Resumo: O presente artigo traz uma breve reflexão sobre a adoção internacional das crianças brasileiras, com foco na nacionalidade. Abordando os preceitos fundamentais do direito a família e a nacionalidade. Analisando os institutos que garantem esses direitos, abarcando a finalidade e aplicabilidade da Constituição Federal, dos Tratados Internacionais e das Leis que dispõe sobre o assunto em tela.
Palavras chaves: Adoção Internacional, Nacionalidade, Crianças brasileiras
1. Introdução
Crianças e adolescentes possuem direitos garantidos no ordenamento jurídico brasileiro, principalmente após a Constituição da República de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Dentre esses direitos, destaca-se para o presente artigo o dever da família, da sociedade e do estado de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O direito à convivência familiar tem importância primordial partindo do pressuposto de que crianças que tem família terão todos os direitos dispostos na Constituição Federal assegurados por essa família. A adoção, entretanto, é medida subsidiária, usada para assegurar às crianças e aos adolescentes que excepcionalmente não podem continuar no seio familiar de suas origens, por vários motivos, como o abandono, maus tratos ou a capacidade psicológica dos pais, e outros o seu direito a um lar.
Já a adoção internacional aparece como medida excepcional e subsidiária, sendo prioritária a permanecia da criança em solo brasileiro para que não se extraia da criança e do adolescente a oportunidade de conviver com suas raízes, cultura e idioma. Nesse sentido, cumpre esclarecer nos casos de adoção internacional, o que ocorre com a nacionalidade da criança ou adolescente brasileiros adotados por estrangeiros.
O instituto da adoção internacional tem por objetivo conceder um novo lar para a criança ou adolescente, que se encontra em estado de abandono, e que geralmente são inadotáveis por brasileiros, já que estes buscam na adoção uma visão de família natural. Depois de verificado adequadamente todas as possibilidades e requisitos necessários, a adoção poderá ser deferida para um estrangeiro sempre atendendo ao interesse superior da criança.
O presente trabalho abordará a probabilidade de êxito de uma adoção internacional, bem como os direitos hereditários que o instituto concede, as consequências do trânsito em julgado da decisão do magistrado; a necessidade de homologação dessa decisão.
Para tanto serão abordados, conceituados e analisados os direitos, os deveres, a legislação vigente, bem como o conteúdo normativo e a doutrina acerca de referida matéria, expondo a adoção internacional com foco na nacionalidade com base na Constituição Federal, o Código Civil de 2002, a Lei 8.069/90 o Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como a Convenção de Haia – Decreto n. 3.087/1999, que possibilitou uma nova realidade para a adoção internacional.
2. A adoção e o direito brasileiro
No conceito de Silvio de Salvo Venosa (2011, p. 273) adoção é o modo camuflado de filiação que busca copiar a filiação natural, sendo esta o resultado de uma manifestação de vontade através de uma sentença judicial, constituindo filiação exclusivamente jurídica que se ampara sobre a suposição de uma relação afetiva. Para Maria Berenice Dias (2007, p. 426) adoção é um ato jurídico em sentido estrito, cuja eficácia está condicionada a chancela judicial. Cria um vinculo fictício de paternidade – maternidade – filiação entre pessoas estranhas, análogo ao que resulta da filiação biológica. Flavio Tartuce e José Fernando Simão (2013, p. 372) concluem que adoção é um ato jurídico stricto sensu, pois seus efeitos são apenas fixados em lei.
Adoção constitui vínculo de filiação afetiva com efeitos legais. Instituto pelo qual o Estado busca resguardar os direitos fundamentais tutelados pela Constituição Federal. Ao adotar uma criança os pais adotivos criam vínculos legais de filiação e de afetividade para com a criança atribuindo ao adotado todos os direitos de filiação, sem distinção.
2.1. Fase cronológica da adoção no direito comparado
Adoção é uma palavra de origem latina adoptione que significa escolher, considerar, olhar para. Segundo Silvio de Salvo Venosa (2001, p. 258) temos noticia de adoção nas antigas civilizações. Em passagens Bíblicas já podemos identificar a pratica da adoção pelos Hebreus.
Ainda conforme o autor a adoção começou a ser difundida na Roma onde ganhou contornos valiosos. O alicerce da adoção se fez presente na civilização grega. Se houvesse um pater famílias sem herdeiros, se considerava a adoção para que pudesse continuar o culto aos deuses-lares. Surge ai um principio básico da adoção, o adotado assumia o nome e a posição do adotante e herdava todos seus bens e também o culto.
