Resumo: Em 1988, a Carta Magna trouxe ao trabalhador brasileiro o exercício do direito de greve. Para que as exigências da Constituição Federal fossem recepcionadas, foi sancionada a Lei Nº 7.783/89, dispondo sobre o exercício de tal direito, fazendo a definição das atividades essenciais como as legitimidades ao exercício de greve, ou seja, regendo as necessidades inadiáveis, como as limitações desse poder, assim como as penalidades que norteiam o abuso desse direito. Em um conjunto harmônico, a doutrina e a jurisprudência encontraram limitações do direito de greve, implícitas em três citações incluídas na Carta Magna, onde podemos citar os abusos cometidos, as penas da lei e o atendimento às necessidades inadiáveis da comunidade. Nesse sentido é que se afirma que há indispensabilidade de um conjunto harmônico entre a doutrina e a jurisprudência mediante as limitações estabelecidas pela CF. Considerados os contornos do ordenamento jurídico brasileiro, faz-se importante ressaltar que o interesse do movimento paredista deverá ser analisado no constante ao foco do movimento, independentemente deste interesse ser de terceiros, da sociedade ou até mesmo de outras categorias e apresentando-se o núcleo paredista é possível distinguir os limites do exercício ao direito de greve. No entanto, as condutas desvirtuadas ao movimento paredista por serem dissonantes aos interesses manifestados, deverão os membros infringentes serem submetidos a sanções pelo abuso do direito facultado.
Palavras-chave: Direito de Greve. Limitações. Legitimidades. Abuso do Direito.
Sumário: Introdução. II. Processo histórico evolutivo da greve no Brasil. III. Direitos dos trabalhadores grevistas e seus empregadores. IV. Limitações estabelecidas ao direito de greve. V. Legitimidade e interesse da greve. VI. O abuso do direito de greve. VII. Conclusão. Referências
I – INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como tema o direito de greve à luz do ordenamento jurídico brasileiro, trazendo à tona clareza aos paradoxos ainda existentes no que se refere a greve trabalhista nos dias atuais.
Nesta perspectiva, construiu-se questões que nortearam este trabalho.
– Sendo a greve um direito constitucional garantido ao trabalhador brasileiro, quais são as limitações estabelecidas?
– Para fazer-se cumprir a lei, há necessidade de ser estabelecido a legitimidade ao exercício deste direito, mas de que forma o ordenamento jurídico brasileiro impõe essa legitimidade?
– São das normas jurídicas que emanam os direitos e as obrigações, sendo assim qual o posicionamento da célula do ordenamento para aqueles que ultrapassam aos direitos facultados, ou seja, para aqueles que exercem o abuso do direito?
Quando se fala em greve, norteia-se não só os tempos atuais, mas também todo um conteúdo histórico. Ainda hoje as greves são propulsoras de movimentos revolucionários em lato sensu, seja nas militâncias trabalhistas, sociais ou políticas. Um exemplo atual é a greve geral convocada pelas Centrais Sindicais contra as Reformas da Previdência e Trabalhista, exemplos como este demonstram claramente a luta dos movimentos paredistas contra opressores. Devido tais motivações dá-se então a importância de se investigar o tema em ênfase.
O direito de greve é de titularidade dos trabalhadores, mas o seu exercício é feito de forma coletiva (art. 9.° da CF/I988). Na realidade, de acordo com a Constituição Federal de 1988, a greve é um direito social, de ordem fundamental, inserido no Título II da Lei Maior (BARROS, 2006).
Neste contexto, o objetivo central deste estudo é apresentar de formar clara e concisa as práticas legais do direito de greve, assim como as práticas que não são admitidas no ordenamento jurídico brasileiro.
Para alcançar os objetivos propostos, utilizou-se como recurso metodológico, a pesquisa bibliográfica, realizada a partir da análise pormenorizada de materiais já publicados na literatura e artigos científicos divulgados no meio eletrônico.
II – PROCESSO HISTÓRICO EVOLUTIVO DA GREVE NO BRASIL
Falando especificamente da greve no território nacional de forma direta e específica, afirma-se que a história evolutiva da greve foi marcada de forma intensiva pelas fases da criminalização e tolerância.
