Direitos humanos julgue você!
1992
Ação = Tropa de choque invade Carandirú para conter rebelião
Resultado = 111 marginais mortos
Reação = Comissão de direitos humanos liderada por Eduardo Suplicy solicita urgente punição do cel. Ubiratan, faz visitas ao presídio e às famílias dos presos, manda rezar missa pelos presos, etc
Outubro / Novembro 2003
Ações = Marginais do PCC metralham bases da PM porque querem banho de sol, protetor solar, anti-séptico bucal, encontros íntimos, etc
Resultado = diversos mortos e feridos, entre PM e Civis
Reação = Comissão de direitos humanos :
NÃO solicita urgente punição aos comandantes do PCC,
NÃO faz visitas aos postos baleados,
NÃO faz visita às famílias dos policiais mortos e feridos,
NÃO manda rezar missa pelos mortos, etc.
ou seja, eles não fizeram NADA
Será que somente os criminosos têm direitos humanos?
[aqui vem uma lista de políticos, artistas, jornalistas e religiosos que, à época, participaram da comissão]
Se você acha que deve continuar prestigiando esses intelectuais politicamente corretos enquanto o povo tem que se trancar em casa para fugir desses marginais, delete essa mensagem.
Mas se vc acha que está na hora de mudarmos a nossa realidade, repasse para seus amigos.”
Primeiramente, gostaria de dizer que vocês nunca me verão discorrer, uma única linha se quer, sobre assuntos como “biologia molecular”, “física quântica”, “engenharia mecatrônica”, ou qualquer outra coisa parecida. Motivo? Eu não entendo nada sobre qualquer destes assuntos! Seria leviano de minha parte tentar discutir um tema sobre o qual eu não tenho conhecimentos mínimos para poder possuir uma opinião a respeito.
Gostaria que quem não entendesse de Direito tivesse a mesma consideração… Não estudei cinco anos na graduação, um ano na pós-graduação, e continuo estudando Direito, para, dia após dia, ouvir pessoas que, na sua maioria, não chegou nem a procurar o significado de “Direito” no dicionário, falar bobagens a respeito de temas jurídicos.
Segundo o grande Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira (in Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, 13ª ed., 1979, vol. 2), dentre os inúmeros significados de “Direito” encontramos “o que é justo, reto e conforme à lei”, ou “ciência das normas obrigatórias que disciplinam as relações dos homens em sociedade”, ou, ainda, “conjunto de leis que estabelecem a forma pela qual se devem fazer valer os direitos; conjunto de leis reguladoras dos atos judiciários”.
Assim, na tentativa de resumir, para os leigos: Direito é ciência, exige profundo estudo e conhecimento das leis, dos princípios jurídicos e das decisões judiciais.
Direito, por outro lado, implica na correta aplicação da lei, mesmo que esta lei seja considerada, por alguns, como “injustas”, pois não podemos usar a mesma lei diferentemente para duas pessoas, pois isto seria injusto, seria privilegiar uma pessoa e/ou prejudicar outra.
Assim, nestes casos, citados pela mensagem que recebi, o que a comissão de Direitos Humanos queria é a simples e correta aplicação da lei. Não vamos aqui entrar na controvérsia se elas são justas, ou injustas, pois queremos apenas demonstrar que “defender os Direitos Humanos”, não é sinônimo de “defender bandidos” como alguns expoentes da mídia nacional insistem em afirmar.
Gostaria que, antes de alguém expor uma idéia sobre “Direitos Humanos”, entrasse em uma faculdade de direito, e procurasse em sua biblioteca um livro sobre o assunto.
Tenho absoluta certeza que, quem assim proceder, encontrará dentro deste livro informações suficientes para perceber que “Direitos Humanos” significa proteção do indivíduo contra o Estado.
Ou seja, segundo a mais sólida – e praticamente unânime – doutrina, lutar por Direitos Humanos é defender as “pessoas comuns” das arbitrariedades e injustiças cometidas pelo Estado (que, para fins de entendimento por parte dos leigos, pode ser considerado como sinônimo de “governo” – apesar de não ser).
Assim, quando uma Comissão de Direitos Humanos qualquer pede que os presos sejam tratados com dignidade por parte dos agentes estatais – principalmente policiais e agentes carcerários -, quando se pede que os presos não sejam torturados ou assassinados, ou quando pede que aqueles que não agem desta forma – a forma que manda a lei -, esta, ou qualquer outra Comissão de Direitos Humanos está cumprindo com seu dever: defender os indivíduos das injustiças cometidas pelo Estado – ou por um, ou mais, de seus agentes.
Que não me entendam mal: não estamos dizendo que as vítimas, sua família, ou a sociedade não têm direitos. Em hipótese alguma teríamos a ousadia de afirmar tamanho disparate. Apenas estamos sendo tecnicamente corretos – e aqui só quem já estudou o assunto poderá confirmar o alegado – ao afirmar que estes direitos – das vítimas e seus familiares -, apesar de absolutamente sagrados, não é questão de “Direitos Humanos”. Não sob o ponto de vista técnico, sob o ponto de vista da “Ciência do Direito”.
