Histórico do controle de constitucionalidade no Brasil

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Resumo: O estudo do controle de constitucionalidade é um dos mais importantes e atuais ao qual o jurista pode lançar-se, visto que todo o ordenamento jurídico está embasado na Constituição, sendo impensável a validade de uma norma em confronto com o Texto Ápice. Tal premissa é a garantia da ordem institucional e dos direitos dos próprios cidadãos, vez que os comandos constitucionais não podem ser modificados ao bel-prazer do legislador ordinário. O presente artigo fará uma abordagem histórica deste instituto vigente no ordenamento jurídico brasileiro.

Palavras-chave: história, controle de constitucionalidade, Brasil.

Abstract: The study of judicial review is one of the most important and timely to which the jurist can throw up, since the entire legal system is rooted in the Constitution, is unthinkable the validity of a standard text on confrontation with the apex. This premise is the guarantee of institutional order and the rights of its own citizens, rather than constitutional commands can not be changed at the whim of the ordinary legislator. This article will give a historical approach of this institute in the Brazilian legal force.

Keywords: history, control of constitutionality, Brazil.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por escopo analisar, de forma objetiva e sucinta, o histórico do controle de constitucionalidade no Brasil, partindo da Constituição Imperial de 1824 até alcançarmos a Constituição Federal de 1988. Destaca-se a importância do tema, tão difundido e discutido na doutrina nacional, como mecanismo para a adequação do cenário legal do país às determinações constitucionais.

Controlar a constitucionalidade, sistema bem desenvolvido pelo Brasil ao longo dos anos, como adiante se mostrará, significa impedir a eficácia de normas contrárias à Constituição. E, para tanto, a defesa da Carta Maior pressupõe a existência de garantias e institutos destinados a assegurar a observância, a aplicação, a estabilidade e a conservação das suas normas.

Conveniente, antes de se adentrar ao tema deste estudo, que seja tratado breve considerações acerca de constitucionalismo, neoconstitucionalismo e constituição.

2. CONSTITUCIONALISMO

Denomina-se constitucionalismo, o movimento social, político e jurídico e até mesmo ideológico, a partir do qual emergem as constituições nacionais. Em termos genéricos e supra-nacionais, constituir-se parte do estabelecimento de normas fundamentais de um ordenamento jurídico de um Estado, localizadas no topo da pirâmide normativa, ou seja, sua constituição. Seu estudo implica, deste modo, uma análise concomitante do que seja constituição com suas formas e objetivos.

TAVARES (2002, p. 1) identifica quatro sentidos para o constitucionalismo:

“(…)numa primeira açepção, emprega-se a referência ao movimento político-social com origens históricas bastantes remotas que pretende, em especial, limitar o poder arbitrário. Numa segunda acepção, é identificado como imposição de que haja cartas consitucionais escritas. Tem-se utilizado, numa terceira acepção possível, para indicar os propósitos mais latentes e atuais da função e posição das constituições nas diversas sociedades. Numa vertente mais restrita, o constitucionalismo é reduzido à evolução histórico-constitucional de um determinado Estado.”

Destarte, envolve a necessidade de uma Constituição escrita para limitar o poder e garantir a liberdade, seja porque esta Constituição deve proclamar os direitos fundamentais do homem e apresentar-se como uma norma imposta aos detentores do poder estatal, seja porque ela obterá o equilíbrio necessário a que nenhum deles possa acumular poderes e eliminar a liberdade.

Neste sentido, o constitucionalismo é dotado de um conjunto de princípios básicos destinados à limitação do poder político em geral e do domínio sobre os cidadãos em particular. O constitucionalismo é um arranjo institucional que assegura a diversificação da autoridade, para a defesa de certos valores fundamentais, como a liberdade, a igualdade e outros direitos individuais. Como ideologia, pode-se dizer que o constitucionalismo compreende os vários domínios da vida política, social e econômica: neste sentido o liberalismo é constitucionalismo.

