Federalismo brasileiro: Origem e evolução histórica de seus reflexos na atualidade

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Brazilian Federalism: Origin and historical evolution of their reflection on actuality

 

Beatriz Stinguel Thomazini – Acadêmica de Direito na Universidade Federal do Espírito Santo

 

Resumo: O presente artigo visa abordar um tema de enorme relevância dentro do Direito Constitucional, especialmente no contexto atual: O Federalismo. A escrita colocará em questões temas essenciais para o entendimento do Federalismo Contemporâneo brasileiro, em destaque sua origem, seu surgimento no Brasil e seu desenvolvimento histórico ao longo dos anos e, consequentemente, dentro das Constituições Federais.

Destarte, buscar-se-á, em tal artigo, elucidar questões contemporâneas do federalismo dentro do país, suas problemáticas, bem como vantagens, além de visar a exposição da origem sociocultural desse modo de organização estatal.

Palavras-chave: Federalismo; Constitucional; História;

 

Abstract: This article will address an enormous relevant topic of Constitutional Law, especially in the current context: Federalism. The writing will put in question essential problems to the urderstanding of Brazilian Contemporary Federalism, highlighting its origin, its emergence in Brazil and its historical development over the years and, consequently, within the Federal Constitutions.

Thus, will be sought, in this article, to elucidate contemporary problems of federalism within the country, its trouble, as well as advantages, in addition to viewing the exposure of the socio-cultural origin of this state organization.

Keywords: Federalism; Constitutional; History.

Sumário

Introdução 1. Conceito de federalismo, federação e distinção entre federação e confederação 1.1. Federação 1.2. Federalismo 1.3. A diferenciação entre federação e confederação 2. Os entes da federação brasileira 2.1. União 2.2. Estados Membros 2.3. Distrito federal 2.4. Municípios 3. A origem do federalismo 4. O nascimento do federalismo no Brasil 5. A evolução do federalismo brasileiro 5.1. O federalismo nas Constituições brasileiras 5.1.1. Constituição política do Império do Brasil: 1824 5.1.2. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil: 1891 5.1.3. Constituição Republicana dos Estados Unidos do Brasil: 1934 5.1.4. A Constituição de 1937 5.1.5. Constituição dos Estados Unidos do Brasil: 1946 5.1.6. Constituição da República Federativa do Brasil: 1969 5.1.7. A Constituição de 1988: A redemocratização brasileira 6. O federalismo no contexto atual brasileiro (o federalismo “à brasileira”) 6.1. Federalismo cooperativo e federalismo dual 6.2. Crítica ao federalismo brasileiro atual: a falsa descentralização. Conclusão. Referências Bibliográficas

 

INTRODUÇÃO

É inegável o fato de que o constitucionalismo brasileiro é narrado ao longo das décadas por inúmeras lutas sociais, bem como por influências e interesses políticos de governantes e população que integravam a chamada “maioria” do país. Esse fator histórico-cultural é essencial para que haja o pleno entendimento da organização atual do país, bem como para que seja feita a análise e comparação entre o federalismo em seu nascimento e o federalismo atual, visando compreender se este ainda mantém raízes daquele ou se tornou um novo modelo de organização velada, tornando-o um federalismo único.

Dessa maneira, procurar-se-á conceituar e discorrer sobre este modelo de Estado, analisando firmemente conceitos doutrinários e históricos, para que seja possível o entendimento acerca de seu surgimento e características especiais, expondo também conceituações sobre a diferença entre federação e federalismo, descentralização estatal, autonomia federativa e demais pontos que virão a ser discutidos na presente análise.

 

  1. CONCEITO DE FEDERALISMO, FEDERAÇÃO E DISTINÇÃO ENTRE FEDERAÇÃO E CONFEDERAÇÃO

1.1 Federação

Inicialmente, antes de expor de fato o conceito de federação, é necessário conhecer a origem da palavra em si, sua etimologia. Partindo dessa análise, o vocábulo é derivado de foedus, do latim, que, partindo de uma tradução superficial, se traduziria como “pacto, união, aliança”. Ou seja, a própria etimologia da palavra já traz, subjetivamente, o que virá a ser o federalismo e a federação. Segundo Michel Temer[1], é dessa forma que se nasce o federalismo, que seja explicado a seguir, a partir de um pacto, união e aliança entre estados.

