Resumo: Este trabalho tem como objetivo demonstrar as íntimas relações que existem entre a soberania interna de uma nação e o poder dos Estados influentes do globo em impor seus conceitos econômicos e sociais por meio do processo de globalização.
Palavras-chaves: Soberania, Relações Internacionais, Globalização
Abstract: This article aims to demonstrate the close relations that exist between the internal sovereignty of a nation and the power of the influential Globe States to impose their economic and social concepts through the process of globalization.
Keywords: Sovereignty, International Relations, Globalization
Sumário: Introdução; 1. Soberania dos Estados; 2. Globalização; Conclusão; Referência.
Introdução
Desde a antiguidade, os Estados procuravam manter o poder interno do seu território para comandar os seus cidadãos, e fazer guerras para conquistar novos territórios e subjugar outros povos. Entretanto, o Império Grego fora responsável por uma mudança sensível na forma de dominação de povos.
Ao contrario de outros impérios, o Império Grego procurava não só conquistar novos territórios, mas dá aos povos conquistados uma sensação de “continuidade” cultural, sem a imposição de sua religião e costumes por meio do uso da força. Entretanto, essa permanência cultural era traiçoeira.
Os povos conquistados pelos gregos necessitavam comercialmente e socialmente do seu subjugador, o que impunha a interação linguística, cultural e intelectual entre eles. Desta forma, ao impor a sua influência por meio dos meios de interação social, os meios gregos resultaram mais eficientes do que os anteriores que se utilizavam do uso da força.
Este fato pode ser comprovado, mesmo após o seu declínio e conquista pelo Império Romano, onde a língua grega era a língua universal utilizada naquele período como o meio de comunicação entre os diversos povos dominados por Roma, apesar de o latim ser a língua materna do império.
Hoje em dia, é possível verificar uma ligação estrita entre o processo imperialista grego e o processo de Globalização mundial atual, o que é motivo de regozijo para uns e revolta para outros, desta forma se faz necessário entender o seu conceito e os seus limites para que não fira a soberania dos Estados pertencentes ao globo.
1. Soberania dos estados
O conceito de soberania surgiu em Roma, com o suprema potestas, que era o poder supremo do Estado na ordem política e administrativa, passando a denominá-lo posteriormente de imperium com amplitude internacional. (Oliveira, 2004). Bodin considerava a soberania o poder absoluto e perpetuo de uma Republica.
A Soberania é um dos pressupostos intrínsecos à existência de um Estado. Um Estado que não possui soberania ou tem a sua soberania limitada não pode ser chamada de Estado.
Soberania é a autoridade superior, neste caso de um país, de impor comandos a outros a que ficam a ele subordinado e a dever obediência, perpétuo, que não pode ser limitada por tempo ou por outro poder externo.
Bonavides (2012, p. 550) refere-se à soberania como “a entidade que não conhece superior na ordem externa nem igual na ordem interna”. Desta forma, não é possível chamar de soberanos os estados-membros de uma federação, onde o poder soberano é investido no órgão federal. Tal poder político de decisão, no âmbito do seu território nacional, é necessário à defesa dos interesses nacionais, inclusive o direito de autodeterminação em nome de um povo.
Partindo do pressuposto de que a Soberania é uma garantia do Estado de não poder sofrer limitações em seu poder territorial, fica a questão de como prevenir possíveis conflitos entre os Estados existentes no espaço mundial, em caso de abuso deste poder.
Após a Primeira e Segunda Guerra Mundial, ficou comprovada de que a Soberania de um Estado deve limitada por regras que protejam a humanidade, para que não descambe no extermínio da população mundial, por vezes inocente ao jogo político de poder dos seus governantes.
Oliveira (2004) afirma que “a soberania é una, integral e universal. Não pode sofrer restrições de qualquer tipo, salvo, naturalmente, as que decorrem dos imperativos de convivência pacifica das nações soberanas no plano do Direito Internacional.”
O poder da soberania exercido pelo Estado encontra fronteiras não só nos direitos da pessoa humana como também nos direitos dos grupos e associações, tanto no domínio interno quanto no internacional. Notadamente no plano internacional, a soberania é limitada pelos imperativos da coexistência de Estados soberanos.
Desta forma, o Direito Internacional surge para impor regras limitativas a Soberania de um Estado, não para ferir o seu poder territorial, mas para conduzir às relações entre as nações soberanas a uma convivência harmônica e que não prejudique a paz mundial. Entretanto, tais leis internacionais não devem possuir um cunho imperialista, ou seja, não devem impor às relações sociais e econômicas de um Estado influente a outro que não possui mando mundial, com o pretexto de “progresso” e desenvolvimento global, como vem ocorrendo atualmente.
2. Globalização
A Globalização pode ser compreendida na interdependência dos povos e países, bem como no processo de interação entre pessoas e países do globo em seus mais diversos níveis sociais, econômicos, políticos e culturais.
