Ser criança é um perigo: um breve inventário sócio-histórico-filosófico sobre a violência contra a criança

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Resumo: Este artigo tem como objetivo principal apresentar um breve inventário sobre algumas concepções filosóficas, históricas e sociais que sustentam representações sobre as violências contra as crianças. Parte-se de algumas das atuais concepções de violência, para, em seguida, apresentar-se uma síntese acerca de concepções filosóficas de infância em Platão, bem como de algumas das diversas representações da infância, da antiguidade ao século XXI.


Palavras-chaves: violência – infância – história.


Sumário: 1. Violência contra criança – do que se trata? 1.1. Violência contra crianças em nosso tempo: um retrato 3×4 em preto e branco. 2. Um breve inventário histórico-filosófico sobre a infância. 2.1 A infância em Platão. 2.2 Quando a infância não existe. 2.3 Quando a infância existe. Século XX: o século da criança.


1. Violência contra criança – do que se trata?


Antes de tudo uma necessária advertência: no presente artigo não se busca desenvolver teorias acerca das violências contra crianças, mas tão-somente apresentar-se um breve inventário acerca de algumas representações filosóficas, históricas e sociais sobre a infância, da antiguidade ao século XXI, na busca de colaborar para uma melhor compreensão das práticas violentas contra crianças.


Ademais, a violência é um fenômeno complexo. Polissêmico, seu conceito possibilita múltiplas abordagens: sociológica, antropológica, etnológica, psicológica, dentre outras. Assim, a cada novo contexto ou perspectiva, um conceito diferente. Entretanto, as indicações de alguns elementos conceituais já teorizados podem colaborar para que os caminhos filosóficos, históricos e sociais não sejam percorridos sem um ponto teórico de partida.


As acepções mais comuns de violência estão dicionarizadas, tais como em Houaiss (2009), em que violência é “ação ou efeito de empregar força física ou intimidação moral contra alguém; exercício injusto ou discricionário de força ou de poder; constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém, para obrigá-lo a submeter-se à vontade de outrem; coação, opressão, tirania”.


Abramovay (2004, p. 94) inclui outras acepções:


“Intervenção física de um indivíduo ou grupo contra a integridade de outro(s) ou de grupo(s) e também contra si mesmo – abrangendo desde os suicídios, espancamentos de vários tipos, roubos, assaltos e homicídios até a violência no trânsito, disfarçada sob a denominação de “acidentes”, além das diversas formas de agressão sexual. Compreendendo-se, igualmente, todas as formas de violência verbal, simbólica e institucional.”


Tavares dos Santos (apud ZALUAR & LEAL, 2001, p.148) inclui a idéia de abuso de poder no conceito de violência: “excesso de poder que impede o reconhecimento do outro – pessoa, classe, gênero, ou raça – mediante uso da força ou coerção […]”.


Almeida (2001, p. 24), por sua vez, conceitua violência, de forma ampla, como sendo “ação intencional (de um indivíduo ou grupo) que provoca uma modificação prejudicial no estado psicofísico da vítima (pessoa ou grupo de pessoas)”.


O Relatório Mundial sobre a Violência e a Saúde, da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002), adota a definição de violência contra criança como


“o uso intencional da força ou poder físico, em forma de ameaça ou efetivamente, contra uma criança, por um indivíduo ou grupo, que prejudica ou tem grandes probabilidades de prejudicar a saúde, sobrevivência, desenvolvimento ou dignidade da criança.”


Seja qual for a definição adotada, resta confirmada a idéia de que a violência é multicausal e multifatorial, ou seja, reclama para sua explicação conceitual diferentes causas e fatores diversos, exigindo-se sempre abordagens transdisciplinares. Deve-se também considerar que a violência não deve ser percebida de forma isolada do seu contexto social, econômico, político e cultural, exigindo-se, igualmente, uma leitura a partir de uma perspectiva histórico-filosófica.


Entretanto, antes de se apresentar este contexto histórico-filosófico sobre a as representações da violência contra crianças, importa lembrar, ainda que em apertada síntese, as cotidianas formas de violências praticadas contra crianças.


1.1 Violência contra crianças em nosso tempo: um retrato 3×4 em preto e branco


No mundo inteiro, a enorme frequência e gravidade das situações diversas de violências praticadas contra crianças são facilmente comprováveis. Para exemplificar, basta pequena fotografia de um dos mais hediondos tipos de violência praticada contra as crianças: a violência sexual, a qual, no presente contexto, ganha especial destaque vez que parece conjugar, numa mesma modalidade (sexual), os sofrimentos das demais modalidades de violência (física, psicológica e negligência), causando às crianças múltiplos danos e gravíssimas conseqüências, tais como, gravidez precoce e indesejada, abandono da escola, discriminação social e familiar, prostituição, desajustes sexuais, depressões e suicídios, dentre outras, quase todas gerando impactos no campo familiar, comunitário e social.


Nos Estados Unidos, por exemplo, são registrados anualmente cerca de 300 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. Na França, morrem 400 crianças por ano vítimas dos próprios pais. Acredita-se que, para cada 20 situações de violência, somente uma é registrada (MONTEIRO FILHO, 1997, p. 05).


A Organização Mundial de Saúde – OMS (2006) estima que 150 milhões de meninas e 73 milhões de meninos abaixo de 18 anos foram forçados a manter relações sexuais ou sofreram outras formas de violência sexual que envolveu contato físico em 2002. E estimativas da Organização Internacional do Trabalho – OIT indicam que, em 2000, 1,8 milhões de crianças e adolescentes se envolveram com a exploração sexual e a pornografia.


A literatura científica tem relatado múltiplos casos de contatos sexuais forçados com crianças e adolescentes. Os estudos de Seabra (apud SADIGURSKY,1999, p. 61), por exemplo, mostraram que 15% das vitimizações em crianças e adolescentes ocorreram com pessoas estranhas à família, mas em 80% dos casos as crianças conheciam os seus agressores e, em 68%, tais agressores eram membros da família. Azevedo & Guerra (1997) informam que os casos de violência sexual são mais comuns na faixa etária entre 7 e 14 anos, porém, mais de um terço das notificações envolvem crianças de cinco anos ou menos.


