Sim, o eletricista tem direito ao adicional de periculosidade, desde que esteja exposto, de forma habitual e permanente, a condições que envolvam risco acentuado à sua integridade física e à vida, principalmente devido ao contato com energia elétrica. O reconhecimento desse direito está previsto na legislação trabalhista brasileira, especialmente na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e regulamentado por normas técnicas específicas, como a Norma Regulamentadora nº 16 (NR-16) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Neste artigo, vamos explicar em detalhes como funciona o adicional de periculosidade para eletricistas, quais os critérios para ter direito ao benefício, como é feito o cálculo, quais são os documentos necessários para comprovar esse direito e como o trabalhador pode buscar a reparação em caso de negativa por parte do empregador. Além disso, abordaremos questões previdenciárias, como o direito à aposentadoria especial por periculosidade e as principais decisões da Justiça sobre o tema.
O que é periculosidade?
A periculosidade, no contexto das relações de trabalho, refere-se à exposição do trabalhador a riscos que possam comprometer sua integridade física ou sua vida. De acordo com o artigo 193 da CLT, são consideradas perigosas as atividades ou operações que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem contato permanente com inflamáveis, explosivos, energia elétrica ou exposição a roubos ou outras espécies de violência física.
No caso específico do eletricista, a exposição direta ou indireta à eletricidade em alta ou média tensão pode causar acidentes graves, choques, queimaduras e até a morte. Por isso, a legislação trabalhista garante o pagamento de um adicional de 30% sobre o salário-base a esses profissionais, como forma de compensação pelo risco assumido.
O que diz a lei sobre eletricistas e periculosidade?
A previsão legal do adicional de periculosidade para eletricistas está no artigo 193, §1º da CLT, com redação dada pela Lei nº 12.740/2012, que estabelece:
“As atividades e operações perigosas são aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis, explosivos ou energia elétrica em condições de risco acentuado.”
Essa previsão foi regulamentada pelo Decreto nº 93.412/1986 e pela Portaria nº 3.214/1978, que instituiu a Norma Regulamentadora nº 16 (NR-16), especialmente em seu Anexo IV, que trata das atividades e operações perigosas com energia elétrica.
O Anexo IV da NR-16 estabelece que o adicional de periculosidade é devido ao trabalhador que realiza atividades ou operações em instalações ou equipamentos elétricos energizados em alta tensão (igual ou superior a 1.000 volts), bem como em baixa tensão (até 1.000 volts), desde que haja risco acentuado, conforme avaliação técnica.
Quais eletricistas têm direito ao adicional?
O direito ao adicional de periculosidade não se limita apenas a eletricistas que atuam em redes de alta tensão. O importante é a presença de risco acentuado à vida, o que pode ocorrer em diferentes contextos de trabalho. Alguns exemplos de profissionais que, comprovada a exposição ao risco, podem ter direito ao adicional:
Eletricista de manutenção predial
Eletricista industrial
Eletricista de redes públicas
Eletricista de instalações comerciais e residenciais
Eletricista de empresas de energia elétrica
Técnico em eletrotécnica
Supervisor de manutenção elétrica
Técnico de campo que realiza inspeções e reparos
A análise sobre o direito ao adicional deve sempre considerar o tipo de atividade realizada, a frequência da exposição e a existência de risco acentuado, que será comprovado por meio de laudo técnico.
O que é considerado risco acentuado?
O conceito de risco acentuado é fundamental para a caracterização da periculosidade. Segundo o entendimento da jurisprudência trabalhista e da própria NR-16, o risco acentuado existe quando o trabalhador está exposto, de forma habitual e permanente, a instalações ou equipamentos elétricos energizados com potencial de causar acidentes graves.
Não é necessário que o trabalhador sofra o acidente, mas que exista a possibilidade real de sua ocorrência no exercício normal da função. Exemplos de situações que caracterizam risco acentuado incluem:
Intervenção em painéis energizados
Trabalho em proximidade com cabos de energia elétrica sem isolamento
Realização de reparos em instalações elétricas sem o desligamento da rede
Atividades com ferramentas condutivas em espaços confinados com fiação viva
Manutenção de postes ou subestações em áreas urbanas
Já atividades esporádicas ou de risco controlado, sem exposição habitual e permanente, podem não caracterizar a periculosidade.
Como é feito o cálculo do adicional de periculosidade?
O adicional de periculosidade é calculado com base em 30% do salário-base do trabalhador, sem a inclusão de gratificações, prêmios, adicionais, horas extras ou outras verbas de natureza variável. Isso está previsto no artigo 193, §1º da CLT, e reforçado pela Súmula 191 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Exemplo prático:
Se um eletricista recebe um salário-base de R$ 2.000,00, o adicional de periculosidade será:
30% de R$ 2.000,00 = R$ 600,00
Salário total com periculosidade = R$ 2.600,00
Esse valor deve ser pago enquanto o trabalhador estiver exercendo a função que o expõe ao risco. Se houver mudança de função para uma atividade sem periculosidade, o adicional deixa de ser devido.
Quais documentos são usados para comprovar o direito?
A comprovação do direito ao adicional de periculosidade exige documentação técnica que ateste a exposição do trabalhador ao risco. Os principais documentos são:
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP)
Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT)
Laudo pericial de insalubridade e periculosidade
Relatórios técnicos de segurança do trabalho
Ficha de registro de empregados
Comprovantes de recebimento de adicional no contracheque
Testemunhos e provas em ações judiciais
O LTCAT e o PPP são os documentos mais relevantes, sendo exigidos tanto na esfera trabalhista quanto na esfera previdenciária (para aposentadoria especial).
