Quando uma empresa entra em processo de falência ou fecha as portas sem regularizar suas obrigações, uma das maiores preocupações dos ex-funcionários é com o não recolhimento do INSS durante o período em que trabalharam. Essa situação afeta diretamente a concessão de benefícios previdenciários, como aposentadoria, auxílio-doença, pensão por morte e tempo de contribuição no CNIS.
Neste artigo, vamos abordar com profundidade o que acontece quando a empresa faliu ou fechou sem pagar o INSS, quais são os direitos do trabalhador, como comprovar os períodos não recolhidos, quais documentos são aceitos pelo INSS, o que diz a lei e como a Justiça do Trabalho e a Previdência Social tratam esse tipo de situação. Também explicaremos como funciona a responsabilidade tributária, como resguardar seus direitos e quais medidas tomar para não sair prejudicado.
O que significa o não recolhimento do INSS pela empresa
Quando uma empresa contrata um trabalhador sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ela tem a obrigação legal de:
Descontar mensalmente o valor da contribuição do INSS do salário do empregado (parte do trabalhador)
Recolher o valor devido como empregadora (parte patronal)
Repassar essas quantias para o Instituto Nacional do Seguro Social
No entanto, muitas empresas descontam o valor da contribuição do funcionário e não fazem o repasse à Previdência, especialmente em momentos de crise financeira. Quando a empresa fecha ou declara falência, os trabalhadores podem descobrir que os períodos em que trabalharam não aparecem no CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais), o que compromete o tempo de contribuição e o acesso a benefícios.
O trabalhador perde o tempo de contribuição se a empresa não recolheu?
A resposta é não. O trabalhador não pode ser prejudicado pela omissão da empresa. Mesmo que o empregador não tenha repassado os valores devidos ao INSS, o vínculo de emprego e a remuneração recebida valem como prova de contribuição.
O artigo 30, inciso I, alínea “a” da Lei nº 8.212/91 estabelece que a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições sociais é da empresa. Já o artigo 19 da mesma lei afirma que a falta de recolhimento não prejudica o direito do segurado aos benefícios da Previdência Social.
Portanto, o trabalhador pode sim utilizar esse período para aposentadoria ou outros benefícios, desde que comprove que trabalhou na empresa.
Quais são os direitos do trabalhador se a empresa faliu e não pagou o INSS
Mesmo com a falência da empresa, o trabalhador mantém os seguintes direitos:
Contar o tempo de trabalho como tempo de contribuição, desde que haja comprovação
Receber os direitos trabalhistas devidos (verbas rescisórias, saldo de salário, férias, FGTS) no processo falimentar
Requerer benefícios previdenciários com base nos salários recebidos
Acionar judicialmente o empregador, inclusive com prioridade nos créditos em caso de falência
Contudo, o reconhecimento de tempo de contribuição não é automático quando há omissão de repasse. O trabalhador deverá comprovar o vínculo empregatício junto ao INSS, por meio de documentos e, se necessário, ação judicial.
Como descobrir se a empresa não pagou o INSS
A forma mais segura de verificar se os recolhimentos foram realizados é consultar o extrato do CNIS, disponível no site ou aplicativo Meu INSS.
Acesse: gov.br/meuinss
Faça login com CPF e senha
Clique em “Extrato de Contribuição (CNIS)”
Verifique se o período em que trabalhou na empresa está registrado
Observe se há valores zerados ou ausência total de registro
Se houver inconsistência no período, ausência de vínculos ou contribuições abaixo do valor real, há indício de não recolhimento ou recolhimento incorreto.
Quais documentos são aceitos para comprovar o tempo de contribuição
Quando o CNIS não apresenta os registros devidos, o trabalhador pode apresentar ao INSS documentos alternativos que provem o vínculo empregatício e o salário:
Carteira de trabalho (CTPS) assinada pela empresa
Contracheques ou holerites
Recibos de pagamento
Termo de rescisão contratual
Declaração do sindicato da categoria
Sentença trabalhista reconhecendo vínculo
Declaração do síndico da massa falida
Cópias de processos trabalhistas
Prova testemunhal, se o caso for levado à Justiça
Com esses documentos, o INSS poderá incluir manualmente os períodos no CNIS, mesmo que a empresa não tenha recolhido os valores devidos.
O que fazer se a empresa faliu e não pagou o INSS
Se você trabalhou em uma empresa que não aparece no CNIS ou aparece com valores inconsistentes, siga este passo a passo:
Reúna toda a documentação disponível: CTPS, contracheques, contrato de trabalho, rescisão, processos trabalhistas.
Acesse o Meu INSS e tente agendar um atendimento para regularização do CNIS.
Faça um requerimento administrativo junto ao INSS com todos os documentos.
Caso o INSS indefira o pedido, procure a Justiça Federal com a ajuda de um advogado previdenciário.
Se tiver ação trabalhista, verifique se houve reconhecimento do vínculo e solicite ao advogado que envie cópia da sentença ao INSS.
O importante é não deixar de buscar o reconhecimento do período, pois ele pode fazer falta no momento da aposentadoria.
Empresa faliu e não pagou verbas trabalhistas: o que fazer
Se além de não recolher o INSS a empresa também não pagou rescisão, saldo de salário, férias ou 13º, você deve:
Entrar com uma ação trabalhista na Justiça do Trabalho
Incluir a empresa no polo passivo do processo falimentar, se já estiver em curso
Solicitar habilitação como credor na falência, com prioridade como crédito trabalhista
Acompanhar o andamento do processo via advogado ou site do Tribunal de Justiça
Os créditos trabalhistas têm preferência de pagamento até o limite de 150 salários-mínimos por empregado. Após isso, o crédito é considerado quirografário e concorre com outros credores.
