Resumo: Este artigo trata da obrigação de prestação de alimentos, que é resultante da separação de casais, normalmente quando há filhos. Tal prestação no Brasil é bastante regulamentada pelo ordenamento jurídico pátrio, porém esta obrigação, quando ocorre entre alimentante ou alimentando residente em outro país apresenta dificuldades processuais e operacionais peculiares. Os tratados internacionais são importantes para a solução das demandas entre ordenamentos jurídicos diferentes, sendo a Convenção de Nova Iorque Sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro, de 1956, Convenção Interamericana Sobre Obrigação Alimentar, de 1989 e a Convenção de Haia Sobre Alimentos, de 2007, neste estudo analisadas com o fito de esclarecer quais os trâmites a serem seguidos quando das demandas de pensão alimentícias do e no exterior. Já para os casos destas demandas entre o Brasil e países com os quais não temos acordos ou tratados internacionais sobre o assunto, a cooperação internacional se apresenta como a forma de viabilização da judicialização dessas demandas alimentícias em âmbito internacional, destacando-se o Ministério das Relações Internacionais brasileiro como instituição fundamental para a viabilização das demandas deste teor.
Palavras-chave: pensão alimentícia. direito internacional. Tratados. convenções.
Abstract: The alimony obligation is a result of the separation of couples, usually when there are children. Such a provision in Brazil is fairly regulated by the legal system, although this obligation, when it occurs in debtor or creditor residing in another country, has peculiar procedural and operational difficulties. International treaties are essential for the settlement of claims between different legal systems, including the Convention on the Recovery Abroad of Maintenance of New York, of 1956, the Inter-American Convention on Support Obligations, of 1989, and the Convention of 23 November 2007 on the International Recovery of Child Support and Other Forms of Family Maintenance (Hague), in the analytical study with the purpose of clarifying which materials are most followed when of the alimony demands from and to abroad. It is already an international case and presents itself as a form of viabilization of the judicialization of the alimony demands in international scope, standing out the Brazilian Ministry of International Relations as fundamental institute for a viabilization of the demands of this content.
Keywords: alimony, international law, treaties, convention.
Sumário: 1 Prestação de alimentos no Brasil. 1.1 Da previsão constitucional. 1.2 Da previsão legal. 2 Da obrigação da prestação alimentícia. 3 Da prisão civil por dívida alimentícia. 4 Da competência. 5 Da prestação de alimentos no estrangeiro e os tratados internacionais. 5.1 A Convenção de Nova Iorque Sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro de 1956. 5.1.1 Objeto da Convenção . 5.1.2 Estados Partes da Convenção de Nova York. 5.1.3 Da autoridade central. 5.1.4 Das possibilidades de judicialização da prestação de alimentos. 5.1.4.1 Abertura de ação para fixação de alimentos no exterior. 5.1.4.2 Abertura de ação para fixação de alimentos no Brasil. 5.1.5 Da possibilidade da prisão civil. 5.2 A Convenção Interamericana Sobre Obrigação Alimentar. 5.3 A Convenção de Haia Sobre Alimentos. 6 Demandas de alimentos no e do exterior com países sem acordo ou tratado internacional com o Brasil. 6.1 Das ações de alimentos entre países . Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A problemática da prestação de alimentos no Brasil é corrente, presente e deve se estender pelo futuro indefinidamente, pois é parte integrante do cotidiano dos brasileiros, fruto das relações interpessoais que resultam separação de casais, com ou sem filhos, dentre outras possibilidades. Contudo, quando o demandante ou o demandado reside em outro país, a tramitação é muito mais complexa, pois envolverá ordenamentos jurídicos diferentes. Nesse contexto, o presente estudo analisa as possibilidades de pedido de fixação, execução e modificação/extinção da pensão alimentícia em casos deste jaez.
Como objetivos do presente estudo, buscou-se analisar os trâmites processuais estabelecidos pelos tratados e convenções internacionais atinentes à obrigação de prestar alimentos aos quais o Brasil é signatários, bem como, os trâmites quando o Brasil não tem acordos internacionais com o país demandante ou demandado de alimentos.
O presente trabalho se justifica pela relevância que os alimentos, em demandas internacionais, têm tomado nos últimos anos, sobretudo quando considerados os fluxos migratórios nos quais o Brasil se vê envolvido, notadamente pelas chegadas de imigrantes vindos da América do Sul e do Caribe, bem como de países africanos. Desta forma, é importante e atual o tema aqui apresentado.
