A demissão por acordo trabalhista é uma modalidade de encerramento do contrato de trabalho criada com a Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), que permite que empregador e empregado ponham fim ao vínculo empregatício de forma consensual, ou seja, de comum acordo. Essa possibilidade trouxe mais flexibilidade para as partes envolvidas e passou a ser uma alternativa viável tanto para o empregador quanto para o empregado que desejam encerrar a relação de trabalho sem litígio.
Diferentemente das modalidades tradicionais de rescisão contratual (como pedido de demissão ou dispensa sem justa causa), a demissão por acordo trabalhista estabelece regras específicas quanto ao pagamento das verbas rescisórias e aos direitos trabalhistas que devem ser observados. Neste artigo, vamos detalhar como funciona esse tipo de desligamento, quem pode optar por ele, quais os direitos garantidos ao trabalhador, quais cuidados devem ser tomados, e como formalizar o procedimento corretamente.
O que é a demissão por acordo trabalhista
A demissão por acordo trabalhista, prevista no artigo 484-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), é uma forma legal de encerramento do contrato de trabalho quando ambas as partes – empregador e empregado – decidem, de forma conjunta e voluntária, encerrar a relação empregatícia.
Essa modalidade foi criada para atender situações em que o empregado deseja sair da empresa, mas o empregador também não tem interesse em manter o vínculo e, ao mesmo tempo, ambos querem evitar litígios trabalhistas ou prejuízos financeiros maiores. É um meio-termo entre o pedido de demissão (em que o empregado perde certos direitos) e a dispensa sem justa causa (que impõe maior custo à empresa).
Características principais da demissão por acordo
A demissão por acordo possui características próprias que a diferenciam das demais formas de rescisão. Entre os principais aspectos, destacam-se:
Deve haver manifestação de vontade mútua, sem coação ou imposição
É formalizada com documento assinado pelas partes
Garante parte dos direitos trabalhistas, com redução proporcional em alguns itens
Permite saque parcial do FGTS e impede acesso ao seguro-desemprego
Esse modelo está disponível tanto para contratos por tempo indeterminado quanto para contratos por tempo determinado (com cuidados adicionais), desde que observadas as regras específicas para a rescisão consensual.
Diferença entre demissão por acordo, dispensa sem justa causa e pedido de demissão
Para entender melhor o alcance da demissão por acordo trabalhista, é importante compará-la com as formas tradicionais de encerramento do contrato:
Pedido de demissão
Iniciativa do empregado
Não há aviso-prévio indenizado pelo empregador
Não há multa de 40% do FGTS
Trabalhador não pode sacar o FGTS (exceto em casos permitidos por lei)
Não tem direito ao seguro-desemprego
Dispensa sem justa causa
Iniciativa do empregador
Pagamento integral de aviso-prévio (trabalhado ou indenizado)
Pagamento de multa de 40% sobre o saldo do FGTS
Liberação do saque total do FGTS
Acesso ao seguro-desemprego
Demissão por acordo
Iniciativa conjunta (empregado e empregador)
Pagamento de 50% do aviso-prévio indenizado (se for o caso)
Pagamento de 20% da multa sobre o FGTS (metade da multa tradicional)
Liberação de 80% do saldo do FGTS
Sem acesso ao seguro-desemprego
A demissão por acordo representa, portanto, um caminho intermediário, que busca equilibrar os interesses das duas partes.
Direitos do trabalhador na demissão por acordo
Ao optar pela demissão consensual, o trabalhador tem direito a receber as seguintes verbas rescisórias:
Saldo de salário (dias trabalhados no mês da rescisão)
Férias vencidas, se houver, com adicional de 1/3 constitucional
Férias proporcionais com 1/3
13º salário proporcional
Metade do valor do aviso-prévio, se não for cumprido
Multa de 20% sobre o saldo do FGTS
Saque de até 80% do valor depositado no FGTS
No entanto, perde o direito ao seguro-desemprego, o que deve ser cuidadosamente considerado antes da formalização do acordo.
Como fazer a demissão por acordo trabalhista
Para formalizar corretamente a demissão por acordo trabalhista, é necessário seguir um procedimento claro e documentado. Veja o passo a passo:
1. Iniciativa das partes
A iniciativa pode partir do empregador ou do empregado, desde que a outra parte concorde voluntariamente. Não deve haver coação, ameaça ou imposição.
2. Registro formal
As partes devem elaborar um documento de rescisão consensual, que deve conter:
Identificação do empregado e empregador
Declaração de vontade mútua
Valores das verbas rescisórias
Forma de pagamento
Data da rescisão
3. Homologação no sindicato ou Ministério do Trabalho
Se o trabalhador tiver mais de 12 meses de vínculo com a empresa, a legislação não exige mais a homologação no sindicato, mas é recomendável que a rescisão seja feita com acompanhamento jurídico, para garantir que os direitos estão sendo respeitados.
4. Assinatura das partes
Empregado e empregador devem assinar o termo de rescisão e todos os documentos pertinentes, como o Termo de Quitação das Verbas Rescisórias (TRCT), extrato do FGTS e guias de pagamento.
5. Pagamento das verbas
O pagamento das verbas rescisórias deve ser feito até 10 dias corridos a partir do encerramento do contrato. O atraso gera multa prevista no artigo 477 da CLT, equivalente a um salário do trabalhador.
