Considerações sobre a contribuição de Francisco de Vitória para Direito Internacional contemporâneo

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Resumo: O presente artigo tem por objetivo explicar a contribuição de Francisco de Vitória, teólogo espanhol enquanto um dos fundadores, bem como teórico para a consolidação do Direito Internacional contemporâneo.


Palavras-chave: Francisco de Vitória. Direito Internacional. Contribuições.


Sumário: 1. Introdução; 2. Contribuição de Francisco de Vitória para o Direito Internacional; 3. Considerações finais; 4. Referências.


1. Introdução


A expressão “Fundadores do Direito Internacional” foi retirada de uma obra coletiva que remonta ao século XX, mais precisamente, tal obra fora publicada em 1904, sob o título de Les Fondateurs Du Droit International.[i]


Francisco de Vitória (1492 ou 1483-1546), teólogo espanhol jusnaturalista, nasceu em Vitória, capital da província de Alava,em Biscaia. Este autor é considerado um dos fundadores do Direito Internacional, partindo da idéia de que a sociedade internacional é “orgânica e solidária”, levando a crer na concepção de que os Estados têm soberania limitada. [ii]


Vitória tem como marco teórico a idéia de uma sociedade internacional orgânica e solidária em que os Estados têm sua soberania limitada.


O autor em comento contribuiu de maneira relevante para a consolidação do Direito Internacional enquanto um ramo específico do Direito. Vitória  é um dos precursores da liberdade dos mares, tendo estudado outros vários temas, a exemplo da guerra justa, admitia a intervenção humanitária, visando defender os direitos humanos de homens,mulheres,crianças e etc.


Francisco de Vitória revoltou-se contra a teologia que dominava o direito internacional no século XVI, tendo combatido as doações de terras à Espanha e Portugal,feitas pelo Papa, pois segundo o autor, os donos dessas terras eram os povos habitantes do Novo Mundo.


“O seu nome foi ofuscado nos séculos XVII e XVIII pelo de Grotius. No século XIX, Ernest Nys o redescobriu e divulgou os seus trabalhos. A sua obra é “Relectiones Morales ou Theologicae” e delas as mais importantes “relectio” para a nossa matéria são: “De Indis Recenter Inventis”, De Jure belli hispanorum in barbaros’ e “De Potestate Civili”.[iii]


Francisco de Vitória foi seguidor do pensamento político do século XVI – Escola de Salamanca.


Ao proceder com uma análise de suas obras, três são os aspectos pelos quais Francisco de Vitória teve um reconhecimento de elevada relevância: São estes[iv]:


a) como teólogo, ao situar a obra evangelizadora da Espanha na América;


b) como pensador político, trouxe e consolidou a idéia de Estado para a sociedade moderna;


c) como jurista, deu um formato às bases do Direito Internacional.


2. Contribuição de Francisco de Vitória para o Direito Internacional


Francisco de Vitória, sem dúvidas, é um dos principais fundadores do Direito Internacional moderno, senão o principal. Este autor contribuiu de modo extremamente significativo para a área mencionada, especialmente em alguns temas, os quais serão discutidos neste momento:


2.1) O Poder


Para Vitória a fonte do poder está em Deus, pois todas as perfeições criadas, tanto individuais como coletivas, são participação de Deus. Já que o poder tem sua origem em Deus, isto o torna justo e legítimo.


Leciona Ramon Hernandez que:


“La suprema fuente Del poder está em Dios. Tiene que ser así, porque todas las perfecciones creadas, individuales y sociales, son participaciones de la perfección suma y consumada, que se halla en Dios. La Sagrada Escritura sale ao paso para confirmarlo. San Pablo lo anuncia a los Romanos: ‘todo poder viene de Dios’ (Rom 13,1). Y si viene de Dios, el poder, em sí mismo considerado, es justo y legítimo; no hay fuerza humana que justa y legítimamente no pueda disolver, ni siquiera mediante un convenio universal. La anarquía caótica de los pueblos que eliminara todo poder es una herejía de la naturaleza. Vitoria expresa esta doctrina con toda la fuerza de una conclusión bien definida: ‘todo poder, público o privado, por el cual se administra la república secular, no sólo es justo y legítimo, sino que tiene a Dios por autor, de tal suerte ni por el consentimiento de todo elmundo se puede suprimir’.”[v]


Para Francisco de Vitória, o homem necessita de poder para tornar-se melhor enquanto humano, bem como para desenvolver o máximo de recursos materiais e espirituais, a fim de levar a humanidade a um grau satisfatório de perfeição. Contudo, o homem não pode atingir tal objetivo de maneira individual; necessita, portanto da ajuda dos demais seres humanos. Dessa maneira, o poder pessoal não satisfaz; faz-se necessário um poder social.[vi]


Assim, o poder tem por base o povo ou a comunidade, em geral. Por isso, Vitória questionava a legitimidade do poder do rei, em sua singularidade, na medida em que um só indivíduo não pode ostentar o poder de todos. Por via de conseqüência, faz-se necessária uma ampla participação do povo neste poder.