Já o ilustre doutrinador Montesquieu dispõe em um de seus livros que “a forma de governo é uma convenção segundo a qual vários corpos políticos consentem em se tornar cidadãos de um Estado maior. É uma sociedade de sociedades, que formam uma nova sociedade, que pode crescer com novos associados a se unirem a ela.”[2], entendendo que a federação é uma forma de constituição que carrega inúmeras vantagens internas do governo republicano, juntamente com a força e poder monárquicos.

Por fim, mediante a análise de diversos autores e doutrinadores, em regra geral e majoritária, entende-se federação como o nome dado a um Estado subdividido em diversas unidades territoriais autônomas e detentoras de governo próprio, sendo estes chamados de Estados Federados, que, ao se unirem, formam a federação, ou seja, o Estado Federal.

Embora os Estados em questão sejam autônomos, estes são guiados e submissos à Constituição Federal, mas também são amparados por esta, que garante que tais estados não podem ser abolidos ou alterados por decisão monocrática governamental.

Apesar da grande autonomia exercida pelos Estados Federados, apenas o Estado Federal possui soberania.

 

1.2 Federalismo

Após explicitado o conceito de Federação, é necessário que entendamos sua diferença em relação ao conceito de federalismo.

Federalismo se dá pelo sistema político no qual diversos estados se unem, formando um Estado Federal, mas mantendo, cada um, sua autonomia. O Federalismo é uma forma de governo que une vários estados em apenas um, todos possuindo autonomia interna, mas sendo obedientes à Constituição Federal, seguindo o modelo da pirâmide hierárquica de Hans Kelsen, mas garantindo a descentralização do poder, permitindo a autonomia legislativa e administrativa, podendo, em muitos casos, abranger até mesmo a esfera jurisdicional. Veremos, mais a frente, que muitas vezes a descentralização se desvia de sua intenção de facilitação da governância e se torna complexa e defeituosa.

Portanto, enquanto federação se dá por um modelo de descentralização política, o federalismo é um fenômeno da divisão de poder.

 

1.3 A diferenciação de federação e confederação

Adiantando um dos pontos a ser tratado, ao se formarem as formas de divisão e organização políticas-estatais, o poder foi organizado, geograficamente, de diversas maneiras, em alguns, estruturando em apenas um núcleo geográfico de poder, enquanto em outros, nota-se a descentralização geográfica, havendo diversos polos de poder espalhados em um mesmo território. Portanto, foram assim que nasceram as “formas de estado”.

Atualmente, entende-se e percebe-se três formas distintas de organização, sendo elas a unitária, a federação e a confederação, no qual daremos enfoque nas últimas citadas, tendo em vista que a forma unitária de poder não é objeto da presente pesquisa.

Classifica-se como federação aquela organização que possui, separadamente, poder legislativo, executivo e judiciário, não havendo, porém, possibilidade dos Estados Federados se separarem ou se dissociarem do Estado Federal. Ou seja, no federalismo os Estados Federados são autônomos, mas não podem ser soberanos.

Enquanto isso, a confederação também é classificada por sua descentralização de poder, a tripartição de seus poderes, mas possui algumas características próprias. No regime de confederação, além da fragmentação, os Estados Membros possuem plenos poderes, podendo ser soberanos, garantindo que podem se desassociar do Estado Federal de acordo com sua vontade própria. A Confederação se dá pela união de estados independentes, em um movimento centrípeto, enquanto a federação se dá pela divisão de um único Estado, caracterizado por um movimento centrífugo.

 

  1. OS ENTES DA FEDERAÇÃO BRASILEIRA

Como já exposto, percebe-se que a organização brasileira de poder se caracteriza pelo federalismo assimétrico, dando, portanto, grande valor aos seus entes integrantes, que serão expostos a seguir.