Vantagens da demissão por acordo para o empregador
A empresa se beneficia dessa modalidade principalmente por:
Reduzir os custos da rescisão (como a multa do FGTS e o aviso-prévio)
Evitar ações trabalhistas futuras
Manter uma relação amigável com o ex-funcionário
Ter previsibilidade dos valores a serem pagos
Isso é especialmente útil em situações de reestruturação de equipes, encerramento de contratos por vontade mútua ou saída de profissionais que desejam empreender ou mudar de carreira.
Vantagens da demissão por acordo para o empregado
Para o trabalhador, as vantagens incluem:
Receber parte das verbas rescisórias mesmo sem ser dispensado
Poder sacar 80% do FGTS
Ter um desligamento amigável, com possibilidade de retorno futuro
Melhor planejamento financeiro e menos conflito
No entanto, o não acesso ao seguro-desemprego é um ponto que deve ser bem avaliado, principalmente se o trabalhador não tiver outra fonte de renda imediata.
Cuidados e riscos da demissão por acordo
Apesar de legal, a demissão por acordo exige cautela para evitar fraudes, coações ou problemas futuros. Veja os principais cuidados:
Coação e simulação
É proibido que o empregador “obrigue” o empregado a assinar um acordo. Qualquer indício de coação pode invalidar o acordo e gerar condenações na Justiça do Trabalho.
Perda de benefícios
O trabalhador perde o direito ao seguro-desemprego e não pode sacar 100% do FGTS. Se ele estiver em situação financeira difícil, a modalidade pode não ser a mais adequada.
Recusa do banco a liberar o FGTS
Apesar da previsão legal, alguns bancos podem dificultar o saque de 80% do FGTS sem a apresentação correta do TRCT e do código de rescisão utilizado no eSocial.
Insegurança jurídica
Empresas que não documentam corretamente o acordo podem ser alvo de ações judiciais, com o trabalhador alegando que foi forçado a aceitar a rescisão.
Código correto para rescisão no eSocial
É importante utilizar corretamente o código de motivo de rescisão no sistema do eSocial. Para a demissão por acordo, o código a ser utilizado é o 33 – Rescisão do contrato de trabalho por acordo entre as partes, conforme tabela padrão.
Esse registro é essencial para liberar corretamente o saque parcial do FGTS e para registrar o evento no sistema de obrigações fiscais e previdenciárias.
Exemplo de cláusula de acordo trabalhista
“As partes, de comum acordo e de forma voluntária, resolvem encerrar o contrato de trabalho celebrado em 01/04/2020, nos termos do artigo 484-A da CLT, sendo devidas as verbas rescisórias na forma prevista para rescisão por acordo. Fica ajustado que o aviso-prévio será indenizado, com pagamento de 50% do valor correspondente, bem como será paga multa de 20% sobre o saldo do FGTS. O empregado poderá sacar até 80% do saldo existente na conta vinculada do FGTS, não fazendo jus ao seguro-desemprego.”
Perguntas e respostas sobre demissão por acordo trabalhista
O trabalhador pode sacar o FGTS na demissão por acordo?
Sim, mas apenas 80% do valor disponível na conta vinculada. Os 20% restantes permanecem no fundo.
O empregado recebe o seguro-desemprego na demissão por acordo?
Não. A legislação é clara ao vedar o direito ao seguro-desemprego nessa modalidade de rescisão.
É necessário homologar a demissão por acordo no sindicato?
Não. Desde a reforma trabalhista, a homologação no sindicato deixou de ser obrigatória, inclusive para contratos com mais de um ano. Mas é recomendável acompanhamento jurídico.
O aviso-prévio pode ser trabalhado na demissão por acordo?
Sim. O aviso-prévio pode ser trabalhado ou indenizado. Se for indenizado, o trabalhador recebe apenas 50% do valor correspondente.
Empregador pode forçar o trabalhador a aceitar demissão por acordo?
Não. Isso é ilegal e caracteriza coação. O acordo deve ser voluntário e formalizado com base na livre manifestação de vontade.
Posso reverter uma demissão por acordo?
Em regra, não. Mas, se for comprovado vício de consentimento, coação ou fraude, o trabalhador pode pleitear a anulação judicial do acordo.
Como fazer o saque dos 80% do FGTS após o acordo?
Com o TRCT, chave de liberação e documentos pessoais, o trabalhador deve procurar uma agência da Caixa Econômica Federal.
Conclusão
A demissão por acordo trabalhista é uma inovação relevante trazida pela Reforma Trabalhista, que tem se mostrado vantajosa tanto para empresas quanto para trabalhadores que desejam encerrar a relação de emprego de maneira amigável, transparente e menos onerosa.
No entanto, é fundamental que essa modalidade seja usada com responsabilidade, respeitando a vontade mútua das partes, documentando o procedimento de forma adequada e esclarecendo todos os efeitos legais ao trabalhador, especialmente a ausência de direito ao seguro-desemprego.
Com a correta orientação jurídica e o cumprimento dos requisitos legais, a demissão por acordo pode ser uma ferramenta eficaz para a gestão de pessoas e para a pacificação das relações de trabalho. Assim, evita-se o ajuizamento de ações, minimiza-se o risco de condenações e fortalece-se uma cultura de respeito e diálogo no ambiente corporativo.