Claro que as pessoas comuns afirmam que foram “roubadas”, quando na verdade foram “furtadas”, enquanto que os juristas afirmam que foram “roubados”, enquanto que os leigos dizem que foram “assaltados”. Porém, “Direitos Humanos” é um termo técnico que não pode ser usado no sentido que querem alguns apresentadores de televisão, no sentido de “defensores de bandidos”, ou de “contra a sociedade honesta”, pois seu significado é, frise-se mais uma vez, defender os indivíduos de injustiças cometidas pelo Estado. Assim, quando um indivíduo comete uma injustiça a outro indivíduo – como no caso de cometer um crime, por exemplo – não se trata de “Direitos Humanos”, mas apenas de uma questão de direito.
As vítimas de crimes, os seus familiares também possuem direitos sagrados que não podem ser esquecidos: direito à descobrir a identidade do culpado e sua conseqüente punição, direito à assistência do Estado, em caso de necessidade provocada pela ação criminosa…
Porém, como dito, tais questões não são, tecnicamente, de “Direitos Humanos”, são questões comuns, mais precisamente de “Direitos de Personalidade”, para continuarmos sendo tecnicamente corretos.
Direitos Humanos são os direitos que o indivíduo possui por ser membro da família humana, direitos que impõem respeito à sua dignidade, direito de não ser tratado como – ou muitas vezes até pior que – um animal.
Os “Direitos de Personalidade” são os mesmos direitos protegidos pelos “Direitos Humanos” – direito à vida, à liberdade, à igualdade, à incolumidade física, etc… – porém, enquanto “Direitos Humanos”, tecnicamente, dizem respeito à proteção do indivíduo contra o Estado, os “Direitos de Personalidade” dizem respeito à proteção de um indivíduo em face de outro indivíduo, ou de grupo de indivíduos.
Não é possível pedir para o Prefeito prender um criminoso. Não é possível pedir para um Juiz do Trabalho conceder pensão alimentícia em benefício do filho de alguém. Não é possível pedir para que uma Comissão de Direitos Humanos lute pela prisão de criminosos. Tudo isso tem uma única explicação: cada uma destas “pessoas” tem sua competência!
Para a proteção dos Direitos de Personalidade temos o Ministério Público, representado pelos digníssimos Promotores de Justiça, aos quais, entre outras coisas, cabe a proteção da sociedade, e denunciação (tecnicamente denunciar significa pedir, ao juiz, a prisão do criminoso, e não simplesmente noticiar um crime à polícia) dos criminosos.
Também existe a Defensoria Pública, que na verdade são advogados pagos pelos cofres públicos para advogar em prol dos necessitados que não possuam recursos suficientes para arcar com os custos dos honorários advocatícios de advogados dos escritórios particulares.
É bom lembrar, ainda, que a própria vítima, ou seus familiares são parte legítima para pleitearem por seus direitos junto ao Poder Judiciário. Aqui é sempre bom lembrar as várias associações de vítimas que são criadas para lutarem por seus direitos.
Não é necessário, portanto, que as Comissões de Direitos Humanos efetivamente lutem pelos direitos das vítimas ou de seus familiares, pois já existem pessoas que poderão, perfeitamente, fazer isso.
Se, porém, for negado o direito à vítima de pleitear seus direitos na justiça, ou se, por outro lado, a família da vítima vier a ficar sem condições mínimas para a subsistência por força do ato praticado pelo criminoso, aí sim, estes poderão procurar uma Comissão de Direitos Humanos para fazerem valer seus direitos…
O importante é, frise-se, que a vítima e/ou seus familiares procurem a justiça por si mesmos, ou com o auxílio do Ministério Público, ou da Defensoria Pública, e, somente após a negativa de seu pedido, é que estes deverão procurar as Comissões de Direitos Humanos para que esta lute por seus direitos.
Por outro lado, os criminosos que estão cumprindo pena, ou os denunciados que esperam julgamento, não possuem quem olhe por eles. Estão trancafiados longe da vigilância social, e à mercê de todo o tipo de atrocidades por parte dos agentes públicos. É isto que justifica a luta das Comissões de Direitos Humanos pela defesa de seus direitos.
Não é possível, durante um campeonato de futebol – por exemplo -, mudar-se as regras do jogo, ou do torneio. Da mesma forma, aquele que cometeu um crime deve ter a segurança de que será condenado apenas às penas que estavam previstas na data em que cometeu o crime.
Assim, uma vez que não existem leis que permitam a humilhação ou a degradação dos presos, ou leis que permitam a tortura, a crueldade para com os presos, ou leis que admitam o trabalho forçado, ou a pena de morte, não é possível que estes indivíduos – seres humanos que ainda são, criados à semelhança de Deus – sejam tratados de forma não compatível com as leis em que foram condenados. É por isso que lutam as Comissões de Direitos Humanos.
É bom lembrar, ainda, que as Comissões de Direitos Humanos não lutam apenas pelos presos ou criminosos, também é comum ver agentes destas comissões envolvidos em ações em favor dos que foram injustamente perseguidos e covardemente assassinados durante o regime militar apenas por opiniões políticas diferentes das esposadas pelo governo de então.