Em época pouco distante do Direito Romano, com Justiniano, foram instituídas duas formas de adotar: adoptio plena, concretizada por parentes e adoptio minus, feita por estranhos. Os adotados mantinham os direitos sucessórios da família natural, quando o estranho adotava o filho não saía da família natural apenas era considerado como filho adotivo e contraía direito a herança do adotante.
Na idade média sob influências religiosas do Direito Canônico a adoção deixou de ser usada.
Segundo Valéria da Silva Rodrigues[1], na Idade Moderna, o marco foi o código de Napoleão de 1791, que definiu adoção de como contrato com requisitos para alcançar validade plena. Exigindo a anuência das partes para sua consumação e adotando rígido trâmite processual. Atenta-se que na Lei francesa os efeitos eram adstritos e a qualidade de filho adotivo só era adquirido após a maioridade. Excluindo, no entanto, os menores, que nos moldes das adoções atuais, carecem de mais agilidade e amparo social.
O Código Napoleônico constituiu normas com relação ao sujeito ativo da adoção, tais como idade, sexo, descendência, estado civil e reputação.
Com efeito, o instituto da adoção sofreu várias mudanças se alinhando às necessidades da sociedade em cada época.
2.2. Fase cronológica da adoção no Brasil
Em 1916, com o advento do Código Civil a adoção era tida como simples para maiores e menores, só seriam adotantes quem não tivesse filho sendo requisito para a adoção a diferença de 18 anos entre adotando e adotado, o instrumento usado era a escritura pública.
A Lei 3.133, foi promulgada em 1957 com o condão de ampliar as possibilidades de adoção. Trouxe importantes transformações como redução da diferença de idade entre adotantes e adotados de 18 para 16 anos e suprimiu a exigência de ausência de filhos. Além disso inseriu a exigência de consentimento do adotado maior ou dos representantes legais nos casos dos menores.
Em 1965 foi criada a Lei 4.655 que admitiu a chamada adoção legítima que dependia de decisão judicial, era irrevogável e fazia cessar os vínculos de parentesco com a família natural formando um vínculo idêntico ao da família biológica.
Com o Código de Menores, Lei 6.697/1979 a chamada legitimação adotiva deu lugar a adoção plena, contudo ainda vigia a adoção simples disposta no Código Civil de 1916. Foi estendido o vínculo de parentesco à família do adotado, fazendo constar no registro de nascimento o nome dos ascendentes independente do consentimento dos avós.
A Constituição da República de 1988[2], trouxe as maiores e mais importantes transformações, consagrando o Principio da prioridade absoluta e extinguiu a diferença entre filhos adotivos e filhos legítimos. Institui que o direito e qualificações seriam iguais a todos os filhos.
“Artigo 227. (…) § 6º – Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmo direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.”
Em 1990 foi promulgado o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente dando maior atenção ao interesse das crianças e adolescentes, passando a regular a adoção dos menores de 18 anos, garantindo a eles todos os direitos inclusive os sucessório, aboliu as espécies de adoção simples e plena que foram unidas em apenas uma.
Houve também em maio de 1993 a promulgação da Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, concluída na Haia. Para Ângela Christina Boelhouwer Montagner (2009)[3], tal convenção foi pioneira em regular a adoção internacional, demonstrando significativo empenho mundial em tratar o assunto. A convenção tem com principal objetivo constituir um sistema de cooperação administrativa e corresponsabilização entre os países de acolhida e de origem da criança. Materializando-se pela imposição de uma série de obrigações entre os países envolvidos de maneira a assegurar prevalentemente os interesses do infante no processo de adoção como também o reconhecimento das adoções internacionais entre os países contratantes.
O atual Código Civil estabeleceu o preceito da adoção plena ratificando as direções do ECA mantendo a adoção dos adultos, crianças e adolescentes com as mesmas especificidades, necessitando em todas hipóteses de processo judicial.
Assim o sistema de adoção brasileiro, bem como o internacional foram se aprimorando e atualmente tem como pilar o maior interesse da criança ou adolescente adotados.
