Resumo: O presente artigo busca analisar a adoção à brasileira, os direitos aos alimentos e a sucessão do adotando com base na jurisprudência brasileira. Embora a prática da adoção à brasileira esteja tipificada no Código Penal brasileiro vigente, ela se faz cada vez mais presente na sociedade. Além disso, a partir do registro no assento de nascimento, o adotando passa a ter os mesmos direitos que os filhos biológicos, uma vez que é vedada qualquer discriminação, de acordo com a Constituição da Republica do Brasil, Código Civil brasileiro e Estatuto da Criança e do Adolescente vigente, aplicado pela jurisprudência dos Tribunais. [1]
Palavras-chave: Adoção à brasileira; Direito a alimentos; Efeitos sucessórios.
Abstract: This article seeks to analyze the adoption of the Brazilian, the rights to food and the succession of adopting based on Brazilian jurisprudence. Although the practice of adoption in Brazil is typified in the current Brazilian Penal Code, it is becoming more and more present in society. In addition, from the registration in the birth seat, the adopter will have the same rights as the biological children, since it is prohibited any discrimination, according to the Constitution of the Republic of Brazil, Brazilian Civil Code and the Statute of the Child and of the existing Adolescent, applied by the jurisprudence of the Courts.
Keywords: Brazilian Adoption; Right to food; Succession effects;
Sumário: Introdução. 2 Aspectos Gerais da adoção no Brasil. 2.1 Adoção no Código Civil de 1916. 3 DO Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 Do Código Civil de 2002. 5 Da Lei Nacional Da Adoção N° 12.010 DE 2009. 6 Da Adoção à brasileira. 6.1 Adoção á brasileira através da analise jurisprudencial. 7 Dos alimentos. 8 Do Direito a sucessão. 9 Da Anulação do Registro Civil no caso de adoção à brasileira com base na jurisprudência brasileira. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Adoção é o ato jurídico e solene no qual alguém acolhe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha. A partir disso, criando uma relação fictícia de paternidade e filiação entre adotante e adotado, independente de existir entre eles relação de parentesco consanguíneo ou afim.
Devido a constante evolução histórica ocorrida ao logo dos anos no âmbito jurídico, que por sua vez reflete o comportamento da sociedade de modo uniforme e atinge também dentre outros, o processo da adoção. Embora a prática da adoção à brasileira está tipificada no Código Penal brasileiro vigente, ela se faz cada vez mais presente na sociedade. Isso se dá por motivos inerentes a forma como o processo de adoção é conduzido. Pode-se citar como exemplo, o tempo de espera, no qual o adotante tem a falsa impressão de que o processo é lento e demorado e que dificulta a colocação da criança no seio da nova família. Com essa pratica, o adotando que deveria estar disponível no cadastro nacional de adoção acaba sendo, de alguma forma desviada de modo criminoso, o que dificulta ainda mais o processo formal da adoção. Além disso, o perfil para adotar, dentre outros requisitos objetivos, faz com que pessoas pratiquem esse feito, tendo a errônea impressão de que está acelerando o processo.
Embora exista, todo o aparato jurídico de proteção aplicado a esse instituto no ordenamento jurídico, esse fenômeno social, o qual transgride o ordenamento jurídico, que é o ato de registrar filho de outros como se fosse seu filho biológico, não atendendo ao que regula os tramites legais da adoção. Inserida no contexto de filiação sócioafetiva, tida como uma relação jurídica de afeto, na qual existe uma relação onde os pais ou o homem ou até mesmo a mulher criam uma criança sem nenhuma relação consanguínea por vontade própria. Essa pratica é muito comum no Brasil, quando um casal se relaciona e a mulher está gravida do relacionamento anterior, o atual companheiro acaba aceitando como seu o filho de outrem.
Existe ainda os casos de aspectos culturais onde a criança é deixada na porta de alguém, e, por acreditar no destino a nova família acaba percebendo que tem o dever afetivo de acolher aquela criança recém-nascida como sua, sendo ainda algo provido pelo destino, que os incumbiu de pais daquele ser humano até então desamparado.
A adoção à brasileira não pode ser anulada, a jurisprudência à medida que o tempo avança tem seguido essa regra clara, observando-se o processo e quem o fez de maneira voluntária. Pois não faz sentido o pai que solicitou e executou todos os trâmites de reconhecimento do filho de forma voluntaria e posteriormente anular os atos praticados. Observando-se ainda que, deve levar em consideração os interesses do adotado em detrimento de quem o adotou.
Além disso, a partir do registro no assento de nascimento, o adotando passa a ter os mesmos direitos que os filhos biológicos, uma vez que é vedada qualquer discriminação, de acordo com a Constituição da Republica Federativa do Brasil, Código Civil brasileiro, Estatuto da Criança e do Adolescente vigente, a Lei Nacional da Adoção e a aplicação da jurisprudência dos Tribunais.
1 ASPECTOS GERAIS DA ADOÇÃO NO BRASIL
1.1 Adoção no Código Civil de 1916
A adoção no Brasil foi elencada na legislação pátria no Código Civil de 1916, nessa legislação, era nítido o caráter contratual desse feito, uma vez que ela visava trazer para aqueles com idade avançada e que não puderam ter filhos biológicos “alguém” que viessem a suceder após a morte, para assim, aquela família continuar se perpetuando.
“No sistema do Código Civil de 1916, tratava-se de negocio jurídico bilateral e solene, uma vez que se realizava por escritura publica, mediante o consentimento de duas partes. Se o adotado era maior e capaz, comparecia em pessoa; se incapaz, era representado pelo pai, ou tutor, ou curador. Admitia-se a dissolução do vinculo, sendo as partes maiores, pelo acordo de vontades.”[2]
Notou-se que a ideia de adoção naquela época destoava e muito do se vê hoje. Deve-se levar em consideração que o Código Civil daqueles tempos estabeleceu de inicio as primeiras normas para adotar alguém. De inicio os candidatos em adotar deveriam ser 18 anos mais velhos que o adotando e ter mais de 50 anos, o legislador acreditava que tal ato deveria ser feito somente por aqueles detentores de maior grau de maturidade, visto que, o arrependimento posterior, poderia acarretar irreparáveis e exorbitantes danos as partes.
Além disso, os adotantes também não poderiam ter descendentes legítimos ou legitimados, duas pessoas não poderiam adotar em conjunto, exceto se fossem marido e esposa. Exigia-se o consentimento de quem estivesse com a guarda do adotado. Outro ponto de reflexão comparando a adoção regulada pelo Código de 1916, o de 2002, Estatuto da Criança e do adolescente e Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, é que: o caráter da adoção era revogável, poderia ser dissolvida pela convenção entre as partes ou quando alegada ingratidão do adotado em face do adotante.
A adoção era feita por escritura publica, o que trazia ao ato uma total diferenciação, como se de fato fosse proposital diferenciar um filho biológico de um adotado. O grau de parentesco da adoção era limitado ao adotado e adotante, exceto quanto a impedimentos matrimoniais. O parentesco natural não extinguia os direitos e deveres pela adoção, salvo o pátrio poder, passado aos pais adotivos. Bem como o tratamento distinto entre os filhos naturais e adotivos no que tange a partilha de bens, tornava a adoção pouco utilizada.
