a ser feita em dias úteis, sob o fundamento de que os fins de semana e feriados não devem ser computados, pois são dias de descanso. A própria parte deverá comprovar a existência de feriado local. A unificação dos prazos recursais e extinção do agravo retido e dos embargos infringentes simplificaram e racionalizaram o procedimento. A regulamentação do agravo interno e do agravo de admissão, assim como a delimitação das hipóteses de agravo de instrumento, trouxeram maior precisão e clareza ao exercício do direito recursal.

[13] O Superior Tribunal de Justiça aprovou enunciado sobre o prazo decadencial para a interposição de ação rescisória. Trata-se da Súmula nº 401, cujo teor é o seguinte: “O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial“. Para a doutrina majoritária e para o TST (Súmula 100), o prazo para o manejo da rescisória conta-se em separado para cada trânsito em julgado.  Para o STJ, nos termos da Súmula 401, esse prazo se inicia do último trânsito em julgado.  Nesse sentido, o Recurso Especial nº 639.233, que é um dos precedentes do referido enunciado. O segundo problema do prazo da ação rescisória relaciona-se com a seguinte situação: em 2009 uma sentença é proferida. A parte vencida recorre, mas, em 2014, o tribunal não conhece a apelação. Para alguns, o trânsito em julgado da decisão ocorreu em 2009, tendo efeito retroativo a decisão de 2º grau que não conheceu o recurso. Contudo, a literalidade da súmula sugere que o trânsito julgado se dará em 2014, isto é, da última decisão, qualquer que seja seu conteúdo. Assim, a rescisória poderá ser interposta até 2016.

[14] A aplicação do direito no modelo positivista traçava o julgador como sujeito passivo da lei. Com a chegada do direito legalizado em códigos, e a consequente junção restritiva do direito à lei, nasce nova forma de saber e discurso. Dentre as modificações percebidas, citam-se as fontes do direito (apenas a lei), a escrita das normas (facilidade de conhecimento da lei pelo povo), bem como nova estrutura politica do Estado voltada mais para a democracia representativa, onde a lei é apenas legítima quando criado por legisladores devidamente eleitos pelos cidadãos. Nesse contexto a atividade dos juristas tornou-se a prudência, revestida como técnica para achar a resolução justa através dos princípios universais do direito natural passou para adequar a lei vigente ao caso concreto.

[15] O neoconstitucionalismo marca a crise do Estado de Direito legal. E também o avanço para o Estado Constitucional, particularmente a partir da Segunda Grande Guerra Mundial, e trouxe grande evolução nas conjecturas jurídicas, sociais e políticas. A evolução da culta da lei para a cultura do direito teve como marco simbólico os julgamentos de Nuremberg, acontecimento em que vários réus que eram integrantes do movimento nazista foram condenados por violação ao direito, mesmo tendo cumprido literalmente a lei vigente e válida da Alemanha naquela época. 
A maior culpa inconteste do juspositivismo foi o fato de os réus em Nuremberg terem justificado suas ações com base na lei positiva. Persegui, torturei e matei porque assim ordenava a lei. E a lei é a lei. Gesetz is Gesetz: eis a principal filosofia do positivismo jurídico.

[16] O positivismo legalista trazia a redução do direito à lei e limitava a sua interpretação. Porém, com a vitória das revoluções burguesas, deixou-se de lado a hegemonia da lei para uma concepção de reductio ad unum, desencadeando no que afirma Hespanha de projeto de redução do pluralismo, ou seja, a tentativa reducionista de mitigar todo o direito social ao direito do Estado e todo o direito estatal à lei. Com a Revolução burguesa embalada pelos interesses burgueses nas regulamentações atinentes à segurança jurídica, permitiram garantir que os contratos devam ser cumpridos e que o Estado apenas deva se limitar as regras gerais no que tange aos negócios privados. Tal racionalização e unificação deu uma sistematização do direito, mais conhecido como movimento codificador. Foi a grande importância devotada à segurança jurídica que ensejou o desenvolvimento do positivismo formalista, desencadeando em afirmativas como: "A vida e o espírito postulam um direito reto, quer dizer, justo e oportuno: um direito que harmonize a pura justiça, que valora e julga a realidade existente, aspirando a estruturá-la segundo a modelo ideal, com o efetivo condicionalismo dessa mesma realidade, um direito, no fim de contas, que estabeleça a justiça do possível ou a possível justiça.”.