3. Da adoção internacional
A adoção internacional tem como característica primordial, a concessão de um novo lar em um país diferente do de sua origem, a criança ou adolescente que geralmente são inadotáveis por brasileiros, visto que estes buscam na adoção uma visão de família natural. Verificado adequadamente todas as possibilidades e requisitos necessários, a adoção internacional poderá ser deferida, desde que atendendo o melhor interesse da criança. Tem-se a adoção internacional como uma medida excepcional e subsidiária, sendo prioritária a permanecia da criança em solo brasileiro para que não se extraia da criança e do adolescente a oportunidade de conviver com suas raízes, cultura e idioma.
3.1. A Adoção Internacional e suas consequências
Pondera-se que a Adoção Internacional tem caráter eminentemente humanitário, em que pese a família como pedra angular de toda sociedade. Busca-se, com a adoção internacional, trazer benefícios para as crianças que não têm uma família e que não foram adotadas por brasileiros. Afinal, acredita-se a criança estar melhor com uma família estrangeira do que institucionalizada, sem nenhum contato com família, sem afeto ou atenção.
Segundo Venosa (2011 p. 295), adoção internacional é aquela em que a pessoa ou casal requerente esteja domiciliado fora do Brasil, sendo como definidor da adoção internacional não a nacionalidade dos adotantes, mas seu domicilio fora do Brasil. De tal forma, para o autor é dever do juiz brasileiro definir com maior cuidado o cabimento e a conformidade da adoção, e exclusivamente depois de consumidas todas as probabilidades de colocação da criança ou adolescente em família substitutiva brasileira, ai sim dar eventual preferência aos estrangeiros.(VENOSA, 2011).
Para Valeria da Silva Rodrigues, Juíza de Direito da Vara de Atos Infracionais da Infância e da Juventude de Belo Horizonte/MG[4],
“A adoção internacional é o instituto jurídico de ordem pública que concede a uma criança ou adolescente em estado de abandono a possibilidade de viver em um novo lar, em outro país, assegurados o bem-estar e a educação, desde que obedecidas as normas do país do adotado e do adotante. De origem humanitária e finalidade de caráter social, visto que possibilita a colocação de uma criança ou adolescente em estado de abandono em um lar, em que possam ser amados como filho, com direito à educação, saúde, alimentação, etc”. (RODRIGUES, 2009, p. 7).
Para Ângela Christina Boelhouwer Montagner( 2009)[5], adoção internacional distingui-se pela morada dos adotantes e adotados em países diferentes, sendo as partes submissas a diferentes sistemas jurídicos.
A adoção internacional, portanto, deverá seguir regras internacionais, sendo o Brasil signatário de Convenção sobre cooperação Internacional e Proteção de Crianças e Adolescentes em Matéria de Adoção Internacional, concluída em Haia.
Conforme Montagner (2009), as decorrências da sentença constitutiva da adoção internacional, são principalmente a criação do vínculo de parentesco com a família adotiva e a invalidação dos laços biológicos. No entanto, outra consequência é a aquisição da nacionalidade do país de acolhimento da criança ou do adolescente adotado.
Expõe a autora que a adoção é meio pelo qual se busca a inserção da criança em um novo seio familiar; para tanto, se torna imperativa a atribuição da nacionalidade pelo país de acolhimento da criança. Ainda para a autora se faz necessário o reconhecimento da nacionalidade, pois tal reconhecimento está ligado ao princípio do melhor interesse da criança, para que seja inserida na ordem de proteção do Estado para onde foi deslocada. Podendo a criança ficar a serviço da própria sorte se a nacionalidade não for prontamente outorgada.
3.2. Problemas quanto à sentença da adoção internacional
Com base nos pensamentos de Valeria da Silva Rodrigues[6], a sentença que constitui a adoção determina consequências pessoais e patrimoniais, tais como:
“I- Reconhecimento do vínculo de filiação entre adotado e adotante, tornando-se pai e filho legítimos. O princípio da igualdade de tratamento entre os filhos é consagrado constitucionalmente no art. 227, §6º, da Constituição brasileira, sendo assim, quando do deferimento da adoção, o adotado deixa de fazer parte de sua família natural, inexistindo qualquer ligação com ela, exceto os impedimentos matrimoniais.
II – Confere ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles, poderá ser modificado também o prenome (art. 47, §5°, do ECA). O prenome do adotado só pode ser modificado mediante seu consentimento.
III- O adotado é equiparado nos direitos e obrigações ao filho sanguíneo, nesta ordem, assegura-se a ele o direito a alimentos e assume os deveres de assistência aos pais adotivos.
