Internação compulsória de dependentes químicos

Resumo: Internação compulsória de dependentes químicos é um dos tipos das variadas internações elencadas na legislação pátria, devendo ser observados os seus limites individuais impostos pelos direitos fundamentais constitucionalmente traçados, bem como os princípios que as regem, sob pena de incorrer ofensa a um bem jurídico extremamente importante que é o direito à vida. A rápida proliferação das substâncias entorpecentes vem crescendo o número de seus usuários, com isso a dependência que nem sempre é tratada de maneira voluntária, ai entra o papel da internação compulsória.

Palavras-chave: compulsória; internação; princípios; ordem-pública; drogas.

Abstract: Compulsory hospitalization of drugs dependent, its one of a lot of kinds of internation in law, we have to respect their limits that are in fundamental norm and the principles that are incluse of this, if this are not respect, we offend the the human rights. The big demand of drugs, grow up the people who is dependent of this, and this people don’t want a voluntary hospitalization, because of this, its very important nowadays the compulsory treatment. 

Keywords: compulsory, hospitalization, principles, public-order, drugs.

Sumário: 1. Introdução. 2. Capacidade civil do dependente químico. 3. Conceito, finalidade e características das drogas e internação compulsória. 4. Competência federativa para a internação compulsória 5. O mínimo existêncial, princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à saúde frente à internação compulsória. 6. Conclusão. Referências.

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho contempla o tema “A Internação Compulsória de Dependentes Químicos”. O grande alastre de vários tipos de entorpecentes nos dias atuais, torna cada vez mais constante esse tipo de internação resguardando a ordem social e principalmente entes queridos que são afetados indiretamente com esse mal.

É extremamente importante a interferência dos entes federativos dentro desse mal social, uma vez que não podem se esquivar das obrigações constitucionalmente impostas sob o argumento de falta de estrutura física, orçamentária, políticas públicas, tratamento de dependentes químicos e afins.

Neste contexto, a questão problema que orienta a pesquisa é a seguinte: até que ponto esse tipo de insanidade afeta a ordem pública e a paz social de uma sociedade? Que ente federativo deve ser competente para tal feito?

O estudo trabalha com a hipótese de que as dificuldades orçamentárias existem e os recursos também, o que não existe, é a correta aplicação através dos entes federativos, não só na saúde, mas em todos os meios que regulamentam os direitos fundamentais de um cidadão, o que verdadeiramente acontece é que tais recursos desaparecem em um piscar dos olhos, não podendo converter-se em promessa constitucional inconsequente. A dependência química afeta principalmente a saúde mental do indivíduo, uma vez que as substâncias entorpecentes podem levar até mesmo ao ponto da necessidade do requerimento de interdição do dependente, podendo com isso, comprometer não só aqueles que convivem diariamente com o seu comportamento ofensivo e diferenciado em virtude da grande quantidade da droga em seu corpo, como também aquelas pessoas que convivem indiretamente com esse indivíduo.

Sendo assim, o objetivo geral deste trabalho é analisar qual a importância da internação compulsória juridicamente dentro do contexto social bem como qual ente federativo possui competência para tal ato.

De forma mais específica, pretende-se verificar a capacidade civil do dependente químico; identificar a competência federativa para a internação compulsória; realizar uma análise da importância da manutenção da ordem pública e analisar o mínimo existencial, princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à saúde.

Este tema é relevante porque apresenta a grande importância de sanar tal mal que aflige a sociedade de hoje que é o uso considerável das drogas em todas as classes sociais, tendo, com isso, uma consequência não só para o usuário, mas para todos que convivem diretamente ou indiretamente com ele. Com isso, requer permanente e cada vez mais aguda a atenção dos entes federativos.

A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica através de fontes indiretas, tais como: livros de Direito Constitucional, Jurisprudência, periódicos, sites jurídicos e revistas. 

O texto está dividido em oito partes, além desta introdução. O capítulo dois descreve a conceituação da capacidade civil e sua aplicação ante ao dependente químico. O terceiro expõe o conceito, finalidade e características das drogas e internação compulsória, o quarto nos ensina qual ente federativo é competente para tal tratamento de internação. O capítulo quinto aborda a existência do mínimo existencial, o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à saúde O sexto aborda a ordem pública e o dependente químico e sua relação ao convívio social. Finalmente, as conclusões são apresentadas no capítulo sete.

2 CAPACIDADE CIVIL DO DEPENDENTE QUÍMICO, ATRAVÉS DO USO CONTÍNUO E IMODERADO DA SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE

2.1 CAPACIDADE CIVIL

A capacidade civil pode ser definida pelo Direito Brasileiro como o direito de poder praticar todos os atos da vida civil, sendo importante para o Direito em qualquer ordenamento jurídico mundial, ganhando espaço próprio nas legislações respectivas. No Brasil, o assunto ganhou um capítulo exclusivo para o seu estudo nos codex civilistas e na Constituição Federal.

Percebe-se que tal instituto possui gigantesca importância no Direito, tanto que, desde Roma antiga, já se falava nesse termo, como escreve Beviláqua, (1999, p.120-123), onde faz referência a restitutio in integrum, dizendo ser este instituto: “no benefício concedido aos menores e às pessoas que se lhes equiparam, a fim de poderem anular quaisquer atos válidos sob outros pontos de vista, nos quais tenham sido lesadas”.