2.1 União

A União se dá como pessoa jurídica de direito público interno, entidade federativa autônoma em relação aos Estados-membros, municípios e Distrito Federal, possuindo competências administrativas e legislativas determinadas constitucionalmente[3].

Sua existência e insolubilidade estão previstas no artigo 1º da Constituição da República Federativa do Brasil:

“Art. 1º: “A República Federativa do Brasil, formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito […]”

O território da União abrange todo o território estatal e possui a mesma população do Estado Brasileiro, fatores que são, por muitas vezes, motivo de confusão para distinguir União de Estado Federal, mas a primeira é apenas uma constituinte abrangente da segunda.

2.2 Estados-membros

No ano de 1889, ao ser assinado o Decreto nº 1, o Brasil deixa de ser um Império unitário e se torna um Estado Federal. Tal decisão fez com que as antigas províncias se tornassem Estados, os quais adotariam, por si só, cada qual uma Constituição independente.

Atualmente, tais Estados possuem autonomia, ou seja, tem a capacidade de auto-organização, desde que estes sigam firmemente a Constituição Federal, pois esta não dá pleno poder aos Estados, apenas permitem que decidam, por si só, questões internas, desde que não firam as decisões do Estado Federal.

Tais Estados são a estrutura básica para que haja a descentralização do poder e, consequentemente, o federalismo. Sem eles, não seria possível que houvesse tal organização, resultando em um modelo unitário, como anterior ao ano de 1889.

 

2.3 Distrito federal

Embora existente há tempos, o Distrito Federal ainda é razão de debates e confusões acerca de sua classificação, tendo em vista que este se caracteriza por um “ente-misto” – de acordo com a visão popular, sendo chamado, durante décadas, de “quase-estado” e “semiestado”. Porém, após inúmeras mudanças de sua classificação e aproximação do Estado Federal, atualmente, entende-se que o Distrito Federal é uma das 27 unidades federativas do Brasil, tal como os outros Estados-membros, se diferenciando pelo fato de abrigar a capital do país e se dividir em 31 microrregiões que não são denominadas municípios, mas sim cidades satélites.

Ademais, também possui competência legislativa conferida aos Estados e Municípios (daí o entendimento de um ente misto), bem como competências concorrentes com a própria União, recebendo os tributos atribuídos aos Estados e municípios.

 

2.4 Municípios

Assim como a União, a presença e indissolubilidade dos municípios estão previstas no art. 1º da Constituição da República Federativa do Brasil, sendo reforçada firmemente em seu art. 18º:

“Art. 18: “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, dentro desta Constituição.”

Diante da presente análise, nota-se que os municípios são uma entidade política constitucionalmente e rigidamente prevista, possuindo renda própria e poder de autodeterminação, assim como os entes citados anteriormente.

Assim como os Estados-membros, os municípios escolhem seus representantes executivos e legislativos, sendo os últimos os vereadores, que ocupam a câmara municipal, sendo elemento básico para a atividade da autonomia plena do município.

 

  1. A ORIGEM DO FEDERALISMO

Sendo analisado em contexto mundial, o Federalismo como forma de Estado é extremamente recente (Século XVIII). E embora tal organização não tenha se desenvolvido linearmente ou igualmente nos países que hoje a adotam, seu nascimento está amplamente relacionado ao movimento constitucionalista americano.

Embora haja divergências, entende-se que o período pós-independência americana, elaborada em 1776 por Thomas Jefferson, foi o marco inicial para a abertura de brechas do crescimento e desenvolvimento do modelo Federalista americano, tendo em vista que a Declaração de Independência trazia consigo um grande ideal de igualdade, direitos humanitários, nacionalismo, fazendo com que a população adentrasse aos moldes da acreditada superioridade americana, como se afere na manifestação de Thomas Jefferson nas Resoluções de Kentucky de 1798 e 1799:

