Atualmente com os avanços conquistados por vários séculos, observa-se uma nova Medicina, que com o apoio de complexas tecnologias vem se desenvolvendo e viabilizando para a humanidade descobertas revolucionárias no campo da saúde, principalmente no que tange à cura de doenças.
A Medicina passou por diversas etapas até chegar aos dias atuais. Houve uma época em que se enfatizou somente a Medicina Curativa, que atua quando a doença já se instalou no paciente, devendo ser tratada a partir de então; já em fase posterior surgiu a Medicina Preventiva, cujo foco é a prevenção, ou seja, a realização de atos preventivos que irão contribuir para o não aparecimento e a involução de doenças. Esta Medicina emergiu quando os especialistas médicos começaram a observar que certas medidas de cuidado à saúde, como higiene pessoal e hábitos alimentares, poderiam evitar diversas doenças. A Medicina Preventiva apresenta-se em três aspectos: “os primários, secundários e terciários”[1].
A Medicina Preventiva primária é realizada no período de “pré-patogênese”[2], ou seja, antes do aparecimento de doenças. Esta fase primária está voltada à questão da educação da sociedade com relação à saúde e os hábitos de vida saudáveis. Já na Medicina Preventiva secundária é que se encontram as ações de prevenção relacionadas à fase inicial da enfermidade, tendo como propósito o diagnóstico e tratamento, de forma que se consiga evitar ou reduzir o reaparecimento e/ou possíveis complicações que a doença venha trazer. A Medicina Preventiva terciária por sua vez, é aquela realizada na fase de reabilitação do paciente, corresponde aos procedimentos indicados para a fase de “doenças crônicas”[3] .
O enfoque é no fato de qualquer procedimento relacionado à prevenção, precisa ter o intento de assegurar a qualidade de vida humana com respeito à dignidade da pessoa humana.
No mesmo patamar destas Medicinas, hodiernamente pode-se contar com a Medicina Preditiva que é a mais atual e discutida sob o ponto de vista de seu efetivo benefício à sociedade, pois, traz consigo aspectos contraditórios, positivos e negativos. A Medicina Preditiva tem como essência a capacidade de se fazer predições sobre a possibilidade do paciente vir a desenvolver algum tipo de doença em nível fenótipo[4], tendo como base testes feitos através do DNA em nível genótipo. A proposta de tal Medicina é propiciar à pessoa o conhecimento prévio de uma doença que ela tem pré-disposição por ordem genética familiar, objetivando vislumbrar qual seria a melhor forma de prevenção ou mesmo de amenização da mesma.
Dentre aspectos positivos trazidos pela Medicina Preditiva, visando à prevenção, destaca-se a que predição pode trazer ao paciente a possibilidade de tratamento adequado antecipado, pretendendo que esta enfermidade não venha a se desenvolver, ou mesmo se isto vier a ocorrer, que aconteça de forma mais amena.
Porém, os aspectos negativos desta Medicina são inevitáveis, quando relativizados no fato de que possam vir a comprometer a vida privada das pessoas, pela descoberta de informações mediante a realização dos testes, de que são portadoras, ou mesmo propensas a desenvolverem determinadas doenças, ocasionando, muitas vezes, discriminações em seu meio social. Inclusive, segregação em várias áreas, como por exemplo, para conseguir um emprego. Contudo, deixam-se aqui várias objeções a serem pensadas sobre o livre exercício dos exames… Será que um empregador, não de forma generalizada, ao realizar os exames admissionais, poderá solicitar que tais testes sejam incluídos no ato da admissão de seus funcionários, sem o conhecimento e consentimento dos mesmos? Com o intuito de livrar-se, para não vir a arcar com o ônus de admitir um empregado que poderá daqui alguns meses ou mesmo anos vir a sofrer algum tipo de doença genética familiar, como câncer, por exemplo? É conhecido que tal conduta é totalmente proibida, e se porventura for provada acarretará ao empregador o pagamento de indenização ao trabalhador, entretanto esse tipo de atitude é de difícil fiscalização. Pois, algumas empresas já utilizam-se de uma “discriminação patológica”[5] na hora de contratar seus funcionários no exame médico, para a verificação se o trabalhador não tem nenhuma doença considerada grave, tais como HIV, LER, entre outras, e desta forma segregando os indivíduos que poderiam ser aptos ao trabalho.
Muitas dessas situações desagradáveis poderão ser vivenciadas pelo indivíduo desnecessariamente, pois algumas enfermidades diagnósticas por intermédio do exame preditivo poderão ou não se desenvolver, e o indivíduo ao ser segregado passará por situações humilhantes, apenas pela “ameaça” de vir a contrair essas enfermidades. Além disso, os aspectos negativos da Medicina Preditiva sobressaem em algumas questões graves, quando o paciente obtém um “diagnóstico pré-sintomático”[6], devido à constatação de que poderá ter problemas de ordem psicológica, tornando o indivíduo saudável em indivíduo doente. Nesta concepção, os indivíduos vivem em dois parâmetros, logo, não são sadios devido a seu gene conter a probabilidade de manifestação de uma doença, entretanto, ainda, não são doentes pelo fato de que até então não houve a manifestação da enfermidade; desta forma tornam-se “doentes sadios”[7], que ficam na expectativa frustrada do surgimento de uma doença, que pode ocorrer inesperadamente, e por isso deixam de ter uma vida normal.
O fato de se antever a propensão a doenças, e isto ser levado ao conhecimento de outras pessoas, além de causar a estigmatização, pode trazer constrangimentos à vida pessoal do indivíduo. Ferindo de forma drástica o seu direito à privacidade, previsto no art. 5° inc. X[8] da Constituição Federal , direito individual e inviolável. Até mesmo porque nos dias atuais, tal direito se tornou um tanto quanto desmoralizado pelo fato da exposição da intimidade que a mídia, a internet e vários meios oferecem. Todavia, em questões de saúde pessoal, a exibição é um fato que deve ser visto com muita seriedade, pois trata-se de algo extremamente relevante por envolver aspectos pertencentes ao foro íntimo de cada indivíduo. Não obstante, deve visar abranger a integridade moral, da pessoa, que deve tê-la resguardada, como garantia de sua dignidade e respeito. Mas, ao viés de todos os aspectos apresentados aqui, os testes preditivos poderão com toda certeza trazer aos indivíduos significativas vantagens no tratamento antecipado de doenças de origem genética, contudo, deve-se atentar à proteção jurídica desses indivíduos, com relação aos fatores que possam discriminá-los no meio social.
Informações Sobre o Autor
Juliana Oliveira Nascimento
Acadêmica do curso de Direito do UNICURITIBA-Centro Universitário Curitiba(Faculdade de Direito de Curitiba) Integrante do JUS VITAE – Pesquisas em Biodireito e Bioética do UNICURITIBA