Uma vez que a prestação de alimentos no Brasil é exaustivamente regulamentada pelo ordenamento jurídico pátrio, as dificuldades processuais importantes daí advindas são de cunho operacional e não legal, como se pode observar por meio da Lei 5478/68 (Lei de Alimentos) e o Código de Processo Civil, ambas regulamentando a contento as demandas de cunho alimentar. É no âmbito internacional que as dificuldades processuais se apresentam de forma importante, pois sempre estarão presentes ordenamentos jurídicos diferentes e operadores do direito com visões díspares de mundo. Nesse contexto, a Convenção de Nova Iorque Sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro, de 1956, estabeleceu uma sistematização dos trâmites processuais para as demandas entre países, facilitando sobremaneira as soluções dos litígios entre os Estados-Partes. Em âmbito da Organização dos Estados Americanos, a Convenção Interamericana Sobre Obrigação Alimentar, de 1989, determinou o direito aplicável, a competência e a cooperação processual internacional, quando o credor de alimentos tiver seu domicílio ou residência habitual num Estado-Parte e o devedor de alimentos tiver seu domicílio ou residência habitual, bens ou renda em outro. Finalmente, a Convenção de Haia Sobre Alimentos, de 2007, foi recepcionada pelo Brasil, adotando tal acordo para a Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família e o Protocolo sobre a Lei Aplicável às Obrigações de Prestar Alimentos, porém passando a vigorar no Brasil a partir de 1º de novembro de 2017.
A metodologia adotada para a presente pesquisa foi revisão bibliográfica, adotando os doutrinadores voltados ao estudo dos alimentos internacionais e a tramitação processual destes, os tratados internacionais e a legislação brasileira como marcos teórico-legais bastantes para servirem de lastro ao presente trabalho.
1 PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS NO BRASIL
Já no Brasil Colônia, as Ordenações Filipinas estabeleciam que “Liv. I, Tit. LXXVIII, § 15 – Se alguns órfãos forem filhos de tais pessoas, que não devam ser dadas por soldadas, o Juiz lhe ordenará o que lhes necessário for para seu mantimento, vestido e calçado, e tudo o mais em cada um ano” (ROCHA, 1907, p. 219). Em terras brasileiras, a preocupação com os alimentos é tão ancestral quanto o nascimento do próprio país. Hodiernamente, o legislador brasileiro tem-se debruçado sobre a temática, desde os preceitos constitucionais até as legislações ordinárias, alçando o ordenamento jurídico brasileiro a patamares respeitáveis quanto à situação alimentar do cidadão.
1.1 DA PREVISÃO CONSTITUCIONAL
O ordenamento jurídico pátrio destina responsabilidade múltipla em relação à obrigação alimentar. Tal obrigação é estatal, social e individual. Contudo, é no art. 5º da Constituição Federal brasileira que se encontra o lastro filosófico que justifica a obrigação e sua magnitude no ordenamento jurídico pátrio: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes […]”.
Não por coincidência, o legislador constitucional elencou a vida, antes mesmo da liberdade, como Direito Fundamental. Esses Direitos de maior grandeza, fundamentais para a própria existência do ser humano, têm como lastros dois grandes princípios, norteadores dos mais caros Direitos: o Princípio da Dignidade Humana (BRANCO, 2007; BONAVIDES, 2003) e o Princípio/Conceito de Estado de Direito. Segundo Silva (2006, p. 113) o conceito clássico de Estado de Direito é composto por três características: 1. submissão (dos governantes e dos cidadãos) ao império da lei; 2. separação de poderes; 3. garantia dos direitos fundamentais.
Pela lógica hermenêutica, constata-se que o próprio estado de direito garante e pressupõe o existência dos direitos fundamentais, evidentemente tendo o direito à vida como grande irradiador de todos os outros direitos, fundamentais ou não. Porém, é no art. 6º onde a Constituição Cidadã declara a alimentação como Direito Social. Esses direitos “caracterizam-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes” e o objetivo estabelecido é a concretização da igualdade social, “que configura um dos fundamentos de nosso Estado Democrático, como preleciona o art. 1º, IV. […]. A constituição consagra os direitos sociais a partir do art. 6º” (MORAES, 2006, p. 60).
Os direitos sociais elencados no art. 6º da CF/1988 deixam clara a importância dos alimentos. Em verdade, não há como desatrelar o direito à vida do direito à alimentação. Um decorre do outro: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Também em seu art. 227, a Constituição Cidadã destina à família, à sociedade e ao Estado a obrigação de amparo à criança, ao adolescente a ao jovem:
“CF Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) “
Desta forma, não há de se olvidar que a obrigação alimentar é inerente ao poder do Estado, à própria existência da sociedade e às famílias, em atenção aos princípios da Dignidade da Pessoa Humana e do Estado de Direito.
1.2 DA PREVISÃO LEGAL
O Código Civil brasileiro prevê a obrigação de prestar alimentos a partir do art. 1.694, devendo esses alimentos ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. ”Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”.