 O constitucionalismo veio para garantir, no papel, que os poderes viessem a ser limitados e divididos como forma de impedir o seu uso arbitrário e que assegurassem os chamados direitos fundamentais, anteriormente a essa fase não existia constituição formal, apenas normas intuitivas desenvolvidas com base nas correntes jusnaturalistas.

Em síntese, constitucionalismo é a teoria que busca explicar a formação e organização dos Estados, limitando o poder dos governantes e criando uma estrutura político-social de uma comunidade.

3. NEOCONSTITUCIONALISMO

Após o constitucionalismo, a partir do início do século XXI, surgiu o chamado neoconstitucionalismo, o que seria uma evolução natural do constitucionalismo, onde procura não apenas garantir os direitos fundamentais do homem, mas também a forma que deve ser concretizadas esses direitos.

Busca-se, dentro dessa nova realidade, não apenas atrelar o constitucionalismo à idéia de limitação do poder político, mas, acima de tudo, buscar a eficácia da constituição, deixando o texto de ter um caráter meramente retórico e passando a ser mais efetivo, especialmente diante da expectativa de concentração dos direitos fundamentas. (LENZA, 2010, p.55)

Assim, o neoconstitucionalismo proclama a primazia do princípio da dignidade da pessoa humana, a qual deve ser protegida e promovida pelos Poderes Públicos e pela sociedade. Da mesma forma, esse movimento enaltece a força normativa da constituição, a qual deixa de ser um mero catálogo de competências e de recomendações políticas e morais, para se tornar um sistema de preceitos vinculantes, capazes de conformar a realidade.

4. CONSTITUIÇÃO

A Constituição aparece como elemento fundamental na organização e funcionamento das nações democráticas. Representa a lei máxima dos ordenamentos organizados sob o regime constitucional. Nela estão arroladas as normas relativas a aspectos fundamentais da organização sócio-econômica de uma dada sociedade, sendo evidente a sua relevância para o bom funcionamento dos sistemas em que se encontra presente.

Em conformidade com MORAES (2004: p.38):

“Constituição deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos”.

Ainda neste sentido, SILVA (2008, p. 39) explica:

“A constituição é algo que tem, como forma, um complexo de normas (escritas ou costumeiras); como conteúdo, a conduta humana motivada pelas relações sociais (econômicas, políticas religiosas, etc.); como fim, a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e; finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder que emana do povo.”

Por sua vez, CARVALHO apud MORAES (p.38), complementa que a Constituição pode ser definida como:

“(…) o estatuto jurídico fundamental da comunidade, isto é, abrangendo, mas não se restringindo estritamente ao político e porque suposto este, não obstante a sua hoje reconhecida aptidão potencial pra uma tendencial totalização, como tendo, apesar de tudo, uma especificidade e conteúdo material próprios, o que não autoriza a que por ele (ou exclusivamente por ele) se defina toda a vida de relação e todas as áreas de convivência humana em sociedade (…).”

As constituições podem se classificadas quanto ao conteúdo; à forma; ao modo de elaboração; à origem; à estabilidade; à extensão e finalidade.

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Quanto à possibilidade de ocorrência de transformações no texto constitucional, há que se falar nas modalidades rígida ou flexível. O primeiro caso dá-se quando a própria constituição estabelece um processo mais oneroso, diferente da legislação ordinária, para a sua reforma. Toda constituição tem pretensão de permanência, porquanto documento fundamental do sistema jurídico de um Estado, não pode estar sujeita a mutações ao sabor das dificuldades passageiras. Essa permanência, entretanto, não quer dizer imutabilidade. Flexíveis são as constituições que não exigem, para sua atualização, modificação, processo distinto daquele referente à elaboração das leis.

Nas palavras de SILVA (2008, p. 42) o texto flexível, por sua vez, “pode ser livremente modificada pelo legislador segundo o mesmo processo de elaboração das leis ordinárias”.