O que fazer se a empresa não pagar o adicional?
Se a empresa não pagar o adicional de periculosidade mesmo com a exposição ao risco, o trabalhador tem o direito de buscar a reparação por meio das seguintes medidas:
Reclamação ao setor de recursos humanos ou segurança do trabalho
Denúncia ao Ministério do Trabalho (atualmente Secretaria de Inspeção do Trabalho)
Ação trabalhista na Justiça do Trabalho para exigir o pagamento retroativo
Pedido de perícia técnica judicial para comprovar o risco
Na Justiça do Trabalho, o eletricista pode pedir o reconhecimento da periculosidade, o pagamento retroativo do adicional dos últimos cinco anos, reflexos nas férias, 13º salário, FGTS e horas extras, além de indenização por danos morais, se houver agravantes.
Aposentadoria especial para eletricistas
Além do adicional de periculosidade, eletricistas também podem ter direito à aposentadoria especial, benefício concedido a quem trabalhou em atividades que colocam em risco a saúde ou a integridade física.
Até a Reforma da Previdência (13/11/2019), o eletricista podia se aposentar com 25 anos de atividade especial, sem exigência de idade mínima. Após a reforma, a aposentadoria especial passou a exigir:
25 anos de efetiva exposição
Idade mínima de 60 anos
Ou, para quem já contribuía antes da reforma, regra de transição com pontuação mínima (86 pontos)
O tempo de exposição é comprovado com o PPP e o LTCAT, e o trabalhador também pode ter direito à conversão de tempo especial em comum para fins de aposentadoria, se o período for anterior a 13/11/2019.
A importância do uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs)
O fornecimento de EPIs é uma obrigação da empresa e uma medida fundamental para reduzir os riscos da atividade elétrica. No entanto, é importante destacar que, mesmo com o uso de EPIs, o adicional de periculosidade não é afastado, diferentemente do que ocorre com a insalubridade.
A razão para isso é que, na maioria das vezes, o uso de EPIs reduz, mas não elimina totalmente o risco acentuado envolvido no trabalho com energia elétrica. Por isso, mesmo quando o trabalhador utiliza os equipamentos corretamente, o adicional continua sendo devido, desde que a exposição ao risco esteja presente.
Jurisprudência sobre eletricistas e periculosidade
Os tribunais brasileiros reconhecem de forma reiterada o direito dos eletricistas ao adicional de periculosidade. Alguns exemplos de entendimentos jurisprudenciais:
“O adicional de periculosidade é devido ao eletricista que, no exercício de suas funções, expõe-se de forma habitual e permanente ao risco de contato com energia elétrica, independentemente da tensão.” (TRT da 3ª Região)
“O uso de Equipamento de Proteção Individual não afasta o pagamento do adicional de periculosidade, salvo se comprovada a eliminação do risco.” (TST, Súmula 364)
“A exposição intermitente ao risco não descaracteriza a periculosidade quando as condições de trabalho envolvem instalações elétricas em locais de difícil acesso.” (TRT da 4ª Região)
Essas decisões demonstram que o entendimento majoritário do Judiciário favorece a proteção do trabalhador eletricista.
Perguntas e respostas sobre eletricista e periculosidade
Todo eletricista tem direito ao adicional de periculosidade?
Não necessariamente. É preciso comprovar a exposição habitual e permanente ao risco, por meio de documentação técnica.
Trabalhar com baixa tensão dá direito ao adicional?
Sim, desde que haja risco acentuado. A periculosidade não depende exclusivamente da tensão, mas da possibilidade de acidente grave.
O adicional de periculosidade incide sobre o salário total?
Não. O adicional é calculado sobre o salário-base, sem incluir outras verbas.
O empregador pode suprimir o adicional se fornecer EPIs?
Não. O uso de EPIs não afasta o direito ao adicional de periculosidade, salvo em casos de eliminação total do risco, o que é raro.
É possível receber periculosidade e insalubridade ao mesmo tempo?
A legislação prevê que o trabalhador deve optar por um dos adicionais. O pagamento cumulativo só é permitido em situações excepcionais por decisão judicial.
Eletricista tem direito à aposentadoria especial?
Sim, desde que comprove exposição ao risco por meio de documentos como PPP e LTCAT.
Conclusão
O adicional de periculosidade é um direito fundamental para o eletricista que, em razão da natureza de sua atividade, se expõe de forma permanente e habitual a riscos causados pelo contato com energia elétrica. Essa compensação financeira visa reconhecer os perigos inerentes ao ofício e garantir maior proteção ao trabalhador.
A legislação brasileira, por meio da CLT e da NR-16, oferece as bases legais para esse direito, e a Justiça do Trabalho tem reconhecido amplamente os pedidos de eletricistas que buscam o pagamento do adicional. No entanto, o reconhecimento não é automático, sendo necessária a comprovação técnica da exposição ao risco.
Além disso, a periculosidade também impacta na aposentadoria, permitindo ao trabalhador pleitear a aposentadoria especial após 25 anos de atividade. Por isso, é essencial que o eletricista conheça seus direitos, mantenha a documentação atualizada e, se necessário, procure assistência jurídica especializada para fazer valer seus direitos trabalhistas e previdenciários.