Note-se que a exigência de que a pessoa disposta a adotar não tivesse filhos ou legitimados era primordial, mostrando que a adoção naquela época servia para suprir a vontade de pessoas inférteis, e não proteger a criança e garantir o seu direito de ser criada em uma família.
“Em se tratando de sucessão hereditária, o adotante tinha direito a apenas metade do quinhão a que tinham direito os filhos biológicos, desde que os filhos biológicos fossem nascidos depois da adoção. Se ao tempo da adoção os adotantes tivessem filhos biológicos, o filho adotivo nada receberia.”[3]
Deixa claro ao o que o adotado tinha direito em concorrência com os filhos biológicos se estes viessem após a adoção, principalmente no que tange a sucessão.
Ainda quanto aos direitos sucessórios, se faz interessante a análise do recorte da apelação cível do ano de 1916:
“N. 6719 – Ribeirão Preto – Apellantes Antonio Nogueira e outro. Appellado, espolio de d. Maria Alvim Nogueira Em Ribeirão Preto surgiu numa causa certa esta questão: pode o filho adoptivo concorrer à herança do pae adoptante com os filhos legítimos deste, ou mesmo com os filhos naturaes? O juiz decidiu que não e o Tribunal confirmou a sentença. No caso em debate, declarou o sr. ministro Whitaker, nem existia a adopção no sentido legal. Para que haja adopção em face da lei, é necessario que o acto do adoptante estabelecendo-a seja confirmada judicialmente, ella não ficará completa e não poderá produzir effeitos em relação a terceiros. O que havia no caso era apenas a declaração do adoptante, feita em testamento, do que adoptava como filho a pessoa que ora invocara essa qualidade. Nada mais. É exacto que o Código Civil Brasileiro não exige essa formalidade de confirmação judicial para que a adopção se tenha por existente. Mas, o Código Civil ainda não está em vigor. O que regula o caso é a legislação vigente e essa não dispensa a confirmação judicial. Mesmo, porém que a adopção estivesse completa, ainda assim o filho adoptivo não tinha direito que reclamava. Na legislação vigente os princípios dominantes em matéria de adopção são estes: o filho adoptivo não fica equiparado aos filhos legítimos nem aos naturais simples; não pode, tão pouco ser chamado de successão a successão “ab intestato”. O único direito que elle tem é o de pedir alimentos. As leis de sucessão não cogitam do filho adoptivo. Não se, póde, nestas condições appelar para o Direito Romano e com base nelle estabelecer uma classe de herdeiros de que as leis patrias não curam. O próprio Código Civil não dá esse direito successorio em que estatue que no caso de morte do filho adoptivo, sem deixar descendentes, a successão deverá ser recolhida pelo pae natural e não pelo pae adoptivo”[4].
Aduz-se ainda que, o Código de 1916 ainda mantinha vinculação pelo parentesco do adotado com a família natural e a possibilidade do rompimento da adoção, os direitos e deveres advindos parentesco natural permaneciam, salvo o poder familiar, que era passado ao pai adotivo.
Ainda nesse contexto, cabe salientar os dizeres de Jayme Abreu acerca da adoção no Código Civil de 1916:
“Havia obstáculos legais à integração total do adotando à família do adotante. A criação do parentesco civil, exclusivamente entre adotado e sua família natural. A possibilidade do rompimento da adoção, de comum acordo, ou unilateralmente, pelo adotado, quando completasse a maioridade, e pelo adotante, por ato de ingratidão”[5].
Todo o processo de adoção era feito e validado mediante escritura publica, onde não cabiam às observações de um juiz como reza a regra do artigo 375: “ A adoção far-se-á por escritura publica, em que se não admite condição, nem termo”. O código Civil de 2002 aboliu tal medida, atualmente não existe adoção por escritura pública, se fazendo imprescindível a interferência de um magistrado, visando assegurar direitos e deveres que é de ordem publica. No contexto hodierno, toda adoção deve ser assistida pelo poder público.
2 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n° 8.069/1990, é uma lei reconhecida internacionalmente, um dos diplomas considerados mais avançados em se tratando de direitos, proteção e garantias da população infanto-juvenil[6].
Esse Estatuto surgiu como uma alternativa ao passado Código de menores de 1979, ele traz uma nova tentativa de delimitar os direitos da criança e do adolescente como dever da família, da sociedade e do Estado. Os direitos elencados nesse Código devem ser assegurados com total prioridade, sendo um dos direitos mais relevantes, básicos e primordial ao ser humano em formação é a convivência familiar e comunitária, essas são essenciais a formação do caráter dentre outros requisitos que se fazem necessários durante essa fase da vida que todos de um modo ou de outro estão sujeitos[7].
A estrutura principal do Estatuto é a doutrina da proteção integral, essa trouxe inúmeras mudanças para o ordenamento jurídico, as crianças e os adolescentes como personagens de suas próprias histórias, como sujeitos de direitos, merecem proteção especial e integral, isso se dá à sua condição peculiar de seres em desenvolvimento, diferentes dos incapazes por ausência de discernimento.
Esse modelo de proteção se diferencia da focada na criança ou adolescente em si, mas basicamente nos seus direitos que devem ser constantemente assegurados pela lei e por todos em sua volta, ao mesmo tempo em que os pais e o Estado são responsáveis pela promoção desses direitos e proteção da criança ou adolescente, eles também são fiscais do fiel cumprimento, pela sociedade que é o conjunto que se relaciona diretamente com esse protegido afim de um bem coletivo maior. Nota-se que visão de tão somente proteger foi modificada para regularizar não mais o infante, mas sim os adultos, tanto nos serviços sociais quanto nas instituições, ao ameaçar ou violar os seus direitos.
De outra ótica desse ordenamento, a atuação do juiz se faz mais presente de uma forma técnica, com fronteiras nas garantias judiciais e em âmbito estritamente jurisdicional, dessa forma, impedindo a manifestação da arbitrariedade judicial e do paternalismo.
Ademais, as competências decisórias foram descentralizadas, trazendo maior participação da sociedade, das crianças e dos adolescentes, hoje possuem maior importância, assim dizendo, tendo as crianças e adolescentes suas opiniões levadas em consideração durante o processo de adoção.
Hoje a adoção regulamentada pelo artigo 39 do Estatuto da Criança e do Adolescente é norteada pelos mesmos princípios tanto para menores, como para maiores de 18 anos.
Consiste à luz de SILVIO DE SALVO VENOSA:
“no atual Estatuto da Criança e do Adolescente já não há distinção: a adoção dos menores de 18 anos é uma só, gerando todos os efeitos da antiga adoção plena. O estatuto menorista posiciona-se em consonância com a tendência universal de proteção à criança, assim como faz a Constituição de 1988, que em seu art. 6º, ao cuidar dos direitos sociais, refere-se à maternidade e à infância. Nos arts. 227 e 229 são explicitados os princípios assegurados à criança e ao adolescente, descreve que a criança ou adolescente tem direito fundamental de ser criado e educado no seio de uma família, natural ou substituta (art. 1º)”[8].
Os filhos biológicos são equiparados ao concebidos fora do casamento e aos filhos adotivos, é vedada toda e qualquer forma de discriminação, como preceitua o art.227 parágrafo 6°, da Constituição Federal.
Para o ECA as crianças e adolescentes são vistos como uma pessoa em desenvolvimento e elas passaram ser tratadas com importância, e declarou o adotado à condição de filho, com igualdade de direitos com caráter irrevogável.