VI- Quanto ao direito sucessório, dada a completa igualdade, os direitos hereditários são idênticos como acontece na filiação biológica.”
Para Ângela Montagner[7] o principal efeito da sentença constitutiva da adoção é a criação do vínculo de parentesco com a família adotiva e a anulação dos vínculos biológicos, permanecendo os vínculos matrimoniais que não é extinto com adoção. Apesar disso, há outra consequência, a imputação da nacionalidade do país de acolhida para a criança adotada. Podendo-se concluir pela desnecessidade de
um novo processo após a chegada da criança no país de acolhida, devendo a sentença ser acatada na sua totalidade.
Em vista das considerações dispõe o artigo 24 da Convenção de Haia – Decreto n. 3.087/1999[8] que o reconhecimento de uma adoção poderá ser rejeitada em um Estado contratante se a adoção for manifestamente oposta a sua ordem pública.
Concluindo, portanto, que a sentença constitutiva de adoção não é absolutória e pode não ter seus objetivos alcançados no país de acolhida.
3.3. Procedimentos pós adoção
A fase essencial no processo de adoção internacional ocorrerá ainda no Brasil, está disposto na Lei 8.069/90 – ECA[9] no artigo 46 § 3º que é o estágio de convivência. E será acompanhado pelas Cejas.
“Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso.
(…)§ 3o Em caso de adoção por pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de, no mínimo, 30 (trinta) dias.
§ 4o O estágio de convivência será acompanhado pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, que apresentarão relatório minucioso acerca da conveniência do deferimento da medida”.
A Convenção de Haia trouxe uma interessante inovação atinente a um sistema de cooperação entre Nações que se disponibilizaram a participar ativamente nos processos de adoção internacional. Estas serão realizadas por intermédio de um único órgão, criado para esta função, em cada país que aderiu à mencionada Convenção.
3.3.1. O papel da Cejas
A Lei nº 12.010/2009[10], que alterou artigos no Estatuto da Criança e do Adolescente, acrescentou a criação da CEJAS conforme dispõe, em seu artigo 52, sobre a Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional (CEJAI) ou Comissão Estadual Judiciária de Adoção (CEJA). Constituem obrigações da CEJA no Brasil:
“VI – a Autoridade Central Estadual poderá fazer exigências e solicitar complementação sobre o estudo psicossocial do postulante estrangeiro à adoção, já realizado no país de acolhida;
VII – verificada, após estudo realizado pela Autoridade Central Estadual, a compatibilidade da legislação estrangeira com a nacional, além do preenchimento por parte dos postulantes à medida dos requisitos objetivos e subjetivos necessários ao seu deferimento, tanto à luz do que dispõe esta Lei como da legislação do país de acolhida, será expedido laudo de habilitação à adoção internacional, que terá validade por, no máximo, 1 (um) ano;
VIII – de posse do laudo de habilitação, o interessado será autorizado a formalizar pedido de adoção perante o Juízo da Infância e da Juventude do local em que se encontra a criança ou adolescente, conforme indicação efetuada pela Autoridade Central Estadual.”
Com relação a Convenção de Haia, a CEJA é incumbida de executar as obrigações presentes em seu texto, tendo em vista sempre o superior interesse da criança. A Convenção trouxe capacidade de cada Estado poder designar mais de uma Autoridade Central. Estabeleceu ainda, em seu artigo 7, que a CEJA adotará, diretamente, todas as providências adequadas e necessárias para fornecer informações sobre a legislação de seus Estados em matéria de adoção e quaisquer outras informações gerais, tais como estatísticas e relatórios sobre o funcionamento e cumprimento da Convenção.
As CEJAS são responsáveis pelos credenciamentos dos candidatos à adoção, ao estudo prévio, considerando as leis do país e as exigências da nossa legislação. Se houver um parecer favorável, será expedido um laudo de habilitação, que deverá constar na petição inicial. Em suma as CEJAS têm o papel orientador e fiscalizador.
Depois de concedida uma adoção, será expedido um certificado pela Autoridade Central brasileira. Tal documento é o meio pelo qual o Estado Brasileiro certifica ao Estado de acolhida que adoção procedeu sob a égide da Convenção de Haia conforme define a própria convenção em seu artigo 23.