O Laboratório de Estudos da Criança – LACRI, da USP (UNICEF, 2006, p. 17), estima que 20% das mulheres e 10% dos homens teriam sido vítimas de violência sexual antes dos 18 anos. Em 2001, por recomendação do Comitê dos Direitos das Crianças, a Assembléia Geral da ONU solicitou ao Secretário Geral que promovesse um estudo detalhado sobre a violência contra as crianças. Em fevereiro de 2003, o Secretário Geral da ONU designou o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro para dirigir o estudo solicitado, cujo relatório foi apresentado à ONU em agosto de 2006, indicando que:


“Num resumo de estudos realizados em 21 países (principalmente países desenvolvidos), de 7 a 36 por cento das mulheres e de 3 a 29 por cento dos homens relataram ter sido vítimas de violência sexual na infância e a maioria dos estudos observou que meninas sofreram abusos numa proporção 1,5 a 3 vezes mais alta que meninos. Na maioria dos casos, o abuso ocorreu dentro do círculo familiar. Da mesma maneira, num estudo multipaíses realizado pela OMS envolvendo países desenvolvidos e em desenvolvimento, entre 1 e 21 por cento das mulheres relataram que haviam sofrido abuso sexual antes de completarem 15 anos, na maioria dos casos por parte de parentes do gênero masculino que não eram o pai ou o padrasto” (PINHEIRO, 2006, p. 15).


Diante do cenário descrito pelo estudo referido, a ONU reconheceu a gravidade das violências praticadas contra crianças e adolescente, confirmando-se que:


“Se reconoce em el estúdio que la violência contra los niños afecta a todos los países y no conoce fronteras sociales, culturales, religiosas ni étnicas, siendo um fenômeno muy difundido, oculto em gran medida y com frecuencia condonadao por la sociedad. Además, la violência contra los niños tiene efectos emocionales y de la salud graves sobre los niños que duran toda da vida; socava el desarollo y la capacidad de aprendizaje de los niños, inhibe las relaciones positivas, ocasiona traumas y depressión y com frecuencia conduce a conductas de riesgo y agressivas.”


Em seguida, e em face de tal constatação, o Secretário Geral da ONU anunciou a designação da Sra. Marta Santos Pais, de Portugal, para o cargo de Representante Especial Sobre a Violência Contra as Crianças1, a qual deve atuar como defensora mundial, independente e de alto nível com o objetivo de promover a prevenção e a erradicação de todas as formas de violência contra crianças e adolescentes.


No Brasil, ainda faltam pesquisas nacionais especializadas, sistematicamente realizadas. Neste sentido, Saffioti (1997, p. 35) confirma que:


“Sobre este fenômeno não se conta com dados globais no Brasil. Obviamente, está-se pensando no abuso sexual denunciado e não no praticado. Mesmo assim, porém, há dois fatores que tornam impossível o esboço de um quadro nacional: de um lado, a precariedade do registro da ocorrência tanto no que respeita à relação entre vítima e agressor, quando no que tange à descrição dos fatos e suas circunstâncias e, de outro, a ausência de um levantamento global destes registros.”


No entanto, a autora referida (1997, p. 35/38) recorre aos dados da Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, realizada em 1992, destinada a investigar as violências contra as mulheres, para demonstrar que:


Se, de acordo com os dados da CPI, mais da metade dos estupros ocorre no seio da própria família, que se pode pensar dos atos libidinosos que não ultimam a penetração vaginal, definidora do estupro? […]


Pode-se, pois, afirmar, sem grande margem de erro, que praticamente todos os estupros intrafamiliares são perpetrados contra menores. […]


Dadas as características de segredo de família apresentadas pelo abuso incestuoso, este é um fenômeno coberto por um pesado e espesso véu.”


Ainda com base nos dados da CPI, pode-se verificar um perfil da vitima, principalmente crianças:


“A faixa etária de maior incidência deste fenômeno, segundo este levantamento, era a de 7 a 10 anos (32,7%). A segunda preferência recaía sobre as crianças entre 11 e 13 anos (28,6%). Isto é, mais de 60% dos abusos atingiram crianças entre 7 e 13 anos de idade […] A preferência por crianças aponta para o abuso sexual enquanto afirmação de poder e não como resultado de uma pulsão sexual irreprimível. Mais uma informação que corrobora este argumento consiste na maior incidência do abuso sexual contra crianças de até 6 anos (20,2%) quando comparada à presença do fenômeno na faixa de 14 a 18 anos (18,5%) (SAFFIOTI, 1997, p. 39).”


Pode-se, igualmente, constatar algumas referências quanto aos agressores, confirmando-se sua proximidade com as vítimas:


“[…] o pai em 41,6% dos casos, o padrasto com uma incidência de 20,6%, o tio com 13,9%, primo com 10,9%, distribuindo-se o restante entre irmão: 3,8%; cunhado: 3,8%; companheiro da mãe: 2,1%; avô: 1,7%; concunhado: 0,4%; sobrinho do padrasto: 0,4%; tio-avô: 0,4%; madrasta: 0,4%.”


A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República divulgou Relatório de Pesquisa no qual constata denúncias de práticas de violência sexual contra crianças e adolescentes em quase 1.000 (mil) municípios brasileiros (SEDH, 2005).


E o Disque Denúncia Nacional de Abuso e Exploração Sexual Contra Crianças e Adolescentes2, por sua vez, em seu Relatório Geral 2010 (SEDH, 2010), confirma o recebimento mais de 2,4 milhões de atendimentos, tendo recebido e encaminhado mais de 130 mil denúncias, em mais de 4.800 municípios, de todos os estados brasileiros, no período de maio de 2003 a julho de 2010.


Segundo o Relatório supramencionado, das 214.689 vítimas com sexo informado nas denúncias, 62% são do sexo feminino e 38% do sexo masculino. Entretanto, quando se trata de violência sexual, o percentual para o sexo feminino sobe para 82%, demonstrando que a violência sexual aqui é tão freqüente quanto nos países do chamado Primeiro Mundo e revelando ser esse um problema público de grandes proporções (SEDH, 2005), embora ainda pareça invisível.


Pinheiro (2006, p. 09) colabora para o entendimento acerca dessa invisibilidade da violência:


“[…] No entanto, grande parte da violência contra crianças continua camuflada por muitas razões. Uma delas é o medo: muitas crianças têm medo de denunciar incidentes de violência contra elas. O medo está estreitamente relacionado ao estigma freqüentemente associado a denúncias de violência, particularmente em locais onde a “honra” da família é mais valorizada do que a segurança e o bem-estar das crianças. […]


A violência também é invisível porque crianças ou adultos não dispõem de mecanismos seguros ou confiáveis para denunciá-la. Em algumas partes do mundo, as pessoas não confiam na polícia, nos serviços sociais ou em outras autoridades; em outras, particularmente em áreas rurais, não há nenhuma autoridade acessível à qual elas possam denunciar atos de violência.”


Ademais, deve-se ainda considerar que a violência denunciada é apenas a “ponta do iceberg das incontáveis agressões cometidas contra crianças e adolescentes em qualquer sociedade” (AZEVEDO & GUERRA, 2006).


Diante desse “pequeno” retrato pode-se verificar que se está mais perto da violência sexual e das outras formas de violência contra crianças do que se gostaria e ela é mais extensa do que se pensa.


Neste sentido, entende-se que uma boa compreensão sobre o fenômeno da violência contra crianças não prescinde de um olhar sobre as representações da própria idéia de infância, desenvolvidas nos contextos sociais, filosóficos e históricos, nos últimos séculos.