No atual contexto, o vinculo afetivo sobressai dentro do seio familiar, em relação ao patrimônio e o sangue, que em outras épocas eram de relevante importância na formação da família, estes dois últimos foram dispensados nessa nova concepção. Isso significa que a afetividade é o principio norteador do direito de família, trazendo mudanças nos paradigmas da adoção.
Para demostrar isso a titulo de exemplo reza o artigo 28, parágrafo 3°, do Estatuto da Criança e do adolescente, o qual deixa claro que seja apreciada a relação de afinidade ao se escolher famílias substitutas. As regras jurídicas da adoção visam à prevalência dos interesses, direitos e necessidades do adotando e que a parentalidade passou a ser constituída a partir do vinculo afetivo, e não como antes era por laços biológicos ou jurídicos.
3 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Com o advento da Lei 10.406/2002 que instituiu o novo Código Civil, a adoção passou a ter de fato a intervenção do magistrado. A sentença proferida pelo juiz seria o único meio de conseguir a adoção, a adoção deve sempre ser assistida pelo poder publico[9].
A introdução dessa Lei trouxe também em seu artigo 1.625, somente será admitida a adoção que constitua efetivo benefício para o adotando, o contrário do que preceituava o antigo Código de 1916. Assim, o adotando é o centro de algo que ele é o protagonista, ele deve ser o centro de todo esse processo que visa o incluir em uma família e um lar que venha a protegê-lo para que possa concluir seu desenvolvimento de forma saudável.
Além disso, o Código extinguiu a diferença entre as formas de adoção para maiores e menores de 18 anos e igualou os aditados aos filhos biológicos. Esse Código em nada alterou o ECA, e o principio da proteção integral foi mantido.
4 DA LEI NACIONAL DA ADOÇÃO N° 12.010 DE 2009
Essa Lei trouxe uma reformulação da adoção no Brasil, chamada Lei Nacional da Adoção (Lei n° 12.010/09), procurou trazer mais rapidez e agilidade através da desburocratização, nesse processo que é conhecido por ser longo. Além disso, promovendo a redução de tempo permanência das crianças em abrigos para no máximo dois anos[10].
Foi instituído o Cadastro Nacional de Adoção, onde está reunido todas as pessoas devidamente cadastradas e que desejam adotar um filho, assim como as crianças e adolescentes disponíveis para adoção. Com isso, o cadastro passou de regional a nacional, visando o aumento das oportunidades tanto para as crianças e adolescentes quanto para quem deseja adota-los com o fim de constituir uma família.
Com essa Lei, ficou estabelecida uma preparação psicológica, regulando à adoção de pessoas mais velhas, com problemas de saúde, negras ou indígenas, além disso, trazer maiores esclarecimentos acerca do que é a adoção.
Assim, dois novos conceitos foram criados, a família substituta e a família extensa, aquela sendo a que acolhe a criança ou o adolescente desprovido de família natural e laços de sangue, e essa constituída por parentes próximos como tio, avós e outros com os quais o adotando mantem vínculos afetivos, com prioridade em detrimento da família substituta quanto ao encaminhamento da criança.
Não é exigido, desde então, estado civil e sexo do adotante, sendo permitida a adoção unilateral por pessoas do mesmo sexo (homossexuais). Sendo a adoção conjunta por casal homoafetivo, vedada, devido à exigência de comprovação de casado ou de união estável.
Porém, no ano de 2015 em uma decisão que proferiu favoravelmente a um casal de homens, do Estado do Paraná, o direito de adotar crianças, levanto em consideração para a exação da decisão a união estável homoafetiva equivalente à entidade familiar. Decisão do Supremo Tribunal federal (STF) da ministra Cármen Lúcia[11]. Essa decisão levou em consideração outra decisão do mesmo tribunal no ano de 2011, na qual foi reconhecida a união estável de parceiros do mesmo sexo. Sendo o ministro relator da ação, Ayres Brito, entendeu que “a carta magna, Constituição Federal de 88 não faz menção a menor diferenciação que seja entre família formalmente constituída e aquela existente entre os rés dos fatos. Contudo, não distingue também, entre a família que é formada por pessoas heteroafetivas e a que é constituída por sujeitos de orientação homoafetiva.”[12]
5 DA ADOÇÃO À BRASILEIRA
A adoção à brasileira é aquela em que um indivíduo registra, como sendo seu o filho de outrem. De acordo com o artigo 242 do Código penal (CP), essa prática é considerada ilegal pelo ordenamento jurídico brasileiro e, envolvem outras três tipificações: o parto suposto; a entrega de filho com idade inferior a 18 anos para pessoa inidônea; e falsidade ideológica.
Dentre as práticas que de algum modo facilitam esse processo pode-se citar que a Lei de Registros Públicos (Lei n° 6.915/73) em seu artigo 54, que regula o registro de recém-nascidos feito pelo Cartório de Registro Civil, no momento de registrar não solicita nenhuma investigação que venha a comprovar os laços biológicos ou a veracidade dos documentos apresentados, o que facilita essa pratica.
Por sua vez, outro fato que contribui para a informalidade desse processo é o tempo e o dinheiro gasto devido a enorme burocracia de que é dotada a adoção legal. Nessa via, ainda existe o receio por parte dos adotantes de o pedido de adoção ser negado pelo juiz competente por uma possível ausência de pré-requisito exigido.
A seguinte critica é observada:
“A chamada Lei da Adoção, em vez de agilizar o processo de adoção e reduzir o tempo de crianças e adolescentes institucionalizados, acabou impondo mais entraves para sua concessão. E, ao invés de esvaziar os abrigos, certamente, vai é esvaziar a adoção”. (DIAS, 2010, p. 12).[13]
Com a nova Lei, o processo de adoção carece dentre outros critérios de acompanhamento por equipe multiprofissional, visando sempre o interesse do adotando, especialmente sobre a irrevogabilidade da medida (art. 166, §2°, ECA). No mais, o total consentimento dos responsáveis do adotando deve ser colhido em audiência pelo juiz, com a presença do Ministério Público, depois de esgotados todos os esforços para a manutenção da criança junto à família natural ou extensa (art. 166, § 3°, ECA).
Destarte, não mais existe a possibilidade de se dispensar o estágio de convivência, salvo se a criança já esteja sobre a tutela ou guarda legal do adotante (art. 46, § 2°, ECA).
Ainda nesse contexto, salienta a nota de MARIA BERENICE DIAS:
“É absolutamente equivocado o prestígio que se empresta à família natural, quando se busca manter, a qualquer preço, o vínculo biológico, na vã tentativa de manter os filhos sob a guarda dos pais ou dos parentes que constituem a chamada família estendida. Essas infrutíferas tentativas fazem com que as crianças, ao serem rejeitados por seus pais e parentes, acumulem sucessivas perdas e terrível sentimento de abandono que trazem severas sequelas psicológicas”[14].
Esse é um ponto de fundamental relevância no contexto da adoção, nota-se que existe uma imensa vontade de manter o adotando no anseio da família biológica ou de parentes consanguíneos mesmo quando infrutíferas essas tentativas. As frustradas tentativas fazem com que as crianças e adolescentes carreguem consigo o sentimento e a sensação da rejeição por parte daqueles que deveriam os acolher, acarretando dificuldades de lidar com esse sentimento que é uma realidade na vida deles e que esses ainda estão descobrindo a vida, aprendendo a viver no mundo onde os adultos é quem comanda. Destarte, toda essa legislação deve incansavelmente buscar arraigar sempre, o melhor interesse para ao adotando, como preceitua o ECA, já que elas são a parte frágil dessa relação de desigualdade.