Por seu turno, o artigo 1.695 do CC estabelece que “o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros”.
Já a Lei de Alimentos (Lei 8.069/90) também dispõe em seu artigo 22 que “Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.
Infere-se, portanto, que o legislador foi incisivo ao estabelecer o direito dos filhos, mormente menores, de receberem pensão alimentícia dos seus pais e o dever destes de prestá-la e vice-versa. Em verdade, essa obrigação não se extingue com a maioridade, podendo persistir nos casos em que haja comprovada necessidade por parte do alimentando.
2 DA OBRIGAÇÃO DA PRESTAÇÃO ALIMENTÍCIA
Os alimentos são consequências naturais da responsabilidade inerente ao poder familiar, quando os genitores não mais vivem juntos e os filhos ficam sob a responsabilidade direta de um deles ou advindos de possível prestação por parte do ex-cônjuge ou ex-companheiro, ou mesmo de filhos para pais. Segundo entendimento de Cahali (2002, p. 16), a palavra alimentos é adotada no direito “para designar o conteúdo de uma pretensão ou de uma obrigação” e significa tudo o que é necessário para satisfazer aos reclamos da vida. O autor explica que são prestações “com as quais podem ser satisfeitas as necessidades vitais de quem não pode provê-las por si”.
Para Gomes (1999, p. 427) “ora significa o que é estritamente necessário à vida de uma pessoa, compreendendo, tão somente, a alimentação, a cura, o vestuário e a habitação, ora abrange outras necessidades, compreendidas as intelectuais e morais, variando conforme a posição social da pessoa necessitada”. O fato é que a obrigação de prestar alimentos compreende, evidentemente, não só comida, mas as necessidades básicas da vida do alimentando.
3 DA PRISÃO CIVIL POR DÍVIDA ALIMENTÍCIA
Como se demonstrou alhures, a prestação alimentícia é obrigação do Estado, da Sociedade e entre pais e filhos, podendo ser estendida aos parentes em determinados casos. Contudo, quando tal obrigação não é cumprida, estar-se-á diante da única possibilidade de prisão civil aceita no ordenamento jurídico brasileiro. Trata-se da mais gravosa consequência juridicamente prevista para um inadimplemento de obrigação em nosso ordenamento.
Há previsão da prisão civil nos casos de descumprimento de obrigação alimentícia na Constituição Federal brasileira de 1988, em seu art. 5º, inciso LXVII: “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel[1]”.
A Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, assinada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, prevê em seu art.7º, item 7: “Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar”.
Há, portanto, graves consequências pelo não cumprimento das obrigações alimentares, uma vez que a Convenção acima aludida ratifica a possibilidade de prisão civil nesses casos e o Brasil tem essa previsão em sede constitucional.
Em sede legal, o art. 528 do Código de Processo Civil brasileiro estabelece que “§ 3º Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1o, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses”. Ainda, em seu § 4º “A prisão será cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns”.
Em sede jurisprudencial, o Superior Tribunal de Justiça brasileiro se pronunciou, conforme enunciado da Súmula 309 do STJ, estabelecendo que “o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores à citação e as que vencerem no curso do processo”. Essa Súmula foi incorporada ao Novo Código de Processo Civil (2015), no §7º, do art. 528.
Saliente-se que a prisão civil do devedor de alimentos não se traduz em um cumprimento de pena, visto não ter caráter penal; trata-se, pois, de “um meio coercitivo (de feitio excepcional) para compelir o devedor a adimplir”. Trata-se de situação estabelecida que “teria o condão de instar o devedor ao pagamento, de modo a evitar ou suspender o cumprimento da prisão” (WAMBIER e TALAMINI, 2010, p. 564).
Para Cahali (2002, p. 1074) “a prisão é um meio coercitivo de execução, visa a compelir o devedor ao pagamento da dívida alimentícia e não, simplesmente puní-lo”. Desta forma, pagando o devedor, a prisão será levantada. Embora seja uma medida violenta, se justifica devido ao caráter humanitário da obrigação alimentar.
4 DA COMPETÊNCIA
A competência para julgar a ação de alimentos, no Brasil, é fixada pelo art. 53, II do Código de Processo Civil, o qual indica a competência para processamento e julgamento de tal ação o foro do domicílio do alimentando: “É competente o foro: […] II – de domicílio ou residência do alimentando, para a ação em que se pedem alimentos.”
Contudo, em casos em que alimentante e/ou alimentando é estrangeiro ou mora no estrangeiro, a competência vai depender do estabelecido em Acordo e Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Esse assunto, cuja repercussão é internacional e de interesse de todos, já foi tema de debates entre países, já no século XIX. Em 1956 a Organização das Nações Unidas realizou conferência, da qual resultou a Convenção de Nova Iorque Sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro (ARAUJO, 2006).
