Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar a ilegalidade da alta programada judicial, no que tange ao benefício previdenciário do Auxílio Doença, especificamente na cessação deste benefício sem a realização de uma nova perícia médica judicial, a fim de verificar se persiste a incapacidade do segurado. Enfoca, também, o alargamento da alta programada na Lei nº 13.457/2017, e as suas mudanças nos entendimentos jurisprudenciais.
Palavras-chave: Auxílio Doença. Ilegalidade. Alta Programada. Lei nº 13.457/2017
Abstract: The aim of this paper is to analyze the illegality of the scheduled court discharge, regarding the social security benefit of the Sickness Allowance, specifically in the cessation of this benefit without conducting a new judicial medical examination, in order to verify if the insured person remains incapable. It also focuses on the increase of the scheduled discharge in Law 13457/2017, and its changes in the jurisprudential understandings.
Keywords: Sickness Allowance. Illegality. Scheduled Discharge. Law 13.457 / 2017
Sumário: Introdução 1. Benefício de auxílio doença e sua função social 2. Alta programada 2.1 A concretização da alta programada administrativa e judicial com o advento da Lei nº 13.457/17 2.2 A ilegalidade da alta programada judicial. Conclusão. Referências
Introdução
O benefício previdenciário do auxílio doença tem como escopo a proteção do segurado incapacitado temporariamente para seu trabalho ou para a atividade habitual, pelo fato de ter desenvolvido uma doença ou sofrido algum acidente.
A análise da incapacidade é realizada mediante um exame médico-pericial a cargo do INSS. Quando há judicialização em prol do referido benefício, o exame médico é feito por um perito médico judicial, onde será constatado se o segurado possui ou não incapacidade para o trabalho ou para exercer suas atividades habituais.
Acontece que, em muitas das vezes, após a avaliação do perito médico judicial, este concede ao segurado o prazo que entende suficiente para a sua recuperação. Porém, via de regra, depois de cessado o prazo estabelecido, não é realizada uma nova perícia para atestar se o segurado está apto ou não para retornar ao seu labor, consequentemente ficando desamparado quando continua inapto, uma vez que fica sem receber o benefício e sem poder voltar ao trabalho.
Em 2017, com a edição da Lei nº 13.457/17, foram recepcionados novos parágrafos no artigo 60 da Lei nº 8.213/91, possuindo, estes, cunhos ampliativos nas altas programadas administrativas e judiciais.
No primeiro capítulo do presente artigo será abordado o conceito do benefício previdenciário do auxílio doença, com enfoque na sua função social e suas principais características.
Adiante, o segundo capítulo, que é dividido em três tópicos, versa sobre a alta programada e sua normatização em seu primeiro tópico. No segundo, é explanado a mudança trazida no artigo 60 da Lei nº 8213/91, após a entrada em vigor da Lei nº 13.457/17 e suas consequências no âmbito jurídico-social. Já o terceiro tópico trata sobre ilegalidade na alta programada judicial e suas consequências sociais aos segurados, e o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a aplicação do referido instituto.
Por fim, no tópico da conclusão, será levantado a solução com amparo no princípio da dignidade da pessoa humana nos casos do instituto das altas programas judiciais.
2 Benefício de Auxílio doença e sua função social
O benefício de auxílio doença é um dos benefícios não programados instituídos pela Previdência Social. Possui como escopo à proteção do segurado do Regime Geral de Previdência Social que adquire incapacidade temporária superior a 15 (quinze) dias consecutivos para exercer suas atividades laborais ou habituais.
Regulamentado pela Lei nº 8.213/91 nos artigos 59 ao 63 e pelo Decreto nº 3.048/99 nos artigos 71 ao 80, o benefício em tema possui nos artigos ora mencionados suas peculiaridades e os requisitos para a concessão do benefício.