Uma pesquisa liderada por LIDIA WEBER, feita com pais e filhos adotivos e com a população em geral. Com resultado, mostrou que há fatores determinantes para disparidade de crianças e adolescentes institucionalizados e postulantes à adoção.
“O principal ponto de desencontro é o preconceito, consciente ou não.
De acordo com as opiniões de boa parte da população as pessoas: teriam medo de adotar crianças mais velhas (acima de 6 meses) pela dificuldade na educação; teriam medo de adotar crianças de cor diferente da sua pelo "preconceito dos outros"; teriam medo de adotar crianças com problemas de saúde pela incapacidade de lidar com a situação e pelas despesas altas que teriam; teriam medo de adotar uma criança que viveu muito tempo em orfanato pelos "vícios" que traria consigo; medo de que os pais biológicos possam requerer a criança de volta; medo de adotar crianças sem saber a origem de seus pais biológicos, pois a “marginalidade" dos pais seria transmitida geneticamente; culpabilizam somente os pais pelo internamento e abandono dos filhos e pensam que o governo deveria controlar o número de filhos, principalmente em mulheres pobres; pensam que uma criança adotada, cedo ou tarde, traz problemas; acreditam que a adoção visa primordialmente o adotante e não a criança, sendo um último recurso para pessoas que não conseguem ter filhos biológicos; acreditam que a adoção pode servir como algo para "desbloquear algum fator psicológico" e tentar ter filhos naturais; acham que quando a criança não sabe que é adotiva ocorrem menos problemas, assim, deve-se adotar bebês e "fazer de conta" que é uma família natural; acham que as adoções realizadas através dos Juizados são demoradas, discriminatórias e burocráticas e recorreriam à adoção "à brasileira" caso decidissem adotar; consideram que somente os laços de sangue são "fortes e verdadeiros". (Weber; Gagno; Cornélio & Silva, 1994; Weber & Cornélio, 1995; Weber & Gagno, 1995).
É visível que os adotantes procuram por um biótipo ao invés de um filho. É imaginável se esse filho com todas ou algumas características supracitadas fosse concebido pelo vinculo biológico, esses pais não cuidariam dele? Cuidariam sim e de seu interesse e continuariam na tentativa de dar o melhor para esse filho e manteriam a unidade familiar. A adoção está envolta numa nuvem de muitos preconceitos, um deles é a idade do adotando, que de alguma forma influencia muito nessa “escolha”. Não é levado em consideração que a criança ou adolescente não herdará as características (boas ou ruins) de seus genitores, cada qual formará a sua personalidade e poderá aprender novos e melhores valores na nova família que é proporcionada pela adoção. Essa postura é preconceituosa e prejudica o adotando e muitas vezes os adotantes procurem a adoção informal no intuito de “selecionar”, “escolher” a acriança ou adolescente que venha a suprir os seus anseios para fazer parte da família. Com isso os dispostos a adotar acabam optando pela adoção à brasileira, pois acreditam que ela seja mais rápida e fácil e por terem o receio que seus perfis não sejam aceitos pelos avaliadores. Mas, as suas consequências carecem de considerável análise.
Desse modo, é criada uma relação frágil, devido a não proteção do Estado, se descoberta, pode ser cessada mediante anulação de relação de filiação e do registro irregular. Contudo, além de não ser recepcionada pelo ordenamento e segurança jurídica, não goza da irrevogabilidade destinada à adoção legal.
Além disso, pode acarretar graves consequências para a criança, sendo que elas ficam sujeitas a traumas devido a sua retirada das famílias nas quais acabaram por construir vínculos afetivos, estando sujeitas a uma nova realidade, tendo que aprender novamente a conviver com mais uma perda familiar que era indispensável.
Ademais, outro viés desse processo ilegal se faz presente na pratica para fins lucrativos, contribuindo para o tráfico de crianças, assunto delicado e que faz parte da historia da sociedade brasileira, como se vê a partir do recorte de jurisprudência produzida em 1916:
“É legal o acto do juiz de orphãos que tendo denuncia de que o pae vendera uma sua filha menor por um conto de réis, e que tanto o comprador como o vendedor pretendiam fugir com a mesma menor, mandou, depois de ouvido o curador de orphãos, apprehendel-a e deposital-a no Asylo de Menores Abandonados, como medida provisória e indispensável em todos os casos de processo para suspensão de poder familiar.”[15]
5.1 Adoção á brasileira através da analise jurisprudencial
Geralmente vem à tona quando há um arrependimento da mãe biológica no que tange a entrega da criança, ou arrependimento por parte dos homens que registram filhos alheios como sendo seu, devido a pedido da companheira e também no intuito de não deixar aquela criança desamparada como o filho biológico de fato, ou também quando filhos legítimos comparecem em juízo para tentar anular o registro feito, quando envolve direitos a sucessão, dentre outros motivos.
A adoção à brasileira é em tese revogável por se tratar de um ato ilícito, mas como leciona hodiernamente, à luz de MARIA HELENA DINIZ:
“Há uma prática disseminada no Brasil – daí o nome eleito pela jurisprudência – de o companheiro da mulher perfilhar o filho dela, simplesmente registrando a criança como se fosse seu descendente. Ainda que este agir constitua crime contra o estado de filiação(CP, 242), não tem havido condenações, pela motivação afetiva que envolve essa forma de agir. Em muitos casos, rompido o vínculo afetivo do casal, ante a obrigatoriedade de arcar com alimentos a favor do filho, o pai busca a desconstituição do registro por meio de ação anulatória ou negatória de paternidade. A jurisprudência, reconhecendo a voluntariedade do ato, praticado de modo espontâneo, por meio da ‘adoção à brasileira’, passou a não admitir a anulação do registro de nascimento, considerando-o irreversível. Não tendo havido vício de vontade, não cabe a anulação, sob o fundamento de que a lei não autoriza a ninguém vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento” (CC, art. 1604).[16]
Vem sendo tratada pela jurisprudência como irrevogável no que tange a pedidos de negação de paternidade, a partir do momento que se foi realizada por livre acordo de vontades de quem a praticou não pode. De acordo com o artigo 1604 do Código Civil de 2002, de fato é inadmissível, pois viola os princípios da lealdade e da confiança que devem sempre vigorar no direito.
Acerca disso, conforme diz: MARIA HELENA DINIZ:
“Toda doutrina é unânime em salientar que a declaração da vontade é elemento essencial do negócio jurídico. Para que este validamente exista, é indispensável a presença da vontade e que esta haja funcionado normalmente. Só então o negócio jurídico produz efeitos colimados pelas partes.” ( . . . )
É o caso em que se têm os vícios de consentimento, como erro, o dolo a coação, o estado de perigo e a lesão que se fundam no desequilíbrio da atuação volitiva relativamente a sua declaração”.[17]
Como se vê na ação que segue:
“APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA -APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE REGISTRO CIVIL. ADOÇÃO À BRASILEIRA E PATERNIDADE SOCIOAFETIVA CARACTERIZADAS – RECURSO IMPROVIDO. 1. O reconhecimento voluntário de paternidade, com ou sem dúvida por parte do reconhecente, é irrevogável e irretratável (arts. 1609 e 1610 do Código Civil ), somente podendo ser desconstituído mediante prova de que se deu mediante erro, dolo ou coação, vícios aptos a nulificar os atos jurídicos em geral. (AC Nº 70040743338, TJRS). 2. Caracterizadas a adoção à brasileira e a paternidade socioafetiva, o que impede a anulação do registro de nascimento da ré pelo pai registral, mantém-se a improcedência da ação. APELAÇÃO IMPROVIDA”[18].
