Os medicamentos de alto custo, também conhecidos como medicamentos excepcionais ou de uso especializado, são aqueles cujo valor de mercado é elevado e que geralmente são utilizados para o tratamento de doenças crônicas, raras ou graves, como câncer, doenças autoimunes, esclerose múltipla, HIV, hepatites virais, entre outras. Esses medicamentos nem sempre estão disponíveis na rede privada, e o custo para o paciente pode ser inviável. Por isso, é fundamental entender quais são os direitos do cidadão, como garantir o acesso a esses tratamentos, e o que fazer quando há negativa por parte do Estado ou dos planos de saúde.
Neste artigo, abordamos de forma detalhada o que são os medicamentos de alto custo, como funcionam as políticas públicas para seu fornecimento, a responsabilidade do SUS, dos planos de saúde e do poder judiciário, além de ensinar passo a passo como agir para obter o fornecimento gratuito ou judicial desses remédios, quando necessário.
O que são medicamentos de alto custo
Medicamentos de alto custo são fármacos com preços significativamente elevados, geralmente superiores à média de mercado, e que exigem controle rigoroso de prescrição e distribuição. Eles são utilizados no tratamento de doenças que demandam terapias complexas e contínuas, como:
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Doenças autoimunes (artrite reumatoide, lúpus, psoríase)
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Câncer
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Esclerose múltipla
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HIV e Aids
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Fibrose cística
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Doenças raras (como AME – atrofia muscular espinhal)
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Hepatites crônicas
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Doenças inflamatórias intestinais (como Crohn e retocolite ulcerativa)
Esses medicamentos, muitas vezes de origem biológica, imunobiológicos ou importados, são registrados na Anvisa e passam por critérios rigorosos de prescrição e aprovação de uso, tanto na rede pública quanto privada.
Por que esses medicamentos são tão caros
Diversos fatores contribuem para o alto custo desses medicamentos. Entre os principais estão:
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Tecnologia de ponta no desenvolvimento (biotecnologia, engenharia genética)
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Baixa escala de produção, principalmente em casos de doenças raras
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Pesquisas clínicas demoradas e caras
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Registro e regulação internacional
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Necessidade de armazenamento especial e transporte com cadeia de frio
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Importação e encargos tributários
Além disso, muitas vezes são medicamentos desenvolvidos por laboratórios multinacionais com patentes ainda vigentes, o que impede a produção de genéricos e amplia o custo de aquisição.
Responsabilidade do SUS no fornecimento de medicamentos de alto custo
A Constituição Federal garante o direito à saúde como um dever do Estado, e isso inclui o acesso a medicamentos essenciais para o tratamento de doenças. Assim, o Sistema Único de Saúde (SUS) é responsável por fornecer medicamentos de alto custo, desde que:
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Estão contemplados nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDT) do Ministério da Saúde
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Estão incluídos nas listas oficiais de medicamentos especializados, estratégicos ou excepcionais
O fornecimento é feito por meio das Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde, com base em critérios clínicos e documentais. O paciente deve apresentar:
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Laudo médico detalhado
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Exames comprobatórios da doença
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Prescrição com justificativa
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Formulário de solicitação padrão
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Cadastro em programas específicos do SUS (quando exigido)
Após análise e aprovação, o medicamento passa a ser fornecido regularmente por meio de farmácias de alto custo vinculadas ao SUS.
Medicamentos não padronizados: o que fazer?
Quando o medicamento prescrito pelo médico não está incluído na lista do SUS, ou seja, é um medicamento fora do protocolo, o paciente pode:
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Solicitar o fornecimento administrativo excepcional, apresentando justificativas clínicas
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Ingressar com ação judicial, pedindo o fornecimento com base no direito à saúde
Nesse caso, o médico deve justificar por que o medicamento fora da lista é essencial, e por que os outros fármacos disponíveis não são eficazes no caso concreto. Laudos médicos e pareceres técnicos são fundamentais para fortalecer o pedido.
Medicamentos de alto custo fornecidos pelos estados
Cada estado brasileiro possui uma lista específica de medicamentos especializados de alto custo que são distribuídos por meio das farmácias de medicamentos especializados, também chamadas de farmácias de alto custo. Esses medicamentos fazem parte da Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF).
O fornecimento pode variar de acordo com a região, mas geralmente segue critérios definidos nacionalmente pelo Ministério da Saúde, por meio dos PCDTs.