2. Um breve inventário histórico-filosófico sobre a infância


Há diversas idéias, crenças, discursos, concepções e acepções de/sobre infância. E diferentes áreas do conhecimento ocupam-se de seu estudo, com destaque para a psicologia, a biologia, a psicanálise e a pedagogia, as quais se dedicam, com mais freqüência, a percorrer caminhos em busca de desenvolver formulações teóricas sobre seus sentidos e significados.


No entanto, tais tentativas, geralmente, confirmam-se como um discurso sobre ela, externo, de fora. Neste sentido, Lajolo (2009, p. 229) dispõe que:


Enquanto objeto de estudo, a infância é sempre um outro em relação àquele que a nomeia e a estuda. As palavras infante, infância e demais cognatos, em sua origem latina e nas línguas daí derivadas, recobrem um campo semântico estreitamente ligado à idéia de ausência de fala. Esta noção de infância como qualidade ou estado do infante, isto é, d`aquele que não fala, constrói-se a partir dos prefixos e radicais lingüísticos que compõem a palavra: in = prefixo que indica negação; fante = particípio presente do verbo latino fari, que significa falar, dizer. […]


Assim, por não falar, a infância não se fala e, não se falando, não se ocupa a primeira pessoa nos discursos que dela se ocupam. E, por não ocupar esta primeira pessoa, isto é, por não dizer eu, por jamais assumir o lugar de sujeito do discurso, e, consequentemente, por consistir sempre um ele/ela nos discursos alheiros, a infância é sempre definida de fora.”


Assim, confirma a autora (idem, p. 230) “não se estranha, portanto, que esse silêncio que se infiltra na noção de infância continue marcando-a quando ela se transforma em matéria de estudo ou de legislação”.


Freitas (2009, p. 253), nesta direção, também assevera que:


“Habitualmente, a relação tormentosa entre a criança e a sociedade é objeto de estatísticas alarmantes acerca das precariedades que assolam os universos infantis no mundo todo. Entretanto, uma questão ausente das estatísticas deve ser trazida ao debate e discutida com o mesmo grau de seriedade que as questões econômicas e políticas encarecem. Isso diz respeito ao fato de que as representações da infância muitas vezes voltam-se contra ela, e raramente, atuam em seu favor.”


Em verdade, basta um breve passeio nas diferentes e diversas fontes bibliográficas para se perceber que a infância foi tratada de diferentes maneiras em tempos e lugares distintos de nossa história, quase sempre no sentido de sua negação ou coisificação. Lajolo (2009, p. 232) também colabora para demonstrar, em apertada síntese, as diferentes concepções de infância que circularam:


“[…] primeiro, vendo a criança como um adulto em miniatura; depois, concebendo-a como um ser essencialmente diferente do adulto, depois … Fomos acreditando sucessivamente que a criança é a tabula rasa onde se pode inscrever qualquer coisa, ou que seu modo de ser adulto é predeterminado pela sua carga genética, ou ainda que as crianças do sexo feminino já nascem carentes do pênis que não têm, ou então tudo isso, ou nada disso, ou então ou então ou então.”


E, em seguida, explica:


“Se o conjunto de idéias e crenças sobre a infância, quando lido em seqüência, soa como uma divertida ciranda de contradições, é admirável observar que, não obstante a contradição, todas estas crenças (conhecimentos?) subsistiram. Por quê? Talvez porque funcionaram, isto é, porque construíram, para a infância de que falavam, uma representação adequada tanto aos pressupostos da disciplina no bojo da qual tal conhecimento (crença?) foi formulado, quanto adequada às expectativas que, em face da infância, alimentava a comunidade onde se produziram e pela qual circula(va)m os saberes em causa.”


Sendo assim, considera-se que importa investigar que concepções filosóficas e históricas sustentam as representações, crenças, conhecimentos, sobre a idéia de infância, conceito que poderá colaborar para uma compreensão mais profunda sobre o fenômeno das violências praticadas contra crianças, até hoje.


Tenta-se, nesta perspectiva, identificar elementos para compreender, explicar ao invés de apenas descrever o fenômeno da violência contra crianças, eis que “a mera descrição não revela as relações dinâmico-causais reais subjacentes ao fenômeno”. (VYGOTSKY, 1989). Assim, que representações filosóficas e históricas foram estabelecidas para infância, como objeto da violência? Será que se tem, hoje, um comportamento filosoficamente “fossilizado” (VYGOTSKY, 1989) acerca das diversas práticas de violências contra crianças? Algumas respostas podem ser percebidas se se escutar algumas vozes filosóficas e históricas que ecoam sobre a infância, o que se pretende indicar a seguir.


2.1 A infância em Platão.


Kohan (2005) indica que a infância, embora não fosse para Platão um problema filosófico relevante, esteve presente em seus discursos, seja como pura possibilidade, seja como inferioridade, seja como outro desprezado ou como material da política.


Na análise de Kohan (2005, p. 33), a primeira marca que se distingue no conceito platônico de infância é que esta pode ser quase tudo, “é a marca dos sem-marca, a presença de uma ausência”. Para o autor, na análise de A República, “os diálogos de Platão não estão alheios ao sentido mais primário da infância que a associa a uma etapa primeira da vida humana”, destacando que:


Enquanto primeiro degrau da vida humana, a infância representa também seu caráter de incompleta, sua falta de acabamento. Porém é verdade que, para Platão, a vida humana e o gênero humano como um todo são considerados como incompletos. A natureza dos seres humanos não está dada de uma vez por todas, mas vai se constituindo em função de certa educação que a transforma de geração em geração. […]


A princípio, essa visão da infância parece extraordinariamente positiva, poderosa: dela pode devir quase qualquer coisa; dela quase tudo pode ser. Contudo, essa potencialidade, esse ser potencial, esconde, como contrapartida, uma negatividade em ato, uma visão não-afirmativa da infância. Ela pode ser qualquer coisa. O ser tudo no futuro esconde um não ser nada no presente. Não se trata de que as crianças já são, em estado de latência ou virtualidade, o que irá devir; na verdade, elas não têm forma alguma, são completamente sem forma, maleáveis e, enquanto tais, podemos fazer delas o que quisermos.” (2005, p. 40)


Ou seja, a infância é considerada apenas como pura possibilidade.


Numa outra vertente de sua análise dos discursos platônicos, Kohan (2005) destaca outra visão marcante da infância: a inferioridade. E é em As Leis, principalmente, de que Kohan (2005, p. 42,43) afirma extrair tal visão:


“[…] A obra em que esse relato aparece mais nítido, e também mais descarnado, é seu último texto, recém referido, As Leis. Ali se afirma que as crianças são seres impetuosos, incapazes de ficarem quietos com o corpo e com a voz, sempre pulando e gritando na desordem, sem o ritmo e a harmonia próprias do homem adulto, e de temperamento arrebatado. As crianças sem seus preceptores são como os escravos sem seus donos, um rebanho que não pode subsistir sem seus pastores.