“KENTUCKY RESOLUTIONS OF 1798 AND 1799

  1. Resolved, That the several states composing the United States of America are not united on the principle of unlimited submission to their general government; but that, by compact, under the style and title of a Constitution for the United States, and of amendments thereto, they constituted a general government for special purposes, delegated to that government certain definite powers, reserving, each state to itself, the residuary mass of right to their own self-government; and that whensoever the general government assumes undelegated powers, its acts are unauthoritative, void, and of no force; that to this compact each state acceded as a state, and is an integral party; that this government, created by this compact, was not made the exclusive or final judge of the extent of the powers delegated to itself, since that would have made its discretion, and not the Constitution, the measure of its powers; but that, as in all other cases of compact among powers having no common judge, each party has an equal right to judge for itself, as well of infractions as of the mode and measure of redress.”[4]

Outrossim, com a consagração da Constituição Americana, todas as 13 nações então pertencentes à Inglaterra tornaram-se independentes, agrupando-se em um movimento centrífugo, buscando a formação de um Estado Federal que garantisse autonomia e soberania para cada um dos membros, formando o modelo atual de federalismo moderno e descentralizado que é de conhecimento comum.

Portanto, com os expostos, confirma-se que, com a criação da Constituição dos Estados Unidos da América em 1787 e com os constantes reforços de Thomas Jefferson, surgiu o primeiro modelo de federalismo existente.

 

  1. O NASCIMENTO DO FEDERALISMO NO BRASIL

Como citado anteriormente, a proclamação da República Brasileira, ao se livrar das amarras de um Império unitário, foi fator decisivo para a implementação do modelo federalista de Estado.

Tal modelo fora implantado diretamente na primeira Constituição Brasileira, de 1981, que apesar de seu caráter fortemente republicano e de seus conflitos, permaneceu expressamente colocado como forma de organização.

Diferentemente dos Estados Unidos da América, o movimento de organização do federalismo se deu por uma ação centrípeta, ou seja: O Brasil Império estava unificado, ao se separar, os estados decidiram por unir-se, mas mantendo sua autonomia, diferentemente dos EUA, onde estavam separados e uniram-se.

 

  1. A EVOLUÇÃO DO FEDERALISMO BRASILEIRO

Como se afere, a inserção do Federalismo no Brasil, embora expressamente colocado após a queda do Império, ainda foi motivo de conflitos, especialmente entre republicanos e federalistas. Para que haja melhor entendimento dos conflitos presentes, dos movimentos que modificaram o primeiro modelo federalista até os dias atuais, é amplamente necessária a análise das Constituições brasileiras e seus contextos socioculturais, considerando que esses fatos são manifestações políticas expressas do ser humano, visando entender, de fato, os fatores motivacionais de cada modificação realizada, não restando apenas à uma análise atual, mas sim uma busca nas raízes das características brasileiras do federalismo e sua importância no cenário atual.

É importante ressaltar, que desde as primeiras organizações territoriais brasileiras, as capitanias hereditárias, notava-se um caráter desconexo e que buscava apenas atender aos interesses de Portugal, vivendo por mais de 5 décadas sob regime unitário, mesmo que dividido em capitanias, se tornando descentralizado apenas no fim da Segunda parte do reinado.

 

5.1 O federalismo nas constituições brasileiras

Considerando que as Constituições estão amplamente coligadas à organização de um país, bem como seu momento histórico, é extremamente importante realizarmos a ligação entre ambas, com a finalidade de entender as reais motivações das decisões e modificações tomadas.

 

5.1.1 Constituição política do Império do Brasil: 1824

Embora ainda não caracterizado um regime federalista e admitindo certa repulsa à este, é possível notar no art. 1º da Constituição de 1824 pequenos indícios de que o Brasil se tornaria uma nação livre, independente e capaz de reger seus próprios poderes, mesmo que ainda de forma centralizada:

“Art. 1º: “O Império do Brasil é a associação política de todos os cidadãos brasileiros. Eles foram uma nação livre e independente que não admite laço algum de união ou federação, que se oponha à sua independência.”

 

5.1.2 Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil: 1891

Em período pouco anterior à Constituição em questão, em 1889, houve no Brasil um amplo movimento republicano, que resultou na Proclamação da República em um decreto de enorme importância para o impulsionamento da Constituição de 1891:

“O Governo provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, decreta:

Art. 1º: “Fica proclamada provisoriamente e decretada como forma de governo da nação brasileira – a República Federativa.”