Todavia, é impossível se falar em capacidade para os atos da vida civil sem antes passar pelo estudo de sujeitos do direito e personalidade jurídica.

Sujeitos do direito são os entes que irão titularizar as mais variadas relações jurídicas. Dirão respeito não somente às pessoas naturais, mas também às pessoas jurídicas. Assim, estes entes serão sujeitos de direito pelo fato de serem dotados de capacidade, que é regida pelo artigo 1º do Código Civil (BRASIL, 2002) que diz que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

O referido artigo acima, nos mostra a existência da capacidade de direitos e deveres para todas as pessoas, quer sejam naturais ou jurídicas.

Capacidade de direito é a habilidade reconhecida às pessoas para serem sujeitos de direito.

Esta capacidade possui duas extensões, no tempo (quando começa) e no espaço (até onde ela é exercida).

O início da capacidade de direito é chamada de personalidade. Já a capacidade de direito no espaço é chamada de domicílio.

Personalidade jurídica, para a Teoria Geral do Direito Civil, é a aptidão genérica para se titularizar direitos e contrair obrigações, ou, em outras palavras, é o atributo necessário para ser sujeito de direito.

Assim, no instante em que se inicia o funcionamento do aparelho cárdio-respiratório, clinicamente aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno depois do parto, o recém-nascido adquire personalidade jurídica, tornando-se sujeito de direito, mesmo que venha a falecer minutos depois.

Assim, todas as pessoas que nascem com vida são dotadas de capacidade de direito, independente de qualquer condição, adquirem personalidade.

A capacidade de fato, não se confunde com a capacidade de direito, uma vez que aquela é a aptidão para um sujeito de direito exercer pessoalmente os atos relevantes, juridicamente, na vida civil, os chamados atos jurídicos. A capacidade de fato, pressupõe a capacidade de direito. Todos que possuem a capacidade de fato, também possuem a capacidade de direito, entretanto, o contrário não é verdadeiro.

Isso posto, pode-se dizer que existem duas formas de capacidade: capacidade de fato e capacidade de direito. O presente estudo baseia-se na capacidade de fato.

Com efeito, diante do que foi relatado, chega-se à conclusão que a capacidade, para prática de todos os atos da vida civil, não é inclusiva e não é pressuposto de todos, mas, ao contrário, é exclusiva para quem a adquire não a perca.

O Código Civil Brasileiro de 2002, em seus artigos iniciais, mostra que a capacidade de fato pode ser limitada, ou seja, os atos da vida civil podem ser delineados apenas para determinados tipos de pessoas, distinguindo as mesmas em absolutamente incapazes e relativamente incapazes conforme rol do 3º e 4º  in verbis (BRASIL, 2002, p.1):

“Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I – os menores de dezesseis anos;

II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:

I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;

III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV – os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.”

O absolutamente incapaz é aquele que não possui qualquer capacidade civil de fato, ou seja, não possui aptidão para agir sozinho dentro do ponto de vista jurídico, devendo, obrigatoriamente, ser representados por uma pessoa legalmente constituída para assumir tal encargo, sob pena de nulidade do ato.

Por outro lado, para melhor classificar os relativamente incapazes, pode-se dizer que “constituem categoria de pessoas igualmente necessitadas de proteção jurídica, porém em grau inferior aos absolutamente incapazes”. Rosenvald e Farias, (2007, p. 210). Estes necessitam de serem assistidos para praticar atos da vida civil, sob pena de anulação desses atos.

Existem alguns critérios para determinar a capacidade de fato de uma pessoa, podendo ser objetivo, que leva em consideração tão somente a idade, ou seja, há uma presunção absoluta de incapacidade de menores, absoluta porque o critério que determina é o biológico (objetivo) e o critério subjetivo que verifica se a pessoa está habilitada para exercer o ato, se ela possuir discernimento suficiente para lhe permitir exercer pessoalmente os atos da vida civil, que será apurado dentro de um processo de interdição.

Interditar uma pessoa é reconhecer judicialmente que ela não poderá praticar pessoalmente os atos da vida civil e diante do uso contínuo e imoderado de determinadas drogas, o indivíduo pode ser submetido a graves consequências, levando-o a um estado em que não poderá mais exercer os atos da vida civil, uma vez que as substâncias entorpecentes geram graves sequelas ao corpo humano, conforme se vê no próximo capítulo.

3 CONCEITO, FINALIDADE E CARACTERÍSTICAS DAS DROGAS E INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA

3.1 DROGAS E SUA CONSEQUÊNCIA

3.1.1 Conceito de drogas

A palavra “droga” de acordo com o dicionário Houaiss da língua portuguesa (2010, p.1085) significa: “qualquer produto alucinógeno (ácido lisérgico, heroína etc.) que leve a dependência química”.

O conceito de drogas no ordenamento jurídico brasileiro se encontra na Lei de Drogas – Lei nº 11.343/2006 – em seu artigo 1º, parágrafo único, que reza (BRASIL, 2006, p.1):

“[…] Parágrafo único.  Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”.

A lista de drogas elucidada no parágrafo único do artigo 1º é elaborada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que é uma instituição do Governo Brasileiro competente para tanto.

Todavia, de acordo com Organização Mundial de Saúde, droga é toda substância não produzida pelo organismo que tem a possibilidade de agir em um ou mais sistemas, criando várias alterações, tanto psíquicas como físicas.

Existem drogas consideradas benéficas, tendo a finalidade de tratamento de doenças que são os medicamentos. Todavia, também existem aquelas drogas que só trazem malefícios à saúde. Assim, pode existir uma mesma substância que atua tanto como medicamento quanto tóxico em determinadas situações.

As drogas maléficas mudam o trabalho cerebral, o que resulta em alterações no estado mental e no psiquismo do dependente químico. Diante de tal situação, essas substâncias são nomeadas de psicoativas, possuindo a capacidade de provocar uma dependência profunda.

Os efeitos das drogas dependem da sua composição, frequência em que é consumida, o contexto em que é inserida e ainda a pretensão do usuário.

O psiquiatra Huguet, (2012, p.1) diz sobre alguns efeitos do uso contínuo de uma substância entorpecente:

“Podem provocar complicações neurológicas que incluem cefaléia, tonteira, desmaios, coordenação diminuída, convulsões e encefalopatias. Usuários de cocaína tem um risco 14 vezes maior de sofrer AVC (acidente vascular cerebral). Usuários crônicos podem apresentar tremores e alterações da motricidade. Overdoses podem ser fatais devido à hipertermia (elevação da temperatura corporal), convulsões, AVC, infarto, arritmias ou insuficiência renal. O uso crônico de maconha leva a alterações cognitivas, na memória, atenção, na motivação, no raciocínio, que podem persistir por horas ou dias após a intoxicação. Não é claro se esses efeitos são plenamente reversíveis com a abstinência”.

Cada substância tem uma característica peculiar que provoca diversas reações diferentes, como aumentar os estímulos nervosos, deixando a pessoa mais eufórica, e com sensações de prazer.

As drogas mais utilizadas e mais comuns no Brasil são: o álcool, anfetaminas, maconha, crack, cocaína, lança perfume e a cola de sapateiro.

Em suma, o uso contínuo e imoderado de qualquer das substâncias elencadas no parágrafo anterior causam graves consequências no organismo como lapsos na memória, falta de sono, falta de apetite, atingindo o aparelho digestivo, nervoso e circulatório, podendo levar ao óbito de acordo com a grande quantidade de consumo, até mesmo a maconha que muitos pensam não trazer qualquer malefício ao longo do seu contínuo uso, causa dependência e consequências físicas e psicológicas, criando problemas de saúde semelhante aos de fumantes de cigarro.

Não podemos deixar de mencionar aqui uma das drogas que possui a maior consequência negativa no corpo humano, o crack. Essa substância entorpecente causa uma rápida dependência e é muito procurada por ter um valor mais barato e ter efeitos mais fortes do que outras drogas. O crack pode causar efeitos ao ritmo cardíaco, com isso pode levar o usuário até mesmo a uma parada cardíaca e um derrame. Além das consequências físicas, o uso imoderado desta substância gera uma oscilação drástica de humor e problemas psiquiátricos, como a paranóia, alucinações e delírios.

Conforme Pacievith nos ensina em seu artigo (2012, p.1):

“Por ser inalado, os crack chega rapidamente ao cérebro, por isso seus efeitos são sentidos quase imediatamente – em 10 a 15 segundos – no entanto, tais efeitos duram em média 5 minutos, o que leva o usuário a usar o crack muitas vezes em curtos períodos de tempo, tornando-se dependente rapidamente. Daí o grande poder de causar dependência do crack. Após tornar-se dependente, sem a droga o usuário entra em depressão e sente um grande cansaço, além de sentir a “fissura”, que é a compulsão para usar a droga, que no caso do crack é avassaladora. O uso contínuo de grandes quantidades de crack leva o usuário a tornar-se extremamente agressivo, chegando a ficar paranóico, daí a gíria “nóia”, como referência ao usuário de crack. Problemas mentais sérios, problemas respiratórios, derrames e infartos são as consequências mais comuns do uso do crack”.

Por fim, podemos analisar que não somente as drogas tituladas como as “mais fortes” podem causar grandes prejuízos ao corpo humano, mas também aquelas que, mesmo menos agressivas, com o uso contínuo e imoderado, podem resultar em malefícios, embora reversíveis através do devido tratamento.

3.2 ASPECTOS GERAIS DA INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA SOB A ÓTICA DA LEI 10.216/2001.

A rápida demanda de drogas ilícitas no cotidiano da sociedade contribuiu profundamente para que várias pessoas se tornassem usuárias e, por consequência, dependentes deste tipo de substância que afeta diretamente o organismo através do uso imoderado.

Com isso, a busca para o tratamento de tais resultados cresce de forma considerável, todavia, a maioria da população não possui condição financeira para arcar com esse tipo de tratamento para a maioria dos usuários.

No nosso ordenamento jurídico não existe uma lei específica para o tema em tela, mas com a crescente demanda de usuários de diversos tipos de droga, juízes e tribunais contribuem para o tema com centenas de decisões com inúmeros tipos de posicionamento.

Nas internações que acontecem no país, sob o regime da Lei nº 10.216/2001, somente a internação do tipo compulsória passa sob a avaliação do Poder Judiciário, porém, é garantia constitucional a qualquer pessoa que sentir-se lesado, procurar o Judiciário, debater sobre a qualquer tipo de internação.

Com efeito, de acordo com a referida legislação, a internação ocorre mediante apresentação de laudo médico que caracterize extrema necessidade, devendo o médico ser devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina do Estado onde se localize o estabelecimento, não podendo esquecer também que a lei em tela assevera um vasto amparo ao doente mental, principalmente no que diz respeito com o seu tratamento médico. Nesse sentido, vejamos os principais dispositivos da referida lei, in verbis (BRASIL, 2001, p.1):

“Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:

I – ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;

II – ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; […]

V – ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;

Art. 3º É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.

Art. 4º A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

§ 1º O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio.

§ 2º O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros.

Art. 5º O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.

Art. 6º A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos.

Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:

I – internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;

II – internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e

III – internação compulsória: aquela determinada pela Justiça. […]

Art. 9º A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários.” (BRASIL, 2001).

Os tipos de internação elencados na lei são a voluntária, que é sob a anuência do paciente, a involuntária, que é sem o consentimento do paciente, e a compulsória, que é essencialmente decidida pelo Judiciário.

“Art. 7º A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a consente, deve assinar, no momento da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de tratamento.

Parágrafo único. O término da internação voluntária dar-se-á por solicitação escrita do paciente ou por determinação do médico assistente.

Art. 8º A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina – CRM do Estado onde se localize o estabelecimento.

§ 1º A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta.

§ 2º O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do familiar, ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento.

Art. 9º A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários.” (BRASIL, 2001, p.1).

Conforme preconiza a referida lei, em seu art. 9º, a internação compulsória determinada pela Justiça levará em conta o estado das clínicas especializadas, sua segurança e a garantia de resguardo do paciente, de sua família e meio social, sendo permitida através de laudo médico que ateste extrema necessidade da internação e ainda a anuência dos familiares quanto a medida tomada.

Evidencia-se ainda que os "princípios para a proteção de pessoas acometidas de transtorno mental e para a melhoria da assistência à saúde mental", aprovados em 17 de Novembro de 1991, pela Organização das Nações Unidas, enfatiza o estudo em evidência, consagrando a máxima urgência na permissão elucidada para a gerência de qualquer tratamento. Concede, entretanto, dadas algumas exceções, no caso da recusa ilógica do paciente em sujeitar-se ao tratamento, que a permissão seja suprida por um representante pessoal ou por um órgão superior independente.

Em ambas as situações acima, o paciente tem que preencher os seguintes requisitos: a) avaliação diagnóstica; b) o propósito, método, duração estimada e benefício esperado do tratamento proposto; c) os modos alternativos de tratamento, inclusive aqueles menos invasivos; d) possíveis dores ou desconfortos, riscos e efeitos colaterais do tratamento proposto.

Cabe esclarecer que a permissão acima dita deve ser adquirida livremente, sem coerções, ameaças ou induzimentos impróprios, após a explanação apropriada com as informações adequadas e compreensíveis.

A internação compulsória dá-se pelo tipo de tratamento compelido ao paciente, ou seja, sem a sua autorização, para sanar um tipo de mal que afeta não só o paciente em si, mas os que estão ao seu redor, no caso, a dependência química.

O norte deste tratamento não é especificamente o usuário que não possui o regular recurso para o tratamento privado e que encontra afastado do seio familiar somente para usar as substâncias entorpecentes, mas o restabelecimento de sua identidade e seu vínculo de referências (familiar, social e profissional), recuperando suas habilidades e qualidades mais positivas.

A interrupção do uso de drogas é uma consequência da reflexão e da adequação destes valores, reabilitando-o fisicamente, socialmente e o mais importante, mentalmente.

A internação compulsória atualmente é uma medida excepcional, tendo em vista que a regra é a possibilidade de um tratamento convencional e de reintegração do usuário a sociedade de uma maneira voluntária. De acordo com a Lei 10.216/2001, a internação é precedida de uma série de avaliações multidisciplinares e laudos médicos que justifiquem a internação (BRASIL, 2001).

Todavia, não é somente função do Estado garantir a recuperação do dependente, mas à família cabe o incentivo fundamental no processo de reestruturação. Na dependência, a família, diante da vulnerabilidade de um de seus membros, sente muito, juntamente com o usuário, enfraquecendo seus membros que sem perceber, agem como facilitadores do uso de drogas, pois as personalidades e características em momento de crise enriquecem diante do dano causado por esse tipo de transtorno.

O tratamento para ser realmente efetivo não precisa ser voluntário, uma vez que o ambiente deve favorecer a efetiva recuperação do paciente, ou seja, quanto mais especializado e direcionado para a real recuperação do dependente, mais os resultados são visíveis, por isso o Estado deve realmente investir consideravelmente neste tipo de diagnóstico.

4 COMPETÊNCIA FEDERATIVA PARA A INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA

A verificação de um direito legítimo pelo ordenamento jurídico de um Estado, principalmente, quando se trata de direito fundamental ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana e a vida, precisaria de um sentido se não fosse concedido a uma pessoa igual direito a uma ordem judicial que facilitasse sua efetiva execução em determinados casos de transgressão ou omissão.

Nesse contexto, o Sistema de Justiça contrai um importante papel para a confirmação dos direitos certificados pelo sistema legal, e deve, por isso mesmo, agir no sentido de conceder a devida ajuda ao cidadão titular de tal direito constitucionalmente garantido e principalmente quando se trata de indivíduo em estado de vulnerabilidade, como é o caso daqueles que precisam recorrer à via judiciária para efetivamente fazer valer seu direito constitucional à devida assistência a sua saúde.

A Constituição Federal, em seu artigo 196 afirma que o direito à saúde é de todos e dever do Estado, colocando tal direito no rol de direitos fundamentais, indisponíveis e inalienáveis assim como todos os demais direitos sociais.

Como preconiza Morais (2006, p. 758):

“A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário e ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (CF, art. 196), sendo de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou por meio de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado” (CF, art. 197).

É imprescindível que tais características legalmente instituídas, impliquem em eficácias quando da sua aplicabilidade.

O art. 6º da Carta Magna garante o efetivo direito à saúde posto como fundamental no ordenamento social brasileiro e ainda o artigo 5º em seu §1º nos garante a sua aplicação imediata (BRASIL, 1988).

Assim também, os artigos. 196 a 200 trazem elencados os devidos entendimentos quanto ao papel do Estado no que diz respeito ao direto de assistência à saúde, destacando-se o art. 198 que define o Sistema Único de Saúde – SUS.

Como cediço, o problema do uso de drogas, é, atualmente, uma questão de cunho social, que requer a atenção das entidades federativas, em todos os níveis de governo, não podendo se esquivar de suas obrigações constitucionalmente traçadas, ainda que na forma de normatização programática, sob o argumento de ausência de estrutura física, ou de projetos e ações de implementação de uma política de prevenção, tratamento e recuperação de dependentes químicos, mormente se considerando a existência de orçamento financeiro, a demanda social pelo atendimento médico específico e o caráter de direito fundamental dos direitos subjetivos lesados, no caso, o direito à saúde.

É inquestionável que trata-se de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência (CF, artigo 23, inciso ll), cujas ações e serviços, no entanto, integram uma “rede regionalizada e hierarquizada” e constituam um sistema único, a teor do disposto no artigo 198 da Constituição Federal (BRASIL, 1988).

Diante do exposto, não se tem razão em afirmar que a competência está intimamente ligada a somente um ente federativo, uma vez que é de responsabilidade solidária, pois o direito à saúde é fundamental à proteção à vida.

Todavia, é exercida no âmbito dos Municípios, entes federados também responsáveis pela assistência à saúde e garantidores de acesso universal e igualitário do cidadão aos serviços a ela inerentes nos moldes do artigo 9º da lei 8080/90:

“Art. 9º A direção do Sistema Único de Saúde (SUS) é única, de acordo com o inciso I do art. 198 da Constituição Federal, sendo exercida em cada esfera de governo pelos seguintes órgãos:

I – no âmbito da União, pelo Ministério da Saúde;

II – no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente; e

III – no âmbito dos Municípios, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente.” (BRASIL, 1990, p.2).

E ainda, o sistema de solidariedade de competências, tal qual lançado no artigo 23, ll da Carta Magna, marca a competência concorrente ao município, para determinar as ações e o modo de execução dos serviços públicos, relativamente ligados à saúde dos municípios.

Diante de tal situação, os Municípios devem garantir o direito à saúde e à vida, mediante a implementação de políticas e o emprego dos recursos necessários a sua real promoção, proteção e recuperação, ainda que mediante o custeio para o tratamento prescrito em entidades privadas, se ausente entidade com o devido convênio do SUS para a sua realização e o efetivo êxito em determinados tratamentos.

Em sendo assim, os entes federativos possuem responsabilidade solidária quanto ao oferecimento de benefícios à efetivação e promoção da saúde, à desintoxicação de um dependente de drogas e seu devido tratamento,  custeando-o, a fim de dar proteção ao direito à vida.

Neste mesmo sentido, decidiu o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:

“EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – MAIOR INCAPAZ DEPENDENTE QUÍMICO – DIREITO À SAÚDE – GARANTIA CONSTITUCIONAL – INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DO PACIENTE – OBRIGAÇÃO/DEVER DE FAZER DO ESTADO – MULTA COMINATÓRIA – POSSIBILIDADE – RECURSO DESPROVIDO. – Conforme previsão do art. 196 da CR/88, a saúde é direito de todos e dever do Estado, que deve garantir mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, sendo que tal direito rege-se pelos princípios da universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços que a promovem, protegem e recuperam. – Comprovada nos autos a necessidade de submissão do representado à internação em clínica especializada, esta deve ser proporcionada pelo Estado, haja vista que a obrigação de prestar o serviço de saúde pública, incluindo-se a realização de tratamento para dependentes químicos, de forma gratuita, é de qualquer dos entes federativos”.   (TJMG.. Agravo de Instrumento Cv  1.0342.12.007079-8/001, Relator(a): Des.(a) Hilda Teixeira da Costa , 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/12/2012, publicação da súmula em 10/01/2013) (MINAS GERAIS, 2013, p.1)

“Agravo de instrumento- Internação compulsória para tratamento de dependência química- Família e políticas públicas- Efetivação do direito à saúde- Tutela antecipada deferida- Fixação de multa- Possibilidade- Agravo a que se nega provimento. 1. A Constituição da República, de 1988, preceitua em seu artigo 196 que a saúde é direito de todos e dever do Estado, aí entendido em sentido amplo, contemplando os entes federados União, Estados e Municípios. 2. Se, nas comunidades tradicionais, a família se ocupava quase exclusivamente da proteção social dos membros que estavam sob sua tutela, nas comunidades contemporâneas elas são compartilhadas com o Estado pela via das políticas públicas.” (TJMG. Agravo de Instrumento Cv  1.0188.13.000370-3/001, Relator(a): Des.(a) Marcelo Rodrigues , 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 06/08/2013, publicação da súmula em 21/08/2013) (MINAS GERAIS, 2013, p.1)

“AÇÃO ORDINÁRIA – INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA – MUNICIPIO E ESTADO – OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA – GARANTIA CONSTITUCIONAL DO CIDADÃO NECESSITADO – DIREITO RESGUARDADO – PRAZO – DILAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O direito à saúde deve ser garantido de forma solidária por todos os entes da federação (arts. 196 e 198, da CF). A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Poder Público prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, garantindo o fornecimento de medicamentos, instrumentos médicos, exames, procedimentos cirúrgicos, tratamentos psicológicos, internação, entre outros, se necessário, de forma gratuita para tratamento de pacientes do SUS portadores de doença grave, em vista da urgência e consequências que possam acarretar sua não realização. A dependência química é doença grave que deve ser tratada imediatamente, buscando-se, assim, afastar consequências ainda mais nefastas à vida do menor necessitado e de seus familiares. Diante da dificuldade que diligências administrativas possam gerar, é possível a dilatação do prazo para cumprimento da liminar, possibilitando ao Município a localização de estabelecimento adequado para o tratamento do menor”.(TJMG. Agravo de Instrumento Cv  1.0141.11.001503-1/001, Relator(a): Des.(a) Edilson Fernandes , 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 24/01/2012, publicação da súmula em 03/02/2012) (MINAS GERAIS, 2012, p.1)

Não no intuito de ser prolixo, todavia, é imperioso esclarecer a pertinência subjetiva de tal assunto, que deve-se ao comando da Constituição Federal no sentido de que as ações e serviços públicos da saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único a ser financiado com recursos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes (art. 198).

Por sua vez, o artigo 4º da Lei nº 8.080/90 disciplina que o Sistema Único de Saúde – SUS é constituído pelo conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público (BRASIL, 1990).

Nesse contexto, ainda que a Administração Pública deva se alicerçar por referências atuariais, nada pode obstruir o fim último de comando constitucional, devendo-se ver o direito do cidadão em toda a sua extensão, independentemente dos contornos das políticas públicas e gestão de recursos.

Desta forma, incumbe ao cidadão optar por qual ente público deve lhe prestar assistência à saúde em atendimento à norma do artigo 196 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), pois todos são legitimados passivos para tanto, à luz das normas vigentes, antes referidas, que regulamentaram a norma constitucional mencionada.

5 O MÍNIMO EXISTÊNCIAL, PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À SAÚDE FRENTE À INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA.

Em se tratando de um assunto como o do presente estudo, que  envolve tanto normas-princípio como princípios morais, sociais e de costume, sempre haverá discussão quanto a existência de sobreposição de um sobre o outro, ou se um está correto e outros incorretos, porém, é mister que se faça um estudo dos centrais nortes da fundamentação para a internação compulsória, a seguir citados.

5.1 O MÍNIMO EXISTÊNCIAL

A negativa do Estado em relação ao tratamento de saúde indispensável à sobrevivência condigna configura afronta ao mínimo existencial, caracterizado também pela dignidade da pessoa humana, pois é obrigação do Estado resgatar o dependente químico do abandono social e oferecer suas garantias constitucionais (artigo 1º, inciso lll, da CF). (Brasil, 2011).

De acordo com Barcellos (2011 p.230), o mínimo existencial corresponde, então, a um conjunto de situações materiais indispensáveis à existência:

“[…] Não vemos como, em relação aos direitos fundamentais sociais mais básicos, como o trabalho, a saúde e a educação, eNão possam ser concebidos e valorados como “direitos prestacionais de natureza subjetiva” naquilo que neles possa ser tido por eminentemente “pessoal”, isto é, diretamente decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana na sua dupla dimensão”individual”e “social”, numa palavra “ser socialmente integrado”.

No que tange à necessidade da preservação do mínimo existencial do cidadão diante da ausência de outros meios menos agressivos para se chegar ao mesmo resultado, deve o Poder Público, justificada a extrema necessidade e o perigo de um dano efetivo, efetuar a internação e intervenções de que precisa o paciente.

Assim, o mínimo existencial é o princípio e o pedestal para uma vida digna e humana. Refere-se a um direito constitucionalmente garantido, sendo ele fundamental e essencial.

O Mínimo existencial é diretamente ligado a justiça social, vez que trata-se de um direito relacionado as necessidades mínimas de existência humana garantido pelos direitos sociais que são efetivados através de programas feitos pelo Estado, sendo assim, normas programáticas.

5.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O princípio da dignidade da pessoa humana está diretamente ligado ao direito à vida, como Morais nos ensina: “O direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos.” (2006, p.30).

Na nossa Carta Magna é assegurado a dignidade da pessoa humana (art.1º, III, CF) como o princípio basilar do ordenamento jurídico brasileiro, de forma que a segurança e a efetividade do direito à saúde deve ser observada, também, sob a visão de tal princípio, como destaca Rosenvald e Farias (2007, p.98):

“[…] destaca-se que o mais precioso valor da ordem jurídica brasileira, erigido como fundamental pela Constituição de 1988 é a dignidade humana. Assim, como consectário, impõe reconhecer a elevação do ser humano ao centro de todo o sistema jurídico, no sentido de que as normas são feitas para a pessoa e para a sua realização existencial, devendo garantir um mínimo de direitos fundamentais que sejam vocacionados para lhe proporcionar vida com dignidade.”

Assim, a escolha do princípio da dignidade da pessoa humana como fundamental no ordenamento jurídico pátrio, garante a efetiva tutela à pessoa humana, tornando-se um valor máximo, centro o centro do posicionamento de toda e qualquer norma jurídica.

Aplica-se aqui o respeito à integridade física da pessoa, o pressuposto da existência do mínimo existencial, já estudado acima, e ainda o respeito à liberdade e igualdade.

Todavia, esse princípio deve ser observado pelas autoridades brasileiras, uma vez que devem favorecer ao usuário de drogas o devido acesso a clínicas especializadas na reconstituição de sua saúde e bem estar social, que atue de uma maneira efetiva, proporcionando resultados positivos.

O conselho federal de psicologia em parceria com o conselho regional de psicologia de Brasília, realizou em 2011 a 4ª inspeção nacional de direitos humanos nos locais de internação de dependentes químicos, constatando várias irregularidades, ameaçando o regular efetivo da internação compulsória.

No final do relatório, em sua conclusão (2011, p. 192), possibilita a visualização de uma má administração do poder público em relação ao destino de verbas para a internação compulsória, preconizando:

“Não são poucas as instituições que recebem recursos públicos ou, ainda, que são reconhecidas como instituições de “utilidade pública”, ficando, portanto, isentas do pagamento de impostos, um modo de subvenção pública que tem sido objeto de denúncias. Número significativo dessas instituições mantém convênios com diferentes órgãos públicos. E isto impõe ao Estado a tarefa da fiscalização quanto ao rigor da aplicação dos referidos recursos, mas, sobretudo, quanto à vigilância pela proteção e defesa dos direitos sociais e humanos dos assistidos. A realidade encontrada exige reposicionamento do Estado brasileiro”.

Pode-se concluir que o respeito à dignidade da pessoa humana está diretamente ligado as qualidades do local de tratamento, sendo este fundamental para o sucesso e para a retomada do usuário de drogas para uma vida mais saudável e ainda para a sociedade em que vivia antes de se tornar um dependente, colocando, assim, em primeiro lugar o direito à vida.

5.3 DIREITO À SAÚDE

Direito é um sistema de normas que tendem a manter uma harmonia social, que regulamenta o comportamento humano dentro de uma sociedade. As demarcações às condutas humanas são colocadas exatamente para que todos possam desfrutar igualmente das vantagens da vida dentro da sociedade

Como se não fosse suficiente, tal direito encontra proteção na própria Declaração Universal da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1948, que afirma terminantemente que a saúde e o bem-estar da humanidade são direitos fundamentais do ser humano.

No mesmo caminho, nas convenções e nos tratados internacionais, reconhecidos e ratificados pelo Brasil, também são encontradas referências ao direito à saúde como direito social fundamental.

O direito á saúde deve conter aspectos sociais e observado como direito individual que proporciona uma liberdade para o indivíduo, para, por exemplo, escolher o tipo de tratamento que quer para uma determinada doença, dentre outras coisas.

Assim, para buscar dentro de uma sociedade o bem-estar, a existência de normas que regulamentam a saúde é fundamental, como por exemplo a vacinação e o isolamento de alimentos nocivos à saúde.

A garantia de liberdade ora explanada se dá de acordo com os recursos que o Estado vai proporcionar ao seu cidadão para um efetivo tratamento. Quanto mais o Estado é desenvolvido, mais o cidadão é livre para procurar o tratamento mais adequado e poderá oferecer as medidas de saúde para todo o povo.

A Constituição de 1988, que é a Carta Magna do nosso ordenamento jurídico, proporciona o direito à saúde como um direito fundamental-social garantido, efetivando as inúmeras declarações internacionais de direitos humanos, depois das atrocidades nazistas sofridas na Segunda Guerra Mundial.

Ao longo de nossa Constituição, muitas são as normas que regulamentam o direito à saúde, todas com a mesma hierarquia, o que demonstra a extrema preocupação do Estado na garantia do direito á saúde, a efetivas ações e programas e ainda a uma vasta possibilidade efetivação desse direito juridicamente.

Todavia, princípios que limitam a concretização desse direito quais sejam o princípio da reserva do possível, o princípio da proporcionalidade e o princípio da igualdade.

O princípio da igualdade, com suas inúmeras interpretações, dentro do direito à saúde, é proporcionalizar um tratamento adequado e um efetivo acesso à proteção do bem jurídico que é a vida.

O princípio da proporcionalidade serve de limitações da validade dos direitos fundamentais, sendo isso possível conforme a necessidade, a adequação e a vedação de certos excessos.

Com isso, a medida almejada deve atingir o melhor fim, causando o menor prejuízo possível, e as vantagens superarem as desvantagens, podendo, desta forma, ter direitos fundamentais limitados em garantia a outros direitos em tela.

O princípio da reserva do possível, regula a área de atuação do Estado em realização a alguns direitos fundamentais, como o direito à saúde, diante da possibilidade de recursos disponíveis.

Observe-se que, embora algumas decisões judiciais estejam legalmente vinculadas, é evidente que a sua efetuação está subordinada, dentre outras coisas que a regulam, como a reserva do financeiramente possível.

A simples alegação de uma delimitação orçamentária, ainda que extremamente importante para a análise da questão, não satisfaz para demarcar o acesso dos cidadãos ao direito à saúde garantido pela Constituição Federal, uma vez que os recursos existem, o que não existe é sua correta implementação.

O que acontece é que o Poder Público afirma não possuir recursos para cumprir uma ordem judicial, mas não prova as alegações, deixando de dar efetividade a uma ordem constitucional. Deve-se provar aqui se a decisão judicial causará mais danos do que vantagens, fazendo uma ponderação desses valores.

Com efeito, o que é de extrema importância ao magistrado observar é até qual ponto a sua ordem terá efetividade sem colocar em risco o equilíbrio financeiro do SUS, principalmente em meio a uma crise econômica.

Assim, o Poder Executivo e o Poder Judiciário devem ter um amplo diálogo para sanar todos esses problemas orçamentários, sem acontecer o desgaste entre esses poderes e ainda entre outros agentes fiscalizadores.

Ante o exposto, o direito à saúde é constitucionalmente garantido por ser um direito fundamental social ligado também ao direito à vida e ao princípio da dignidade da pessoa humana. Em caso de omissão do Poder Público quanto a garantia desse direito, o Sistema Jurídico entra em cena para a efetividade desse importante direito.

6 CONCLUSÃO

O presente trabalho tem o escopo principal de demonstrar a amplitude das consequências do uso contínuo e imoderado das drogas, tendo em vista a rapidez da sua proliferação em todo o meio em que vivemos.

Para tanto, é imprescindível que se evidencie o conceitos de droga e a partir de qual momento é ideal para a efetivação da internação compulsória.

Nesse sentido, o usuário de drogas poderá chegar a tal ponto que não poderá mais exercer pessoalmente os atos da vida civil, por todos os resultados que o efeito do uso imoderado das substâncias entorpecentes pode trazer para o organismo.

Para que seja resguardado o direito à vida do usuário de droga, é necessário que este, voluntariamente, procure o devido tratamento para sanar a dependência, Todavia, na maioria dos casos, esse tratamento não é realizado, o que afeta diretamente a ordem pública do meio em que o viciado vive, entrando em cena a internação compulsória.

A internação compulsória tem o objetivo de tratar tal vício e inserir o usuário de volta ao meio em que vivia, respeitando a dignidade da pessoa humana e o direito á vida, respeitando os requisitos traçados pela legislação pátria.

Para que o sucesso do tratamento seja efetivo, as clínicas devem ser bem estruturadas e ainda contar com profissionais qualificados e especializados para esta determinada situação o que geralmente dezenas de famílias, na busca de tratar o membro usuário, não consta com o devido orçamento para realizar tal feito.

Assim, cabe ao Estado promover o mínimo existencial em respeito a um direito fundamentalmente traçado na sua Carta Magna que é o direito à saúde, o que demonstra no artigo 196 do citado diploma legal (BRASIL 1988).

Foi demonstrado também os limites traçados para acontecer a determinada internação compulsória, de acordo com a Lei nº 10.216/91 e ainda várias jurisprudência pátrias sobre este assunto.

Por fim este trabalho vem traçar qual são os objetivos para a internação e para um efetivo tratamento através do dever de proporcionar ao cidadão o direito à saúde e o mínimo existencial para a garantia de uma vida digna e saudável.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Letícia Alvernaz Gomes de Sousa

Graduada em Direito. FADIVALE – Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce, conclusão em 2015. Pós Graduanda em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho – Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce. Advogada


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