Empresas que contratam ou transferem brasileiros para trabalhar no exterior devem observar uma legislação específica: a Lei nº 7.064/82, que regula a situação de trabalhadores enviados por empresas sediadas no Brasil para prestar serviços fora do território nacional. Esse dispositivo legal assegura a proteção dos direitos trabalhistas e previdenciários desses profissionais, define responsabilidades das empresas e estabelece regras contratuais específicas.
Neste artigo, você vai entender como funciona o envio de trabalhadores brasileiros ao exterior por empresas nacionais, quais são as obrigações legais dessas empresas, os direitos garantidos ao trabalhador, o papel da Lei 7.064/82, e outros pontos relevantes como vínculo previdenciário, FGTS, repatriação, e acordos internacionais. Acompanhe até o fim para esclarecer todas as dúvidas, inclusive na seção de perguntas e respostas.
O que é a Lei 7.064/82 e por que ela é tão importante
A Lei nº 7.064, de 6 de dezembro de 1982, é a legislação que trata da situação jurídica de trabalhadores contratados ou transferidos por empresas brasileiras para prestar serviço no exterior. Essa lei se aplica tanto aos casos em que o trabalhador é contratado já com a intenção de ir ao exterior, quanto àqueles em que ele é contratado inicialmente para atuar no Brasil e, posteriormente, transferido para outro país.
A relevância da Lei 7.064/82 está em garantir que o trabalhador brasileiro, mesmo em outro país, continue usufruindo de direitos fundamentais da legislação trabalhista brasileira, além de assegurar proteção social, como previdência, FGTS, retorno ao Brasil, assistência médica, entre outros.
Sem essa regulamentação, os trabalhadores poderiam ficar sujeitos exclusivamente à legislação do país estrangeiro, muitas vezes menos protetiva, ou ainda sem qualquer proteção legal clara.
Quem pode aplicar a Lei 7.064/82
A Lei 7.064/82 se aplica às empresas com sede ou filial no Brasil que contratam trabalhadores para atuarem no exterior. São exemplos:
Empresas de engenharia que atuam em obras no exterior (como construção de rodovias, barragens ou refinarias);
Empresas multinacionais que têm sede no Brasil e enviam profissionais a outras unidades no mundo;
Instituições financeiras brasileiras com operações internacionais;
Companhias aéreas ou marítimas brasileiras com rotas internacionais;
Empresas de tecnologia e consultoria com contratos globais.
Além disso, a lei também pode ser aplicada em casos em que uma empresa estrangeira pertencente ao mesmo grupo econômico de uma empresa brasileira solicita a transferência de um trabalhador, nos termos do artigo 2º da lei. Ou seja, mesmo que a empresa de destino não seja brasileira, a legislação ainda pode se aplicar por conta do vínculo societário entre as empresas.
Contratação direta para o exterior ou transferência?
A Lei 7.064/82 trata de duas formas principais pelas quais empresas levam brasileiros para trabalhar no exterior:
Contratação direta para o exterior
É quando o trabalhador é contratado no Brasil por uma empresa brasileira, com a finalidade específica de atuar fora do país. Desde o início, o contrato de trabalho já prevê que o local de prestação do serviço será outro país.
Exemplo: um engenheiro civil contratado no Brasil por uma empreiteira para atuar em uma obra no Oriente Médio.
Transferência de trabalhador já contratado
Nesse caso, o trabalhador é inicialmente contratado para prestar serviços no Brasil e, posteriormente, é transferido para o exterior. A transferência pode ser temporária ou por prazo indeterminado.
Exemplo: um analista de sistemas contratado no Brasil que, após três anos na sede nacional, é enviado para a filial da empresa nos Estados Unidos.
Ambas as situações estão previstas na Lei 7.064/82 e exigem um contrato específico com cláusulas que respeitem a legislação trabalhista brasileira, mesmo quando o trabalho será realizado em território estrangeiro.