Art. 2º: “As Províncias do Brasil, reunidas pelo laço da federação, ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil.”

Art. 3º: “Cada um desses Estados, no exercício de sua legítima soberania, decretará oportunamente a sua constituição definitiva, elegendo os seus corpos deliberantes e os seus governos locais.”

Portanto, mesmo de maneira anterior à Constituição de 1891, nota-se um forte caráter federalista.

A problemática presente em tal época é que a ideologia era baseada em três pilares: o liberalismo inglês, a democracia francesa e o federalismo americano. Tais fatores seriam extremamente importantes para o funcionamento do federalismo brasileiro em tal época, se o Brasil possuísse condições socioeconômicas de suporta-lo, tendo em vista que o país acabara se sair de um enorme período de insatisfação política derivada do governo Império, a abolição da escravatura e a queda na produção de cana de açúcar.

Dessa maneira, segundo BARROSO (1982), o federalismo brasileiro, a princípio, fora adotado de maneira extremamente superficial, ignorando a real situação brasileira, servindo apenas de “cortina de fumaça” para as problemáticas que atingiam de fato a população, beneficiando apenas os detentores de poder que já estavam no poder desde a época imperial.

Assim, tendo em vista que o federalismo brasileiro não resultou de uma questão plenamente de necessidade, mas sim de cunho puramente ideológico, começou a desenvolver-se um federalismo único, com divergências no modelo americano no qual foi baseado, resultando em um federalismo “dualístico”, que entende a União e os Estados como entes federativos.

Por fim, mesmo de maneira conflituosa, a Constituição de 1891 passou a prever, de fato, a implantação da República Federativa e a transformação de suas províncias em Estados:

“Art. 1º: “A Nação Brasileira adota como forma de governo, sob o regime representativo, a República Federativa, proclamada a 15 de novembro de 1889, e constitui-se, por união perpétua e indissolúvel das suas antigas províncias, em Estados Unidos do Brasil.”

 

5.1.3 Constituição Republicana dos Estados Unidos do Brasil: 1934

Diante de um contexto mundial extremamente turbulento, inicialmente, cresceu no Brasil a onda do Estado Intervencionista, chegando a medidas extremas, bem como a dissolução do congresso e a instituição de um governo absolutista.

Tendo como partida a forte intervenção estatal e a necessidade da proteção de direitos, nota-se um aumento nas leis trabalhistas e vantagens previdenciárias, impulsionando ainda mais a descentralização, indo contra as vontades do governo, que buscava um forte autoritarismo.

Para exercer mais efetivamente a forma de controle, houve uma “padronização” de comportamentos e leis, e a criação de um novo ente federativo – os municípios, para que houvesse maior possibilidade de controle sobre a população.

Porém, como plot twist, surge a Constituição de 1934, grande garantidora de Direitos Trabalhistas e Humanos de forma geral, reforçando a ideia do federalismo:

“Art. 1º: “A Nação Brasileira, constituída pela União perpétua e indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios em Estados Unidos do Brasil, mantém como forma de governo, sob regime representativo, a República Federativa proclamada em 15 de novembro de 1889.”

 

5.1.4 A Constituição de 1937

Sem grande importância para o federalismo brasileiro, a Constituição de 1937 fora criada no Estado Novo de Getúlio Vargas, em momento de enorme instabilidade e afloramento da Segunda Guerra Mundial, juntamente com seu governo pendular. Para muitos historiadores, devido ao seu curto período de duração, nem pode sequer ser denominada como Constituição. Mas, para quesitos históricos, sem muitas delongas, a Constituição do Estado Novo também manteve o federalismo sem nenhuma mudança relevante:

“Art. 3º: “O Brasil é um Estado Federal, constituído pela união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. É mantida a sua atual divisão política e territorial.”

 

5.1.5 Constituição dos Estados Unidos do Brasil: 1946

Em termos sociais, tal Constituição foi um foco de esperança de retomada de Direito dos brasileiros, tendo em vista a efevercência da anterior. Em termos práticos, o federalismo não sofreu grandes alterações, manteve-se estático.