Para Francisco de Vitória, as diversas formas de poder são legítimas como modos diferentes de transmitir o poder à comunidade. Tendo em vista a impossibilidade de todos os integrantes governarem ao mesmo tempo, deve-se fazer opção por um ou alguns representantes que possam administrar a sociedade em nome da comunidade.[vii]


O poder tem quatro limitações: Deus, os direitos dos cidadãos, as imprudências e erros do rei e a consulta popular.[viii]


a) Deus – o primeiro limite ao poder seria Deus, pois entre los paganos no existirían verdaderos poderes; sus príncipes y governantes serían ilegítimos. [ix]Se o poder tem sua origem em Deus, o que o desliga Dele o torna ilegítimo. Eis a causa de ser Ele a primeira limitação;


b) Os direitos dos cidadãos – a segunda limitação seriam os direitos dos cidadãos, na medida em que o governante deve realizar a sua função sem desrespeitar tais direitos. O representante do povo não pode fazer tudo aquilo que desejar; os indivíduos são detentores de direitos pessoais inalienáveis. Por isso, para Vitória o indivíduo não pode renunciar aos seus direitos jamais;


c) Imprudências e erros do rei – a terceira limitação ao poder seriam as imprudências e os erros do representante do povo. Para Vitória, o caso mais grave de imprudência desse representante está na declaração indevida e equivocada de uma guerra, já que o poder do monarca não pode ser jamais resistido;


d) Consulta popular – este é o quarto limite ao poder. A monarquia hereditária supõe na eleição tradicionalmente aceita e considerada legitimamente no poder. A eleição é algo necessário no sentido de que haja a escolha da pessoa mais apta a conduzir a administração pública. Na época vivida pro Vitória, o povo era carente de poder e, por isso o autor sonhava  com uma eleição na qual houvesse a participação de todos os cidadãos.


Para Vitória, a vontade da maioria constitui-se em elemento transmissor do poder e, se este é transmitido de maneira legítima,a minoria deve aceitá-lo, já que a maioria deu a legitimidade necessária ao poder.


2.2) A sociedade das nações


A sociedade das nações, a proclamação e a defesa dos direitos humanos foram pensadas por Francisco de Vitória no século XVI, portanto quase quatrocentos anos antes de existirem formalmente.


Para o autor, o direito das gentes só tem força se houver um pacto entre os homens. A existência ou não de autoridade suprema para a ordem mundial que unifique o interesse de todos, está no mesmo universo das exigências comuns a todos os povos de todas as nações.


Veja:


“El derecho de gentes no solo tiene fuerza por el pacto y convenio de los hombres, sino que tiene por sí mismo fuerza de ley. Y es que el orbe todo, que en cierta manera forma una república, tiene poder de dar leyes justas y a todos convenientes, como son las delderecho das gentes. De donde se desprende que pecan mortalmente los que violan los derechos des gentes, sea de paz, sea tocantes a la guerra. Y en los asuntos graves, como en la inviolabilidad de los legados, ninguna nación puede darse por no obligada por el derecho de gentes, pues éste viene conferido por la autoridad de todo el orbe.”[x]


Vitória rechaça a existência de privilégios para alguns países em detrimento de outros. Para ele, a sociedade internacional deve ser regida pelo princípio da igualdade entre os Estados.


Nota-se que a organização e representatividade dos Estados Parte da Organização das Nações Unidas – ONU, com o poder de veto, não estão de acordo com o Direito Internacional e suas exigências naturais.


Francisco de Vitória admite a intervenção humanitária em outros Estados, isto é, a possibilidade de intervenção de um Estado na vida política e social de outro, quando os direitos humanos de homens, mulheres e crianças estejam sendo desrespeitados.


