Resumo: A Lei 13.467/17 alterou a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho para consignar que quando for requerida a anulação de cláusula de Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, os sindicatos convenentes deverão integrar a lide, de forma necessária. Esta inovação está enquadrada no § 5º do artigo 611-A da Consolidação. Referido artigo contempla também que o que for acordado pelas partes sociais (Sindicatos, e Sindicatos e Empresas) poderá se sobrepor à Lei, isto é, o “negociado valerá sobre o legislado”. Assim, a questão que fica é se um trabalhador que ingressar com Reclamação Trabalhista deverá incluir no polo passivo os Sindicatos, em caso do direito discutido estiver baseado em alguma cláusula coletiva sindical.
Palavras-Chave: Litisconsórcio Necessário; Sindicatos; Anulação de Cláusula.
Abstract: The Law 13467/17 amended the CLT – Consolidation of Labor Laws to provide that when the annulment of a Convention clause or a Collective Bargaining Agreement is required, the unions that celebrated the agreement should integrate the dispute in a necessary manner. This innovation is framed in Paragraph 5 of Article 611-A of Consolidation. This article also contemplates that what is agreed upon by the parties (Trade Unions, Trade Unions and Companies) may overlap with the Law, that is, the "negotiated will be valid on the legislated". Thus, the question remains whether a worker joining a Labor Complaint should include the unions in the passive poles, in case the right discussed is based on some collective bargaining clause.
Key-words: Litisconsortium necessary; Unions; Annulment of clause.
Sumário: Introdução. I – Do Litisconsórcio Necessário. II – Anulação de Cláusula de Norma Coletiva. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A reforma trabalhista trouxe uma novidade à CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, determinando um litisconsórcio necessário às lides que tenham por pedido a anulação de uma cláusula de Acordo Coletivo de Trabalho – ACT ou Convenção Coletiva de Trabalho – CCT.
A novidade surgiu por meio do §5º do artigo 611-A da CLT que estipula ser necessário que todos os sindicatos que participaram da formação da norma coletiva, passem a integrar o processo em que se discute a cláusula convencionada. A ideia do legislador reformador é tentar frear as inúmeras ações que irão questionar a validade de cláusulas normativas, uma vez que o artigo 611-A da CLT prevê a possibilidade do “negociado” valer mais do que o “legislado”.
Todavia, como já dizia Léon Husson (1947, p. VIII), de Montpellier:
“A filosofia do direito só adquirirá rigor e precisão quando se decidir a sair das generalidades para aventurar-se no terreno da ciência jurídica, pronta a receber os impactos das controvérsias que deverá enfrentar. De sua vez, a ciência jurídica só elucidará plenamente suas dificuldades quando consentir em estender suas vistas para além dos textos e das realidades sociais a que se prende, até chegar aos horizontes morais e metafísicos que os envolve”.
Deste modo, imagina-se que diversos trabalhadores irão se socorrer do Judiciário para tentar recompor a perda ou diminuição de direitos que irão ocorrer por força de ACT ou CCT, sendo que, por meio do litisconsórcio necessário, deverá ser incluído no polo passivo todos os sindicatos convenentes das normas coletivas que estiverem sendo discutidas na lide.
Todavia, este litisconsórcio necessário não deverá ser imposto a todas as reclamações trabalhistas, como será demonstrado a seguir.
I – DO LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO
O litisconsórcio, nas palavras de Schiavi (2011, p. 305):
“Consiste na autorização legal para que mais de uma pessoa figure no polo ativo, no polo passivo ou em ambos os polos da relação jurídica processual. Desse modo, teremos nos polos ativo, passivo, ou nos dois, mais de um autor ou mais de um réu”.
O Código de Processo Civil, quando trata do listisconsórcio necessário, explica no artigo 114 que:
“O litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes”.
Arruda Alvim (2016, p 80) esclarece que:
“No litisconsórcio necessário, é indispensável a presença conjunta de autor e/ou réu. Dizemos indispensável, pois não se considera completa a parte, ativa ou passiva, sem que todos os que devam ser litisconsortes integrem o respectivo polo da relação jurídica processual. No litisconsórcio facultativo, pode o litisconsórcio ser formado ou não, em nada afetando sua não formação, os efeitos da sentença que atingirão somente quem tenha sido parte”.
Uma hipótese de litisconsórcio necessário no processo do trabalho ocorre nas ações em que se pede o reconhecimento de relação de emprego, pela intermediação fraudulenta de mão-de-obra.