Porém, novamente, o governo se baseava em 3 pilares constitucionais: A Constituição norte-americana, a francesa e na constituição que visava direitos sociais.

Apesar de não ser considerada como uma Constituição que aplicou grandes modificações no modelo federalista, entende-se que ela serviu como propulsora para a passagem do federalismo dualista clássico para o federalismo cooperativo, visto que garantiu maior assistência à áreas e indivíduos fragilizados.

É importante ressaltar que a instabilidade política do país não permitiu que tal modelo perdurasse, tendo em vista a renúncia de Jânio Quadros, a posse de João Goulart e o Golpe Militar de 1964, que inseriu uma forma de governo tirânica e com pouca liberdade para os demais entes envolvidos, especialmente ao ser implantada a Constituição de 1967, o qual o caráter totalitarista fora complementado com o Ato Institucional 5, que basicamente deferiu poderes ilimitados ao governante.

 

5.1.6 Constituição da República Federativa do Brasil: 1969

Ainda com um forte caráter autoritário e totalitarista, a nova Constituição modificou o nome de “Estados Unidos do Brasil” para “República Federativa do Brasil”.

As medidas adotadas durante esse período forçavam submissão dos Estados e outros entes ao Estado Federal, de onde saiam todas as normas que deveriam ser obedecidas, violando, de certa forma, a autonomia dos entes, o que gerou enorme centralização política – valor contrário aos princípios federalistas, embora estes ainda previstos em lei.

 

5.1.7 Constituição de 1988: a redemocratização brasileira

Buscando dar o fim ao autoritarismo pelo qual o Brasil havia passado durante a ditadura militar e focando trazer de volta o modelo federativo com descentralização, surge a Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã – por trazer de volta direitos que foram retirados e acrescentar novos.

Porém, a Constituição não alcançou os resultados desejados quanto a forma de organização governamental e territorial, visto que, embora aplicado o federalismo cooperativo, não houve foco no crescimento socioeconômico de áreas e populações mais pobres, deixando de lado a garantia de bens jurídicos maiores.

Quando fora notado que a implantação do federalismo desta maneira causava desagrado a boa parte da população, ampliou-se o rol das competências comuns e concorrentes, para que os entes passassem a governar de maneira sistêmica e comunicativa, não mais isolada.

Por fim, foi selecionado o sistema trinário, o qual elencou a União, Estados, Municípios e Distrito Federal como entes administrativos, porém, com diferenças materiais e hierárquicas entre eles. Os Estados, novamente, tiveram competência residual a despeito das competências dos Municípios e da União. Uma crítica de diversos autores sobre tal formatação, é que para os Municípios, não foi concedida possibilidade de participação no Congresso Nacional, fazendo com que este seja visto de forma inferior.

É importante frisar que tal reforma teve vantagens e desvantagens, mas ainda peca na área da realidade social, visto que não há investimento significante no plano normativo, ficando sempre estagnado, sem se adaptar as realidades sociais.

 

  1. O FEDERALISMO NO CONTEXTO ATUAL BRASILEIRO (O FEDERALISMO “À BRASILEIRA”)

Nos anos posteriores à inserção da Constituição de 1988, fora possível notar no país um crescente processo de abertura política, bem como o reestabelecimento de um Estado democrático de Direito, sendo possível o respeito e acolhimento dos mais diversos interesses visados por cidadãos brasileiros. É importante ressaltar que a nova descentralização trazida pela “Constituição Cidadã” implicou, em tese, na redistribuição de recursos para as regiões menos favorecidas, mas, como consequência, elevou a participação de parlamentares das regiões mais desenvolvidas em detrimento às outras.

Tendo em vista a regionalização causada pela maneira que fora inserido o federalismo brasileiro, é impossível desassociar aquela deste. Podemos notar tal fator presente desde o “descobrimento” do Brasil, onde as regiões foram divididas em capitanias hereditárias, que deixam reflexos atualmente, na formação e divisão dos Estados Federativos, característica que será exposta mais adiante.

 

6.1 Federalismo cooperativo e federalismo dual

Dentro das diversas divisões de competências do federalismo, este pode ser classificado como cooperativo e dual.