5 DA PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS NO ESTRANGEIRO E OS TRATADOS INTERNACIONAIS
O problema que envolve prestação de alimentos no e do estrangeiro é multifacetado e multicomplexo, tanto do ponto de vista jurídico quanto operacional, pois envolve ordenamentos jurídicos díspares, evidentemente com operadores do direito que têm visões de mundo diferentes. Contudo, a cooperação internacional é absolutamente necessária para dar conta das demandas existentes. Segundo a Coordenação-Geral de Cooperação Jurídica Internacional – DRCI/SNJ, a maior parte dos pedidos em matéria civil, tramitados pelo Brasil, trata de questões de caráter humanitário, como pensões alimentícias (40%) e demais questões de família, como determinação de paternidade, divórcio e outros (20% adicionais). “Nestes casos, trata-se de pessoas que necessitam da cooperação internacional para garantir o acesso a direitos básicos e fundamentais, como a prestação de alimentos a crianças” (BRASIL, 2018).
Para solucionar tais problemas, entidades internacionais têm se esforçado para implementar acordos entre países no sentido de facilitar a tramitação de processos entre os Estados-Partes. Sobre a matéria de alimentos, o esforço internacional produziu diversos acordos, iniciando em 1929, com o Código de Bustamante (Código de Direito Internacional Privado); em 1956 foi estabelecida a Convenção sobre prestação de alimentos no estrangeiro (Nova York); 1956: Convenção sobre a lei aplicável às obrigações alimentares aos menores (Haia); 1958: Convenção relativa ao reconhecimento e execução das decisões em matéria de obrigações alimentares aos filhos menores (Haia); 1962: Convenção sobre a obtenção de obrigações alimentares (Oslo); 1973: Convenção sobre a lei aplicável às obrigações alimentares (Haia); 1989: Convenção interamericana sobre obrigações alimentares (Montevideu); 1993: Convenção relativa ao reconhecimento e execução das decisões em matéria de obrigações alimentares aos menores (Haia);
5.1 A CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE SOBRE A PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS NO ESTRANGEIRO DE 1956
Já em seu preâmbulo, a Convenção se justifica, considerando a urgência de uma solução para o problema humanitário surgido pela situação das pessoas sem recursos que dependem, para o seu sustento, de pessoas no estrangeiro, e acrescenta a situação, no estrangeiro, da execução de ações sobre prestação de alimentos ou o cumprimento de decisões relativas ao assunto. Essas situações suscitam sérias dificuldades legais e práticas, pois há, por evidente, ocorrência de contato de diversos ordenamentos jurídicos a serem envolvidos na situação. Por isso, a disposição dos representantes dos Estados signatários foi de prover os meios que permitam resolver estes problemas e vencer estas dificuldades,
5.1.1 Objeto da Convenção
De acordo com o art. I, a Convenção tem como objeto a possibilitação de se obter alimentos entre as partes quando estas residem em países diferentes. Trata-se, pois, de “um conjunto normativo que visa à solução de conflitos, agilizando e uniformizando mecanismos, que trouxe facilidades aos processos para a fixação e cobrança de alimentos, nos casos em que as partes” (BRASIL, 2017).
Assim estabelece o Artigo I:
“Objeto da Convenção
1. A presente Convenção tem como objeto facilitar a uma pessoa, doravante designada como demandante, que se encontra no território de uma das Partes Contratantes, a obtenção de alimentos ao s quais pretende ter direito por parte de outra pessoa, doravante designada como demandado, que se encontra sob jurisdição de outra Parte Contratante. Os organismos utilizados para este fim serão doravante designados como Autoridades Remetentes e Instituições Intermediárias.
2. Os meios jurídicos previstos na presente Convenção completarão, sem os substituir, quaisquer outros meios jurídicos existentes em direito interno ou internacional. “
O Brasil aderiu a esta Convenção em 31 de dezembro de 1956, ratificada por meio do Decreto Legislativo nº. 10 do Congresso Nacional, de 13 de novembro de 1958, havendo a referida Convenção entrado em vigor, para o Brasil, em 14 de dezembro de 1960, trinta dias após o depósito do instrumento brasileiro de ratificação junto ao Secretário-Geral das Nações Unidas realizado a 14 de novembro de 1960.
5.1.2 Estados Partes da Convenção de Nova York
Não foram todos os Estados nacionais que se tornaram partes da Convenção. Evidentemente há implicações quanto ao ordenamento jurídico, decisões políticas, organização das instituições em cada Estado, dentre outras.