Com o avanço da tecnologia, ficou ainda mais fácil essa interação entre pessoas, bem como a expansão dos mercados com países potencialmente emergentes, com um baixo investimento de capital, dado a eficiência da comunicação do mundo globalizado. (COIMBRA, 2013).
“A globalização representa (…) um desafio significativo para o exercício da soberania dos Estados no contexto internacional. Esses desafios, que não são triviais, levaram alguns autores a falar em “crise da soberania”, questionando não somente a utilidade do conceito para captar e explicar as características atuais do fenômeno, como também quem seria o “sujeito” da soberania”. (MIRANDA, 2004)
O comércio, as novas tecnologias de informação, os meios de comunicação internacionais e a migração global fomentaram um fluxo sem restrições de cultura que transpõe os limites territoriais de diversas nações. Imagens, ideias, estilos e produtos são disseminados pelo mundo de uma forma muito rápida.
Desta forma, conceitos de atitudes aceitas em países ocidentais, tendem a tentar influenciar outras partes do globo onde os valores humanos e sociais são diferentes. Sobre isso diz Anthony Giddens (2007):
“Os filmes e programas de televisão produzidos no Ocidente, que dominam as mídias mundiais, tendem a avançar uma série de agendas políticas, sociais e econômicas que refletem uma visão do mundo especificamente ocidental. Alguns preocupam-se com o fato da globalização estar a conduzir à criação de uma ‘cultura global’, em que os valores dos mais ricos e poderosos – neste caso, os estúdios de cinema de Hollywood – se sobrepõem à força dos hábitos e das tradições locais. De acordo com esta perspectiva, a globalização é uma forma de ‘imperialismo cultural’, em que os valores, os estilos e as perspectivas ocidentais são divulgados de um modo tão agressivo que suprimem as outras culturas nacionais.”
A globalização tem as suas ações positivas, como a minimização de guerra entre nações, a facilitação de meios de transporte de pessoas e informações, uma viagem da Europa à América que antes era feita em 46 dias, hoje pode ser realizada de avião em 9 horas; uma informação, carta, livros, imagem ou som que levaria meses e talvez anos para chegar a um local distante, pode hoje ser visto ou enviado instantaneamente pela internet.
Entretanto, esta mesma globalização pode destruir as culturas próprias de um povo e nação, corroendo valores étnicos e éticos, privilegiando a especulação financeira em detrimento da produção, tendo uma cultura reduzida a mero entretenimento do comércio e cultura ocidental. (CHRISTOS, 2013)
A tendência dos meios de comunicação de homogeneizar e tornar todas as pessoas e povos iguais, através de padrões dominantes, transforma as nações do globo em povos sem identidade cultural e impõe a exclusão a quem não se enquadra em tais padrões.
Tendo um grande poder no mundo financeiro mundial, a globalização é uma forma de imperialismo, que para Lênin (1975), em sua obra O imperialismo, fase superior do capitalismo, pode ser demonstrada em quatro situações que visualizamos atualmente:
1. A concentração da produção e do capital através de um processo intenso de megafusões e incorporações em todos os seus estamentos – industrial, bancário e de serviços;
2. A exportação de capitais que se visualiza na criação de títulos com valor de dólar americano, mas emitidos fora dos EUA, formando um peculiar mercado de moedas e sendo posteriormente o maior influenciador do endividamento dos países periféricos.
3. A partilha econômica e territorial do mundo com a formação de blocos econômicos nas regiões do mundo, bem como na transformação dos Estados Unidos em uma potência hegemônica na economia internacional, com um alto poder de controle econômico-financeiro das regiões dos países periféricos.
4. A tendência à decomposição e ao parasitismo com a transferência de recursos dos países da periferia para os países centrais que podem ser assemelhadas à extorsão colonial.
A Globalização não traz benefícios uniformes a todos os povos. Alguns ganham muito, outros ganham poucos e ainda há outros que perdem. A exigência de menores custos de produção e de tecnologia mais avançada acaba por excluir a mão de obra menos qualificada, desta forma os países mais pobres perdem com a desvalorização das matérias-primas que exportam e com o atraso tecnológico.
Sua influência no pensamento político mundial impõe aos países orientais, conceitos que muitas vezes podem não caber de forma harmônica com os demais valores de sua sociedade. Um exemplo disto é a imposição da “democracia” como o modelo certo e ideal que deve ser perpetrado a todos os Estados existentes no mundo. Faz-se necessário entender, entretanto, que nem todas as civilizações estão preparadas para serem “Estados democráticos”, não porque devem nascer ditatoriais e existir desta forma, mas porque a democracia é um processo desenvolvido pelo povo, que inclui os seus valores étnicos e sociais, e não um fim a ser alcançado.