O que acontece se a empresa fechou sem declarar falência formalmente
Muitas vezes, a empresa simplesmente encerra suas atividades sem declarar falência oficialmente. Nestes casos:
O trabalhador pode entrar com ação trabalhista contra os sócios, pedindo a desconsideração da personalidade jurídica
Pode haver responsabilidade solidária ou subsidiária dos sócios, dependendo das provas
A comprovação do vínculo pode ser feita normalmente no INSS com os documentos adequados
Ainda é possível acionar o Ministério Público do Trabalho para fiscalizar a situação
O importante é reunir o máximo de provas da relação de trabalho e buscar o reconhecimento judicial.
A Receita Federal pode cobrar os sócios da empresa?
Sim. A Lei nº 8.212/91 prevê a responsabilidade tributária solidária dos sócios-administradores nos casos de omissão dolosa no recolhimento das contribuições previdenciárias.
Portanto, se a empresa descontou o INSS do empregado e não repassou, os sócios podem ser responsabilizados civil, administrativa e criminalmente, além de responderem com seu patrimônio pessoal, se for comprovada má-fé ou fraude.
O que diz a jurisprudência sobre o tema
A jurisprudência brasileira é clara ao afirmar que o trabalhador não pode ser prejudicado pela conduta da empresa. Veja decisões de Tribunais Regionais e do STJ:
“A falta de recolhimento das contribuições previdenciárias pela empresa não prejudica o direito do empregado ao reconhecimento do tempo de serviço.”
(TRF-3, Apelação Cível 001XXX-42.2021.4.03.9999)
“Cabe ao INSS aceitar prova do vínculo empregatício para fins de tempo de contribuição, ainda que a empresa não tenha efetuado o recolhimento.”
(STJ, REsp 1.000.234/SP)
Essas decisões mostram que o Judiciário está alinhado com a legislação para proteger o trabalhador diante da omissão patronal.
O tempo reconhecido vale para todos os tipos de aposentadoria?
Sim. Uma vez reconhecido, o tempo de serviço vale para todas as espécies de aposentadoria:
Aposentadoria por idade
Aposentadoria por tempo de contribuição (regras de transição)
Aposentadoria por invalidez
Aposentadoria especial, se houver comprovação das condições insalubres
O valor do salário de benefício pode, no entanto, ser menor se os salários da época não forem devidamente comprovados. Por isso, é importante também juntar contracheques ou outros comprovantes de remuneração.
Posso pagar o INSS da empresa por conta própria?
O trabalhador não pode recolher a parte da empresa por conta própria. Ele pode, no máximo, fazer pagamento como contribuinte individual para futuros períodos, mas não pode substituir a obrigação patronal retroativa.
Por isso, o caminho certo é comprovar o vínculo e o salário para que o INSS reconheça o tempo com base na documentação apresentada.
Dica: não espere a aposentadoria para regularizar
Muitas pessoas só descobrem que houve omissão da empresa quando vão pedir a aposentadoria e o período não aparece no CNIS. Nessa altura, o processo fica mais demorado, pois envolve:
Busca de documentos antigos
Espera por análise do INSS
Possível ajuizamento de ação judicial
Por isso, é recomendável que o trabalhador acompanhe seu CNIS regularmente, especialmente após sair de uma empresa.
Perguntas e respostas sobre empresa que faliu e não pagou INSS
Se a empresa não recolheu o INSS, vou perder meu tempo de contribuição?
Não. O vínculo de emprego provado garante o reconhecimento do tempo, mesmo sem recolhimento.
Como provo que trabalhei na empresa falida?
Com carteira assinada, contracheques, termo de rescisão, ação trabalhista, entre outros documentos.
Posso pagar o INSS por conta da empresa?
Não. Só é permitido recolher como contribuinte individual para períodos futuros.
O tempo não registrado no CNIS pode ser reconhecido na Justiça?
Sim. Se o INSS negar o reconhecimento, você pode buscar esse direito por meio judicial.
Tenho direito a receber os atrasados da empresa?
Sim. Por meio da Justiça do Trabalho e do processo de falência, com preferência legal.
Se a empresa faliu há muitos anos, ainda posso reclamar?
Sim. O direito previdenciário não prescreve para reconhecimento de tempo, mas o trabalhista prescreve após 2 anos do término do contrato.
Sou aposentado, mas faltaram alguns meses por falência. Posso corrigir?
Sim. Você pode pedir a revisão da aposentadoria com documentos e corrigir o tempo reconhecido.
Conclusão
A falência ou fechamento de uma empresa não impede que o trabalhador utilize o período trabalhado como tempo de contribuição no INSS, mesmo que os recolhimentos não tenham sido realizados. O vínculo de emprego e a remuneração recebida são suficientes, desde que possam ser comprovados por documentos ou por meio judicial.
Se você foi afetado por essa situação, é fundamental reunir provas, consultar o extrato do CNIS e buscar a regularização o quanto antes. A omissão da empresa não pode prejudicar sua aposentadoria ou outros direitos previdenciários. Com as medidas corretas, é possível garantir seu tempo de contribuição e a proteção social que você conquistou com o seu trabalho.