Nesse ponto, importante traçar, de forma breve, um paralelo entre o que se convencionou denominar de Constituições rígidas e flexíveis, segundo CANOTILHO (2003, p. 215):

A rigidez traduz-se fundamentalmente na atribuição às normas constitucionais de uma capacidade de resistência à derogação superior à de qualquer lei ordinária. Significa isto que a Constituição (normas constitucionais) só pode ser modificada através de um procedimento de revisão específico e dentro de certos limites (formais, circunstanciais e materiais) como se verá no estudo sobre o procedimento de revisão (cfr. CPR, artigos 284.º e segs.). Os outros actos normativos desprovidos do valor e da força de leis constitucionais de revisão (CRP, artigos 119.º/1/1, 161.º/1 e 166.º/1) não possuem capacidade derrogatória relativamente às normas constitucionais. No caso de estes outros actos normativos editarem disciplina jurídica em desconformidade com as regras e princípios da Constituição eles são inconstitucionais (cfr. CRP, artigo 277.º/1) com as conseqüências jurídicas que serão indicadas no momento da análise da fiscalização da constitucionalidade. A opção por um "texto rígido", no sentido assinalado, é hoje justificado pela necessidade de se garantir a identidade da constituição sem impedir o desenvolvimento constitucional. Rigidez é sinônimo de garantia contra mudanças constantes, freqüentes e imprevistas ao sabor das maiorias legislativas transitórias. A rigidez não é um entrave ao desenvolvimento constitucional, pois a constituição deve poder ser revista sempre que a sua capacidade reflexiva para captar a realidade constitucional se mostre insuficiente.

A dicotomia entre rigidez/flexibilidade não postula necessariamente uma alternativa radical; exige-se, sim, uma articulação ou coordenação das duas dimensões, pois, se, por um lado, o texto constitucional não deve permanecer alheio à mudança, também, por outro lado, há elementos do direito constitucional (princípios estruturantes) que devem permanecer estáveis, sob pena de a constituição deixar de ser uma ordem jurídica fundamental do Estado para se dissolver na dinâmica das forças políticas. Neste sentido se fala da identidade da constituição caracterizada por certos princípios de conteúdo inalterável.”

As Constituições rígidas, sendo Constituições em sentido formal, demandam um processo especial de revisão. Esse processo lhes confere estabilidade ou rigidez bem superior àquela que as leis ordinárias desfrutam. Daí, a supremacia incontrastável da lei constitucional sobre as demais regras de direito vigente num determinado ordenamento. Compõe-se assim uma hierarquia jurídica, que se estende da norma constitucional às normas inferiores (leis, decretos-leis, regulamentos etc.), e a que corresponde por igual uma hierarquia de órgão.

Conclui-se, portanto, que o controle da constitucionalidade só existirá, por lógica, nos ordenamentos que se fundarem em conceitos constitucionais rígidos. Pois, se uma lei qualquer tivesse o poder de ab-rogar normas constitucionais, estaríamos diante de uma Constituição flexível e, deste modo, sem utilidade alguma esse mecanismo de proteção – Controle de Constitucionalidade.

5. NOÇÕES DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Controle de constitucionalidade caracteriza-se, em princípio, como um mecanismo de correção presente em determinado ordenamento jurídico, consistindo em um sistema de verificação da conformidade de um ato (lei, decreto, etc) em relação à Constituição. Não se admite que um ato, hierarquicamente, inferior à Consituição confronte suas premissas, caso em que não haveria harmonia das próprias normas, gerando insegurança jurídica para os destinatários do sistema jurídico.

Para que um sistema jurídico funcione, pressupõe-se sua ordem e unidade, devendo as partes agir de maneira harmoniosa. O mecanismo de controle de constitucionalidade procura restabelecer a unidade ameaçada, considerando a supremacia e a rigidez das disposições constitucionais. O controle de constitucionalidade verifica eventual lesão de direitos fundamentais (constitucionais) ou de outras normas do texto constitucional, objetivando preservar a supremacia constitucional contra atentados vindos do legislador.