Sendo de interesse do adotado, é facultado a esse somente, pedir a anulação da adoção à Brasileira.
Destarte, é notório a violação ao principio da dignidade da pessoa humana cercear o direito de conhecimento da origem genética, respeitando, por conseguinte, nela a necessidade psicológica de se conhecer a verdadeira identidade biológica[19].
Nessa ceara, cabe a análise do recorte a seguir:
“DIREITO CIVIL. RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE BIOLÓGICA REQUERIDA PELO FILHO. ADOÇÃO À BRASILEIRA. É possível o reconhecimento da paternidade biológica e a anulação do registro de nascimento na hipótese em que pleiteados pelo filho adotado conforme prática conhecida como “adoção à brasileira”. A paternidade biológica traz em si responsabilidades que lhe são intrínsecas e que, somente em situações excepcionais, previstas em lei, podem ser afastadas. O direito da pessoa ao reconhecimento de sua ancestralidade e origem genética insere-se nos atributos da própria personalidade. A prática conhecida como “adoção à brasileira”, ao contrário da adoção legal, não tem a aptidão de romper os vínculos civis entre o filho e os pais biológicos, que devem ser restabelecidos sempre que o filho manifestar o seu desejo de desfazer o liame jurídico advindo do registro ilegalmente levado a efeito, restaurando-se, por conseguinte, todos os consectários legais da paternidade biológica, como os registrais, os patrimoniais e os hereditários. Dessa forma, a filiação socioafetiva desenvolvida com os pais registrais não afasta os direitos do filho resultantes da filiação biológica, não podendo, nesse sentido, haver equiparação entre a “adoção à brasileira” e a adoção regular. Ademais, embora a “adoção à brasileira”, muitas vezes, não denote torpeza de quem a pratica, pode ela ser instrumental de diversos ilícitos, como os relacionados ao tráfico internacional de crianças, além de poder não refletir o melhor interesse do menor.”[20]
Não se deve esquecer que quem praticar adoção á brasileira, à luz do Código penal, será punido os responsáveis, com sanções que vão desde a anulação do ato à retirada da criança, como também pena de reclusão de até dois anos.
6 DOS ALIMENTOS
O Código Civil brasileiro trata do direito aos alimentos em seu artigo 1694 a 1710. Dispõe o artigo 1696:
“O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros”.[21]
Com isso há também essa obrigação no vínculo adotivo. No que tange a adoção plena essa obrigatoriedade não há o que se questionar na Lei Civil, pois o adotado desvincula-se por inteiro de sua família natural. Porém há a necessidade de se estabelecer sobre o dever de prestar alimentos, no que tange a adoção simples.
Nesse mesmo sentido o Código Civil de 2002 deixa claro em seu artigo 1596:
“Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.”[22]
Desfazendo qualquer ideia em contrario, que poderá diferenciar os filhos biológicos dos adotivos. Afirmando que os filhos, havidos ou não da relação de casamento, por adoção, terão os mesmos direitos, vedada quaisquer descriminação nesse contexto. Isso de fato está positivado fazendo garantias para o adotado que está em pé de igualdade com o filho biológico, que vai de encontro ao que diz o ECA, que se deve levar em consideração o melhor interesse da criança ou adolescente, fins patrimoniais e sucessórios é outra seara que será debatida em outros momentos, antes de qualquer questionamento o foco da proteção e cuidado será o que está positivado em Lei.
De encontro a tudo isso, a Constituição Federal de 1988, trouxe em seu corpo o notório artigo 227 caput e no seu paragrafo 6, o que segue:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (…)
§ 6º – Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiaçã[23]o” .(grifos nossos).
Destarte, pondo fim a diferenciação que havia entre os filhos advindos de formas diferentes, não apenas na qualificação, mas também quanto aos direitos que poderiam ser reconhecidos em favor dos filhos dito naturais e aqueles que foram concebidos fora do casamento.
German Gambón Alix, é referido por Antônio Chaves que descreve três características que diferenciam a obrigação de alimentos dentro do vinculo gerado pela adoção, são elas: a legitimidade, não somente como os demais casos, é amparada pelo direito positivado, e dele retira seu único fundamento e razão de ser, sendo que não descansa em um elemento natural; a prioridade advir de um acordo voluntário e espontâneo, alcançando, além disso, encontram-se em segunda linha as relações do adotado com a sua família de sangue; é reciproca como reflexo de uma relação bilateral de paternidade e filiação[24].
“Diante dessa proteção máxima da pessoa humana, precursora da personalização do Direito Civil, e em uma perspectiva civil-constitucional, entendemos que o art. 6 da CF/88 serve como uma luva para preencher o conceito atual dos alimentos. Esse dispositivo do Texto Maior traz como conteúdo os direitos sociais que devem ser oferecidos pelo Estado, a saber: a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados. Anote-se que a menção à alimentação foi incluída pela Emenda Constitucional 64, de 4 de fevereiro de 2010, o que tem relação direta com o tema aqui estudado. Ademais, destaque-se que, conforme a doutrina contemporânea constitucionalista, os direitos sociais também devem ser tidos como direitos fundamentais, tendo aplicação imediata nas relações privadas” (TARTUCE; SIMÃO apud GAGLIANO; PAMPLONA, 2012, p. 684).
Depreende-se que, as prestações alimentares são essenciais a sobrevivência e dignidade do credor que se encontra em momento que não as pode suprir, fazendo-se necessário ajuda de outrem.
O dever do adotante de prestar alimentos ao adotando não deixa dúvidas, uma vez que, efetivada a adoção o pai adotivo é o principal responsável pelo adotando O adotante se prontifica a sustentar o adotando enquanto dure o pátrio poder, além disso, a lhe prestar alimentos nos casos em que estão devidos pelo pai ao filho menor de 18 anos de idade. Vale lembrar também que, o filho tem, igualmente, o dever de prestar alimentos ao pai, posto que a Lei o menciona no rol dos devedores de tal prestação. Essa menção se faz desnecessária, por ter o adotado o estatus de filho legitimo.