[17] O saber jurídico não é mais dogmático que possui o intuito de explicar e sistematizar o direito positivado, mas compreender outros saberes como filosofia, psicologia, sociologia, economia, dentre outros, em razão da relevância que estas áreas têm para explicar e definir o direito justo e aplicável ao caso concreto. Conclui-se que a Constituição não é um documento jurídico, mas sim, político que possui valor superior a qualquer outra norma jurídica, devendo o legislador a esta estar vinculado. Assim, nem tudo o que o Poder Legislativo produz é válido, ou seja, nem tudo que é vigente tem validade. Desta forma, a vontade do legislador ordinário deixa de ser plenamente soberana, justamente pelo direito não possuir a lei como fonte única e interminável, já que a construção do direito se faz através da Constituição até a jurisprudência, tendo o juiz o papel de sujeito ativo, o senhor do direito.
Do juiz inanimado previsto por Montesquieu passa-se à ideia do juiz que interpreta o ordenamento jurídico e que procura, através da sensibilidade, a solução justa para o caso concreto. No sistema neoconstitucionalista, o início para a descoberta do direito não é a lei, mas a Constituição. A lei até poderá ser o final da descoberta do direito, porém, apenas se for absolutamente compatível com as demais normas hierarquicamente superiores. A jurisprudência passa a ser fonte imediata do direito, novamente valorizando a figura do juiz como sujeito ativo que interpreta de forma vívida o ordenamento jurídico.

[18] Ao jurista não cabe mais o papel de aplicador das leis e códigos. A sua função é interpretar e construir o ordenamento jurídico válido em torno da Constituição. A invasão do neoconstitucionalismo faz nortear, mesmo que implicitamente, uma determinada política constitucional que não contempla apenas decisões judiciais, mas adentra em todas as esferas de poderes, as quais ensejarão um aperfeiçoamento no direito e, consequentemente, para a sociedade, especialmente nos âmbitos dos direitos de liberdade individuais.

[19] Segundo Norberto Bobbio, podemos compreender “liberalismo” como uma determinada concepção de Estado, na qual este tem poderes e funções limitados. Assim, será o avesso daquele Estado no qual o poder absolutista imperou em boa parte da Idade Média e da Idade Moderna. Da mesma forma, ele se contrapõe ao que hoje consideramos ser o Estado social, ou de bem-estar social que se viu na URSS no século XX. Além disso, Bobbio também aponta que um Estado liberal não é necessariamente democrático, mas, ao contrário, realiza-se historicamente em sociedades nas quais prevalece a desigualdade à participação no governo, sendo ela bastante restrita em termos gerais, limitada a classes possuidoras. O Estado liberal é o Estado limitado, sendo a função dele a conservação dos direitos naturais do homem. Assim, se a defesa dos direitos dos homens é o mote do pensamento liberal, a valorização do individualismo é uma consequência óbvia e direta no Estado Liberal ou, nas palavras de Bobbio, “sem individualismo não há liberalismo”.

[20] Desta forma, o Direito Processual de nossos dias é caracterizado por menor preocupação com as formalidades processuais e maior preocupação com a justiça da decisão e seus reflexos na sociedade. Almeja-se formar um processo apto a atingir os resultados políticos e sociais que legitimam sua existência. Particularmente acredito que a ênfase ao julgamento resta esmaecida e uma ênfase a composição consensual da lide.