“Artigo 23. 1. Uma adoção certificada em conformidade com a Convenção, pela autoridade competente do Estado onde ocorreu, será reconhecida de pleno direito pelos demais Estados Contratantes. O certificado deverá especificar quando e quem outorgou os assentimentos previstos no artigo 17, alínea "c".
2. Cada Estado Contratante, no momento da assinatura, ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, notificará ao depositário da Convenção a identidade e as Funções da autoridade ou das autoridades que, nesse Estado, são competentes para expedir esse certificado, bem como lhe notificará, igualmente, qualquer modificação na designação dessas autoridades.”
Em posse desse certificado os adotantes deverão providenciar o passaporte da criança. Somente a após o transito em julgado da sentença de adoção, será autorizada a saída do adotando do território nacional, seguindo os requisitos do artigo 52 § 9º do ECA[11].
“Artigo 52. (…) § 9o Transitada em julgado a decisão, a autoridade judiciária determinará a expedição de alvará com autorização de viagem, bem como para obtenção de passaporte, constando, obrigatoriamente, as características da criança ou adolescente adotado, como idade, cor, sexo, eventuais sinais ou traços peculiares, assim como foto recente e a aposição da impressão digital do seu polegar direito, instruindo o documento com cópia autenticada da decisão e certidão de trânsito em julgado.”
Após chegarem ao país de acolhida dos adotantes os organismos estrangeiros que atuem em adoção deverão enviar semestralmente relatórios de acompanhamento do adotado conforme dispõe o artigo 17 do Decreto nº 5.491[12], que regula a atuação desses organismos estrangeiros.
Dispõe ainda o § 10º do Estatuto da Criança e Adolescente, que Autoridade Central Federal Brasileira, poderá solicitar informações, a qualquer momento, sobre a situação das crianças ou adolescentes adotados.
4. Da questão relativa à nacionalidade na adoção internacional
Segundo Jairo Dias Junior,[13] o direito positivo de cada Estado define o critério de aquisição da nacionalidade.
A Constituição Federal[14] elenca em seu artigo 12, I que são brasileiros natos:
“a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país;
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira;’
Por outro lado dispõe o artigo 22 da Lei 818/1949[15], que dispões sobre a preda e a reaquisição da nacionalidade, determina que perde a nacionalidade brasileira o individuo que por sua vontade adquiri outra nacionalidade.
Ocorre que as duas Leis que disciplinam a Adoção internacional no Brasil não fazem previsão à perda ou atribuição da nacionalidade das crianças ou adolescentes adotados por estrangeiros. Ficando tal decisão a cargo do país de acolhida.
4.1. Conceito de Nacionalidade
A doutrina separa a nacionalidade em duas classes, a primária ou originária, que é atribuída independente da vontade do individuo no momento do nascimento. E a nacionalidade secundária ou adquirida, que depende da manifestação de vontade do interessado com a concordância do Estado.
Existem dois critérios que podem atribuir nacionalidade primária ou originária a um individuo; o critério Ius sanguinis, que confere a nacionalidade pelo sangue e o critério ius soli, que impõe a nacionalidade por territorialidade, conforme já exposto os dois critérios são adotados pelo Brasil.
Diante do exposto podem surgir os conflitos de nacionalidades, que podem ser positivos, configurados pelo polipátrida, individuo que possui várias nacionalidades, e o conflito negativo, configurado pelo apátrida, indivíduo que não possui nenhuma nacionalidade. Tal situação tem sido fortemente combatida após a carta de Declaração Universal dos Direitos Humanos promulgada em 1948, da qual o Brasil faz parte.
Cabe ainda ressaltar os modos e os critérios para perda da nacionalidade brasileira, o que, conforme a Constituição da República de 1988[16], ocorrem por dois motivos.
“Artigo 12. (…) § 4º – Será decretada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I – tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de
atividade nociva ao interesse social;
II – adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;
b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis.”
Já a reaquisição da nacionalidade está prevista na Lei 818/49, que regula a aquisição, a perda e a reaquisição da nacionalidade, e a perda dos direitos políticos. Dispõe a lei em seu artigo 36 que qualquer brasileiro que, por naturalização voluntária adquirir outra nacionalidade, sem licença do Presidente da República, aceitar de governo estrangeiro, comissão emprego ou pensão, ou que por sentença judiciária tiver cancelada a naturalização, por exercer atividade nociva ao interesse social, e que por esses motivos tiver perdido a nacionalidade, poderá readquiri-la por decreto, se estiver domiciliado no Brasil[17].