Vejamos o julgado a seguir:
“APELAÇÃO CÍVEL – FAMÍLIA – NASCIMENTO – REGISTRO CIVIL – RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE – SIMULAÇÃO – FALSIDADE – PATERNIDADE BIOLÓGICA – PATERNIDADE SOCIOAFETIVA – ADOÇÃO – DEVIDO PROCESSO – VÍNCULO AFETIVO – INEXISTÊNCIA – EFEITOS – PATERNIDADE SOCIAL – ASSISTÊNCIA MATERIAL – PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS – DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – PATERNIDADE RESPONSÁVEL – "ADOÇÃO À BRASILEIRA": CONSEQUÊNCIAS PERSISTENTES. 1. É nulo o ato de reconhecimento de filiação alheia como própria, se dolosamente simulada a declaração de paternidade. 2. Embora nulo o negócio jurídico simulado, o que se dissimulou subsiste se válido no conteúdo e na forma. 3. Processo e sentença proferida em ação de adoção são requisitos formais de validade do ato de registro da paternidade socioafetiva. 4. O afeto é elemento de consolidação da relação parental, mas sua ausência não a descaracteriza. 5. Só a extinção do vínculo afetivo entre pais e filhos não os exime das obrigações e direitos legais derivados do poder/dever familiar. 6. Ainda que não haja afeto, subsiste a relação de parentalidade social, fundada nos princípios constitucionais da dignidade humana e da paternidade responsável, orientados à preservação da família. 7. O dever de prestação de alimentos é expressão da paternidade social de que se investe aquele que voluntariamente reconheceu como próprio filho de outrem, ainda que ao arrepio do devido processo ("adoção à brasileira"). V. V.P. APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. AÇÃO ANULATÓRIA DE REGISTRO DE NASCIMENTO. PATERNIDADE. AUSÊNCIA DE VÍNCULO BIOLÓGICO CONFESSADO PELOS LITIGANTES. DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DE INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO SOCIOAFETIVO. RECURSO DESPROVIDO. I – Sabendo-se que o registro público goza de presunção "juris tantum" de veracidade, sua desconstituição é perfeitamente possível. II – Comprovada a inserção da paternidade no assentamento civil mediante alegação de falso (inveracidade da declaração do perfilhante), justificável a relativização da irrevogabilidade do reconhecimento preconizada no art. 1.610 do CCB/2002, como autorizam os arts. 1.604 e 1.608, ambos também do CCB/2002. III – Se as partes não controvertem quanto à inexistência da paternidade biológica e se revelado inequivocamente nos autos a inexistência da paternidade socioafetiva, inexorável concluir que o assentamento civil que a estampa não prestigia a verdade real, o que suficiente a seu desfazimento”[25]. (TJ-MG – AC: 10362100016314001 MG, Relator: Peixoto Henriques, Data de Julgamento: 28/01/2014, Câmaras Cíveis / 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/02/2014)
7 DO DIREITO A SUCESSÃO
Segundo Maria Berenice Dias:
“Não mais se identifica como família exclusivamente o relacionamento selado pelo matrimônio. O conceito de família alargou-se passando a albergar os vínculos gerados pela presença de um envolvimento afetivo. O amor tornou-se um fato jurídico merecedor de proteção constitucional. A existência de um elo de afetividade é o que basta para o reconhecimento de uma entidade familiar. Com o desaparecimento da família patriarcal e matrimonializada, passou a família a ser identificada pelo laço de afetividade que une pessoas. Conforme bem lembra Paulo Luiz Netto Lôbo, o princípio da afetividade tem fundamento constitucional: não é petição de princípio, nem fato exclusivamente sociológico ou psicológico. (2007)
A partir desse ponto, novas composições familiares passam a surgir, nas quais é possível vislumbrar novos modelos familiares, são eles: família nuclear, composta por pai e mãe e filhos; extensa, composta por três ou quatro gerações; adotiva; monoparental, que é aquela chefiada por só um genitor; reconstituídas, são aquelas que se reconstituem após a separação do casal; casais que não possuem filhos casais homossexuais, com ou sem filhos; famílias socioafetivas; anaparentais e famílias paralelas.
Aponta Maria Berenice Dias:
“Com isso alargou-se o conceito de família, passando a enlaçar todas as formas de convivência que se estruturam a partir de um comprometimento amoroso. Ainda que não se possa dizer que a família está em desordem, família agora é um conceito plural: desconstituída, recomposta, monoparental, homoparental, clonada ou gerada artificialmente. Como alerta Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka não importa a posição que o indivíduo ocupe na família ou qual a espécie de grupamento familiar a que ele pertence, o que importa é pertencer ao seu âmago, é estar naquele idealizado lugar onde é possível integrar sentimentos, esperanças, valores, e se sentir, por isso, a caminho da realização de seu projeto de felicidade” (2007).
A partir de todas as novas composições de formas de constituição de família, existe entre elas um principio comum, o da afetividade, que se tornou o principio basilar das entidades familiares, levando em conta não somente o vinculo sanguíneo, como esta mais que claro em todas as concepções para fins legais que incluem a sucessão, tanto o filho afetivo quanto o filho adotivo e o sanguíneo, possuem os mesmos direitos, como aponta a jurisprudência.
A constituição Federal Brasileira de 1988 em seu artigo 227,§ 6°, diz que todos os filhos estão em consonante igualdade, vedada toda e qualquer forma de desigualar essa relação entre eles. Deste modo, todos são considerados sujeitos iguais com direitos iguais, uns havidos durante o matrimonio, outros fora da constância do casamento, uns biológicos, outros afetivos, mas todos com o mesmo direito e deveres para com a posse do estado de filiação.
Deste modo, consoante Maria Helena Diniz (2007, p. 21):
“(a) não pode haver nenhuma distinção entre filhos legítimos, naturais e adotivos, quanto ao nome, direitos, poder familiar, alimentos e sucessão; (b) permite o reconhecimento de filhos havidos fora do casamento; (c) proíbe que se revele no assento do nascimento a ilegitimidade simples ou espuriedade; (d) veda designações discriminatórias relativas à filiação”.
Desse modo, a igualdade entre filhos é realidade, e assim, não poderá existir qualquer diferença, por menor que esta seja. O filho biológico ou não, o havido na constância do casamento ou não, o filho devidamente reconhecido ou o adotado, não poderão ser de modo algum discriminados, todos, segundo a Constituição federal, devem ter os seus direitos e deveres assegurados em face do principio da igualdade jurídica entre os filhos e da dignidade da pessoa humana.
Deve existir essa igualdade entre os filhos, deste modo de forma plena e concreta, não podendo ser admitida qualquer espécie de designações que possam vir a contrariar toda a isonomia defendida pelo ordenamento jurídico pátrio.
Diante dessa posse do estado de filho, geram-se direitos pessoais e patrimoniais, e são estes devidamente garantidos pela carta maior.
Carlos Roberto Gonçalves aponta que:
“Com relação ao direito sucessório, todos os filhos concorrem, em igualdade de condições com os filhos de sangue, em razão da paridade estabelecida pelos arts. 227, § 6º da Constituição e art. 1.628 do Código Civil. Em conseqüência, os direitos hereditários envolvem também a sucessão dos avós e dos colaterais, tudo identicamente como acontece na filiação biológica[26]”. (GONÇALVES, 2008,P.361).
Para Guilhermo Alberto Saraiva:
Para efeitos sucessórios, os filhos adotivos se equiparam aos consanguíneos ( Cód. Civil de 2002, art.1.626). A existência de filho adotivo arreda da sucessão todos os demais herdeiros do adotante.[27]
Destaca-se a igualdade de direito entre os filhos havidos ou não na constância do casamento, dizem-se filhos biológicos e adotivos, em plena igualdade.