[21] Segundo Marcus Vinicius Rios Gonçalves o processo de hoje e do futuro busca os seguintes valores: FACILITAÇÃO DO ACESSO A JUSTIÇA: a lei deve adotar mecanismos que permitam que todos possam levar ao Judiciário os seus conflitos, reduzindo-se a possibilidade da chamada litigiosidade contida em que a insatisfação não é levada a juízo, e permanece latente;
DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO: a demora na solução dos conflitos traz ônus gravosos àquele que ingressa em juízo, o que estimula o adversário a tentar prolongar indefinidamente o processo. Devem-se buscar mecanismos que repartam esses ônus;
INSTRUMENTALIDADE: o processo é instrumento que deve ser sempre o mais adequado possível para fazer valer o direito material subjacente.
Assim deve-se buscar amoldá-lo sempre, de modo a que sirva da melhor forma à solução da questão discutida;
TUTELA DE INTERESSES COLETIVOS E DIFUSOS: é decorrência direta da exigência de garantia ao acesso a justiça. Há direitos que se encontram pulverizados entre os membros da sociedade, o que traz o risco à sua proteção, se esta não for atribuída a determinados entes;
UNIVERSALIZAÇÃO: todos os valores aqui mencionados poderiam ser resumidos neste: a busca pela democratização e universalização da justiça, única situação em que o Judiciário cumprirá idealmente o seu papel, que é o de assegurar a todos a integral proteção de seus direitos;
CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL: os princípios do direito processual civil estão, em grande parte, na Constituição, e as normas devem ser interpretadas sob a ótica constitucional, o que permite falar em direito constitucional processual;
EFETIVIDADE DO PROCESSO: relacionada a todos os princípios anteriores. O processo tem de ser instrumento eficaz de solução dos conflitos. O consumidor do serviço judiciário deve recebê-lo de forma adequada, pronta e eficiente. A técnica não deve ser um fim último, mas estar a serviço de uma finalidade, qual seja, a obtenção de resultado que atenda ao que se espera do processo, o ponto de vista ético, político e social. (GONÇALVES,  Marcus Vinicius Rios, Direito Processual Civil Esquematizado, São Paulo, Ed. Saraiva, 2011, pág. 41/42).

[22]  Contrário à ideia da participação dos litigantes, in litteris, salientou Lênio Luiz Streck e outros: Então agora as partes deverão cooperar entre si? Parte e contraparte de mãos dadas a fim de alcançarem a pacificação social… Sem ironias, mas parece que Hobbes foi expungido da “natureza humana”. Freud também. O novo CPC aposta em Rousseau. No homem bom. Ou seja, com um canetaço, num passe de mágica, desaparece o hiato que as separa justamente em razão do litígio. Nem é preciso dizer que o legislador pecou ao tentar desnudar a cooperação aventurando-se em setor cuja atuação merece ficar a cargo exclusivo da doutrina.

[23] “A evolução histórica do direito processual costuma ser apontada em três fases. A primeira correspondente ao praxismo ou sincretismo, no qual não havia distinção entre processo e direito material; a segunda fase é chamada de processualismo, no qual se demarcam as fronteiras entre direito processual e material, e as categorias processuais conhecem o desenvolvimento científico; e a terceira fase é chamada material, e as categorias processuais conhecem o desenvolvimento científico; e a terceira fase é chamada de instrumentalismo, que, embora se reconheça diferenças funcionais entre direito processual e material, se estabelece entre estes uma relação de interdependência e complementariedade, posto que o direito processual concretiza e materializa o direito substantivo, o que vale dizer que o primeiro dá sentido instrumental ao segundo.” (In: LEITE, Gisele, Neopositivismo, Neoconstitucionalismo e o Neoprocessualismo: o Que Há Realmente de Novo no Direito?, São Paulo, Ed. Síntese, 2012, p. 125).

[24] A legislação europeia vem consagrando, de forma expressa, o contraditório em seu sentido substancial ou material, consoante dispositivos da legislação alemã que aqui são trazidos à baila para ilustrar tal situação:. “§ 139 ZPO — CONDUÇÃO MATERIAL DO PROCESSO. O órgão judicial deve discutir com as partes, na medida do necessário, os fatos relevantes e as questões em litígio, tanto do ponto de vista jurídico quanto fático, formulando indagações, com a finalidade de que as partes esclareçam de modo completo e em tempo suas posições concernentes ao material fático, especialmente para suplementar referências insuficientes sobre fatos relevantes, indicar meios de prova, e formular pedidos baseados nos fatos afirmados. 
O órgão judicial só poderá apoiar sua decisão numa visão fática ou jurídica que não tenha a parte, aparentemente, se dado conta ou considerado irrelevante, se tiver chamado a sua atenção para o ponto e lhe dado oportunidade de discuti-lo, salvo se se tratar de questão secundária. O mesmo vale para o entendimento do órgão judicial sobre uma questão de fato ou de direito, que divirja da compreensão de ambas as partes. O órgão judicial deve chamar a atenção sobre as dúvidas que existam a respeito das questões a serem consideradas de ofício.  As indicações conforme essas prescrições devem ser comunicadas e registradas nos autos tão logo seja possível. Tais comunicações só podem ser provadas pelos registros nos autos. Só é admitida contra o conteúdo dos autos prova de falsidade.  “Se não for possível a uma das partes responder prontamente a uma determinação judicial de esclarecimento, o órgão judicial poderá conceder um prazo para posterior esclarecimento por escrito”.