A Súmula 331 do TST, no item I (redação antes da Reforma Trabalhista) estipula que “A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974)”.
Ora, em caso de fraude na terceirização de mão-de-obra, a consequência será a formação do vínculo de emprego com o tomador de serviços, anulando-se o contrato de trabalho com o intermediário.
Com efeito, em uma reclamação trabalhista em que se pede a anulação do contrato com a empresa intermediária, sob o argumento de fraude, e o reconhecimento da relação de emprego, diretamente entre o trabalhador e o tomador de serviços, teremos então dois pedidos: – a anulação do contrato com uma empresa, e reconhecimento de emprego com outra empresa.
Por conta do litisconsórcio aqui ser necessário, temos que o regime aqui será unitário.
Para explicar a questão do regime unitário, retomamos as lições de Arruda Alvim (2016, p. 81/82):
“Quanto à sorte que os litigantes terão no que diz respeito ao direito discutido, podemos classificar o litisconsorte em simples ou unitário. Será unitário o litisconsórcio quando a demanda deva ser decidida de forma única para todos quantos figurem no mesmo polo da relação processual. Daí surge a diferença entre litisconsórcio necessário e unitário, sendo este último definido pelo art. 116 do CPC/2015: “O litisconsórcio será unitário quando, pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir o mérito de modo uniforme para todos os litisconsortes”.
Ora, no caso acima descrito, ou se anula a triangulação havida para todos (contratos que ligavam tomador de serviços, reclamante e empresa terceirizada), ou não se anula para ninguém. Deste modo, necessário colocar no polo passivo tanto o tomador de serviços como a empresa de intermediação de mão-de-obra, quando se alega fraude na terceirização.
Fato diferente, no entanto, se dará quando houver uma reclamação trabalhista em que não se discuta fraude na intermediação de mão-de-obra. Por exemplo, numa terceirização lícita, onde o que se reclama é a declaração de uma responsabilidade subsidiária do tomador de serviços, cujo fundamento é o item IV da Súmula 331 do TST.
O item IV determina que para haver responsabilidade subsidiária, o tomador de serviços deverá constar do título executivo judicial e, para que isto ocorra, o reclamante tem que ajuizar a ação contra as duas empresas que compõe a terceirização, isto é, a tomadora de serviços e a empresa de intermediação de mão-de-obra. Mas aqui o litisconsórcio é facultativo. O reclamante não está obrigado a ajuizar a ação, desde o início, contra o tomador de serviços, pois não há regime unitário.
Neste sentido, explica Cambi (2017, p. 137):
“Será facultativo quando decorrer da mera iniciativa das partes, não havendo uma imposição da lei, nem tampouco razões lógicas advindas da natureza da relação de direito material. As circunstâncias que autorizam o litisconsórcio facultativo estão previstas nos incisos I, II e III do art. 113 do Código de Processo Civil. São elas a comunidade de direitos ou de obrigações, a conexão pelo pedido ou pela causa de pedir, a afinidade de questões por ponto comum de fato ou de direito”.
Vejamos agora as mudanças implementadas pela Reforma Trabalhista.
II – ANULAÇÃO DE CLÁUSULA DE NORMA COLETIVA
A Lei 13.467/17 criou um dispositivo novo à CLT, que é o artigo 611-A, que trouxe em seu bojo o parágrafo quinto que estipula:
“Os sindicatos subscritores de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho deverão participar, como litisconsortes necessários, em ação individual ou coletiva, que tenha como objeto a anulação de cláusulas desses instrumentos”.
E isto se deve porque o legislador reformador percebeu que irão surgir diversas normas coletivas (Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho, doravante chamados por CCT e ACT) porque foi estabelecido que os Sindicatos, e estes junto com empresas, poderão estipular novas regras jurídicas que irão se sobrepor à lei. Sabendo disso, desde já o Estado-Juiz pretende controlar ou dificultar a anulação destas, determinando que em toda ação anulatória de cláusulas de normas coletivas sejam – obrigatoriamente – incluídos no polo passivo todos os Sindicatos convenentes.
Normalmente, é o Ministério Público do Trabalho que ajuíza ações anulatórias de CCT e ACT. Desta forma, em todas elas, os sindicatos que participaram da formação das negociações coletivas deverão estar dentro do processo judicial, como litisconsortes necessários.