Os Estados que aderiram à Convenção foram Alemanha, Argélia, Argentina, Austrália, Áustria, Barbados, Bélgica, Bielorrússia, Bósnia & Herzegóvina, Brasil, Burkina Faso, Cabo Verde, Cazaquistão, Chile, China, Chipre, Colômbia, Croácia, Dinamarca, Equador, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Filipinas, Finlândia, França, Grécia, Guatemala, Haiti, Holanda, Hungria, Irlanda, Israel, Itália, Libéria, Luxemburgo, Macedônia, Marrocos, México, Moldávia, Mônaco, Montenegro, Níger, Noruega, Nova Zelândia, Paquistão, Polônia, Portugal, Quirguistão, Reino Unido, República Centro-Africana, República Checa, Romênia, Santa Sé, Seicheles, Sérvia, Sri Lanka, Suécia, Suíça, Suriname, Tunísia, Turquia, Ucrânia e Uruguai. Segundo informações do MPF (2017), a retificação da França se estende ao Departamento da Argélia, Oases e Saoura, Departamento de Guadalupe, Guiana, Martinica, Reunião e Territórios de Além Mar (São Pedro e Miquelão, Somalilândia Francesa, Arquipélago Cômoro, Nova Caledônia e Dependências, Polinésia Francesa).
5.1.3 Da Autoridade Central
A Convenção dividiu as funções de Autoridade Central entre duas instituições: a Autoridade Remetente, que é um órgão que deve enviar os pedidos de cooperação e outro que deve receber tais pedidos em determinado país – Instituição Intermediária (artigo II). Coube à Procuradoria-Geral da República o exercício de ambas atribuições, no Brasil, conforme artigo 26 da Lei no 5.478, de 25 de julho de 1968 (Lei de Alimentos) e o Decreto no 56.826, de 02 de setembro de 1965.
5.1.4 Das Possibilidades de Judicialização da Prestação de Alimentos
Quando se lida com situações que envolvam mais de um ordenamento jurídico, enfrentam-se óbices diversos, dentre os quais a norma jurídica a ser aplicada ao caso concreto, uma vez que o regramento brasileiro pode ser diferente dos outros países. Devido a essas diferenças, há dificuldades processuais variadas, como o exemplo citado pelo MPF (BRASIL, 2016, p. 35) da execução de alimentos gravídicos, que “só será possível quando houver sentença de reconhecimento de paternidade e, ainda assim, só será cumprida internacionalmente caso tenha havido exame conclusivo de DNA”.
A Convenção de Haia de 2007 (Convenção sobre a Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família) estabelece, de forma mais clara, os procedimentos processuais.
Em seu art. 10, estabelece os pedidos disponíveis:
“§ 1º As seguintes categorias de pedidos estarão disponíveis, no Estado Requerente, para o credor que pretenda cobrar alimentos, nos termos desta Convenção: […]
c) obtenção de decisão no Estado Requerido quando não exista decisão, incluída a determinação de filiação, quando necessária;
d) obtenção de decisão no Estado Requerido quando reconhecimento e execução de decisão não forem possíveis ou tiverem sido denegados por falta de requisito para reconhecimento e execução, nos termos do artigo 20, ou por algum dos fundamentos especificados no artigo 22, alíneas b ou e; “
Contudo, como o item d) do art. 10 prevê, a Convenção de Haia estabelece, também, os motivos para o indeferimento do pedido da homologação e execução da decisão estrangeira para cobrança de alimentos, entre eles:
“ (i) quando esta for manifestamente contrária à ordem pública do Estado requerido27;(ii) ou tiver sido obtida mediante fraude processual; (iii) ou for caso de litispendência internacional e a ação foi instaurada primeiro no Estado requerido; (iv) ou for incompatível com uma decisão proferida no Estado requerido sobre as mesmas partes e a mesma causa de pedir, (v) ou não ter sido assegurado à parte pelo Estado requerido o direito ao contraditório e à ampla defesa; e (vi) a parte não ter sido devidamente citada ou notificada. (RIBEIRO et al., 2016, p. 11) “
Dito isto, é preciso analisar os casos possíveis de propositura de ação alimentício, seja de fixação, modificação ou exoneração, conforme se verá a seguir.