[25] Apesar de que Ada Pellegrini Grinover defende que o princípio da igualdade formal, que a lei se configura como mera ficção, já que todos os seres humanos são desiguais por sua própria natureza, tendo o legislador se recusado a manifestar sobre essa desigualdade. Ao defendermos o princípio da igualdade material, por ser dinâmica, observa-se que compete ao Estado superar as desigualdades de forma a se atingir uma igualdade real.

[26] Ainda no sentido contrário, aduz STRECK: “Habermas dialoga com Robert Alexy: As partes não estão obrigadas à busca cooperativa da verdade, uma vez que também podem perseguir seu interesse numa solução favorável do processo “introduzindo estrategicamente argumentos capazes de consenso” (…)…

[27] O princípio do contraditório possui duas dimensões, a saber: a dimensão formal e a dimensão substancial. A dimensão formal garante às partes o direito de integrar a ação cujo objeto possa atingir-lhes em determinado direito. É a garantia de as partes serem ouvidas antes de uma decisão que lhes seja desfavorável. Enquanto que a dimensão substancial realiza-se no “poder de influência”, ou seja, não basta poder participar do processo, é preciso que essa participação seja apta a interferir no conteúdo da decisão.

[28] Sobre o tema Medina esclarece que a doutrina afirma que a imparcialidade do juiz é característica da atividade jurisdicional. Com a regulamentação da figura do assessor ao juiz ao lado dos demais auxiliares de Justiça, e a ampliação dos motivos de impedimento e suspeição do juiz aplicando-se também aos seus auxiliares e aos demais sujeitos imparciais do processo.

[29] Após a revolução industrial, com consequente massificação da produção e as lesões ao mercado consumidor, a concepção de defesa judicial duelítisca, lastreada no individualismo e no conceito egoísta de direitos subjetivos, tornou-se insuficiente, estimulando, assim o surgimento de novas ideias aptas a abarcar em apenas uma ação inúmeros sujeitos de direito lesados. Surgiram assim os interesses transindividuais cujas origens segundo Mafra Leal (In: Ações Coletivas: História, Teoria e Prática. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1998, pp.22 e 27) localiza as primeiras ações do gênero na Inglaterra medieval (século XII).
A maioria da doutrina, entretanto, prefere localizar os antecedentes da moderna ação coletiva no século XVII como uma variante do bill of peace.  O bill era uma autorização para processamento coletivo de uma ação individual e era concedida quando o autor requeria que o provimento englobasse os direitos de todos que estivessem envolvidos no litígio, tratando a questão de maneira uniforme, evitando a multiplicação de processos… O ser humano medieval estava indissociavelmente ligado à comunidade ou corporação a que pertencia, sendo fácil visualizar essa categoria como uma entidade homogênea e unitária (de certa forma, um indivíduo), fazendo-se representar tacitamente por alguns de seus membros…
Não havia, portanto, discussão acerca da representatividade do autor da ação coletiva, por não se discernir indivíduo de comunidade como se concebe hoje, estariam já no direito medieval ou no direito inglês do século XVII.
Na atualidade, os entes coletivos passam a atuar como substitutos processuais, representando inúmeros lesados e recebendo toda a "herança" dos direitos que foram lesados ou estão na iminência de ser lesados no mundo material, ou seja, toda a necessidade de ação que os substituídos materialmente possuem de obrigar o futuro demandado a fazer, deixar de fazer ou pagar alguma coisa. Em suma, os substituídos devem obter, por intermédio da jurisdição, exatamente aquelas "ações materiais" imprescindíveis para a concretização da justiça e satisfação dos direitos transubjetivos, que assumiram esta condição por fatores reais e não meramente conceituais.