Esse sistema consiste no ato de submeter à verificação de compatibilidade normas de um determinado ordenamento jurídico com os comandos do parâmetro constitucional em vigor, formal e materialmente (forma, procedimento e conteúdo), retirando do sistema jurídico (nulificando ou anulando) aquelas que com eles forem incompatíveis. Deste modo, caracteriza-se como uma concretização e um desenvolvimento do direito constitucional, mediante a fiscalização da observância e cumprimento das normas e princípios constitucionais vigentes. Tal afirmativa propicia o entendimento de que os atos normativos devem estar subordinados, formal, procedimental e substancialmente, ao parâmetro constitucional.

No sistema jurídico existe a chamada hierarquia de normas. Sendo que na lição de BASTOS (1997, p. 345), "as normas de direito encontram sempre seu fundamento em outras normas jurídicas". Assim as normas inferiores encontram seu fundamento de validade em outras normas de escalão superior. Desde a norma mais simples até à própria Constituição ocorre o fenômeno da "pirâmide jurídica". O problema reside na adequação de todas as normas de caráter inferior, com a própria Constituição a qual seria a topo da pirâmide.

6. HISTÓRICO DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL

6.1. CONSTITUIÇÃO DE 1824

A Constituição que D. Pedro I outorgou em março de 1824 (praticamente idêntica a que também outorgou a Portugal em 1826, como D. Pedro IV) atendia ao pensamento constitucionalista predominante na Europa no início do século XIX.

A Constituição de 1824 não regulou sobre o controle de constitucionalidade a ser exercido pelo Poder Judiciário, quando em seu artigo 15, atribuía ao Poder Legislativo a prerrogativa de fazer as leis, interpretá-las, suspende-las, revogá-las e de zelar pela guarda da Constituição.

                    Com efeito, partindo-se do pressuposto de que a Carta de 1824 sofreu influência de doutrinadores da Inglaterra e da França, sendo que os juízes ignoravam as premissas do Direito Constitucional dos Estados Unidos, em especial, relacionadas ao Controle de Constitucionalidade, é que BANDEIRA DE MELO (1997, p. 148) concluiu: “Por isso, não obstante, de há muito, nesse país, o judiciário exercesse o controle de constitucionalidade dos atos dos outros poderes, no Brasil se ignorava essa prerrogativa, ou mesmo conhecendo-a os governantes, não se afeiçoaram a ele”.

Esta Carta, não adotou essa espécie de controle judicial de constitucionalidade das leis, uma vez que seu texto não se coadunava com o que se pode hodiernamente chamar de "rígido".

Ademais, fortemente influenciada pelo modelo francês, outorgou-se ao Poder Legislativo a atribuição de fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, além de velar pela guarda da Constituição

6.2. CONSTITUIÇÃO DE 1891

A segunda Constituição brasileira, intitulada Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, foi escrita em 1891. Foi efetuada por meio de um congresso constituinte, no qual os representantes do povo brasileiro se reuniram com vistas a proceder à organização de um regime político caracterizado pela liberdade e pela forma democrática.

Na Constitucional Republicana de 1891, realizada sob a influência do constitucionalismo norte-americano, o qual teve sua inserção no país sob a ação de Rui Barbosa, houve a adoção do tipo de controle jurisdicional difuso no ordenamento pátrio.

MENDES, COELHO e, BRANCO (2009, p. 1035) assim discorrem:

“Iniciada a República, desde a sua primeira Constituição (1891), o Brasil passou a adotar o modelo difuso de controle da constitucionalidade, buscando fundamentos no modelo norte-americano, reconhecendo a competência do Supremo Tribunal Federal para rever as sentenças das Justiças dos Estados, em última instância, quando se questionasse a validade ou a aplicação de tratados e leis federais e a decisão do Tribunal fosse contra ela, ou quando se contestasse a validade de leis ou de atos dos governos locais, em face da Constituição ou das leis federais, e a decisão do Tribunal considerasse válidos esses atos ou leis impugnadas (art. 59, §1º, a e b).”

A Constituição de 1891 reconheceu ao Supremo Tribunal Federal competência para rever, em última instância, decisões proferidas pelas Justiças dos Estados quando questionados tratados ou leis federais ou quando se contestasse a validade de leis ou de atos dos governos locais em face da Constituição ou de leis federais.