(GARCIA, 2014) complementa com o seguinte posicionamento:
“No Brasil, a evolução revela que a greve, inicialmente foi considerada um delito, como se observa no Código Penal de 1980 (registrando-se que, com o Decreto 1.162, de 12 de Dezembro de 1980, passou a ser punida apenas a greve exercida com o uso de violência) e na Lei 38, de 4 de abril de 1935, sobre segurança nacional.”
Após anos extensivos, pleiteados arduamente pelos movimentos sociais, através de influências externas (OIT)[1] e internas (Movimento operário, surto industrial e a política trabalhista de Getúlio Vargas), finalmente a visão do conceito greve tinha outra compreensão, o que hoje nos dias atuais é facultado como um dos Direitos Fundamentais.
O Direito do Trabalho passou a ter maior força e valorização no país após a legislação entrar em vigor, gerando vida a Norma Fundamental.
A República Federativa alçou o valor social, em conexo com outros princípios fundamentais, como o princípio da dignidade da pessoa humana. A Constituição Federal corrobora, “visem à melhoria de sua condição social” (art.7º, caput, da CF/88). Ou seja, ao trabalhador brasileiro foi positivado e facultado tal direito.
A Constituição Federal sancionou através do direito de greve, o livre arbítrio, ou seja, aos trabalhadores foi facultado o exercício ao direito de greve, assim como os interesses que devam por meio dele defender.
A Constituição Federal em seu art. 9º, caput, corrobora: é assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
Dessa forma, o legislador concedeu a outorga do direito fundamental ao trabalhador, podendo assim o mesmo exercer o pleito pelos seus direitos, bem como por seus interesses para fim de defender os valores sociais intrínsecos no ordenamento jurídico brasileiro.
III – DIREITOS DOS TRABALHADORES GREVISTAS E SEUS EMPREGADORES
Aos trabalhadores que estiverem no exercício ao direito de greve há garantias estabelecidas por lei, são os direitos assegurados aos grevistas.
A lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989 é o regimento que dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências.
Em seu dispositivo infracitado, estão direitos assegurados aos grevistas:
“Art. 6º São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos:
I – o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve;
II – a arrecadação de fundos e a livre divulgação do movimento.
§ 1º Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.
§ 2º É vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.
§ 3º As manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.”
O inciso I do artigo supracitado fala sobre meios pacíficos de persuadir ou aliciar os trabalhadores, porém de forma pacífica. O dicionário define as palavras persuadir e aliciar da seguinte forma:
“Persuadir: verbo, transitivo direto e bitransitivo e pronominal – levar (alguém ou a si mesmo) a acreditar, a aceitar ou a decidir (sobre algo); convencer(-se).
Aliciar: verbo, transitivo direto e bitransitivo – atrair a si; tornar (alguém) seu sequaz ou cúmplice; seduzir, envolver”.
O movimento grevista poderá desta maneira persuadir ou aliciar trabalhadores a aderirem à greve sendo-lhes garantido por lei.
Corroborando sobre persuasão, Souza afirma (2000, Pag. 115):
[…] Exercer maior ou menor influência sobre a definição que os outros formulam, para o que se exprimirá de maneira a proporcionar-lhes a impressão que os levará a agirem voluntariamente de acordo com a sua própria intenção ou plano.
O empregador ou entidade patronal correspondente tem por direito saber sobre a paralização com antecedência mínima de 48 horas. Todavia “Não havendo acordo, é assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente os serviços necessários” (art.9º, parágrafo único, da lei nº 7.783/89).
IV – LIMITAÇÕES ESTABELECIDAS AO DIREITO DE GREVE
O direito de greve não é absoluto, existem limitações estabelecidas. Para que haja harmonia até mesmo em meio a manifestações pleiteadas.
A Constituição Federal de 88, no que tange aos direitos e garantias fundamentais traz no seu art. 5.°, os direitos e deveres individuais e coletivos, reforçando que “em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar os direitos e garantias fundamentais de outrem” (art. 6º, § 1º, da lei 7.783/89). Sendo assim todos os direitos fundamentais devem ser observados ao ser exercido o direito de greve.
É vedado a ameaça ou dano à propriedade por observância ao art. 2º da Lei 7.783/89 que determina “a greve de ser exercida de forma pacífica”.