[30] Desta forma, se os interesses são difusos, coletivos ou individuais homogêneos, eventual decisão que conceda a ação de direito material veiculada na ação processual para a defesa daqueles somente poderá ter como limite o espectro de abrangência das lesões perpetradas, bem como a localização dos sujeitos que se enquadrem naquelas realidades jurídicas (juridicizadas pelo reconhecimento de que são realidades fáticas que merecem a proteção da norma legal). Exemplo está presente, nos referidos contratos de adesão, que são oferecidos nacionalmente por grandes empresas. Se forem consideradas nulas determinadas cláusulas abusivas destes "pactos", em ação coletiva de consumo, a eficácia deverá ser "erga omnes" e limitada às pessoas lesadas e ao campo de existência de lesões, potenciais ou efetivas, na forma já vista.

[31] Há um anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos (PL5139/2009), já enviado ao Ministério da Justiça, que ao especificar hipóteses de coisa julgada secundum eventum probationis admite que, mesmo havendo sentença de improcedência fundada em provas produzidas, qualquer legitimado possa intentar outra ação, com idêntico fundamento, no prazo de 2 (dois) anos contados do conhecimento geral da descoberta da prova nova, superveniente, que não poderia ser produzida no processo, desde que idônea, por si só, para mudar seu resultado.

[32] Por fim, sobre a relação entre demandas coletivas e individuais, determina ainda o art. 104 do CDC que não haverá litispendência entre uma ação individual e uma ação coletiva (que trate de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos), mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

[33] A Ciência Processual contemporânea é resultado de inúmeras transformações que se procederam, ao longo da história, pela atuação dos aplicadores do direito e pela incansável colaboração dos estudiosos do direito. De fato, até o século XIX, não se falava em uma Teoria Geral do Processo, haja vista que a ação era concebida como desdobramento do próprio direito material e o instituto jurídico do processo como sinônimo de procedimento. Naquela época, como se pode perceber, o Direito Processual consistia em uma simples parte, mero apêndice, do Direito Privado, sem que fosse atribuída autonomia científica àquela matéria.

[34] A respeito ainda da legitimidade, Nelson Nery Jr apontou em artigo disponível em: http://www.conjur.com.br/2014-dez-20/nelson-nery-jr-faltou-ouvir-povo-respeito-cpc Acesso em 23/12/2014. Onde relata que se pensou no STF e no STJ, mas faltou ouvir o povo sobre o novo CPC.

[35] Niklas Luhmann (1927-1998) foi sociólogo alemão. Considerado um dos mais relevantes representantes da sociologia alemã atual. Adepto a uma teoria particularmente própria do pensamento sistêmico. Luhmann teorizou a sociedade como um sistema autopoiético. Ao aplicar o conceito dos sistemas autopoiéticos ao direito. Conseguiu reduzir a complexidade social. Recriando com base nos seus próprios elementos. Sua autorreferência permite que o direito mude a sociedade e se altere ao mesmo tempo, movendo-se com base em seu código binário (direito/não-direito).

[36] Já no seu primeiro artigo o projeto de novo CPC enfatiza o valor fundamental da Constituição, o que significa um enfoque contemporâneo e, particularmente neoprocessualista. Outro relevante ponto é a cautela no que se refere à manutenção da segurança jurídica e da estabilidade da jurisprudência.

[37] O elemento central da teoria de Luhmann é a comunicação. Sistemas sociais são sistemas de comunicação e a sociedade é o sistema social mais abrangente. Um sistema é definido pela fronteira entre ele mesmo e o ambiente, separando-o de um exterior infinitamente complexo. O interior do sistema é uma zona de redução de complexidade: a comunicação no interior do sistema opera selecionando apenas uma quantidade limitada de informação disponível no exterior. O critério pelo qual a informação é selecionada e processada é o sentido (em alemão Sinn).
Autopoiese ou autopoiesis (do grego auto "próprio", poiesis "criação") é um termo cunhado na década de 1970 pelos biólogos e filósofos chilenos Francisco Varela e Humberto Maturana para designar a capacidade dos seres vivos de produzirem a si próprios. Segundo esta teoria, um ser vivo é um sistema autopoiético, caracterizado como uma rede fechada de produções moleculares (processos) em que as moléculas produzidas geram com suas interações a mesma rede de moléculas que as produziu. A conservação da autopoiese e da adaptação de um ser vivo ao seu meio são condições sistêmicas para a vida. Portanto, um sistema vivo, como sistema autônomo está constantemente se autoproduzindo, autorregulando, e sempre mantendo interações com o meio (grifo meu), onde este apenas desencadeia no ser vivo mudanças determinadas em sua própria estrutura, e não por um agente externo.