2.3) A Guerra Justa


Para Francisco de Vitória, a Guerra Justa é aquela que é declarada somente após um país sofrer uma injúria grave. Portanto, a guerra defensiva é justa, por outro lado, a ofensiva não. Ademais, só uma ofensa grave poderia justificar uma guerra ofensiva, porém recorrendo a não utilização de armas nos primeiros momentos.


O ataque deve ser maior gravidade e, conseqüentemente, não é baseado em qualquer ataque que um país poderá declarar guerra a outro. Caso faça baseado em uma ofensa de menor proporção, tratar-se-á da guerra injusta.


Ademais, o autor rechaça a guerra com objetivos de aumento de riqueza, prestígio ou devido à religião.


Ramon Hernandez ensina:


“Tampoco es causa justa de guerra La gloria o el provecho particular del príncipe. La afirmación es evidente, porque el príncipe debe ordenar tanto la paz como la guerra al bien común de la república. Si no puede invertir los fondos públicos en sua propia gloria y provecho, mucho menos puede exponer a sus súbditos al peligro”.[xi]


Para Vitória, a defesa dos interesses da pátria é o único motivo para que haja uma declaração de guerra. Portanto, esta sendo defensiva, é sempre justa.


2.4) Os índios


A consolidação da noção de dignidade da pessoa humana, a partir do século XVI, época em que ocorreu a expansão colonial espanhola. Acerca disso, Vitória ratificou a exploração e escravidão dos índios e, tendo em vista o pensamento estóico e cristão, que aqueles – os índios – baseado no direito natural, bem como na sua natureza humana, e não em uma opção religiosa, eram teoricamente detentores de liberdade e igualdade. Portanto, os índios deveriam ser respeitados enquanto sujeitos da história e possuidores de bens e na condição de signatários dos contratos firmados com a coroa espanhola.


3. Considerações finais


Nota-se, portanto que Francisco de Vitória, enquanto o principal fundador do Direito Internacional contribuiu sobremaneira para a consolidação dessa área do conhecimento jurídico, especialmente nos temas discutidos no presente trabalho.


Francisco de Vitória foi um mestre digno de admiração, por suas argumentações concretas, pela fidelidade à tradição tomista, pelo desenvolvimento de seus princípios, pela coragem de contestar teóricos de sua época, especialmente sobre a temática do domínio e a expoliação dos índios americanos.


O teórico estudado foi um mestre em expor caminhos que dão base à prática das relações internacionais, muito presente no cenário internacional contemporâneo.


 


Referências

SÁNCHEZ-BARBA, Mario Hernández. Francisco de Vitoria. Revista interdisciplinar de Ciencias de La Comunicación y Humanidades.n. 5. jun. 2009

HEREDIA, Vicente Beltrán de. Francisco de Vitoria. Barcelona, Madrid, Buenos Aires, Rio de Janeiro: Labor, 1939.

HERNANDEZ, Ramon. Francisco de Vitória: vida y pensamiento internacionalista. Madrid: Biblioteca de autores cristianos, 1995.

MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional público. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. v. 1.

VITÓRIA, Francisco de. Os índios e o direito da guerra: de indis et de jure belli relectiones. Rio Grande do Sul: Unijuí, 2006.

 

Notas:

[i] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional público. v. 1. p. 163.

[ii] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional público. v. 1. p. 163.

[iii] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional público. V. 1. p. 163.

[iv] SÁNCHEZ-BARBA, Mario Hernández. Francisco de Vitoria. Revista interdisciplinar de Ciencias de La Comunicación y Humanidades.n. 5. jun. 2009. p. 202.

[v] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 158.

[vi] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 160.

[vii] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 165.

[viii] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 167.

[ix] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 167.

[x] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 176, citando Francisco de Vitória.

[xi] Cf. HERNÁNDEZ, Ramon. Francisco de Vitoria: vida y pensamiento internacionalista. 1995, p. 192.


Informações Sobre os Autores

Mércia Cardoso De Souza

Mestranda em Direito Público – linha de pesquisa Direito Internacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas. Bolsista CAPES. Pesquisadora colaboradora do Centro de Direito Internacional – CEDIN e Instituto de Investigação Científica Constituição e Processo – CNPq/PUC Minas. Auxiliar Judiciária do Tribunal de Justiça do Ceará – TJCE

Gabriela Flávia Ribeiro Mendes

Acadêmica de Direito da PUC Minas. Pesquisadora colaboradora da PUC Minas

José Maurício Vieira Filho

aluno da pós-graduação “lato sensu” em Direito Internacional da Universidade de Fortaleza (UNIFOR).


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