[…] O Ateniense estipula que uma criança, enquanto homem livre que será (no futuro), deve aprender diversos saberes, e enquanto escravo que é (no presente), pode e deve ser castigado por qualquer homem livre que se encontre com ela.”


Em Diálogos, Kohan (2005, p. 44-48) também identifica a figura da infância como a vergonha, uma metáfora da inferioridade:


Em muitos outros Diálogos, a infância ocupa um espaço semelhante de inferioridade. […]


No Teeteto, as crianças são alinhadas com as mulheres e as bestas como exemplos de indivíduos de uma classe que diferem entre si em sua relação com a saúde. Em vários lugares e de diversas formas, Platão diz que as crianças não têm razão, compreensão ou juízo. Por exemplo, para referir-se a um argumento óbvio, simples ou sem importância, muitas vezes afirma-se que é próprio de uma criança; nesses casos, o adjetivo infância é sinônimo de pueril, ingênuo, débil. […]


Em suma, nos diferentes sentidos e capacidades físicas e intelectuais que, para Platão, constituem uma pessoa, ele considera a criança inferior…”


Evidenciada, pois, a condição de inferioridade da infância.


Outra marca identificada por Kohan (2005, p. 55) nos discursos platônicos sobre a infância é a que a considera como não-importante, acessória, supérflua, depreciada e, portanto, que não tem lugar na pólis. Veja-se:


“[…] Assim Sócrates responde a Cálicles com sua mesma moeda: “as crianças são vocês”. As crianças são sempre os outros. Esse talvez seja o único ponto em que Sócrates e Cálicles coincidem. Discordam sobre quase tudo: sobre a filosofia, sobre a política, a retórica, o bem, o prazer. Mas em uma coisa coincidem: “as crianças são vocês, os outros”. As crianças são a figura do não-desejado, daqueles que não aceitam a “minha” verdade, do rival desqualificado, de quem não compartilha uma forma de entender a filosofia, a política, a educação, e por isso deve ser vencido, azotado, expulso da pólis. As crianças são, para Sócrates e para Cálicles, portanto, para Platão, uma figura do desprezo, do excluído, o que não merece entrar naquilo de mais valioso disputado por Platão, teoricamente, com os sofistas: a quem corresponde o governo dos assuntos da pólis, tà politikà.”


Eis, pois, em síntese, como a infância se configura como “a marca dos sem-marca”, “pura possibilidade”, um vir a ser, o que ainda não é, inferiorizada, subjugada, castigada, corrigida, não-importante, depreciada, o outro desprezado, na voz de Platão.


Por fim, Kohan (2005, p. 55-59) destaca que “tanto em Alcebíades I, quanto no Górgias, A República e As Leis, as discussões que alcançam a infância e a educação adquirem sentido em função de sua significação política:


“Neste registro, as crianças não interessam pelo que são – crianças -, mas porque serão os adultos que governarão a pólis no futuro. […] Para isso, as educaremos, desde a mais tenra idade. […] Educa-se para politizar os novos, para fazê-los participantes de uma pólis que se define, previamente, para eles. As relações entre política e educação são carnais: educa-se a serviço de uma política a um só tempo em que a ação política persegue, ela mesma, fins educativos. Por isso a educação é tão decisiva para Platão, porque é sua melhor ferramenta para alcançar a pólis tão sonhada.”


E Kohan (2005) conclui:


“Possibilidade, inferioridade, outro rechaçado, material da política. Marcas sobre a infância deixadas por um pensamento. Marcas de uma Filosofia da Educação. Marcas que situam a infância em uma encruzilhada entre a educação e a política. Primeiras marcas da infância na Filosofia da Educação. Antigas marcas da infância. Marcas distantes. Primeiras? Antigas? Distantes?”


Como se apresenta a seguir, nem primeiras, nem assim tão antigas, nem mesmo tão distantes.


2.2 Quando a infância não existe.


O reconhecimento da criança como pessoa humana – sujeito de direitos – parece constitui-se como algo novo no contexto histórico-social da humanidade. A perspectiva da “proteção integral”, configurada no final do século XX e no começo do século XXI confronta-se com a histórica negação da humanidade da criança, sua coisificação, sua dominação absoluta ou seu disciplinamento rigoroso, historicamente perpetuados (FALEIROS, 2007).


Pode-se afirmar, sem vacilações, que a infância foi objeto das mais diversas tentativas de silenciamento e que a história da criança é a história da sua descoisificação, de sua desobjetalização. DeMause (1991, p. 14) considera que


“a história da infância é um pesadelo do qual recentemente começamos a despertar. Quanto mais atrás regressamos na História, mais reduzido o nível de cuidados com as crianças, maior a probabilidade de que houvessem sido assassinadas, aterrorizadas e abusadas sexualmente.”


Segundo Ariés (1978) até o século XII não se considerava a infância como uma especificidade e a infância não era sequer representada pela arte medieval, mas, quase sempre as crianças eram representadas como adultos em miniaturas. Ademais, afirma o autor, as crianças pequenas eram de tal maneira insignificantes que nem mesmo eram contadas em face do alto índice de mortalidade e ao mesmo tempo de nascimentos. Não existia nem mesmo o atual pudor frente às crianças a respeito de assuntos sexuais.


É certo que tais perspectivas devem ser relativizadas conforme os diversos grupos sociais, seus diferentes modus vivendi, seus respectivos contextos sociais, históricos e culturais, bem como suas múltiplas visões de mundo. Entretanto, parecem consenso as constantes práticas de violências contra crianças e adolescentes ao longo da história.


Delgado (2000, p. 12-13) confirma, por exemplo, que:


“En la primera literatura escrita aparecen com frequencia relatos cuyos protagonistas son los niños abandonados por sus padres em los bosques, em el campo o em outro lugar. A estos niños se lês há llamado expósitos a lo largo de la historia. La mayoría de estos niños abandonados debió morir sin dejar rastro.”


E comentando as práticas dos fenícios, cartagineses e hebreus, na antiguidade, Delgado (2000, p. 22-23) destaca:


Los fenícios y sus herederos los cartagineses practicaban sacrifícios humanos, sobre todo de niños, em situaciones excepcionales. Los historiadores de la Antiguedad se escandalizaron por esta “costumbre bárbara llena de infâmia”. Cuenta Diodoro Sículo que, cuando Cartago estaba asediada por sus enemigos, em el 310 a.C., inmolaron a um centenar de niños de lãs mejores famílias, al dios Crono, dios que los griegos recordaron como devorador de sus próprios hijos. […]


Antes de estabelecerse em la tierra prometida, el legislador Moisés tropezó con la perversa costumbre de sacrificar a los niños a los ídolos paganos como rito heredado de los pueblos vecinos. La imagem de Abraham dispuesto a sacrificar a su único hijo Isaac, concebido em su ancianidad y heredero de su nombre, de sus riquezas y, lo que era más importante para El, de lãs promesas de Yavé, se nos hace más comprensible a La luz de uma sociedad que valoraba positivamente el infanticídio como un acto, quizás heróico, de sentido religioso y de sumisión a la divinidad.”