5.1.4.1 Abertura de Ação para Fixação de Alimentos no Exterior
Trata-se da situação na qual não há sentença condenatória ao pagamento de alimentos, nem acordo judicial ou extrajudicial homologado. Neste caso é necessária a propositura de ação judicial de fixação de alimentos (BRASIL, 2016). Conforme o art. III da Convenção:
“ARTIGO III
Apresentação do Pedido à Autoridades Remetente
1. Se o demandante se encontrar no território de uma Parte Contratante, doravante designada como o Estado do demandante, e o demandante se encontrar sob a jurisdição de outra Parte Contratante, doravante designada como o Estado do demandado, o primeiro poderá encaminhar um pedido a uma Autoridade Remetente do Estado onde se encontrar para obter alimentos da parte do demandado. “
De acordo com a Cartilha elaborada pelo Ministério Público Federal (BRASIL, 2016) o fluxograma a ser seguido é o seguinte:
Nota-se que o demandante pode procurar algumas Instituições. Para o presente estudo, focar-se-á na Defensoria Pública, que receberá a demanda por parte do assistido, remetendo à Procuradoria-Geral da República, que remeterá à Instituição Intermediária no Exterior. A Convenção dividiu as funções de Autoridade Central entre: um órgão que deve enviar os pedidos de cooperação – Autoridade Remetente – e outro que deve receber tais pedidos em determinado país – Instituição Intermediária (artigo II). De acordo com o Manual de Cooperação Jurídica Internacional e Recuperação de Ativos Cooperação em Matéria Civil (BRASIL, 2008, p. 50), no Brasil, a Procuradoria-Geral da República foi designada para exercer ambas as atribuições, conforme preceituado pelo artigo 26 da Lei no 5.478, de 25 de julho de 1968 (Lei de Alimentos) e pelo Decreto no 56.826, de 02 de setembro de 1965.
5.1.4.2 Abertura de Ação para Fixação de Alimentos no Brasil
Em casos análogos ao anterior, porém quando o demandante residir no exterior e o demandado no Brasil, o pedido de cooperação jurídica será encaminhado à Procuradoria da República mais próxima do domicílio do demandado para a propositura da ação perante a Vara Federal. O MPF atuará como representante processual em favor do alimentando (BRASIL, 2016, p. 7).
Sobre a situação em tela, o Código de Processo Civil brasileiro segue o mesmo entendimento acima. Em seu art. 21 estabelece a competência do Poder Judiciário brasileiro na matéria em tela: “Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que: I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; […]“
Desta forma, tanto a Convenção de Nova Iorque quanto a legislação ordinária brasileira prevêem a possibilidade de ação de fixação de alimentos no Brasil, quando a parte alimentante resida ou tenha domicílio em outro país.
5.1.5 Da Possibilidade da Prisão Civil
No Brasil, conforme prevê a Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso LXVII e o Código de Processo Civil brasileiro, em seu art. 528, quando do cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo. Ainda, os parágrafos assim estabelecem:
“§ 1o Caso o executado, no prazo referido no caput, não efetue o pagamento, não prove que o efetuou ou não apresente justificativa da impossibilidade de efetuá-lo, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 517.
§ 2o Somente a comprovação de fato que gere a impossibilidade absoluta de pagar justificará o inadimplemento.
§ 3o Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1o, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses. “
A decretação da prisão por não pagamento de pensão alimentícia é a mais gravosa consequência de inadimplemento de uma obrigação no Brasil. Contudo, não são todos os países que assim adotam, razão pela qual a prisão civil de inadimplentes com as obrigações alimentícias no estrangeiro não é simples. “Os pedidos de cumprimento de mandado de prisão civil por dívida de alimentos […] não têm sido cumpridos em razão da ausência de idêntica previsão legal desse instituto em várias jurisdições”. Essa dificuldade de inexistência de previsão legal no estrangeiro inviabiliza a prisão do devedor. “ O que ocorre então é a citação do devedor para pagamento espontâneo ou sua constituição em mora, sem prisão civil” (BRASIL, 2016, p. 36). Nas palavras do professor Ingo Wolfgang Sarlet, da PUC-RS (SARLET, 2016):
“O que não resulta legítimo do ponto de vista constitucional, por mais relevante que seja — e o é — a satisfação das necessidades alimentares pelos responsáveis pelo seu adimplemento — é que pais, mães e avós sejam, na esfera cível, submetidos a condições até mesmo mais gravosas (como dá conta o problema do regime prisional e da prisão domiciliar) de presos comuns provisórios ou definitivos, ou que, por força de prisão civil, sejam — no que diz com as condições de cumprimento da prisão — equiparados aos presos comuns. “
Tida como o mais grave recurso para compelir o devedor de alimentos ao pagamento, a prisão civil não é, em alguns casos, viável em países cujos ordenamentos jurídicos não contemplem tal instituto.
5.2 A CONVENÇÃO INTERAMERICANA SOBRE OBRIGAÇÃO ALIMENTAR
Do âmbito da Organização dos Estados Americanos, foi assinada em Montevidéu, em 15 de junho de 1989 e tem seu âmbito de aplicação nos Estados-partes. Estes signatários são Argentina, Belize, Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Equador, Guatemala, México, Panamá, Paraguai, Peru e Uruguai.