Em regra geral, os requisitos necessários para a concessão do auxílio doença são: 1) não ser portador, antes da filiação ao Regime Geral da Previdência Social, de nenhuma doença ou lesão que gere a concessão do benefício, 2) possuir carência de 12 contribuições mensais, 3) comprovação da incapacidade laborativa através de exame realizado por um perito médico da Previdência Social.
O artigo 61 da Lei nº 8.213/91 estabelece que a renda mensal do benefício de auxílio doença será no valor de 91% (noventa e um por cento) do salário benefício do segurado e não terá o valor inferior ao do salário mínimo e nem superior ao do limite máximo do salário de contribuição.
A data de cessação do benefício do auxílio doença ocorre quando há recuperação do segurado para exercer suas atividades laborais ou habituais, pela transformação em aposentadoria por invalidez ou auxílio acidente, e também quando consegue manter subsistência própria após um processo de reabilitação profissional, assim determina o artigo 78 do Decreto nº 3048/99 e o artigo 62 da Lei nº 8213/91, in verbis:
“Art. 78. O auxílio-doença cessa pela recuperação da capacidade para o trabalho, pela transformação em aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente de qualquer natureza, neste caso se resultar sequela que implique redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade.
Parágrafo único. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez.”
O benefício do auxílio doença, como todos os benefícios previdenciários, possui uma função social. Tem como escopo a proteção social do segurado que se encontra incapaz temporariamente para exercer suas atividades laborais, dignificando-o no modo que atenda suas atividades vitais básicas.
3 Alta programada
A alta programada obteve força normativa com o advento do Decreto nº 5.844/2006, o qual acrescentou novos três parágrafos no artigo 78, do Decreto nº 3.048/99. No primeiro parágrafo, acrescentou a possibilidade de o médico perito estabelecer um prazo que o mesmo entenda suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado, dispensando a realização de uma nova realização de perícia.
Outra mudança, trazida no segundo parágrafo acrescentado no Decreto nº 3.048/99, foi a possibilidade de o segurado que se considere incapaz a voltar ao labor após o prazo estabelecido pelo perito médico da Autarquia Federal solicite uma nova perícia médica, na forma estabelecida pelo Ministério da Previdência Social.
A forma estabelecida pelo Ministério da Previdência Social para que seja realizada uma nova perícia é feita por um requerimento de Pedido de Prorrogação através do segurado até 15 dias antes do término do benefício. Caso o pedido de prorrogação seja negado, é facultado ao segurado recorrer no prazo de 30 dias junto à Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social.
Entretanto, mesmo a Autarquia Federal disponibilizando meios para a manutenção nos casos de alta programada, estes não são eficazes, uma vez que há muitas dificuldades operacionais no momento de realizar o pedido de prorrogação do benefício de auxílio doença, consequentemente ficando o segurado desamparado e acionando o Poder Judiciário para restabelecer o benefício.
A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, visando as dificuldades dos segurados nos pedidos de prorrogações de benefícios de auxílio doença, uniformizou o entendimento de que é dispensável o pedido de prorrogação para o ajuizamento de uma ação para restabelecimento do benefício, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. UNIFORMIZAÇÃO DEJURISPRUDÊNCIA. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. ALTAPROGRAMADA. NEGATIVA ADMINISTRATIVA CONFIGURADA. DESNECESSIDADE DE PRÉVIOPEDIDO DE PRORROGAÇÃO. INCIDENTE PROVIDO. 1. Em se tratando de pedido de restabelecimento de auxílio-doença, suspenso pelo regime de alta programada, dispensável se faz o prévio pedido de prorrogação, por configurar o ato de cancelamento manifesta negativa da Administração quanto ao direito postulado. Precedente desta Turma Nacional (PEDILEF 200972640023779). 2. Pedido de Uniformização de Jurisprudência provido, com determinação de devolução dos recursos com mesmo objeto às Turmas de origem a fim deque, nos termos do art. 15, §§ 1º e 3º, do RI/TNU, mantenham ou promovam a adequação da decisão recorrida”. (TNU – PEDILEF: 200770500165515 PR, Relator: JUÍZA FEDERAL SIMONE DOS SANTOS LEMOS FERNANDES, Data de Julgamento: 06/09/2011, Data de Publicação: DOU 04/10/2011)
Conclui-se, portanto, que a alta programada realizada pela Autarquia Previdenciária, mesmo possuindo meios para prorrogação do benefício, fere a dignidade do segurado quando este ainda se encontra incapaz, uma vez que tais meios não são eficientes, e, consequentemente, é necessário ingressar com uma ação judicial para restabelecer o seu direito, ficando o mesmo sem nenhuma subsistência.