6.3. CONSTITUIÇÃO DE 1934

A Constituição mexicana de 1917, a Constituição da União Soviética de 1918 e a Constituição alemã de 1919, promulgada na pequena cidade de Weimar, implantaram novas soluções políticas e jurídicas e impressionaram o nosso legislador constituinte de 1934, que, mesmo não abandonando de todo o paradigma americano, começou a caminhar em direção às constituições parlamentaristas européias.

A Constituição de 1934 trouxe significativas alterações no sistema de controle de constitucionalidade. O constituinte determinou que a regra de declaração de inconstitucionalidade somente seria realizada pela maioria da totalidade de membros dos tribunais, evitando a insegurança jurídica advinda da constante mudança no entendimento dos tribunais.

Também consagrou a competência do Senado Federal para “suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário”, dando efeito erga omnes à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. (Constituição Federal de 1934, arts. 91, IV).

BRANCO, COELHO e MENDES (2010, p. 1196-1197), ensinam que se buscava “resolver o problema relativo à falta de eficácia geral das decisões tomadas pelo Supremo em sede de controle de constitucionalidade”. Porém, com base no direito comparado, tinha o constituinte dado poder excessivo ao Senado, que acabaria por transformar solução em problema, “com a cisão de competências entre o Supremo Tribunal e o Senado”.

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

A tendência inaugurada pela Constituição de 1891 foi mantida com a Constituição de 1934, onde se introduziu a primeira disposição que trata da reserva de plenário, ou seja, a inconstitucionalidade no âmbito do Tribunal só poderia ser proclamada pela maioria da totalidade dos seus membros, bem como se consagrou a competência do Senado Federal para suspender a execução de qualquer ato normativo, quando o Judiciário o houvesse declarado inconstitucional, conferindo, portanto, eficácia erga omnes à decisão do Supremo Tribunal Federal

No entendimento da maioria dos doutrinadores, a Constituição de 1934 revelou-se como um verdadeiro marco na progressão do país em direção a um controle direto de constitucionalidade, sendo que das inovações por ela trazida, a mais importante, neste sentido, foi a representação interventiva.

6.4. CONSTITUIÇÃO DE 1937

A Constituição de 1937, estatuída durante o Estado Novo e conhecida como “polaca”, sendo marcada pelo autoritarismo caracterizado por uma superconcentração do poder nas mãos do chefe do Poder Executivo que não permitia a atuação de um controle de constitucionalidade, dotado de liberdade e independência, como naturalmente deveria ser.

O seu artigo 96 dispôs que só por maioria absoluta de votos da totalidade dos juízes, poderiam os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou de ato do Presidente da República, todavia, o parágrafo único deste mesmo dispositivo ressalvava:

“No caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa do interesse nacional de alta monta, poderá o Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento: se este a confirmar por dois terços de votos em cada uma das Câmaras, ficará sem efeito a decisão do Tribunal.”

6.5. CONSTITUIÇÃO DE 1946

Em tempos de redemocratização do Brasil surge a Constituição de 1946, sendo que o sistema de controle de constitucionalidade continuou sendo o difuso (incidenter tantum), mantendo-se assim os mesmos preceitos trazidos pela Carta Magna de 1937. 

O texto constitucional de 1946, denominado de Constituição dos Estados Unidos do Brasil, surgiu com a derrocada de Getúlio Vargas, haja vista que a ditadura do Estado Novo passara a carecer de legitimidade em virtude da participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, ao lado de nações democráticas. Com a saída de Getulio Vargas, há o fim do denominado Estado Novo e tem início um período de redemocratização, no qual foram minimizadas as atribuições conferidas ao Poder Executivo, de modo a restabelecer o equilíbrio entre os poderes; ocorre a constitucionalização do mandado de segurança, a fim de possibilitar uma maior proteção dos direitos de caráter líquido e certo que não tenham a proteção conferida pelo hábeas corpus ou pela ação popular e a propriedade passa a ser submetida à sua função social, de modo que passa a ser possível a ocorrência da desapropriação quando da ocorrência de interesse de caráter social.