Destaca Carlos Roberto Gonçalves que:
“Com relação ao direito sucessório, o filho adotivo incorre hoje, em igualdade de condições com os filhos de sangue, em face da paridade estabelecida pelo art.227,§ 6°, da Constituição e do disposto no art. 1.628 do Código Civil. Em consequência, “ os direitos hereditários envolvem também a sucessão dos avós e dos colaterais, tudo identicamente como acontece na filiação biológica . Na linha colateral, na falta de parentes mais próximos, ao adotivo, como acontece com o filho biológico, sucede até o quarto grau, isto é, pode ser contemplado no inventário por morte dos tios[28] ( art.1.839 do Código Civil de 2002 e art 1.612 do Código de 1916).” ( GONÇALVES, 2012, p. 406.
Nota-se a total igualdade entre os filhos adotivos e biológicos no que tange os efeitos sucessórios.
Ainda nessa ceara, leciona Maria Helena Diniz:
“Visto que se equipara ao filho advindo do parentesco consanguíneo, herdando, em concorrência com cônjuge sobrevivente ou convivente do falecido, na qualidade de descendente do autor da herança ( CC, arts. 1.829, I e 1790, I e II) afastando da sucessão todos os demais herdeiros do adotante que não tenham a qualidade de filho” ( DINIZ, 2010, p.544).
Vem corroborar o entendimento pacifico da doutrina baseada no Código Civil de 2002, que instala a igualdade de direitos a fins sucessórios do filho adotivo e biológico.
Aponta Maria Helena Diniz:
“Para efeitos sucessórios, os filhos de qualquer natureza são equiparados, havendo, assim, direito sucessório recíproco entre pais e filhos reconhecidos, pois tanto os ascendentes como os descendentes são herdeiros necessários. Deste modo, o filho reconhecido concorre em pé de igualdade com os irmãos havidos na constância do casamento, herdando quinhão igual ao que couber aos demais filhos.” (DINIZ, 2007, p. 476).
É preciso, o que traz a doutrina, diante do contexto no que tange os efeitos sucessórios da adoção, é regulada pelo mesmo direito dos filhos biológicos distinção que qualquer natureza.
8 DA ANULAÇÃO DO REGISTRO CIVIL NO CASO DE ADOÇÃO À BRASILEIRA COM BASE NA JURISPRUDENCIA BRASILEIRA
Nesse Contexto, é notável a constante a formação de conceitos do que vem a ser a família brasileira, é preciso parar e repensar o que de fato essas modificações trouxeram e trazem no cotidiano. O que é ser pai? Pai é somente aquele que cria? Ou por outro viés, pai é aquele que transmitiu sua herança genética? Com a atual Carta Magna, definindo e elucidando o afeto como fonte definidora do que vem a ser pai, família para o filho adotivo, o direito entra na discussão do que é ser pai, tanto de filhos havido na constância do casamento quanto de filhos adotados.
Se faz importante conhecer melhor as modalidades de filiação, as quais são três: a Jurídica, a biológica, e a socioafetiva. A primeira se dá em razão da lei, a exemplo, a presunção legal da paternidade e a adoção regulamentada pela Lei 12.010/09. A segunda definição é o que une de forma genética, ou consanguínea o pai e o filho. Por ultimo, a terceira, conceituada pelas doutrinas e jurisprudências, em síntese, como os laços construídos a partir do afeto, formados entre um pai e um filho devido à convivência constante entre eles. Aos poucos, o ordenamento jurídico vem mostrando e acolhendo essa concepção.
“A filiação é uma relação construída, quotidianamente, e exige de seus membros um agir positivo, um comportamento qualificado pela existência de um tratamento recíproco de pai e filho. Em outras palavras, trata-se de construção fática da posse de estado de filho, que representa a valorização da vertente afetiva da relação, e que transcende o sentido biológico que pode, ou não ter lhe dado origem. Contemporaneamente, o papel de pai é muito mais amplo, muito mais rico em detalhes do que o papel de genitor, visto que, a “verdadeira paternidade decorre mais de amar e servir do que de fornecer material genético”(CARBONERA; SILVA, 2009, p. 357 apud CARVALHO, 2012, p. 109).
Parte da convivência, do afeto, como outros aspectos para surgir a posse do estado de filiação.
Para Edson Fachin, em suas sábias palavras, leciona que: a posse de estado de filho não se origina somente da verdade biológica, mas sim da relação paterno-filial, relevante aos requisitos afetivos e sociológicos na vida das pessoas.
“A verdadeira paternidade não pode se circunscrever na busca de uma precisa informação biológica; mais do que isso, exige uma concreta relação paterno-filial, pai e filho que se tratam como tal, donde emerge a verdade socioafetiva. Balanceando a busca da base biológica da filiação com o sentido socioafetivo da paternidade, o lesgilador valeu-se da conhecida noção de posse de estado. Não é propriamente à verdade biológica que a posse do estado de filho serve prioritariamente. Depreende-se que ela se dirige mais a valorizar o elemento afetivo e sociológico da filiação, posto que sua ausência pode pôr em dúvida o vínculo da filiação” (FACHIN, 1996, p.70 apud CARVALHO, 2012, p. 126)
Destarte, na mesma seara de Fachin, José Bernardo Ramos Boeira, deixa claro que a posse do estado de filho é:
“uma relação afetiva, intima e duradoura, peculiar, conhecida pela reputação frente a terceiros como se filho fosse, e pelo tratamento que de fato existe na relação paterno-filial, em que há chamamento de filho e a aceitação do chamamento de pai”( BOEIRA, 1999, p.60, apud LIMA, 2014, p. 35).
Depreende-se que se origina do simples fato de demonstrar ou apresentar tanto na vida publica quanto na vida privada ser filho de quem o educa e cuida e deve existir a vontade por ambas as partes dessa relação o sentimento de serem reconhecidos como pai e filho, o que independe da verdade biológica.
Existe de fato o entendimento por meio de doutrinas e jurisprudências que a filiação é reconhecida pela posse do estado de filho, a seguir, um julgado em que mesmo um exame de DNA (ácido desoxirribonucleico), com resultado negativo, não desconstruiu a filiação, pois estava presente a posse do estado de filho por mais de 10 anos entre eles.
“DECISÃO MONOCRÁTICA. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. EXAME DE DNA. RESULTADO NEGATIVO. RECONHECIMENTO ESPONTÂNEO DO VÍNCULO FAMILIAR PROMOVIDO PELO AUTOR AO REGISTRAR A MENOR, ATRIBUINDO A ELA O PRÓPRIO NOME. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO A INQUINAR A MANIFESTAÇÃO DE VONTADE, A QUAL SUCUMBE QUALQUER RESERVA MENTAL PRÉVIA. PRECEDENTES DO STJ. PREVALÊNCIA DO INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA NA MANUTENÇÃO VÍNCULO PARENTAL. ESTUDO SOCIAL CONCLUSIVO NO SENTIDO DE RECONHECER A SOCIOAFETIVIDADE E POSSE DO ESTADO DE FILHA (NOME, TRATO E FAMA) QUE PERDURA POR MAIS DE DEZ ANOS. VÍNCULO AFETIVO QUE NÃO SE DESFAZ EM FUNÇÃO DO RESULTADO DE MERO EXAME PERICIAL, TAMPOUCO PELA SEPARAÇÃO DO AUTOR E A REPRESENTANTE LEGAL DA MENOR. TUTELA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA PERSONALIDADE DA RÉ. BLINDAGEM AMPARADA PELA IMPOSSIBILIDADE DE PONDERAÇÃO DO EPICENTRO AXIOLÓGICO DA PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. Recurso que se nega seguimento, na forma do art. 557, caput, do CPC. Suspendo de ofício a condenação do Autor ao pagamento das custas e honorários em respeito à gratuidade de justiça deferida a seu favor, na forma do art. 12 da Lei nº 1.060/50” (TJ-RJ – APL: 00223867120098190206 RJ 0022386-71.2009.8.19.0206, Relator: DES. TERESA DE ANDRADE CASTRO NEVES, Data de Julgamento: 16/01/2013, SEXTA CÂMARA CIVEL, Data de Publicação: 26/04/2013 18:26).