3.1 A concretização da alta programada administrativa e judicial com advento da Lei nº 13.457/17
No ano de 2017, a Medida Provisória 767/2017, que alargava a técnica da alta programada, fora convertida na Lei nº 13.457, de 26 junho de 2017, acrescentando os §8º e §9º no artigo 60 da lei 8.213/91, como forma de concretização o alastramento do instituto em tema.
Discorre o §8º e §9º do artigo 60 Lei 8213/91:
“Art. 60. [……]
§ 8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.
§ 9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei. “
No §8º, a grande alteração na norma surgiu quando o legislador acrescentou a fixação do prazo estimado para a duração do benefício na via judicial do ato de concessão ou reativação do auxílio doença, tendo em vista que a fixação do prazo já existia desde 2006 com a possibilidade da alta programada administrativa.
Já o §9 da referida Lei trouxe uma concretização das omissões de prazos não fixados pela perícia médica judicial, estabelecendo o prazo de 120 dias quando há omissão da fixação da data de cessação do benefício.
As indicadas alterações normativas tomaram diversas proporções no Poder Judiciário, tendo muitos Tribunais Regionais Federais mudado os seus entendimentos quanto a matéria.
Vejamos a mudança no entendimento no Tribunal Regional Federal da 3ª Região antes e após a entrada em vigor da lei 13.457/17:
“MANDADO DE SEGURANÇA. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA COMPROVADA. CONSTATAÇÃO PERICIAL. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONTRÁRIOS. TERMO FINAL. ALTA PROGRAMADA JUDICIAL. ILEGALIDADE. – A fixação de termo final ao auxílio-doença, vai de encontro ao que dispõe a Lei nº 8.213/91, art. 60, pelo qual o benefício é devido enquanto durar a incapacidade laborativa. – A respeito do tema, a TNU proferiu decisão no proc. nº 050134-33.2014.405.8302, de 11 de dezembro de 2015, no sentido de que "É indevida a fixação de termo final à cessação de auxílio-doença por meio de decisão judicial (Alta Programada Judicial)". – Dessa forma, correta a sentença ao conceder segurança consistente em determinar à autoridade impetrada que restabeleça o pagamento de benefício de auxílio-doença ao impetrante até que ulterior perícia médica constate a efetiva capacidade laborativa do segurado. – Reexame necessário e recurso de apelação a que se nega provimento.” (TRF-3 – AMS: 00041423920064036104 SP, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, Data de Julgamento: 03/04/2017, OITAVA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2017) (grifos nosso)
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. LAUDO PERICIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DATA DE CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. ALTA PROGRAMADA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. – São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais – quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social. – No caso, a perícia médica concluiu que a parte autora estava total e temporariamente incapacitada para atividades laborativas, conquanto portadora de alguns males ortopédicos. – Os demais requisitos para a concessão do benefício – filiação e período de carência – também estão cumpridos. Devido o auxílio-doença. – O benefício de auxílio-doença é devido desde a data do requerimento administrativo, tal como fixado na sentença, por estar em consonância com os elementos de prova e jurisprudência dominante. – A legislação prevê expressamente a fixação do prazo de cento e vinte dias para a cessação do benefício, quando a sua concessão, ainda que judicial, não tenha determinado prazo final. – Nesse passo, decorrido o prazo de 120 dias da concessão judicial do benefício, e na ausência de requerimento de prorrogação do benefício, não há qualquer irregularidade ou ilegalidade na cessação administrativa. Pelo contrário, trata-se de atuação vinculada da Administração, decorrente de imposição legal. – A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux). – Os juros moratórios são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser utilizada a taxa de juro aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux). – Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio. – Os honorários advocatícios ficam mantidos em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante § 2º do artigo 85 e § único do art. 86 do Novo CPC, orientação desta Turma e nova redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça. Contudo, considerando o parcial provimento ao recurso interposto pela autarquia, não incide ao presente caso a regra do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal. – Apelação do INSS parcialmente provida”. (TRF-3 – Ap: 00232822820174039999 SP, Relator: JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, Data de Julgamento: 27/11/2017, NONA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/12/2017) (grifos nosso)
Diante das circunstâncias trazidas pelos novos parágrafos do artigo 60 da Lei 8213/91, uma grande insegurança jurídica foi gerada nos casos da alta programada, uma vez que, quando aplicado tal instituto, é necessário que o segurado recorra da decisão para que seja realizada uma nova perícia antes da cessação do benefício, sob pena do mesmo, quando incapaz para voltar ao trabalho, ficar sem receber o benefício que faz jus e sem receber nenhuma remuneração do seu empregador.
3.2 A ilegalidade da alta programada judicial
O instituto da alta programada judicial vem repercutindo cada vez mais no Poder Judiciário após a entrada em vigor da Lei 13.457/17. Acontece, que a prática deste instituto viola a dignidade da pessoa humana e os direitos sociais do segurado, além de afrontar a Carta Magna e o artigo 62 da Lei 8213/91.
A cessação do benefício do auxílio doença na via judicial, sem uma realização de uma perícia médica judicial para análise da capacidade do segurado, se está apto ou não a voltar as suas atividades habituais, deixa este desamparado quando ainda continua incapaz, o impedindo de perceber seus proventos da Autarquia, que lhe é de direito, e do seu empregador, uma vez que em regra geral o empregador não permite a volta do segurado, ou até mesmo o demitindo.
O Superior Tribunal de Justiça, sensível à tal problemática social, já possui um posicionamento firmado de que a alta programada é ilegal e viola diretamente o artigo 62 da Lei 8213/91, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO POR ALTA PROGRAMADA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que não é possível o cancelamento automático do benefício previdenciário através do mecanismo da alta programada, sem que haja o prévio procedimento administrativo, ainda que diante da desídia do segurado em proceder à nova perícia perante o INSS. 2. Agravo interno não provido”. (STJ – AgInt no REsp: 1546769 MT 2015/0190632-1, Relator: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 17/08/2017, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/10/2017)
“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTA PROGRAMADA. CANCELAMENTO AUTOMÁTICO DO BENEFÍCIO À MÍNGUA DE NOVA PERÍCIA MÉDICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O procedimento conhecido por "alta programada", em que a autarquia previdenciária, ao conceder benefício de auxílio-doença, fixa previamente o prazo para o retorno do segurado à atividade laborativa, à míngua de nova perícia, não encontra respaldo na legislação federal. 2. Em atenção ao art. 62 da Lei n. 8.213/91, faz-se imprescindível que, no caso concreto, o INSS promova nova perícia médica, em ordem a que o segurado retorne às atividades habituais apenas quando efetivamente constatada a restauração de sua capacidade laborativa. 3. No que regulamentou a "alta programada", o art. 78 do Decreto 3.048/99, à época dos fatos (ano de 2006), desbordou da diretriz traçada no art. 62 da Lei n. 8.213/91. 4. Recurso especial do INSS improvido”. (STJ – REsp: 1599554 BA 2016/0122451-9, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 28/09/2017, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/11/2017)