Esta Convenção determina o direito aplicável, a competência e a cooperação processual internacional, quando o credor de alimentos tiver seu domicílio ou residência habitual num Estado-Parte e o devedor de alimentos tiver seu domicílio ou residência habitual, bens ou renda em outro Estado-Parte (art. 1º).
Segundo a Convenção, em seu art. 11, as sentenças estrangeiras sobre obrigação alimentar terão eficácia extraterritorial nos Estados Partes, se preencherem os seguintes requisitos:
“a) que o juiz ou autoridade que proferiu a sentença tenha tido competência na esfera internacional, de conformidade com os artigos 8 e 9 desta Convenção, para conhecer do assunto e julgá-lo;
b) que a sentença e os documentos anexos, que forem necessários de acordo com esta Convenção, estejam devidamente traduzidos para o idioma oficial do Estado onde devam surtir efeito;
c) que a sentença e os documentos anexos sejam apresentados devidamente legalizados, de acordo com a lei do Estado onde devam surtir efeito, quando for necessário;
d) que a sentença e os documentos anexos sejam revestidos das formalidades externas necessárias para serem considerados autênticos no Estado de onde provenham;
e) que o demandado tenha sido notificado ou citado na devida forma legal, de maneira substancialmente equivalente àquela admitida pela lei do Estado onde a sentença deva surtir efeito;
f) que se tenha assegurado a defesa das partes;
g) que as sentenças tenham caráter executório no Estado em que forem proferidas. Quando existir apelação da sentença, esta não terá efeito suspensivo. “
Tais requisito devem ser observados, sob pena de não recepção da demanda. Tais requisitos visam viabilizar a comunicação e interação entre os ordenamentos jurídicos díspares.
5.3 A CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE ALIMENTOS
O Decreto nº 9.176, de 19 de outubro de 2017 promulgou a Convenção sobre a Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família e o Protocolo sobre a Lei Aplicável às Obrigações de Prestar Alimentos, firmados pela República Federativa do Brasil, em Haia, em 23 de novembro de 2007. A Convenção passou a vigorar a partir de 1º de novembro de 2017.
São partes da Convenção, além do Brasil, Albânia, Alemanha, Áustria, Bélgica, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Cazaquistão, Chipre, Croácia, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estados Unidos, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Holanda (Países Baixos), Honduras, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Montenegro, Noruega, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Tcheca, Romênia, Suécia, Turquia e Ucrânia.
Tendo em vista que esta Convenção substitui, entre os contratantes, a Convenção de Nova Iorque, de 20 de junho de 1956, então deverão passar a adotar esta Convenção (Haia) as tratativas do Brasil com Alemanha, Áustria, Bélgica, Bósnia e Herzegovina, Cazaquistão, Chipre, Croácia, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Holanda (Países Baixos), Hungria, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Montenegro, Noruega, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Tcheca, Romênia, Suécia, Turquia e Ucrânia.
De acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública (2017), os pedidos tramitarão pelo Ministério da Justiça, Autoridade Central para a Convenção, papel exercido por intermédio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), da Secretaria Nacional de Justiça.
6 DEMANDAS DE ALIMENTOS NO E DO EXTERIOR COM PAÍSES SEM ACORDO OU TRATADO INTERNACIONAL COM O BRASIL
No presente estudo, as discrepâncias quanto a demandas de alimentos existentes entre Brasil e os países com os quais não temos acordo ou tratado internacional são relevantes. Assim, surge a problemática maior deste estudo, qual seja, se não há acordo com algum país, qual a solução para os casos de prestação alimentícia quando envolver alimentandos ou alimentados entre Brasil e países não signatários de tais acordos ou tratados?
Como dito alhures, as demandas judiciais envolvendo mais de um ordenamento jurídico apresentam dificuldades variadas. Neste cenário, há de se evocar a Cooperação Internacional Jurídica, envolvendo ordenamentos jurídicos diferentes, Instituições díspares e, evidentemente, operadores do direito afeitos a diferentes realidades legais.
6.1 DAS AÇÕES DE ALIMENTOS ENTRE PAÍSES
Nos casos em que não haja acordo ou tratado internacional firmado entre os países e haja necessidade de tramitação de ação de pensão alimentícia, salvo algumas exceções, o Ministério da Justiça atua, por intermédio do Departamento de Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania (DRCI/SNJ), como Autoridade Central brasileira tanto para os pedidos de cooperação jurídica internacional em matéria civil feitos pelo Brasil, quanto para aqueles recebidos do exterior. São cerca de 800 pedidos analisados e tramitados mensalmente (BRASIL, 2018).