Também é comum ver integrantes dos movimentos de Direitos Humanos lutarem contra o aborto, a eutanásia, ou em ações que visam a proteção dos sem-terra e sem-teto, dos que ficaram desabrigados por causa de fortes chuvas de verão…
Quem afirma que a Comissão de Direitos Humanos é protetora de bandidos é porque, felizmente, nunca precisou da ajuda daqueles que lutam pela dignidade humana, e que, infelizmente, se mantêm alienados à realidade sociais brasileira, corrompidos por um sistema capitalista que transmite a falsa idéia de que só passa por dificuldades aqueles que não apreciam o trabalho, ou que são bandidos por natureza…
Infelizmente, a realidade é outra: é comum ver pais de família trabalharem incessantemente durante toda a vida, e, ao se aposentarem, não terem uma casa para morar, não terem condições, se quer, de comprar remédios necessários para manter sua vida, ou, ainda, em alguns casos ainda mais extremos, não terem condições nem mesmo de se alimentarem dignamente – e aqui merece aplausos a iniciativa governamental do programa Fome Zero, por mostrar a muitos brasileiros uma realidade que não conheciam – e é por tudo isso que lutam os defensores dos Direitos Humanos: pela dignidade humana em todas as suas formas…
Não desconhecemos as opiniões de autores que começam a afirmar a possibilidade de vigência dos Direitos Humanos face, não só ao Estado, mas também face aos indivíduos. Apesar de me filiar a esta corrente, acredito que cientificamente correto é apresentar a opinião majoritária, além de que não me parece acertado aceitar a idéia defendida pela mídia que possui uma conotação de vingança, de perseguição aos que cometeram crimes.
Não pretendemos adentrar nesta ceara, mas apenas para demonstrar o atraso desta mentalidade, cumpre lembrar que já no Século XXVII os filósofos demonstravam o equívoco deste tipo de ideologia, sendo que o mais famoso defensor de uma nova mentalidade quanto aos criminosos foi, já no Século seguinte, Cesare Bonesana (1738-1794), mais conhecido como Marquês de Beccaria – ou simplesmente Cesare Beccaria – e que, até hoje, é aplaudido nas universidades de todo o mundo por mostrar, em seu famoso livro “Dos delitos e das penas”, que as penas impostas aos criminosos devem possuir uma certa conformidade em relação aos crimes que foram cometidos, e que, apesar de condenados, os criminosos continuavam sendo seres humanos, possuidores de dignidade própria.
Assim, percebe-se que aqueles que defendem a idéia de perseguição aos criminosos, que defendem os trabalhos forçados, ou a tortura estão, no mínimo, 300 anos atrasados… E, pior que isso, não se atentam para o fato de que poderão, um dia, por equívoco policial, ou judicial, acabar dentro de uma instituição de recuperação, e serem tratados da maneira que acham que os criminosos devem ser tratados…
Porém, o mais importante e poderoso argumento pela defesa da dignidade dos condenados é o de que, um dia, eles vão voltar a fazer parte da sociedade.
Faça uma experiência, amarre um cão – de qualquer raça, até das mais pacíficas – por um, não tão longo, período, talvez um mês. Durante este tempo não o solte para nada, não limpe suas fezes, não o alimente direito, e se possível dê-lhe umas boas pancadas de vez em quando, de preferência uma vez por dia. Depois deste período de um mês solte-o. Duvido que este animal não lhe morderá, ou que ao menos não tentará fazê-lo…
Por que com os seres humanos seria diferente?
“Violência gera violência!”
Os criminosos são, e serão sempre, pessoas humanas.
Devem ser tratados com dignidade e respeito. Devem ser re-educados para o convívio em sociedade. Devem ser tratados como quem fez uma coisa errada, mas, sobre tudo, devem ser tratados como seres humanos criados à imagem e semelhança de Deus.
Desde que Jesus Cristo veio a Terra ele nos ensinou que “olho por olho, dente por dente” é uma coisa errada e que gera mais violência. Devemos apresentar aos criminosos nossa “outra face”, pois o melhor exemplo que daremos pela sua recuperação é o perdão pelos erros que cometeram.
Essa é a verdadeira luta dos defensores dos Direitos Humanos.
Julgue você mesmo!
Informações Sobre o Autor
Enéas Castilho Chiarini Júnior
Advogado em Pouso Alegre/MG, pós-graduado em Direito Constitucional pelo IBDC (Inst. Bras. de Dir. Constitucional) em parceria com a FDSM (Fac. de Dir. do Sul de Minas), capacitado para exercer as funções de Árbitro/Mediador pela SBDA (Soc. Bras. para Difusão da Mediação e Arbitragem), e membro, desde a fundação, do Quadro de Árbitros da CAMASUL – Câmara de Mediação e Arbitragem do Sul de Minas –, é, ainda, autor de diversas matérias jurídicas publicadas em revistas do Brasil e do exterior, e em diversos sites jurídicos.