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTA PROGRAMADA. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. NECESSIDADE DE PERÍCIA. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. CABIMENTO. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015 para o presente Agravo Interno, embora o Recurso Especial estivesse sujeito ao Código de Processo Civil de 1973. II – Esta Corte firmou entendimento no sentido da impossibilidade da alta médica programada para cancelamento automático do benefício previdenciário de auxílio-doença, sem que haja prévia perícia médica que ateste a capacidade do segurado para o desempenho de atividade laborativa que lhe garanta a subsistência, sob pena de ofensa aos princípios da ampla defesa e do contraditório. III – O Agravante não apresenta, no agravo, argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. IV – Honorários recursais. Não cabimento. V – Em regra, descabe a imposição da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015 em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação. VI – Considera-se manifestamente improcedente e enseja a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015 nos casos em que o Agravo Interno foi interposto contra decisão fundamentada em precedente julgado sob o regime da Repercussão Geral, sob o rito dos Recursos Repetitivos ou quando há jurisprudência pacífica de ambas as Turmas da 1ª Seção acerca do tema (Súmulas ns. 83 e 568/STJ). VII – Agravo Interno improvido, com aplicação de multa de 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa”. (STJ – AgInt no REsp: 1368692 SC 2013/0042455-2, Relator: Ministra REGINA HELENA COSTA, Data de Julgamento: 24/10/2017, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/11/2017)
Vejamos o que dispõe a Ilustre Jurista Marisa Ferreira dos Santos sobre a alta programada:
“A alta programada é evidentemente violadora da Lei. O segurado tem direito a cobertura previdenciária de auxílio doença enquanto estiver incapaz para o exercício da atividade habitual. Embora, em algumas hipóteses, possa o médico estimar a duração provável da enfermidade, não é razoável afirmar que a incapacidade cessará em data prefixada pelo perito, com a consequente cessação do benefício”.
É clarividente que o instituto em tema viola o artigo 62 da Lei 8213/91, ao passo que o dispositivo legal determina que o segurado não terá o seu benefício cessado até que esteja habilitado para o desempenho de uma nova atividade que lhe garanta a sua subsistência.
Ademais, a cessação do auxílio doença sem uma prévia perícia médica viola ainda diversos artigos da Constituição Federal, o princípio da dignidade da pessoa humana inserido no artigo 1º, os direitos sociais esculpidos no artigo 6º e o artigo 201, no que tange a cobertura do segurado que possua doença.
Conclusão
A cessação do auxílio doença pelo instituto da alta programada na via judicial com fundamento no §8 e §9 do artigo 60 da Lei 8.213/91 despreza a proteção do segurado e afronta a ideia de uma lídima justiça social.
A divergência sobre o presente instituto tem causado uma grande insegurança jurídica, ocasionando consequentemente prejuízos aos segurados pelo fato dos mesmos ficarem desamparados ou a mercê de um julgamento em instância superior.
O artigo 62 da Lei 8213/91 é afirmativo ao dispor que somente é possível a cessação do auxílio doença quando o segurado for reabilitado para o desempenho de uma atividade que lhe traga subsistência ou, quando transformado em aposentadoria por invalidez.
Como de conhecimento notório, a medicina não é uma ciência exata, e em muitas das vezes a cura de uma doença não depende apenas do tratamento médico, uma vez que há diversos fatores que podem influenciar na melhora ou não da doença. Desta forma, a maneira correta para que seja verificada a recuperação do segurado é realizando uma nova perícia médica antes da cessação do auxílio doença.
Através do presente trabalho, pode-se concluir que o instituto da alta programada judicial afronta diretamente os direitos e garantias fundamentais do segurado, tendo em vista que este tem a sua dignidade atentada e o seu direito violado.
Informações Sobre o Autor
Hugo Luiz Dantas Rodrigues
Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes – UNIT Advogado militante na seara trabalhista e previdenciária Pós-Graduando em Direito da Seguridade Social pela Universidade Cândido Mendes