Partindo dessas referências concebidas pelo direito brasileiro, se faz necessário analisar e corroborar o que diz a jurisprudência acerca da possibilidade de desconstituir da certidão de nascimento do filho adotivo que se deu pela adoção à brasileira.
Nesse sentido diz a jurisprudência:
“DIREITO CIVIL E FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. RECONHECIMENTO ESPONTÂNEO DE PATERNIDADE DE QUEM ERA CIENTE DE NÃO SER O PAI BIOLÓGICO. SITUAÇÃO QUE CONFIGURA VERDADEIRA ADOÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO OU DEFEITO FORMAL NA DECLARAÇÃO DE RECONHECIMENTO DE FILIAÇÃO. EXAME DE DNA IRRELEVANTE. DEMONSTRAÇÃO INDELÉVEL DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PREPONDERÂNCIA DA FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA SOBRE A BIOLÓGICA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-RN – AC: 52336 RN 2009.005233-6, Relator: Des. Amaury Moura Sobrinho, Data de Julgamento: 27/08/2009, 3ª Câmara Cível)”.
“APELAÇÃO CÍVEL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. CONFIGURAÇÃO DO VÍNCULO BIOLÓGICO. ALTERAÇÃO DO REGISTRO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE. FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA CONFIGURADA PELA ADOÇÃO PROMOVIDA PELOS PAIS REGISTRAIS HÁ MAIS DE 30 ANOS. IRREVOGABILIDADE, 1. Assegurado o direito de investigar sua origem biológica e constatado o vínculo genético com o investigado, é parcialmente procedente a pretensão do autor, na medida em que o reconhecimento de paternidade não pode ter repercussões na esfera registral nem patrimonial, uma vez que encontra óbice na relação de filiação socioafetiva…” (TJ-RS – AC: 70045659554 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 26/01/2012, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/02/2012
Assim, tem-se o afeto como formador da família e da filiação entre pai e filho. A anulação do registro civil para fins de sucessão não é acolhido pelas decisões na jurisprudência, uma vez que o vinculo já está formado e passa a regular a convivência entre pai e filho. Porém, se faz plausível essa possibilidade quando o filho se enquadra por indignidade ou deserdação por tentar contra a vida dos pais, no entanto é assegurado ao filho adotivo o direito de conhecer de descobrir a sua verdade biológica, mas essa vontade deve vir do filho, uma vez feita a doção e estabelecido o vinculo afetivo não poderá mais ser desfeita por desejo de outrem que não seja a pessoa do filho, que é assegurado pelo ECA, que defende que os interesses dessa relação devem ser voltados para a parte frágil e que carece de cuidados que é o filho adotivo.
“DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. ANULAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO: ARTS. 1.604 e 1.609 do Código Civil. 1. Ação negatória de paternidade, ajuizada em 14.08.2006. Recurso especial concluso ao Gabinete em 14.06.2013. 2. Discussão relativa à nulidade do registro de nascimento em razão de vício de consentimento, diante da demonstração da ausência de vínculo genético entre as partes. 3. A regra inserta no caput do art. 1.609 do CC-02 tem por escopo a proteção da criança registrada, evitando que seu estado de filiação fique à mercê da volatilidade dos relacionamentos amorosos. Por tal razão, o art. 1.604 do mesmo diploma legal permite a alteração do assento de nascimento excepcionalmente nos casos de comprovado erro ou falsidade do registro. 4. Para que fique caracterizado o erro, é necessária a prova do engano não intencional na manifestação da vontade de registrar. 5. Mesmo que não tenha ficado demonstrada a construção de qualquer vínculo de afetividade entre as partes, no decorrer de mais de 50 anos, a dúvida que o recorrente confessa que sempre existiu, mesmo antes da criança dnascer, de que ele era seu filho, já é suficiente para afastar a ocorrência do vício de consentimento – erro – no momento do registro voluntário. 6. No entendimento desta Corte, para que haja efetiva possibilidade de anulação do registro de nascimento, é necessária prova robusta no sentido de que o pai foi de fato induzido a erro, ou ainda, que tenha sido coagido a tanto. 7. Recurso especial desprovido.” (STJ – REsp: 1433470 RS 2013/0188242-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/05/2014, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/05/2014).
Destarte, essa jurisprudência corrobora a impossibilidade da anulação do assento de nascimento por mera volatilidade dos relacionamentos amorosos entre os “pais”, ainda assim, o Código Civil de 2002 no caput do art. 1.609, visa proteger a criança registrada. Por tal razão o art. 1.604 do mesmo diploma legal consente a alteração do assento de nascimento excepcionalmente nos casos onde ficar comprovado o erro ou falsidade do registro, para que fique caracterizado o erro, é necessária a prova do engano não intencional na manifestação da vontade de registrar. Mesmo que subsistiu a duvida antes da criança nascer e não tenha sido construído vinculo de afetividade entre as partes no prazo de mais de 50 anos, já é suficiente para afastar a ocorrência de vicio de consentimento-erro- no momento do registro voluntario. No caso da analise em tela, do recurso, o entendimento foi por improcedência do pedido do autor que pedia a desconstrução da paternidade no assento do registro civil.
9 CONCLUSÃO
Com o advento do Código Civil de 1916, entraram em vigor as primeiras normas que regulavam o processo de adoção no Brasil e atendia a necessidade da sociedade patrimonialista daquela época. Visavam dar filhos aos casais que não os tinha, enquanto isso o vínculo afetivo não tinha relevância jurídica alguma.
Portanto, a partir do Código Civil de 2002, dando relevância aos princípios da Constituição Federal de 1988, trazendo a isonomia entre os filhos, a dignidade da pessoa humana, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei Nacional da Adoção (12.010/09) a criança passou a ter os seus interesses protegidos pelo Estado.
Essa importância do Estado para com a criança refletiu de modo positivo na estabilidade familiar assim como no bem- estar, importância essa que refletiu no sistema da adoção que se tem hoje. A adoção deixou de ser analisada apenas sob a ótica dos adotantes. A partir disso passou a ter caráter assistencialista, onde não se leva em conta somente a vontade do adotante de poder adotar filhos quando não os pode ter de modo natural, mas também a oportunidade do adotando terá de receber um lar e poder ter o convívio familiar, que agora é uma garantia legal.
É notório no âmbito jurídico, que há o reconhecimento da família como um grupo social constituído essencialmente de afetividade e que o principio da socioafetividade norteia as decisões de lides do Direito de Família.
Com isso resultou a adoção à brasileira, dentro de todo esse contexto jurídico e social de primazia das relações afetivas em detrimento dos laços biológicos e do principio do melhor interesse da criança, iniciou-se, um tratamento mais flexível por parte dos operadores do direito.
Informações Sobre o Autor
John Lennon Alves de Lima
Acadêmico de Direito na Católica do Tocantins- FACTO