Há também vedação constitucional quanto à greve de militares, na doutrina e na jurisprudência são vedados a utilização do instituto da greve para estes, conforme o art. 142 § 3.°, IV, da CF “ ao militar são proibidas a sindicalização e a greve”, Incluído pela EC n. 18/1998.
Quanto aos servidores públicos, exige-se lei específica regulando o exercício do direito de greve, conforme o art. 37, inciso VII, da Constituição da República, com redação determinada pela EC 19/1998 (SARAIVA, 2012).
Em via de regrar aos servidores públicos da Administração direta, autárquica e fundacional, em razão da exigência de lei específica regulando o direito de greve, vez que a mesma ainda não está aprovada. Por sua vez o STF tem o entendimento de que o art. 37, VII, da CF/88 é norma de eficácia limitada, ou seja, enquanto não houver lei que regulamente o direito de greve especificamente aos servidores públicos, o direito ao exercício de greve por servidores é ilícito.
V – LEGITIMIDADE E INTERESSE DA GREVE
A titularidade do direito de greve como mencionado diversas vezes no artigo cientifico é uma faculdade do trabalhador, sendo incumbido a eles decidir o exercício do direito e os interesses que por meio dele devam defender.
Porém para que haja legitimidade na instauração da greve, os legitimados para o mesmo são as organizações sindicais dos trabalhadores, em vista do direito em ênfase ser de natureza coletiva. Sendo importante salientar que o momento escolhido para deflagração da greve é decisão que deve ser tomada pelos trabalhadores.
Havendo acordo coletivo, convenção coletiva ou sentença normativa em vigor, em regra, não há prerrogativas para instauração de greve (Art. 14, Lei 7.783/89).
Nesse sentido, há o entendimento de que a chamada "greve política", buscando resultados adverso ao contrato de trabalho, perante o governo, não é possível. Nessa linha de entendimento, os atos e movimentos de protesto contra o Estado (e não contra o empregador), com finalidade estritamente política (e não com o objetivo de defesa de interesses profissionais dos trabalhadores), ainda que justificáveis e validos, não têm como ser definidos como greve propriamente dita, afastando a incidência de suas regras, princípios, direitos e deveres próprios (DELGADO, 2012).
Sobre o tema, pode ser destacada a seguinte decisão do TST:
“Greve. Natureza política. Abusividade. A greve política não é um meio de ação direta da classe trabalhadora em beneficio de seus interesses profissionais e, portanto, não está compreendida dentro do conceito de greve legal trabalhista. Entende-se por greve política, em sentido amplo, a dirigida contra os poderes públicos para conseguir determinadas reivindicações não suscetíveis de negociação coletiva. Correta, portanto, a decisão que declara a abusividade do movimento grevista com tal conotação, máxime quando inobservado o disposto na Lei 7.78311989. Recurso Ordinário conhecido e desprovido" (TST, SDC, RODC 57121211999.0, ReI. Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle, DJ 15.09.2000).
Porém, cabe salientar que em corrente doutrinária contrária defende-se a validade das greves políticas (especialmente se a motivação política vincular-se a fatores de repercussão na vida e trabalho dos grevistas), pois cabe aos trabalhadores decidir os interesses a serem defendidos, sabendo-se que as greves não necessitam circunscrever-se a interesses estritamente contratuais trabalhistas (MARTINS, 2010).
VI – O ABUSO DO DIREITO DE GREVE
A Constituição Federal de 88 em seu art. 9.°, § 2º diz: “os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei”. Garantindo assim a observância ao princípio universal, ninguém se deve lesar, responsabilizando os praticantes dos atos ilícitos adversos das intencionalidades do movimento paredista.
Por sua vez a Lei complementar 7.783/1989 em seu art. 14 dispõe:
“Constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas contidas na presente lei, bem como a manutenção e da paralisação após a celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho”.
Quando houver a celebração de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa e for mantida a paralisação dos serviços, sendo inobservado as determinações expressas pelo diploma legal será caracterizado como abuso do direito de greve.