[38] Considerando o ordenamento jurídico, conclui-se que o direito não apresenta lacunas, posto que sempre haja no ordenamento ainda que estado latente e inexpressivo, uma regra capaz de disciplinar cada possível situação ou conflito entre interesses. O mesmo não acontece, porém, com a lei, por mais criativo e previdente que fosse o legislador, nunca conseguiria cobrir através desta todas as situações que regulasse a complexa riqueza da vida social, nas suas constantes mutações e evoluções.

[39] Insta conferir interpretação conforme a Constituição ao modelo principiológico constitucional do processo e à técnica da heterointegração do processo civil no ramo trabalhista, significando, primeiramente, realçar a insuficiência e o equívoco dos reflexos deitados sobre a leitura isolada dos elementos componentes da aplicação subsidiária no processo laboral (existência de omissão e compatibilidade da heterointegração), bem como a necessidade de buscarem resultados compatíveis com a maior efetividade da tutela jurisdicional, preocupação tão presente na processualística moderna.
Também sobre a possibilidade de heterointegração, o Enunciado nº 66, aprovado na I Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada de 21 a 23 de novembro de 2007, e organizada pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (ANAMATRA), estabelece que:
66. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DE NORMAS DO PROCESSO COMUM AO PROCESSO TRABALHISTA. OMISSÕES ONTOLÓGICA E AXIOLÓGICA. ADMISSIBILIDADE.
Diante do atual estágio de desenvolvimento do processo comum e da necessidade de se conferir aplicabilidade à garantia constitucional da duração razoável do processo, os artigos 769 e 889 da CLT comportam interpretação conforme a Constituição Federal, permitindo a aplicação de normas processuais mais adequadas à efetivação do direito. Aplicação dos princípios da instrumentalidade, efetividade e não-retrocesso social.

[40] Grosso modo, interpretar significa determinar o significa e fixar-lhe o alcance. Há o método gramatical que leva estrita consideração às palavras da lei, para tanto o intérprete analisa as palavras tanto individualmente como também sua sintaxe. Há o método lógico sistemático onde ocorre o exame em suas relações com as demais normas que compõem o ordenamento e à luz dos princípios gerais que o informam. Já o método histórico onde se dá a análise das vicissitudes sociais de que resultou e das aspirações a que correspondeu. E, o método comparativo, pois os ordenamentos jurídicos, além de enfrentarem problemas similares ou idênticos, avizinham-se e se influenciam mutuamente.

[41] Enxergar os pressupostos processuais como requisitos para o julgamento do mérito, como apontou Rimmlespacher em uma das mais importantes teses do direito processual produzida na Alemanha no Século XX é verdadeiro dogma, pois não há como admitir tal precedência quando são descobertas as funções dos pressupostos. Prevalece na jurisprudência alemã que a análise dos pressupostos processuais precede a análise do mérito.

[42] O juiz não é mero árbitro cego e indiferente à lide, passivo no proceder e equidistante das partes, como reivindicava o vetusto direito moderno-legal-formal. Assim pode e deve interferir no processo constantemente, e não apenas de modo corretivo, mas também de modo colaborativo, a fim de proporcionar o pleno esclarecimento das partes, a máxima transparência nos procedimentos, atos e opiniões, a recíproca lealdade processual e, por fim, a máxima higidez do processo, de modo a permitir um pronunciamento de mérito (ou seja, uma decisão judicial de fundo sobre os interesses materiais versados no conflito concreto de interesses). In: FELCIANO, Guilherme Guimarães. O modelo de Stuttgart e os poderes assistenciais do juiz: origens históricas do processo social e as intervenções intuitivas no processo do trabalho.  Disponível em: http://www.idb-fdul.com/uploaded/files/2014_04_02717_02752.pdf .


Informações Sobre o Autor

Gisele Leite

Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.


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