No Antigo Testamento encontram-se registros dessas práticas violentas, das mais variadas formas. Para exemplificar, no Segundo Livro de Reis indica-se que o povo hebreu comia os próprios filhos: “Dá-me o teu filho, para o comermos hoje; amanhã comeremos o meu. Cozemos então meu filho e o comemos” (II REIS 6: 26-29). E no Deuteronômio (21: 18-21) destacam-se as providências destinadas aos “filhos incorrigíveis”:


“Se um homem tiver um filho indócil e rebelde, que não atenda às ordens de seu pai nem de sua mãe, permanecendo insensível às suas correções, seu pai e sua mãe tomá-lo-ão e o levarão aos anciãos da cidade à porta da localidade onde habitam, e lhes dirão: este nosso filho é indócil e rebelde; não nos ouve, e vive na embriaguez e na dissolução. Então, todos os homens da cidade o apedrejarão até que ele morra”.”


Práticas “correcionais” e “disciplinares” também se encontram registradas em outros textos bíblicos, tais como em Provérbios (13:24): “Aquele que poupa a vara, quer mal ao seu filho, mas o que o ama, corrige-o continuamente”. 


DeMause (1974) relata uma longa e horrorosa história de violências praticadas contra crianças, desde os tempos mais antigos até a atualidade. O infanticídio e o abandono eram práticas comuns desde os tempos mais remotos. Práticas sacrificiais estão presentes, segundo ele, desde 7000 a.C, entre celtas, gauleses, escandinavos, egípcios, fenícios, israelitas e babilônios, bem como na Grécia e em Roma. Ainda segundo o autor, o assassinato de crianças era uma prática diária e até o século XVIII, o tempo que os pais dispensavam ao cuidado dos filhos era mínimo.


Na Roma antiga, o pater famílias tinha direito de vida e de morte sobre seus filhos (COULANGES, 2004). Tranquilo (1937, p. 165/6), biógrafo dos doze Césares, destacou que Tibério Nero César pervertia sexualmente crianças de tenra idade.


Na Antiguidade e na Idade Média, mesmo considerando que a criança e a infância não eram abordadas diretamente pela história, aparecendo apenas na abordagem a outros tópicos, bem como havendo certa imprecisão quanto ao emprego dos termos “criança” e “infância” (LYMAN, 1974), pode-se confirmar que a caracterização da infância como um estágio específico e valorizado não existia.


Delgado (2000, p. 26-27) também colabora neste sentido, ao comentar sobre tal temática na Grécia arcaica e clássica:


Hablar del niño griego nos lleva inmediatamente a la infância de los héroes homéricos (…)


El mundo de los héroes mitológicos cantado por Homero había pasado, si bien continuaba como um buen espejo em el que mirarse y al que imitar. Estos personajes, más legendários que reales, eran héroes adultos, sin infância, educados no por um padre y uma madre, sino por centauros em el bosque. Irrumpen en su pequeña historia colectiva a partir de la muchachez y de la juventud, nunca desde la infância. El centauro Quirón recuerda a su alumno Aquiles las vomitonas que le producía el vino que le daba cuando era niño, anécdota problabemente histórica, que indica el afán de los adultos em quemar cuanto antes la etapa infantil considerada inútil y sin valor.”


E sobre a criança espartana, Delgado destaca que:


Nada más triste que um niño en Esparta, si hemos de creer em los mitos que la história nos há suministrado. No existe la família, la vida privada, la liberdad individual. Sólo existe el estado omnisciente, omnipotente y temible, que gobierna mediante el terror y la ejecución, sin control político de ningún tipo.[…]


?Qué valor podia tener el niño en este ambiente?[…]


Nada más nacer, los niños eran lavados com vino para conocer su resistência. Posteriormente eran examinados por uma comisión de expertos, que dictaminaba si merecia o no la pena dejar vivir al racién nacido. Los débiles y defectuosos eran arrojados a las llamadas Apoyetas (literalmente “expositorios”), sima en las laderas del monte Taigeto. Ni se les ponían fajas ni se atendían sua llantos y miedos em la oscuridad de la noche. Si sobrevivían, les esperaba la vida triste de los cuarteles sometidos a los campeonatos de resistência, a los azotes y al caldo negro de la comida colectiva.[…]


Su máxima gloria consistia em llegar a formar parte de los iguales (homoioi)…”


Segundo Ariés (1978) é somente a partir do século XVII que a criança passa a ocupar um novo lugar, conseqüências das diversas transformações sociais e culturais processadas; a conformação da idéia de família, na acepção mais próxima à da moderna; o desenvolvimento do sentimento de infância como inocente e conseqüente necessidade de sua proteção; as novas idéias iluministas em circulação; a industrialização e o acelerado desenvolvimento urbano; a escolarização específica da criança; a ascensão da burguesia comercial, dentre tantas outras transformações que, apesar das chicotadas e correções humilhantes continuarem, a infância foi “inventada”.


No Brasil, a infância é marcada, duramente, pela interminável e indelével violência, pela sua coisificação. Segundo Chaves (1995, apud GUERRA, 1998), relatos em diversas capitanias indicam que os índios não praticavam castigos físicos para o disciplinamento de seus filhos e que foram os jesuítas, da Companhia de Jesus, que introduziram a aplicação de castigos físicos contra crianças na Colônia.


Castigos diversos, extremamente violentos, com o uso de palmatórias, varas de marmelo com alfinetes nas pontas, cipós, espancamentos sistemáticos, tinham o intuito de disciplinar e corrigir (FREYRE, 1984). Em Casa-grande & Senzala, Freyre (1984, p. 50) registra que “através da submissão do moleque, seu companheiro de brinquedos e expressivamente chamado leva-pancadas, iniciou-se muitas vezes o menino branco no amor físico”, sendo comum o homem branco “sifilizar” a menina negra. Além disso, as crianças escravas eram costumeiramente estupradas por rapazes brancos, sem que nenhuma ação fosse promovida para inibir e punir os violentadores (NEVES, 1992).


A literatura confirma tais registros de representações, imagens e sentidos de infância em circulação igualmente marcantes. Monteiro Lobato, por exemplo, citado por Lajolo (2009, p. 239/240), em seu conto “Negrinha”, narra:


“[…] Assim cresceu Negrinha – magra, atrofiada, com os olhos eternamente assustados. Órfã aos quatro anos, por ali ficou feito gato sem dono, levada a pontapés. Não compreendia a idéia dos grandes. Batiam-lhe sempre, por ação ou omissão. A mesma coisa, o mesmo ato, a mesma palavra provocava ora risadas, ora castigos. Aprendeu a andar, mas quase não andava, com pretexto de que ás soltas reinaria no quintal, estragando as plantas.