Todavia, faz-se imprescindível ressaltar a exceção estabelecida no parágrafo art. 14, parágrafo único, inciso I e II, da Lei 7.783/1989 que dispõe:
“Parágrafo único: na vigência de acordo, convenção ou sentença normativa, não constitui abuso do exercício do direito de greve a paralisação que:
I – tenha por objetivo de exigir o cumprimento de cláusula ou condição;
II – seja motivada pela superveniência de fato novo ou acontecimento imprevisto que modifique substancialmente a relação de trabalho. “
Não será interpretado como abuso do direito de greve, ainda que na vigência de acordo, convenção ou sentença normativa, nas hipóteses de greve por exigência cumprimento de cláusula ou condição que possa estar sendo inobservada pelo empregador.
Ainda na excludente de ilicitude, quanto ao abuso do direito de greve, registra-se os casos de fato novo ou acontecimento imprevisto, uma vez que são geradores de eventuais modificações na relação de trabalho para benefício do empregado.
É constituído abuso de direito todo ato que for exercido em desconformidade com a legislação, excepcionalmente os que forem praticados em legitima defesa ou em caso de exercício regular de direito.
Para melhor esclarecimento, exemplifica-se como abuso do direito de greve o descumprimento do aviso prévio da paralisação, a deflagração de greve sem assembleia geral, a realização de piquetes violentos, a ocupação ameaçadora de estabelecimentos, sabotagem nas instalações e nas máquinas da empresa, boicote aos serviços e produtos da empresa, agressão física a integrantes da classe patronal ou a dissidentes do movimento grevista, violência contra o patrimônio e faltas graves e delitos trabalhistas.
A Lei nº 7.783/89, em seu art. 15 dispõe: “A responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou crimes cometidos, no curso da greve, será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil ou penal”. Imputando assim a responsabilidade dos atos ilícitos e os crimes praticados trabalhadores grevistas, nas esferas mencionadas pela normativa.
Os excessos cometidos são caracterizados como uma conduta abusiva, ou seja, uma afronta ao direito de greve, equiparando-se ao ato ilícito.
Por sua vez, na esfera cível, cabe ao responsabilizado o dever de reparar, em estado integral todos os danos que em decorrência dos excessos cometidos tenham lesado. Se o dano for moral cabe ressaltar os atos irregulares também deveram ser indenizados no que tange os ilícitos imputados.
VII – CONCLUSÃO
Ante o exposto, a greve é um direito constitucional garantido ao trabalhador brasileiro, usando do direito a eles facultado, o empregado busca através da paralização dos serviços, lutar pelos seus interesses. Nesse sentido compreende-se greve como a suspensão temporária do trabalho, sendo a greve um ato formal condicionado à aprovação do sindicato mediante assembleia.
Aos participantes do movimento paredista é garantido durante a greve: o emprego de meios pacíficos de persuasão; a arrecadação de fundos, bem como, a livre divulgação do movimento.
Quanto as empresas ficam a elas vedado: frustrar a divulgação do movimento, adotar meios que forcem o empregado a comparecer ao trabalho, assim como, a rescisão do contrato de trabalho durante a greve não abusiva, da mesma forma que contratar trabalhadores substitutos.
Por sua vez os grevistas não podem proibir o acesso ao trabalho daqueles que assim o quiserem fazê-lo, caso contrário o direito de greve estaria indo contra direitos e garantias fundamentais como o direito de ir e vir, ou da liberdade da pessoa humana. Sendo assim é vedado aos grevistas proibir o acesso ao trabalho daqueles que assim o quiserem fazê-lo.
A legislação também prevê penalização para o caso de abuso do direito de greve. Sendo definido por lei como abuso: o descumprimento do aviso prévio da paralisação, a deflagração de greve sem assembleia geral, a realização de piquetes violentos, a ocupação ameaçadora de estabelecimentos, sabotagem nas instalações e nas máquinas da empresa, boicote aos serviços e produtos da empresa, agressão física a integrantes da classe patronal ou a dissidentes do movimento grevista, violência contra o patrimônio e faltas graves e delitos trabalhistas.
Informações Sobre o Autor
Dheymax Lobo da Silva Miranda
Pós-graduado em Direito do Trabalho e Direito Constitucional – Universidade Cândido Minas; Bacharel em Direito – ULBRA; Curriculum lattes: http://lattes.cnpq.br/2061087101414641