4.2. A nacionalidade e a adoção internacional
Novamente com base nos pensamentos de Montagner (2009), a concessão da nacionalidade pelo país de acolhida à criança adotada deriva dos meios de adquirir a nacionalidade originária e secundária, que é fixada pelo direito constitucional de cada país, que pode ser ius soli ou ius sanguinis. Diferentemente ocorre com a nacionalidade secundária, que é adquirida após o nascimento, a qual é concedida por manifestação de vontade do individuo ou por imperativo do Estado, havendo a aceitação do individuo.
Ângela Montagner (2009) explica que poucos países instituem a perda da nacionalidade em consequência da adoção, e boa parte dos Estados tratam da aquisição da nacionalidade; já em outros existe a supressão, como é o caso do Brasil, e nesses casos a adoção internacional não produz efeito de atribuir a nacionalidade, o que para ela precisa ser analisado sistematicamente de acordo com o ordenamento de cada país.
De tal forma, e fazendo uma interpretação da Constituição juntamente com o artigo 26 da Convenção de Haia, que não dispõe sobre a questão da nacionalidade, não existe argumento para a perda da nacionalidade em relação ao país de origem.
Portanto, se ocorre aquisição da nacionalidade por consequência da sentença constitutiva da adoção, a aquisição da nacionalidade é involuntária ou por atribuição, tornando-se assim um polipátrida, continuando a criança a ter a nacionalidade brasileira pelo critério ius soli. Não há que se falar também da aquisição secundária de nacionalidade, já que à criança não é dado o poder de escolha, além do quesito de não ser juridicamente capaz para tanto.
Por outro lado atenta Valeria da Silva Rodrigues[18]:
“Dessa forma, conclusão a que se chega, é que muito embora a adoção internacional seja medida extrema, que nega o direito a nacionalidade brasileira ao adotado, integrando-o a um novo país, uma nova realidade, muitas vezes é a única hipótese para algumas crianças de crescerem dentro de um ambiente familiar, sendo recomendável, de acordo com as circunstancias fáticas a serem apuradas”.
O ideal seria que a atribuição da nacionalidade ocorresse com a homologação no país de acolhida, da sentença que constitua a adoção. Ocorre que não são todos os países que recepcionam sentenças alienígenas.
4.3. Nacionalidade no Brasil
A LINDB Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro[19] dispõe em seu artigo 7 que, a lei do domicilio da pessoa determinará sobre as questões relativas ao começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.
Instituiu o artigo 12, § 4º da Constituição Federal, que ocorrerá a perda da nacionalidade se um brasileiro nato adquirir outra nacionalidade, excluindo os casos em que a obtenção ocorra por via originária no país estrangeiro ou imposição de naturalização pela lei estrangeira ao brasileiro habitante no exterior, para que exerça os exercícios e direitos civis ou como condição de sua permanência no país.
Cabe ressaltar que o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, bem como a Convenção de Haia, institutos que regulam a adoção no Brasil, não dispõe regras para aquisição ou determinação da nacionalidade das crianças brasileiras adotadas por estrangeiros, mas norteiam-se sempre pelo melhor interesse dos adotados.
Diante do exposto, trata-se a adoção um instituto do direito de família que deve ser regido pelo direito do país do domicílio do adotado. Como no ordenamento brasileiro não existe uma definição por parte dos dispositivos que tratam da adoção conclui-se a questão deve ser deliberada pelo ordenamento do país de acolhida do adotado.
Recentemente a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça[20] indeferiu um recurso especial interposto por uma mãe que tentou evitar que seu filho retornasse à Itália. O menor, filho de mãe brasileira e pai italiano, possui dupla nacionalidade, a família residia na Itália. Em uma viagem dos três ao Brasil a mãe decidiu não retornar com o filho para sua antiga residência na Itália. Em três meses o pai iniciou procedimento administrativo perante autoridade brasileira, a União propôs ação de busca e apreensão a fim de que a criança fosse entregue a um representante do estado italiano e devolvido ao local de sua residência habitual. Um dos fundamentos usados pelo ministro Humberto Martins foi artigo 12 da Convenção de Haia já que a mãe tinha a retenção nova da criança, o que autoriza seu retorno imediato. O Relator ponderou ainda que a finalidade da convenção não é discutir o direito de guarda da criança, o que competirá ao juízo natural do Estado de sua residência habitual. O desígnio da convenção é garantir, sempre que possível, o regresso da criança ao país de residência habitual, para que a guarda seja regulamentada e julgada.