[…] O corpo de Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões. Batiam nela os da casa todos os dias, houvesse ou não houvesse motivo. Sua pobre carne exercia para cascudos, cocres e beliscões a mesma atração que o ímã exerce para o aço.


[…] Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos, como gato sem dono.


Freitas (2009, p. 259) analisando a obra de Freyre, confirma a permanente situação de violência a que as crianças eram submetidas: “ser criança em qualquer situação significa estar em algum elo da cadeia agressor/agredido com variação e troca circunstancial dos papéis”. E para explicar, cita Freyre: “a vítima desse esnobismo dos barões foi o filho. Que judiasse com os moleques e as negrinhas, estava direito; mas na sociedade dos mais velhos, o judiado era ele.”


Leite (2009, p. 28), analisando relatos de viagens e memórias de estrangeiros pelo Brasil da escravidão, destaca o seguinte trecho do relato de Thomas Ewbank, em sua passagem pelo Brasil, em 1828, num mercado de escravos:


“Frequentemente tive a oportunidade de ver senhoras brasileiras nesses mercados. Elas chegam, sentam-se, examinam e apalpam suas aquisições e as levam consigo, com a mais absoluta indiferença. Muitas vezes vi grupos de senhoras bem vestidas comprando escravos com a mesma animação com que as senhoras inglesas fazem compras nos bazares. […] Senti-me atraído por um grupo de crianças, uma das quais, uma menina, tinha um ar triste e cativante. Ao me ver olhando para ela, o cigano a fez levantar-se dando-lhe uma lambada com uma comprida vara, e lhe ordenou com voz áspera que se aproximasse. Era desolador ver a pobre criança de pé à minha frente, toda encolhida, em tal estado de solidão e desamparo que era difícil conceber como pôde chegar àquela situação um ser que, assim como eu, é dotado de uma mente racional e uma alma imortal. Algumas das meninas tinham um ar muito doce e cativante. Apesar de sua pele escura, havia tanto recato, delicadeza e cordura nos seus modos que era impossível deixar de reconhecer que eram dotadas dos mesmos sentimentos e da mesma natureza das nossas filhas. O vendedor preparava-se para colocar a menina em várias posições e exibí-la da mesma maneira como faria com um homem, mas eu declinei da exibição e ela retornou timidamente ao seu lugar, parecendo contente por poder se esconder no meio do seu grupo. […]”


Nos séculos XVIII e XIX o abandono de crianças e o infanticídio eram práticas encontradas entre brancos, negros, inclusive entre índios (LEITE, 2009). Bebês eram deixados nas ruas, em lixeiras, terrenos baldios, nas calçadas, o que provocou a idéia de criação da Roda dos Expostos, um cilindro giratório na parede da Santa Casa que permitia que a criança fosse colocada sem que a autora do ato fosse reconhecida (VENANCIO, 1997).


A grande maioria dessas crianças abandonadas, rejeitadas, eram de origem “ilegítima” e 90% morriam por ausência de cuidados ou por falta de condições da própria Santa Casa. No período republicano as rodas foram sendo transformadas em asilos de “meninos desvalidos”, sendo que a última Roda dos Expostos só foi extinta nos anos cinqüenta do século XX (FALEIROS, 2007). Sobre a roda dos expostos. Marcílio (2009, p. 53) dispõe que:


“A roda de expostos foi uma das instituições brasileiras de mais longa vida, sobrevindo aos três grandes regimes de nossa história. Criada na Colônia, perpassou e multiplicou-se no período imperial, conseguiu manter-se durante a República e só foi extinta definitivamente na recente década de 1950! Sendo o Brasil o último país a abolir a chaga da escravidão, foi ele igualmente o último a acabar o triste sistema da roda dos enjeitados.”


E sobre o destino dos expostos, Marcílio (idem, p. 69) indica que “parte considerável deles acabava por morrer, logo após o abandono, por fome, frio ou comidos por animais, antes de poderem encontrar uma alma caridosa que os recolhesse dos caminhos, portas de igrejas ou de casas, praças públicas ou até monturos de lixos”.


No regime disciplinar escolástico também se encontram registros de práticas violentas pela própria escola, conforme relata Macêdo (2006, p. 250):


“A história disciplinar, do século XV ao século XVII, nos revela dois aspectos importantes: o primeiro é que se tratava de uma disciplina humilhante, onde o uso do chicote era critério do mestre. Nesse período, o castigo corporal se generalizou e todas as crianças e jovens, independentemente da idade que tivessem, eram submetidas ao mesmo regime disciplinar e igualmente surradas. O segundo aspecto é a dilatação da idade escolar que era submetida ao chicote, inicialmente reservado às crianças pequenas, estendendo-se depois a todos os alunos, até mesmo àqueles que já tinham 20 anos. No ambiente escolar não havia distinção entre crianças e adolescentes e todos partilhavam as humilhações dos castigos corporais.”


Além das diversas formas de violências praticadas contra crianças, abandono e rejeição, humilhação e espancamentos, a indigência igualmente marca a história das crianças brasileiras, inclusive durante o século XX, colaborando para a multiplicação dos sofrimentos. Neste sentido, o Relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF, em 1979, Ano Internacional da Infância, revela que:


“Por detrás da maior parte dos problemas das crianças se tropeça com as desigualdades e pobreza. Os problemas anteriormente assinalados respondem a causas múltiplas que seria perigoso simplificar excessivamente. Sem dúvida, parece claro que a maior parte deles estão, direta ou indiretamente, ligados à pobreza e, portanto, à desigualdade da distribuição dos resultados do desenvolvimento. […] Porém, todas essas conseqüências empurram por sua vez, para a pobreza. Através das carências infantis, a pobreza se reproduz a si mesma.”


Moncorvo Filho (1926, p. 15/16), por sua vez, considerando aspectos voltados à história da pediatria e ao atendimento da infância empobrecida, divide a história da criança no Brasil em três períodos:


1º período (antigo) – de 1500 a 1874 – período em que a criança brasileira teria vivenciado abandono por parte das autoridades públicas, sendo amparadas por instituições religiosas e caritativas;


2º período (médio) – de 1874 a 1889 – fundação da pediatria e cultivo da especialidade;


3º período (moderno) – de 1889 a 1922 – época em que começou intensa a propaganda sobre higiene infantil e o interesse geral pela criança como fator social. Medidas oficiais protetoras.”