A grande novidade foi a Emenda Constitucional 16, de 26.11.1965, a qual alargou a Competência Originária do STF, através de nova redação dada à alínea k, do art. 110, inc. I, da Constituição de 1946, determinando que O Supremo Tribunal poderia processar e julgar “a representação contra inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa federal ou estadual, encaminhada pelo Procurador-Geral da República”.

Para VELOSO (2010, p. 33)

“O objetivo, como se vê, não era o de estabelecer um verdadeiro controle concentrado de constitucionalidade, pois a manifestação do STF, atendendo a representação do Procurador-Geral da República, não operava erga omnes, e tinha o escopo de constatar a violação de princípio constitucional sensível, para legitimar a decretação da intervenção da União no ente federativo. Mas a solução da Constituição de 1946 significou um novo e vigoroso passo para a instituição do controle concentrado.” 

6.6. CONSTITUIÇÃO DE 1967 E EC. 1/69

No regime da Constituição de 1967, assim como na vasta reforma empreendida através da Emenda Constitucional nº 1/69, foram mantidos, com míni mas alterações redacionais, os dispositivos constitucionais encontrados na Constituição de 1946 com a alteração da Emenda Constitucional nº 16/65 referentes ao controle de constitucionalidade.

Na Constituição de 1967/69 manteve-se a característica da duplicidade dos modelos adotados no Brasil, com a preservação do controle difuso e a subsistência da representação de inconstitucionalidade (ação direta de inconstitucionalidade), como acima referido.

Contudo, merece destaque o embate jurisprudencial e doutrinário acerca da natureza jurídica da referida representação de inconstitucionalidade: se dúplice ou não; bem como do exercício pelo Procurador-Geral da República do domínio da representação: direito versus poder-dever.

Embora, à época, não se tenha chegado a uma conclusão, nem doutrinária, nem no âmbito do Supremo Tribunal Federal, a discussão em muito contribuiu para a evolução do modelo de controle concentrado posteriormente adotado com o advento da Constituição de 1988.

A Constituição de 1967 não inseriu modificações de consistência no que se refere ao controle de constitucionalidade das leis. Todavia, uma transformação de relevo se fez por meio da Emenda n.º 1 de 1969  – ela determinou a criação do controle de constitucionalidade estadual, a qual se prestava à finalidade da intervenção no âmbito dos municípios.

6.7. CONSTITUIÇÃO DE 1988

A Constituição de 1988 amplia significativamente os meios de proteção judicial e conseqüentemente o controle de constitucionalidade das leis.

Ensina BRANCO, COELHO e MENDES (2010, p. 1101) sobre o controle de constitucionalidade da Constituição de 1988:

“A Constituição preservou a representação interventiva, destinada à aferição da compatibilidade de direito estadual com os chamados princípios sensíveis (CF, art. 34, VII, c/c o art. 36, III). Esse processo constitui pressuposto da intervenção federal, que, nos termos do art. 36, III, e § 1º, da Constituição, há de ser executada pelo Presidente da República. Tradicionalmente, é o Supremo Tribunal Federal competente para conhecer as causas e conflitos entre a União e os Estados, entre a União e o Distrito Federal ou entre os Estados entre si (art. 102, I, f). Tal como os outros países da América Latina, não dispõe a ordem jurídica brasileira de instrumento único para defesa de direitos subjetivos públicos”.

Por fim, foi com a Constituição cidadã, na denominação conferida à Lei Fundamental de 1988 pelo Deputado Federal Ulisses Guimarães, que, muito embora mantido modelo misto (concreto e abstrato) de controle da constitucionalidade, o dito controle abstrato/concentrado ganhou força, superando definitivamente o controle concreto/difuso.