4.4. Análise no Direito Comparado
Valeria Silva Rodrigues[21] resalta que a Itália é o país que mais adota crianças brasileiras e ponderou:
“Depois que a criança entrou na Itália e transcorreu-se o eventual período de custódia pré-adoção, o procedimento se conclui com a ordem, por parte do Tribunal para os menores, de transcrição do procedimento de adoção nos registros do estado civil.
Competente a essa transcrição é o Tribunal para os menores do lugar de residência dos genitores no momento da sua entrada na Itália com o menor (mesmo se diverso daquele que pronunciou antes o decreto de idoneidade)
Com a transcrição, o menor torna-se definitivamente um cidadão italiano e um membro a todos os efeitos da nova família “multiétnica” que acaba de nascer.”
Já na França o segundo pais que mais adotada crianças brasileiras a adoção é atribuída pelo critério do jus sanguinis como critério de atribuição primário da nacionalidade e o jus soli como critério secundário. Nesse sentido salienta Adriana do Vale Farias Saldanha[22], que a própria agência francesa orienta:
“Em seguida a adoção de uma criança estrangeira por nacionais franceses, essa última conserva, na maioria dos casos, sua nacionalidade de origem. É, no entanto, possível, uma vez que ao menos um dos dois pais adotivos seja francês, que a criança possa adquirir a nacionalidade francesa.”
Existem também vários outros países que conforme já mencionado não acolhem ou homologam a sentença brasileira constitutiva de adoção. Nesses casos entende-se que o deferimento de adoção no país estrangeiro, constituem na perda da nacionalidade brasileira, por se tratar de um pedido, mesmo que por seus representantes.
Conclusão
Adoção no Brasil tem sido um assunto importante devido ao grande número de crianças e adolescentes abandonados como mostra o último balanço do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), revelando que 4.856 crianças estão aptas a serem adotadas e mais de 30 mil estão em abrigos[23].
Há também o fator do crescente interesse de estrangeiros em adotar nossas crianças, o que, segundo assessora técnica da Autoridade Central Brasileira do Ministério da Justiça, Juliana Paes de Castro, em 2009 chegava a 400 o número de crianças adotadas por estrangeiros[24].
O Brasil tem se empenhado para atender o maior interesse da criança. Recentemente o CNJ – Conselho Nacional de Justiça colocou em pauta de votação uma resolução que deve incluir estrangeiros ou brasileiros residentes no exterior ao Cadastro Nacional de Adoção (CNA), com o intuito de ampliar o número a adoção de crianças mais velhas e grupo de irmão.
A criança adotada que poderá ter no país dos pais adotivos as mesmas garantias de um cidadão e principalmente uma pátria que garanta seus direitos, além de receber como filho que lá nasce, serão acima de tudo titulares dos direitos que foram garantidos desde a Declaração Universal dos Direitos dos Homens[25].
O estudo realizado neste trabalho mostra que ainda existem algumas falhas a serem tratadas, como o fato de um país signatário da convenção ter disponibilidade de decidir se a criança perde ou não a nacionalidade de origem, o foco do trabalho, bem como o fato de o órgão que escolhe o casal que adotará a criança não seja propriamente, parte do judiciário, mas sim uma comissão independente que são as CEJAS. Ficando implícito que após o deferimento da adoção o Brasil não exerce mais nenhuma tutela sob a criança, principalmente nos casos em que a adoção resulta na perda da nacionalidade.
Restou claro que, mesmo que essas crianças percam a nacionalidade brasileira ao ser adotada por estrangeiros, a adoção internacional tem grande importância no cenário brasileiro de adoção, principalmente para os casos de grupos de irmãos, crianças com problema de saúde ou com mais de 4 anos, que terão na adoção internacional seus direitos assegurados, principalmente o direito de viver em uma família.
/prisma/article/view/903/849. Acessado em: 23/10/2013.
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Informações Sobre os Autores
Cristiane Helena de Paula Lima Cabral
Doutoranda em Direito Público Internacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestra em Ciências Jurídico Internacionais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Especialista em Direito Público. Professora Universitária
Juliana Rita Gonzaga Neves
Advogada, Graduada em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato