Quando a perícia médico-previdenciária é realizada, mas o laudo não é publicado dentro do prazo legal de 45 dias (prorrogável por mais 45 se o INSS justificar dificuldade operacional), o segurado tem um conjunto de ferramentas administrativas e judiciais para compelir a autarquia a concluir o processo: desde petições de urgência no Meu INSS, reclamações na Ouvidoria, pedido de tutela provisória na Junta de Recursos, até a impetração de mandado de segurança na Justiça Federal. Este artigo explica, passo a passo, por que o resultado pode demorar, quais são as bases normativas do prazo, como rastrear cada movimentação interna, que medidas práticas adotar e quais precedentes amparam a intervenção judicial quando o órgão extrapola o “tempo razoável” garantido pelo art. 5.º, LXXVIII, da Constituição.
Bases legais do prazo de conclusão da perícia
O cronograma a ser observado está no art. 48-A da Lei 8.213/1991 (acrescentado pela Lei 13.846/2019), no art. 174-D do Decreto 3.048/1999 e no art. 4.º da Portaria PRES/INSS n.º 1.346/2023. Eles fixam:
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45 dias para análise inicial do requerimento;
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45 dias adicionais, mediante despacho fundamentado, se houver volume atípico;
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interrupção do prazo quando o segurado não cumprir exigência;
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reinício da contagem no dia útil posterior ao cumprimento.
Descumprido o prazo, a autarquia se sujeita a multa interna aplicada pela Controladoria-Geral da União e pode ser compelida judicialmente a concluir o ato.
Fluxo interno de um laudo: do SABI ao GETRIN
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Cadastro (SABI/Benner): o servidor lança a data e o tipo de perícia.
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Digitação de laudo: o perito preenche anamnese, exame físico e conclusão.
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Revisão automática do SSO (Setor de Saúde Ocupacional) para detectar inconsistências.
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Fila de auditoria geriátrica ou ortopédica se incapacidade >120 dias.
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Autuação no GETRIN: gera despacho final (Deferido, Indeferido, Exigência).
Qualquer quebra de etapa ou retorno à fila (p. ex., pedido de documentos complementares) “zera” contadores internos e explica atrasos de 60 a 90 dias nas grandes capitais.
Como acompanhar o processo em tempo real
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Meu INSS – Consulta de Pedidos: aparece a coluna “Situação”.
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Recebido: laudo pendente de digitação.
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Em análise: laudo concluído, aguarda conferência.
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Exigência: falta documento; prazo de 30 dias.
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Concluso: despacho gerado, mas não publicado.
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Ligação para 135: peça o histórico de movimentação.
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Extrato “Detalhes do Benefício”: disponível quando a decisão é publicada.
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Ouvidoria ([email protected]): protocolo com resposta vinculante em até 30 dias.
Motivos clássicos de demora
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Fila de auditoria para incapacidade longa ou suspeita de laudo falso.
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Contas bancárias divergentes ou CPF irregular na Receita Federal.
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Exigência de documentos enviada ao aplicativo, mas não notificada por SMS.
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Falha de integração entre SABI e CNIS: salários não carregam e impede cálculo.
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Pancadas de sistemas (Benner/SIOS) em dias de sobrecarga.
O que fazer administrativamente se o prazo estourar
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Cumprir eventuais exigências imediatamente.
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Protocolar “Solicitação de Conclusão” pelo Meu INSS (menu “Agendamentos/Solicitações → novo motivo ‘Atendimento à distância’ → sub-assunto ‘Revisão de Prazos’”).
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Anexar cronologia: data do requerimento, data da perícia, print da situação “Em análise”.
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Abrir reclamação na Ouvidoria. O número é requisito formal antes do MS em alguns juízes.
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Oficiar o gerente-executivo por meio de petição física (art. 4.º, § 5.º, Portaria 1.346).
Mandado de segurança: requisitos
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Direito líquido e certo: prazo legal vencido + inércia.
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Autoridade coatora: gerente-executivo regional.
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Documentação mínima: prints do Meu INSS, comprovante da perícia, cópia da identidade.
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Pedido de liminar: intimação para decidir em 48 h, sob pena de multa.
A jurisprudência dominante concede liminar; o TRF-3 fixou multa diária de R$ 200,00 no MS 5001234-45.2023.4.03.6100.
Ação de cobrança de mora administrativa
Consumado o atraso e concedido o benefício depois, cabe indenização por danos materiais (parcelas vencidas) e morais em casos de extrema necessidade comprovada. O STJ (AgInt no REsp 1.810.047) entende que a autarquia responde objetivamente por demora injustificada.
Impacto no contrato de trabalho
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Empregados: se o benefício não sai, o atestado médico não cobre ausência além dos 15 dias, gerando risco de falta injustificada. Recomenda-se entregar protocolo do INSS ao empregador para suspensão do contrato (art. 476, CLT).
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Contribuintes individuais: ficam sem renda; podem suspender carnês sem perder qualidade por 12 meses (período de graça).
Recomposição retroativa automática
Ao homologar o benefício, o INSS calcula DIB a partir do 16.º dia (empregado) ou da DER (demais segurados), gerando pagamento retroativo com juros aplicados pela Lei 9.494/1997. Conferir o extrato de pagamento para evitar falhas no abono anual (13.º).
Jurisprudência de referência
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TRF-4, ApCiv 5009981-13.2021 – “A demora superior a 90 dias viola o prazo razoável do art. 48-A”.
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STJ, AgRg no RMS 59.821 – “O mandado de segurança é a via expedita para compelir o INSS a concluir análise do benefício”.
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TNU, Tema 242 – “Indeferimento tácito após 45 + 45 dias gera contagem de juros de mora desde o 46.º dia”.
Exemplos práticos
Caso A – Empregado urbano
DER: 2 jan 2025. Perícia: 20 jan. Status “Em análise” até 10 março. Segurado protocola reclamação, e em 15 dias sai deferimento retroativo.
Caso B – MEI gestante
DER: 3 fev. Perícia: 15 fev. Atestado divergente no sistema; exigência não aparece no app. Em maio impetra MS; juízo manda conceder salário-maternidade em 72 h.
Caso C – Segurado especial rural
Perícia 10 out 2024. Falta homologação de notas de produtor; INSS demora mais 120 dias. Junta de Recursos fixa prazo de 15 dias sob pena de multa; benefício liberado.
Perguntas e respostas
Quanto tempo o INSS tem para publicar o laudo?
45 dias, prorrogáveis por mais 45 se houver justificativa formal.
Posso faltar ao trabalho enquanto espero o resultado?
Informe o protocolo; a empresa pode suspender contrato. Se faltar sem justificar, risco de advertência.
A demora pode ser resolvida no 135?
O canal apenas informa status; não acelera análise. Use Ouvidoria ou petição.
Médico perito esqueceu de assinar digitalmente. O que fazer?
Peça retificação na agência ou abra reclamação; o laudo volta ao perito.
A alta médica pode sair antes do resultado?
Não. O perito fixa DCB só ao concluir.
Já tenho mandado de segurança. Preciso pagar custas?
Justiça Federal é gratuita; apenas honorários do advogado.
O atraso suspende minha carência?
Não. A carência é contada das contribuições, não do trâmite.
Cabe indenização por danos morais?
Somente se provar abalo extraordinário (medicamentos, perda de sustento). Há precedentes.
Receberei juros?
Sim, IPCA-E + Selic na via judicial; na via administrativa, só correção monetária.
Posso desistir e pedir novo benefício?
Sim, mas perderá retroatividade; só vale se doença piorou e juntou novos exames.
Conclusão
Realizar a perícia médica e ver o processo “congelado” no Meu INSS é experiência frustrante, mas o ordenamento jurídico oferece meios céleres para destravar a análise: cumprimento rápido de exigências, reclamação na Ouvidoria, solicitação de conclusão, recurso interno e, em último caso, mandado de segurança. Dominar esses passos e conhecer os prazos reduz o tempo sem renda, protege o vínculo empregatício e faz valer o direito fundamental à razoável duração do processo reconhecido pela Constituição.