Para clarear o raciocínio, Gemignani (2016, p. 292) estipula que:
“Em caso de litisconsórcio necessário é devida a integração de todos que tem interesse jurídico. Se não ocorrer a integração, e mesmo assim for proferida sentença, essa será nula. Portanto, a integração do litisconsorte necessário é obrigatória, sendo determinada pelo juiz ao autor, que assim deverá requerer”.
A Lei 13.467/17 pretendeu, por meio do § 5º do artigo 611-A, que doravante toda Reclamação Trabalhista individual, em que se discuta a validade de uma cláusula de ACT/CCT, deverão os Sindicatos convenentes ser incluídos no polo passivo da lide.
Um exemplo do que muito ocorreu antes da Reforma Trabalhista, pode ser tratado pela questão estruturada no item II da Súmula 437 do TST, verbis:
“É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva”.
Percebe-se que quando o trabalhador ajuíza uma reclamatória alegando o item II da Súmula 437 acima, seu pedido é de horas extras contra o empregador, alegando invalidade da cláusula coletiva. Mas neste tipo de ação, não deverá haver o litisconsórcio necessário com os sindicatos que convencionaram a CCT/ACT que está em discussão nesta reclamação trabalhista.
E tal afirmação se deve por conta dos pedidos que são realizados em ação anulatória de cláusula de ACT/CCT e em uma reclamação trabalhista, que são distintos.
Ora, o pedido da ação anulatória é a anulação da cláusula de CCT/ACT, sendo que o regime é unitário, pois irá anular a cláusula para todos os sindicatos e respectivas categorias.
Já em uma reclamação trabalhista não se pede a anulação. A Reclamação não é uma ação anulatória de cláusula de ACT/CCT. Não há nenhum pedido referente a isso. O pedido é de pagamento de horas extras. O juiz em sua decisão irá ressaltar que o pagamento é devido tomando por base que a cláusula normativa insculpida na CCT/ACT, será ineficaz neste caso. Ou seja, o julgador de primeiro grau não irá anular a cláusula coletiva.
Lembrando sempre que, o que define a ação é o pedido, e não sua causa de pedir.
Ou, como declara Marinoni (2014, p. 75) “o pedido consiste naquilo que, em virtude da causa de pedir, postula-se ao órgão julgador”.
Para deixar ainda mais claro, Grinover, Dinamarco e Araújo Cintra (2014, p. 283/284) discorrem que:
“Assim é que, considerando-se uma massa de demandas propostas ou a propor, distinguem-se elas entre si não só pela natureza do provimento que o autor pede, como também pelo objeto de seu alegado direito material. Variando um deles, já não se trata da mesma ação”.
CONCLUSÃO
A reforma trabalhista trouxe ao mundo jurídico o §5º do artigo 611-A, na CLT, determinando que sempre que for anular uma cláusula de Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, todos os sindicatos que participaram na formação desta norma coletiva deverão ser incluídos no polo passivo, num autêntico litisconsórcio necessário.
O interesse por detrás desta obrigação, que gera o regime unitário da sentença judicial que deverá ser uniforme a todas as partes (a anulação da cláusula coletiva interferirá nos direitos de todos os grupos sociais), é que se tentará tornar a vida dos trabalhadores que forem reclamar individualmente no judiciário, sobre direitos ceifados ou diminuídos por força de Convenções ou Acordos Coletivos de Trabalho, um pouco mais difícil.
Isto é, como se sabe, por força da Lei 13.467/17, diversos direitos trabalhistas poderão ser repactuados por normas coletivas e, caso um obreiro se encaminhe ao Judiciário para discutir a validade desta norma infra legal, a ideia é que todos os sindicatos que participaram da formação desta sejam incluídos na lide, para discutir esta questão em conjunto.
No entanto, quando um trabalhador requer na Justiça do Trabalho um direito, não está ele pleiteando a anulação de uma cláusula coletiva, mas simplesmente que a mesma não seja utilizada neste caso.
O juiz da Vara do Trabalho não irá anular a cláusula, simplesmente declarará que esta é ineficaz para o caso que está em suas mãos, para decidir.
Em razão disso, não será necessária a inclusão – via litisconsórcio necessário – dos sindicatos que produziram as Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho, em lides individuais ou plúrimas trabalhistas, em que não se requer a anulação das cláusulas daquelas normas coletivas.
Informações Sobre o Autor
Mauricio de Carvalho Salviano
Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Advogado. Professor do Curso de Direito UniToledo em Araçatuba SP