Tal fenômeno se deve, principalmente, à considerável ampliação dos legitimados ativos à propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade (art. 103, CF/88); à criação da Ação Declaratória de Constitucionalidade por meio da Emenda Constitucional nº 3/1993 (art. 102, I, "a", CF/88); da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (art. 103, § 2º, CF/88); bem como, e por fim, através do desenvolvimento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (art. 102, § 1º, introduzido na CF/88 pela Emenda Constitucional nº 3/1993) que preencheu as lacunas existentes no modelo concentrado, permitindo a análise direta pelo Supremo Tribunal Federal de questões que antes somente poderiam ser discutidas por meio de Recursos Extraordinários, como a inconstitucionalidade de normas pré-constitucionais, controvérsia constitucional sobre normas já revogadas e a inconstitucionalidade de norma municipal em face da Constituição Federal

7. CONCLUSÃO

A afirmação da supremacia constitucional no ordenamento jurídico de um país está vinculada à noção da possibilidade de se realizar um controle de constitucionalidade, assim como também se relaciona com a solidez constitucional e a defesa dos direitos considerados fundamentais. É no texto constitucional que estão definidas a estrutura apresentada por m país, assim como as normas de caráter fundamental que norteiam a organização estatal.

Proceder ao controle de constitucionalidade, consiste em desempenhar um ato que se mostra vinculado à noção de supremacia do texto constitucional no ordenamento jurídico de que faz parte, assim como também é algo que se relaciona à idéia de rigidez constitucional e da proteção aos direitos considerados  fundamentais. É, dessa maneira, uma garantia de que os direitos e garantias fundamentais que são previstos no texto constitucional venham a ser objeto de respeito por parte das diversas normas que compõem um determinado ordenamento jurídico.

No que tange a realidade brasileira, observa-se que cada desses modelos de controle de constitucionalidade no Brasil, teve falhas de origem, notadamente porque foram copiados de maneira um tanto diferenciada em relação aos modelos originais. Isto gerou sérios problemas em nosso sistema jurisdicional de controle de constitucionalidade.

 A breve abordagem a respeito da evolução histórico-jurídica do Controle Jurisdicional de Constitucionalidade no Brasil se faz necessária na medida em que além de vislumbrar a sua importância, permite uma compreensão melhor das transformações ocorridas atualmente, no que tange a função originária de nossos Tribunais de zelarem pela supremacia de nossa Constituição, seja pela forma difusa ou concentrada.

 

Referências
AMORIM, Filipo Bruno Silva. Evolução histórica do controle de constitucionalidade nas Constituições brasileiras. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2502, 8 maio 2010 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/14815>. Acesso em: 3 mar. 3913.
BANDEIRA DE MELO, Oswaldo Aranha. A teoria das constituições rígidas. 2. ed. São Paulo: José Bushatsky, 1997.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
BESTER, Gisela Maria Direito Constitucional. São Paulo: Manole, 2005.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
BRANDÃO, Caio Rogério da Costa. Breve Histórico sobre o Controle Jurisdicional de Constitucionalidade no Brasil. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, no 173. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=1189> Acesso em: 3  mar. 2013
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. RT Legislação.
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7. ed.  Coimbra: Almedina, 2003.
CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 12. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006.
FREITAS JUNIOR, Lauro Francisco da Silva. Breves comentários ao controle de constitucionalidade no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 32, 1 jun. 1999 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/105>. Acesso em: 3 mar. 3913
HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 4. ed. rev. e atual., Belo Horizonte: Del Rey, 2003.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
MAMEDE, Mateus Lúcio. Evolução histórica do controle de constitucionalidade no direito brasileiro e o direito comparado. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 98, mar 2012. Disponível em: <http://www.ambito-ridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11235 >. Acesso em mar 2013.
MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocência Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 15. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
RODRIGUES, Débora Lima Silva. O controle de constitucionalidade na história das constituições brasileiras. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 5, no 256. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=1909> Acesso em: 3  mar. 2013
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 23. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
VELOSO, Zeno. Controle Jurisdicional de Constitucionalidade, 3. ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

Informações Sobre o Autor

Jayme Gustavo Arana

Procurador Federal AGU e especialista em Direito Processual Civil, Previdenciário e Constitucional


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!
logo Âmbito Jurídico