O federalismo dual tem por característica principal uma separação muito bem definida e rígida entre o sistema central e as demais unidades, tal como nos Estados Unidos.

No Brasil, o modelo, em teoria, adotado, é o federalismo cooperativo, que, contrapondo o modelo anterior, não possui uma separação rígida entre as competências definidas, podendo ser denominada como federação de equilíbrio, já que é fundada no equilíbrio entre as competências e autonomia conferidas aos entes federados pela Constituição Federal.

 

6.2 Crítica ao federalismo brasileiro atual: a falsa descentralização

Embora o país seja caracterizado por uma ampla mistura cultural, social e econômica, demonstrando várias realidades dentro de um só local, nota-se, atualmente, que diferentemente do princípio da descentralização do federalismo, a maior parte do poder jurídico, político e legislativo estão concentrados nas mãos da União, minimizando e ocultando a participação dos demais entes componentes.

Tal fator leva ao prejuízo de determinadas regiões e indivíduos, pois é notável que, embora mista, a cultura e costumes brasileiros são claramente individuais e regionalizados, como característica citada anteriormente.

A inserção de uma única via de imposição de Leis e Códigos não representa a inteira diversidade brasileira, mas sim se baseia na ideia de “homem médio”, que não representa, de fato, o brasileiro em si, mas carrega como características o típico habitante de cidades metropolitanas e, preferencialmente, do Sudeste.

Essa realidade é um dos fatores explicativos na dificuldade de obtenção de recursos em municípios pequenos, visto que ampla maioria dos valores arrecadados permanece nas mãos da União.

Ademais, pela grande extensão do país, torna-se complexo deter todo o controle e poderio de todos os estados e municípios, tornando a efetividade da administração pública de tais lugares baixíssima, especialmente regiões afetadas pela dificuldade de acesso.

Portanto, é conclusivo que há a extrema necessidade de uma descentralização de fato dentro do Estado Brasileiro, que não seja prevista apenas pelo seu modelo de organização política-regional, mas sim em suas aplicações e políticas garantidoras de acolhimento das mais diversas regiões e culturas presentes no país, garantindo que os administradores de estados e municípios possuam maior autonomia diante destes, se desvinculando de maneira mais efetiva em relação à União, podendo, assim, haver maior análise e presença na realidade de cada localidade, garantindo que haja investimento financeiro, técnico e cultural suficientes para suprir a necessidade de tal população.

 

Conclusão

Ante o conteúdo exposto no presente artigo, conclui-se que o federalismo brasileiro carrega fortes raízes históricas de sua origem e de seu nascimento no país, dando relevância a grande regionalização derivante das divisões das capitanias hereditárias, bem como a centralização velada dentro da federação brasileira, também com gênese no período colonial. Dessa forma, é inegável a necessidade de uma reforma e aplicação de políticas que visem, novamente, a descentralização do poderio brasileiro, garantindo que os direitos e deveres dos cidadãos sejam aplicados de acordo com sua realidade, visando o princípio da equidade, sem deixar grande parte do comando nas mãos da União, que se baseia na figura de um “homem médio” que não corresponde, de fato, ao cotidiano brasileiro, especialmente fora da região metropolitana do Sudeste. Assim, com a crescente descentralização, confiando mais poderes nas mãos dos governantes de estados e municípios, é esperada a maior aplicabilidade de métodos garantistas e investimentos de capitais de acordo com a real necessidade de cada local, de maneira pontual.

 

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[1] TEMER. Elementos de direito constitucional. 2007. p. 59

[2] REVERBEL. O Federalismo numa visão tridimensional do Direito. 2012. p. 129.

[3] WADY, Ariane Fucci. Existe diferença entre União e República Federativa do Brasil?. Notícias, [s. l.], 2008. Disponível em: https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/102536/existe-diferenca-entre-uniao-e-republica-federativa-do-brasil-ariane-fucci-wady. Acesso em: 4 dez. 2019.

[4] The Papers of Thomas Jefferson, Volume 30: 1 January 1798 to 31 January 1799 (Princeton University Press, 2003)