Toma-se como interessante esta periodização em face da importância de se apresentar um olhar “científico”, especializado, não leigo sobre a infância, pretensamente diferente das idéias até então. Todavia, Pereira (2008, p. 65) anuncia:


“Ao se debruçar sobre o tempo da infância – como tempo singular da vida humana -, os primeiros médicos de crianças afirmariam as idéias de incompletude e de crescimento infantil como anátemas, distinto dos demais tempos de vida humana. Não sem desdobramentos simbólicos, éticos e políticos, a compreensão da infância como tempo de incompletude (e, neste pensamento, também de doenças), reforçará concepções acerca da vida humana como plena apenas na adultez – tempo de saúde, civilidade, realização. Ao criar um desenho solipsista, a pediatria também virá a contribuir para solidificação da imagem da superioridade do tempo adulto da vida sobre os demais, reforçando estereótipos …”


E mais adiante (idem, p. 97), proclama:


“A medicina pediátrica transformaria o corpo infantil num registro objetivado pela estatística, um corpo sem palavra (infante). Como objeto de uma palavra controlada pelo médico, o corpo infantil é reduzido a um objeto falado, sujeito de estudo, objeto. Objeto de uma palavra erudita, desprovido de fala própria.”


Freitas (2009, p. 252/253) ainda destaca a relação infância e identidade brasileiras:


“Quero chamar a atenção para o fato de que a criança pode ter sido uma metáfora viva da violência numa sociedade que proclamou em inúmeras ocasiões sua destinação à civilização, mas que, via de regra, não cessou de embrutecer-se.


Entre os temas infância e identidade da nação brasileira é possível reconhecer um conjunto de analogias que surpreende pela reelaboração constante das perspectivas de futuro. O Brasil e as crianças do Brasil acontecerão um dia; serão um “não sei onde” definido após um “depende de”. A incompletude natural da criança é projetada como metáfora da nação inconclusa, e a “peculiaridade” da nação inconclusa é o recurso argumentativo com o qual a história social da infância torna-se depositária dos exemplos de um quotidiano no qual tudo é fratura, fragmento e dispersão.”


Por fim, resta, então, confirmar-se que:


“A antiga – mas fundamentalmente atual – polêmica divisão entre natureza e cultura assenta-se nesse caso, sobretudo, nas concepções que se difundem e se transformam, desde o século XVIII, a respeito da humanidade intrínseca à infância. São acompanhados, pois, de interrogações a respeito da humanidade latente ou emergente da infância: afinal, nascemos humanos ou tornamo-nos humanos no decurso da vida? Tornar-se humano, nesse sentido, inclui previsivelmente a ultrapassagem da infância. A dúvida quanto à humanidade pressuposta do tempo de infância – infans – é o pano de fundo da enunciação dos ritos fundamentais de transformação da criança em humana e, por suposto e como decorrência circunstancial e contextual, em adulto saudável, cidadão responsável e produtivo” (PEREIRA, 2008, p. 98).


Assim, tristemente negada, abandonada, rejeitada, empobrecida e violentada foi/é a infância em quase todos os tempos e lugares.


2.3 Quando a infância existe. Século XX: o século da criança.


 O filósofo francês Lyotard (apud KOHEN, 2005, p. 239) indica, por sua vez, que a infância não nos abandona e não pode ser apenas considerada a idade sem razão:


“Por infância entendo que nascemos antes de nascer para nós mesmos. E, portanto, nascemos através dos outros, mas também para outros, entregues, sem defesa, aos outros. Estamos sujeitos a seu mancipium que eles próprios não podem avaliar. Porque, embora sejam mães e pais, eles mesmos são também infantes. Eles não estão emancipados de sua própria infância, da ferida da infância ou do apelo que ela lança.”


Agamben (apud KOHEN, 2005, p. 243) confirma o reconhecimento histórico da infância e destaca:


“O ser humano é um ser histórico porque tem infância, porque a linguagem não lhe vem dada por natureza […] Se não há possibilidade de que o ser humanos seja a-histórico, é precisamente porque não fala desde “sempre”, porque tem que aprender a falar (a falar-se, a ser falado) numa infância que não pode ser naturalizada, universalizada nem antecipada. No humano, a infância é a condição da história.”


Novamente recorre-se a Kohen (2005, p. 246) para explicar que “este conceito de Agamben permite-nos pensar a infância desde outras bases. Ele parece indicar uma ruptura, uma diferença, uma quebra, na continuidade dos discursos filosóficos e pedagógicos tradicionais sobre a infância”. E criticando as visões platônicas de infância, explicita em referência à sua filosofia:


“[…] se ela não quer ser totalitária, arrogante e tola em relação à infância, é preciso quebrar essa linha que pensa a infância apenas como possibilidade, como inferioridade, como outro excluído ou como matéria dos sonhos políticos; aquela imagem que concebe a educação da infância como preenchimento de um receptáculo disposto por natureza para acolher os sonhos adultos.”


Azevedo (2001) considera que a “emergência da infância” indicada por Ariés (1978) refere-se à criança burguesa, pois à criança pobre restou o trabalho precoce, desvelado por longas e pesadas jornadas de trabalho abusivamente explorado.


Todavia, é somente no início do século XX que as idéias de infância foram transformadas em discurso normativo e promove-se a universalização dos direitos das crianças, quando a infância foi juridicamente inventada.


Em 1924, a Liga das Nações proclama a Declaração de Genebra reconhecendo a criança como sujeito de direitos, confirmando-se, por exemplo, seu direito ao desenvolvimento saudável, à alimentação e à saúde. Embora escrita num contexto de minimização dos problemas decorrentes da Primeira Guerra, a Declaração constituiu-se no primeiro documento de âmbito internacional que tinha como destinatária exclusiva a criança.


Em seguida, aos poucos se foi desenvolvendo um verdadeiro Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos das crianças, constituído de múltiplos mecanismos de promoção e proteção de seus direitos.


Diversos instrumentos e mecanismos universais e regionais de proteção dos direitos humanos estabelecem normas internacionais que buscam promover efetivamente a proteção da dignidade da pessoa humana, inclusive das crianças, contra todas as formas de violações de direitos humanos.


O Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos, também denominado de Sistema das Nações Unidas, através de suas principais fontes normativas – a Declaração Universal dos Direitos Humanos e os grandes Pactos Internacionais – expressa a necessidade de proteção das crianças como exigência dos direitos humanos.


A Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela ONU em 1948, constituindo-se o principal marco ético-normativo da idéia contemporânea de direitos humanos dispõe, expressamente, que “toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal” (Art. 3º) e que a “infância tem direito a cuidados e assistência especiais” (Art. 25, §2º).


O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos proclamados pela ONU em 1966 e ratificados pelo Brasil em 1992, desenvolvidos para reforçar, consolidar, complementar e aperfeiçoar os direitos consignados na Declaração Universal dos Direitos Humanos destacam, respectivamente, que “toda criança terá direito, sem discriminação alguma por motivo de cor, sexo, língua, religião, origem nacional ou social, situação econômica ou nascimento, às medidas de proteção que a sua condição de menor requer por parte de sua família, da sociedade e do Estado” (Art. 24) e que “devem-se adotar medidas especiais de proteção e assistência em prol de todas as crianças e adolescentes” (Art. 10).


O Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, delineado pela Organização dos Estados Americanos – OEA paralelamente ao Sistema das Nações Unidas e integrado principalmente pela Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e pela Convenção Americana de Direitos Humanos também colabora com esta perspectiva de proteção.


A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem proclamada em 1948, em termos semelhantes à Declaração Universal, explicita que “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança de sua pessoa” (Art. I) e complementa: “toda criança tem direito à proteção, cuidados e auxílios especiais” (Art. VII).


A Convenção Americana de Direitos Humanos, aprovada pela OEA em 1969 e ratificada pelo Brasil em 1992, seguindo a mesma linha das demais disposições declaratórias supramencionadas, também dispõe que “toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida” (art. 4º, 1) e que “toda pessoa tem direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral” (Art. 5º).


O Sistema Europeu, cujo principal instrumento normativo é a Convenção Européia de Direitos Humanos, o Sistema Africano, mediante a Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos e o Sistema Árabe, pela Carta Árabe dos Direitos Humanos e pela Declaração Islâmica dos Direitos Humanos, proclamam, igualmente aos demais instrumentos internacionais já indicados, a inviolabilidade da integridade e da dignidade da pessoa humana, sempre destacando a necessidade da criança de receber proteção especial e os cuidados necessários ao seu bem-estar, considerando sua condição de pessoa em peculiar situação de desenvolvimento.


É certo que os instrumentos normativos internacionais de direitos humanos acima referidos, embora dotados de fundamentos e princípios básicos próprios, tratam da temática da violência contra crianças apenas mediante princípios gerais, nos termos das disposições indicadas.


Entretanto, buscando aperfeiçoar esse corpus júris referente à criança, a ONU proclamou, em 1989, e o Brasil ratificou em 1990, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança com a tarefa específica de “confirmar que os direitos humanos são de fato universais, que incluem realmente as crianças: que as crianças também têm direitos humanos” (PETER NEWELL, In HART, 2008, p. 27).


Além disso, a Convenção sobre os Direitos da Criança é o primeiro instrumento internacional de direitos humanos que trata, expressamente e especificamente, da prevenção de todas as formas de violência contra as crianças e adolescentes, dispondo que os Estados Partes devem adotar medidas legislativas, administrativas, sociais e inclusive educacionais apropriadas para protegê-las (Art. 19).


No Brasil, não bastassem as mencionadas disposições internacionais de proteção dos direitos humanos, confirmando a necessidade de promover proteção efetiva às crianças em toda parte, encontram-se fontes normativas que igualmente expressam e explicitam, de forma cogente, impositiva e vinculante, a exigência de enfrentar a violência contra crianças.


A Constituição Federal de 1988 institui como dever de todos – família, sociedade e Estado – proteger as crianças contra todas as formas de violência, negligência, discriminação, exploração, crueldade e opressão (Art. 227, caput), impondo, inclusive, a punição severa da violência sexual contra crianças e adolescentes (Art. 227, § 4º).


O Código Penal Brasileiro, em diversas disposições, estabelece aumento da pena se o crime for praticado contra crianças. E o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, a principal referência normativa para a promoção, proteção e reparação dos direitos das crianças no Brasil, logo nas Disposições Preliminares, em seu artigo 5º, dispõe que:


“Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. “


No Capítulo II, referente ao Direito à Liberdade, ao Respeito e a Dignidade, dispõe expressamente o ECA, no art. 18, que “é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”. E no art. 20, destaca que “é dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente”. Ademais, o Estatuto criminaliza e penaliza mais de vinte condutas caracterizadas como práticas de violências contra crianças.


Como se vê, mesmo em síntese, a história da infância carrega a marca indelével da violência generalizada, a qual não pode ser escondida, sob silêncio criminoso, sendo seu enfrentamento, em qualquer contexto, somente possível com sua exposição à luz do dia e com a efetividade do conjunto normativo duramente construído ao longo do século XX, configurando-se como um imperativo ético-normativo dos direitos humanos, impondo-se à família, à sociedade e ao Estado promover ações de prevenção e combate a esse fenômeno tão hediondo.


Como diz Kohan (2005, p. 247):


“Infante é todo aquele que não fala tudo, não pensa tudo, não sabe tudo. Aquele como Heráclito, Sócrates, Rancière e Deleuze, não pensa o que todo mundo pensa, não sabe o que todo mundo sabe, não fala o que todo mundo fala. Aquele que não pensa o que já foi pensado, o que “há que pensar”. É aquele que pensa de novo e faz pensar de novo. Cada vez pela primeira vez. O mundo não é o que pensamos. “Nossa” história está inacabada. A experiência está aberta. Nessa mesma medida somos seres de linguagem, de história, de experiência. E de infância.”


Seja como for, ser criança ainda é… um perigo!


 


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Notas:

1 Resolução 62/141 da Assembléia geral da ONU.

2 O serviço Disque Denúncia Nacional de Abuso e Exploração Sexual Contra Crianças e Adolescente é um serviço que recebe, encaminha e monitora denúncias de violência contra crianças e adolescentes recebidas de todos os estados brasileiros. Foi criado em 1997, sob a coordenação da Associação Brasileira Multidisciplinar de Proteção à Criança e ao Adolescente (Abrapia). Em maio 2003, o serviço foi trazido para o Governo Federal, sendo coordenado e executado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), em parceria com a Petrobrás e o Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria). O serviço atende a uma diretriz estabelecida no Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes de 2000 de estabelecer um canal de comunicação entre a população e o Governo Federal, para a recepção, encaminhamento e monitoramento das denúncias de violência contra crianças e adolescentes, buscando interromper a situação revelada e subsidiar a formulação de políticas públicas voltadas para a proteção de crianças e adolescentes. O Disque 100 funciona diariamente de 8h às 22h, inclusive finais de semana e feriados, recebendo denúncias anônimas e garantindo o sigilo. As denúncias podem ser feitas de todo o Brasil através de discagem direta e gratuita para o número 100 (SEDH, Relatório Geral, 2010).


Informações Sobre o Autor

Alci Marcus Ribeiro Borges

Advogado, Especialista em Educação em Direitos Humanos p/ UFPI e em Infância e Violência p/ USP. Mestre em Educação p/ UFPI. Professor do Curso de Direito do Instituto Camillo Filho e dos Cursos de Especialização e de Preparação à Magistratura da Escola Superior de Magistratura do Piauí. Caroline Bastos de Paiva Borges Bacharel em Direito, Especialista em Direito Público e em Direito Privado p/ UFPI / Escola Superior de Magistratura do Piauí.


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