Para que um governo não democrático seja deposto de um Estado, é necessário que o povo desenvolva a sua democracia, ou pensamento democrático que lhe cabe, e não que se encaixe em um modelo preestabelecido pelos Estados influentes do globo, como aconteceu com o Iraque. AMIN (2012), afirma que:
“A democracia e o direito dos povos, invocados hoje por esses mesmos representantes do capital dominante, dificilmente se podem conceber, excepto como meios políticos da direção neoliberal na crise contemporânea mundial, como complementos dos meios econômicos. A democracia em questão depende de cada caso. O mesmo é verdade em respeito ao "bom governo", de que também falam. Até porque isto fica inteiramente ao serviço das prioridades que impõem as estratégias dos EUA/Tríade, e é também cinicamente usado como instrumento. Daí a extensa aplicação dos dois pesos e duas medidas. Por exemplo, nada de intervenções em favor da democracia no Afeganistão ou nos países do Golfo Pérsico, assim como não se meteram ainda nos caminhos de Mobutu, ou hoje, nos de Savimbi, e de muitos outros amanhã. Em alguns casos os direitos dos povos são sagrados (hoje no Kosovo, amanhã no Tibete), e em outros casos são esquecidos (na Palestina, no Curdistão, Chipre, em relação aos Sérvios da Krajina, que os Croatas expulsaram pela força, etc.). Inclusive o terrível genocídio do Ruanda não ocasionou nenhuma investigação séria sobre as responsabilidades dos estados que deram o seu apoio diplomático aos governos que o prepararam abertamente. Sem dúvida que a abominável conduta de certos regimes facilita a tarefa de arranjar pretextos que são fáceis de explorar. Mas o silêncio cúmplice em outros casos retira toda a credibilidade a estes discursos sobre a democracia e o direitos dos povos. É-nos impossível deixar de cumprir requerimentos da luta pela democracia e respeito pelos povos, sem os quais não há progresso.” (AMIN, 2012)
Para Marcos Coimbra (2013), a Globalização não é mais do que um aforma moderna de colonialismo, onde os Estados mais ricos implantam uma estratégia de dominação, com o estratagema da necessidade de maior integração entre os povos apenas para utilizar os recursos naturais e riquezas dos países periféricos, de forma a beneficiar seus respectivos povos.
Na ciência, na tecnologia e até mesmo na área militar é possível visualizar diversos tipos de empecilhos empregados pelos países mais influentes para impedir a autonomia tecnológica, o desenvolvimento dos setores nuclear e aeroespacial, e a sucateamento e desativação das indústrias bélicas dos países dependentes, entre eles, o Brasil.
Outros autores, entretanto, associam os processos de globalização a coexistência lado a lado de uma enorme diversidade de culturas e não de homogeneização cultural. Para estes, às tradições locais juntam-se as culturas provenientes do estrangeiro, promovendo a estes povos opções de escolha de estilos de vida. Desta forma, não há que se falar em formação de uma cultura global unificada, mas de fragmentação das diversas formas de culturas. GIDDENS (2007) afirma que:
“As antigas identidades e modos de vida enraizados em culturas e em comunidades locais estão a dar lugar a novas formas de ‘identidade híbrida’, compostas por elementos de diferentes origens culturais. Deste modo, um cidadão negro e urbano da África do Sul atual pode permanecer fortemente influenciado pelas tradições e perspectivas culturais das suas raízes tribais, mas simultaneamente adotar um gosto e um estilo de vida cosmopolitas – na roupa, no lazer, nos tempos livres, etc. – que resultam da globalização.”
Conclusão
É possível entender por fim, com todos os dados históricos que a humanidade possui, que o helenismo do Império Grego, pode ser encontrado dentro do processo de globalização, com a não utilização da força, mas na sutil modificação de valores intrínsecos sociais, culturais, linguísticos e econômicos dos Estados dependentes e seus respectivos povos.
Pelas continuidades reveladas no atual processo de internacionalização, pode-se visualizar que a atual fase do mundo trata-se do velho imperialismo, travestido de uma aparência midiático tecnocrata desta sociedade “globalizada” que cumpre o seu papel: reproduzir as assimetrias como forma de dominação característica do fenômeno imperialista clássico. Baseando-se nisso, o direito a soberania, ou seja, o poder de decisão de um Estado, que representa um povo, de como deve viver dentro do seu território, deve ser premente defendida.
Faz-se necessário que a população mundial entenda que, os conceitos de certo e errado, bom ou mau, verdadeiro ou falso, são intrínsecos aos valores étnicos e éticos do povo que constitui o Estado e que o Globo não pode decidir como determinado povo deve viver, se esta decisão não está de acordo com os padrões históricos e sociais do mesmo.
Informações Sobre o Autor
Daiane Carvalho Batista
Advogada. Mestranda em Diplomacia e Politica Externa pela UCES Argentina. Especialista em Direito Constitucional. Graduada em Direito pela Faculdade Ruy Barbosa