O paciente deve procurar a Secretaria de Saúde do estado, preencher os formulários e apresentar os documentos exigidos. O tempo de análise pode variar, e, em caso de demora excessiva, o paciente pode judicializar a demanda.
Planos de saúde são obrigados a fornecer medicamentos de alto custo?
Sim. Se o medicamento está registrado na Anvisa, é prescrito por médico habilitado e visa o tratamento de doença coberta pelo plano, a operadora de saúde tem o dever de custeá-lo, mesmo que seja de alto custo.
A jurisprudência brasileira é majoritariamente favorável ao consumidor em casos de negativa de cobertura, com base no Código de Defesa do Consumidor e no entendimento de que a saúde é um direito fundamental. Tribunais vêm decidindo que cláusulas contratuais que limitam ou excluem medicamentos de alto custo, mesmo em tratamento domiciliar ou oral, são abusivas.
O plano de saúde só pode recusar o custeio nos seguintes casos:
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Quando o medicamento não tem registro na Anvisa
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Quando a doença não está coberta no contrato
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Quando não há prescrição médica adequada
Fora isso, a negativa pode ser considerada ilegal e passível de ação judicial.
O que fazer em caso de negativa do plano de saúde
Se o plano de saúde negar o fornecimento do medicamento de alto custo, o beneficiário deve:
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Solicitar a negativa por escrito, com justificativa detalhada
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Reunir os documentos médicos (prescrição, laudos, exames)
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Registrar reclamação na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar)
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Procurar um advogado ou a Defensoria Pública para ajuizar ação judicial com pedido de liminar
A liminar, quando concedida, obriga o plano de saúde a fornecer imediatamente o medicamento, sob pena de multa diária.
Judicialização da saúde: quando recorrer à Justiça
A judicialização ocorre quando o paciente busca o Judiciário para garantir o fornecimento de um medicamento de alto custo que foi negado pelo SUS ou pelo plano de saúde. É uma ferramenta legítima e muitas vezes necessária diante da urgência do tratamento e da negativa administrativa.
Para entrar com uma ação judicial, é necessário apresentar:
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Relatório médico justificando a necessidade do medicamento
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Prova de negativa do SUS ou do plano
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Comprovação de que o medicamento está registrado na Anvisa
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Orçamentos de farmácias (se for para ressarcimento)
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Comprovante de hipossuficiência, se for o caso de buscar a Defensoria
O Judiciário tem concedido liminares com base no princípio da dignidade da pessoa humana, principalmente quando há risco de morte ou de agravamento da doença.
Liminares e obrigações imediatas
A liminar é uma medida de urgência concedida pelo juiz para garantir o fornecimento rápido do medicamento antes do julgamento final da ação. Para isso, é necessário comprovar:
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Urgência na situação clínica
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Risco de dano irreparável
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Existência do direito à saúde
Com a liminar concedida, o Estado ou plano de saúde deverá fornecer o medicamento em prazo curto (normalmente de 5 a 10 dias). O não cumprimento pode gerar multa diária ou responsabilização dos gestores públicos ou da operadora.
Ressarcimento de medicamentos já adquiridos
Se o paciente comprou o medicamento por conta própria, por urgência ou ausência de resposta das autoridades, ele pode ingressar com ação judicial para reembolso dos valores gastos. Para isso, é importante guardar:
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Nota fiscal da compra
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Prescrição médica
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Laudos clínicos que comprovem a necessidade do uso
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Comprovação da negativa de fornecimento
O Judiciário, nesses casos, pode determinar o reembolso com juros e correção monetária, além de condenar o responsável por danos morais, quando aplicável.
Danos morais por negativa de medicamento
A recusa injusta ou arbitrária de fornecimento de medicamento de alto custo pode gerar abalo emocional, risco à vida e sofrimento desnecessário ao paciente. Em casos assim, é possível ingressar com ação de indenização por danos morais contra o Estado ou plano de saúde.
Tribunais têm fixado indenizações que variam conforme a gravidade do caso, tempo de sofrimento, consequências do atraso no tratamento e má-fé da parte que negou o atendimento. É uma forma de reparar o prejuízo imaterial causado à dignidade do paciente.