O trâmite dos pedidos é feito, entre países, por carta rogatória. Estas cartas e demais pedidos de cooperação jurídica internacional formulados pelo Judiciário brasileiro, especialmente o auxílio direto, devem ser encaminhados à Autoridade Central brasileira, para análise e tramitação. Caso haja tratado entre os países em cooperação, seguir-se-ão os critérios e trâmites a eles inerentes.
Em casos nos quais não há tratado internacional entre os países, a Autoridade Central o transmitirá ao Ministério das Relações Exteriores para os procedimentos pertinentes junto às representações diplomáticas do país no exterior. “Após o diligenciamento do pedido, o Ministério das Relações Exteriores devolve a documentação à Autoridade Central, que providenciará a transmissão à Autoridade Requerente”(BRASIL, 2018).
CONCLUSÃO
No presente estudo, a obrigação de alimentos no Brasil foi abordada, suas origens e a regulamentação estabelecida pelo ordenamento jurídico pátrio. Porém, ao se analisarem os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, conclui-se que a Convenção de Nova Iorque Sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro, de 1956, é mais abrangente e historicamente imprescindível para a facilitação dos trâmites das demandas envolvendo obrigações de prestar alimentos entre pessoas residentes em países diferentes. Sendo aplicada entre os Estados-Partes, a tramitação de tais demandas se tornou exequível e sobremaneira facilitada, ao prever esta Convenção a criação das autoridades centrais nos países signatários, o que tornou mais objetiva e célere a tramitação dos processos. Ainda, a Convenção regulamentou em nível internacional, entre os signatários, as possibilidades de judicialização da prestação de alimentos, tanto no quanto do exterior.
No âmbito da Organização dos Estados Americanos, a Convenção Interamericana Sobre Obrigação Alimentar, de 1989, tem destaque ao determinar o direito aplicável, a competência e a cooperação processual internacional, quando o credor de alimentos tiver seu domicílio ou residência habitual num Estado-Parte e o devedor de alimentos tiver seu domicílio ou residência habitual, bens ou renda em outro Estado-Parte, além de esclarecer que as sentenças estrangeiras sobre obrigação alimentar terão eficácia extraterritorial nos Estados Partes, se preencherem os requisitos ali estabelecidos.
A Convenção de Haia Sobre Alimentos, em vigor no Brasil a partir de 1º de novembro de 2017, que trata sobre a Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família, substitui, entre os contratantes, a Convenção de Nova Iorque, de 20 de junho de 1956, devendo estes signatários passar a adotar esta Convenção.
Porém, quando se tratar de demandas de alimentos no e do exterior com países sem acordo ou tratado internacional com o Brasil, a tramitação da ação de pensão alimentícia, salvo algumas exceções, é direcionada ao Ministério da Justiça, que atua, por intermédio do Departamento de Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania (DRCI/SNJ), como Autoridade Central brasileira tanto para os pedidos de cooperação jurídica internacional em matéria civil feitos pelo Brasil, quanto para aqueles recebidos do exterior. Nestes casos, a Autoridade Central o transmitirá ao Ministério das Relações Exteriores para os procedimentos pertinentes junto às representações diplomáticas do país no exterior. Essa cooperação internacional depende, evidentemente, de maiores esforços e as relações diplomáticas entre os Estados em questão influenciam no trâmite processual de tais demandas.
Sem o objetivo de esgotar o assunto, a presente pesquisa constatou ainda que as questões envolvendo países vizinhos ao Brasil, cujo funcionamento do sistema político-judiciário é bastante diferente do brasileiro, como o caso da Venezuela, estudos mais profundos devem ser conduzidos, principalmente diante do grande fluxo de venezuelanos que imigram para o Brasil, trazendo consigo importantes demandas judiciais, sendo as obrigações alimentares das mais proeminentes.
BRASIL. Decreto Legislativo nº 146 de 09/12/2016. Convenção sobre a Cobrança Internacional de Alimentos em benefício dos Filhos e de outros Membros da Família. Disponível em < http://legis.senado.leg.br/legislacao/DetalhaSigen.action?id=570231>. Acesso em 07 mar. 2018.
Subchefia para Assuntos Jurídicos. 25 jul. 1968.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 309. Disponível em < http://www.stj.jus.br/SCON/SearchBRS?b=SUMU&livre=309>. Acesso em 07 mar. 2018.
Informações Sobre o Autor
Vilmar Antonio da Silva.
Graduado em Direito, especialista em metodologia, mestre em Desenvolvimento Regional da Amazônia. É professor de Direito da Faculdade Cathedral de Boa Vista-RR e assessor jurídico na Defensoria Pública do Estado de Roraima