Obrigações das empresas que enviam brasileiros ao exterior
As empresas que contratam ou transferem brasileiros para prestar serviço no exterior devem cumprir diversas obrigações estabelecidas na Lei 7.064/82. As principais são:
Elaboração de contrato por escrito
O contrato de trabalho para o exterior deve ser celebrado por escrito e conter cláusulas específicas, tais como:
Função a ser exercida;
Local da prestação de serviço;
Duração prevista do trabalho no exterior;
Salário (em moeda estrangeira e nacional);
Benefícios concedidos (como ajuda de custo, moradia, transporte, seguro saúde, entre outros);
Cláusulas de repatriação;
Assistência médica ao empregado e seus dependentes;
Indicação da legislação aplicável (a brasileira, conforme determina a lei).
Esse contrato deve ser registrado em cartório e, preferencialmente, homologado junto ao Ministério do Trabalho.
Garantia de retorno ao Brasil
Ao final do contrato ou da missão no exterior, o empregador é responsável pelo retorno do trabalhador ao território brasileiro, o que inclui passagens, transporte de bens pessoais e outras despesas de repatriação.
Se o empregado for dispensado no exterior ou se o contrato terminar, a empresa deverá providenciar e custear o retorno, salvo em casos de demissão por justa causa ou renúncia expressa do trabalhador.
Continuidade de direitos trabalhistas
Mesmo atuando fora do país, o trabalhador deve ter assegurados os direitos previstos na legislação brasileira, tais como:
Férias + 1/3 constitucional;
13º salário;
FGTS;
Recolhimento de INSS;
Adicionais legais;
Estabilidade provisória, se for o caso (exemplo: gestante ou acidentado).
A empresa deve garantir que os direitos não sejam reduzidos pela aplicação da legislação estrangeira menos favorável.
Reajuste salarial e compensação cambial
O trabalhador transferido ao exterior deve receber ajustes salariais que mantenham seu poder aquisitivo. Caso haja grande desvalorização da moeda brasileira em relação à do país de destino, a empresa deve fazer a compensação necessária para que o trabalhador não perca renda real.
Além disso, pode haver pagamento de parte do salário em moeda local e outra parte no Brasil, a critério das partes, desde que acordado no contrato.
Assistência médica e jurídica
A empresa é responsável por garantir assistência médica gratuita ao trabalhador e seus dependentes durante o período de trabalho no exterior, podendo isso ser feito por meio de seguro-saúde, convênios locais ou reembolso de despesas médicas.
Também deve garantir assistência jurídica em caso de litígios trabalhistas, previdenciários ou outros problemas legais enfrentados pelo trabalhador no país de destino.
Recolhimento do FGTS e INSS no exterior
FGTS
A empresa é obrigada a continuar depositando o FGTS mensalmente em nome do trabalhador enquanto ele estiver no exterior, desde que o vínculo empregatício continue com a empresa brasileira. Os depósitos devem ser feitos em reais e respeitar os percentuais da legislação (8% do salário bruto).
INSS
Quanto à Previdência Social, o trabalhador no exterior pode continuar vinculado ao INSS brasileiro, desde que haja formalização da manutenção da filiação. A empresa pode recolher as contribuições ou o trabalhador pode recolher por conta própria, como contribuinte individual, conforme o caso.
Se o país de destino possuir acordo internacional de previdência com o Brasil, o tempo de trabalho pode ser computado para efeitos de aposentadoria, evitando a bitributação previdenciária.
Empresas especializadas em exportar mão de obra
Algumas empresas brasileiras atuam de forma específica na exportação de mão de obra, ou seja, sua atividade principal é contratar trabalhadores no Brasil para prestar serviços fora do país. Essas empresas precisam observar todos os requisitos da Lei 7.064/82, bem como a regulamentação complementar, como normas do Ministério do Trabalho, autorizações especiais, registros e cumprimento de obrigações fiscais.
É fundamental que a empresa possua credibilidade, experiência e idoneidade jurídica, pois o trabalhador no exterior está vulnerável e depende diretamente da atuação correta da contratante.
Empresas que atuam em regime de grupo econômico
Muitas empresas multinacionais possuem estrutura de grupo econômico, com unidades no Brasil e no exterior. A Lei 7.064/82 permite que um trabalhador seja transferido para uma empresa do mesmo grupo, mesmo que juridicamente distinta, e continue sendo protegido pela legislação brasileira.
Nesses casos, ainda que o contrato formal de trabalho seja alterado para indicar a empresa estrangeira como empregadora, o vínculo com a empresa brasileira não pode ser completamente rompido, sob pena de fraude ou de perda de direitos.
A jurisprudência do TST reconhece que, mesmo quando há contrato de trabalho com empresa do exterior, se for comprovada a existência de grupo econômico com empresa brasileira, o vínculo trabalhista pode ser reconhecido com esta última.
Exemplo prático
Imagine que um técnico de petróleo é contratado por uma empresa brasileira de engenharia e enviado para prestar serviços em uma plataforma na África. Mesmo que ele passe anos fora do país, a empresa é obrigada a manter o depósito do FGTS, assegurar assistência médica, garantir seu retorno ao fim do contrato, e assegurar todos os direitos trabalhistas da legislação brasileira.
Caso o técnico se acidente no trabalho, mesmo em outro país, ele terá direito à estabilidade, afastamento pelo INSS (se mantiver o vínculo previdenciário) e, se for demitido sem justa causa após o retorno, à multa de 40% sobre o FGTS.
Riscos e cuidados do trabalhador ao aceitar uma proposta internacional
Antes de aceitar uma proposta para trabalhar fora do Brasil, o trabalhador deve tomar uma série de precauções jurídicas:
Solicitar o contrato por escrito com cláusulas claras;
Verificar se a empresa está registrada e possui sede ou filial no Brasil;
Conferir se haverá recolhimento de INSS e FGTS;
Garantir que o contrato assegure assistência médica e retorno ao país;
Consultar um advogado trabalhista, se possível;
Verificar se o país de destino possui acordo previdenciário com o Brasil.
Aceitar uma proposta internacional sem amparo jurídico pode levar à perda de direitos, abandono em território estrangeiro e problemas legais sérios.
Perguntas e respostas
O que é a Lei 7.064/82?
É a lei que regula a situação dos trabalhadores contratados ou transferidos por empresas brasileiras para prestar serviço no exterior.
Quais os principais direitos garantidos pela Lei 7.064/82?
Férias, 13º salário, FGTS, INSS, assistência médica gratuita, repatriação, reajuste salarial com compensação cambial e aplicação da legislação brasileira.
Empresas estrangeiras devem seguir a Lei 7.064/82?
Não, salvo se fizerem parte do mesmo grupo econômico de empresa brasileira, quando se aplica o artigo 2º da lei.
A empresa pode pagar todo o salário em moeda estrangeira?
Sim, desde que haja previsão contratual e que seja assegurado o valor equivalente em reais para fins de recolhimento de FGTS e INSS.
Quem deve custear o retorno do trabalhador ao Brasil?
A empresa contratante, salvo em casos de abandono ou demissão a pedido do trabalhador.
Posso perder o vínculo com o INSS se for para o exterior?
Sim, se não houver recolhimentos. Por isso, é importante verificar se a empresa fará o recolhimento ou se será necessário contribuir por conta própria.
Quais os riscos de aceitar uma vaga no exterior por empresa não registrada no Brasil?
Risco de não ter vínculo jurídico com a legislação brasileira, perder direitos trabalhistas, não ter FGTS e INSS, além da dificuldade em acionar a empresa em caso de problemas.
Conclusão
Empresas brasileiras que contratam ou transferem trabalhadores para atuar no exterior estão sujeitas às normas da Lei 7.064/82, que visa proteger os direitos do trabalhador fora do país. Essa legislação é essencial para evitar abusos, garantir segurança jurídica e assegurar que os profissionais enviados ao exterior mantenham seus direitos trabalhistas e previdenciários.
O trabalhador deve estar atento à legalidade da contratação, exigir contrato por escrito, verificar o recolhimento de FGTS e INSS, e conhecer seus direitos à assistência médica, retorno ao Brasil e demais garantias previstas por lei. Da mesma forma, as empresas devem cumprir rigorosamente suas obrigações para evitar ações judiciais, danos à imagem e prejuízos financeiros.
Trabalhar no exterior pode ser uma experiência enriquecedora, desde que amparada por normas claras, contratos bem elaborados e respeito à legislação. Conhecer e aplicar a Lei 7.064/82 é o primeiro passo para garantir que essa jornada seja segura, justa e promissora para ambas as partes.