Dicas práticas para obter medicamento de alto custo pelo SUS
Para obter medicamentos de alto custo gratuitamente pelo SUS:
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Verifique se o medicamento está na lista da CEAF
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Solicite prescrição médica com justificativa técnica detalhada
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Reúna os documentos exigidos pela Secretaria de Saúde
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Preencha os formulários padrões (como o LME – Laudo para Medicamento Especializado)
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Protocole o pedido na farmácia de alto custo
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Acompanhe o processo e solicite prazos formais
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Se houver negativa ou demora injustificada, procure auxílio jurídico
Organizar bem a documentação e agir com agilidade é essencial para garantir o fornecimento contínuo e evitar interrupções no tratamento.
Como funciona a farmácia de alto custo
As farmácias de alto custo, mantidas pelos estados ou municípios, são unidades específicas para a entrega de medicamentos excepcionais. O fornecimento segue protocolos clínicos, com controle rígido e acompanhamento dos pacientes.
É comum que o paciente precise renovar periodicamente os laudos e receitas, para continuar recebendo o medicamento. O local e horário de funcionamento dessas farmácias devem ser informados pelas Secretarias de Saúde locais.
Como garantir medicamentos de alto custo em doenças raras
Pacientes com doenças raras enfrentam ainda mais dificuldades para obter medicamentos de alto custo, muitas vezes de fabricação estrangeira e sem representação nacional. Nesses casos, a judicialização é quase sempre necessária.
O paciente deve:
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Contar com laudo de especialista reconhecido
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Apresentar estudos ou evidências sobre a eficácia do tratamento
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Demonstrar que não há alternativa terapêutica disponível no SUS
Embora seja mais complexo, os tribunais reconhecem a necessidade de garantir o tratamento, especialmente quando comprovado o risco de vida e a inexistência de outras opções.
Medicamentos não registrados na Anvisa: é possível obter?
Medicamentos sem registro na Anvisa, mesmo que usados em outros países, não são obrigatórios de serem fornecidos nem pelo SUS nem pelos planos de saúde. No entanto, em situações excepcionais e devidamente fundamentadas, é possível solicitar autorização judicial para:
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Importação direta pelo paciente
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Fornecimento excepcional por decisão judicial
É necessário apresentar laudos médicos, pareceres internacionais e comprovação da eficácia do medicamento. O processo é mais demorado, mas tem sido acolhido em casos graves e urgentes.
Perguntas e respostas sobre medicamentos de alto custo
Quem tem direito a medicamento de alto custo?
Todo cidadão que não tenha condições de adquirir por conta própria e cujo tratamento seja necessário para preservar sua saúde, mediante prescrição médica adequada.
O SUS é obrigado a fornecer todo e qualquer medicamento?
Não. Apenas os que constam nos protocolos oficiais ou que sejam autorizados judicialmente em casos excepcionais.
O plano de saúde pode recusar um medicamento caro?
Não, se ele tiver registro na Anvisa e for necessário ao tratamento de doença coberta pelo contrato. A recusa pode ser considerada abusiva.
Preciso de advogado para pedir um medicamento pela Justiça?
Sim, mas quem não puder pagar pode procurar a Defensoria Pública.
Posso pedir reembolso de medicamento comprado por minha conta?
Sim, desde que comprove que tentou obter administrativamente e que a compra foi urgente ou necessária.
A recusa pode gerar indenização por danos morais?
Sim, especialmente se houver sofrimento, agravamento da doença ou risco à vida.
Demora do SUS é motivo para ação judicial?
Sim. A demora injustificada pode ser combatida com liminar judicial.
Conclusão
O acesso a medicamentos de alto custo é uma questão central na proteção da saúde e da dignidade do paciente. Embora existam regras e políticas públicas para seu fornecimento, a realidade é que muitos pacientes ainda enfrentam barreiras administrativas, negativas abusivas e burocracias excessivas para obter remédios essenciais ao seu tratamento.
Conhecer seus direitos, organizar a documentação e agir com orientação jurídica são atitudes fundamentais para garantir o fornecimento adequado. Seja pelo SUS, por meio dos planos de saúde ou pela via judicial, o que não pode acontecer é o cidadão ser privado de um tratamento vital por questões financeiras ou burocráticas.
A luta pelo acesso à saúde é um dever coletivo. Cabe ao cidadão exigir seus direitos, às operadoras e gestores públicos cumprir com suas obrigações e ao Judiciário garantir o cumprimento da Constituição. Afinal, o acesso ao medicamento não é um privilégio: é um direito.