Por Diogo Albaneze*
No último dia 23 de setembro, o Governo federal publicou o Decreto nº 10.025/2019 (“Decreto”), que dispõe sobre a utilização da arbitragem para dirimir litígios, no âmbito dos setores portuário e de transportes, que envolvam a União ou as entidades da administração pública federal e as empresas contratadas.
Regulamentada no País pela Lei 9.307/96, a arbitragem configura um mecanismo privado de solução de litígios, por meio do qual um terceiro escolhido pelas partes (imparcial, independente e que possua as qualificações técnicas desejadas) profere uma sentença definitiva, com força de decisão judicial.
O Decreto é bem-vindo e vem ao encontro de todo um arcabouço legal e normativo criado para fortalecer a utilização da arbitragem nas contratações envolvendo a administração pública. E nem poderia ser diferente. Na medida em que o Governo federal busca atrair novos investimentos (sobretudo na área de infraestrutura), nada mais adequado do que apresentar ao mercado mecanismos que possam conferir maior previsibilidade e segurança jurídica a esses investidores.
Ao criar um regramento para a utilização da arbitragem no âmbito das relações contratuais firmadas pela União federal, o Decreto conferiu uma importante ferramenta para facilitar e incentivar a utilização da arbitragem pelos órgãos públicos federais. Afinal, dadas limitações e controles (internos e externos) a que os entes públicos estão sujeitos, é inegável que a existência de um regramento claro e objetivo (como é o Decreto nº 10.025/2019) confere maior conforto e segurança jurídica na utilização desse mecanismo privado de solução de conflitos.
Dentre as principais virtudes do Decreto, destacamos a previsão de um rol exemplificativo das discussões que poderão ser submetidas à arbitragem, dentre elas: I – as questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos; II – o cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de parceria; e III – o inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes, incluídas a incidência das suas penalidades e o seu cálculo.
Outro aspecto interessante do Decreto refere-se à estipulação de um prazo máximo de 24 meses para que o(s) árbitro(s) apresente(m) a sentença arbitral. Esse prazo pode vir a ser prorrogado, desde que por acordo entre as partes e que o período não exceda 48 meses.
Considerando a morosidade do Poder Judiciário brasileiro, a estipulação de um prazo máximo para a prolação da sentença arbitral soluciona uma das grandes preocupações e incertezas dos investidores quando entram em um litígio contra o Poder Público – relacionada à (falta de) previsão para o término definitivo do processo.
Por fim, e aqui nos parece ser a principal inovação em relação ao arcabouço normativo existente, o Decreto trouxe a previsão expressa acerca da possibilidade de as partes fugirem do sistema de precatórios em relação ao pagamento das condenações proferidas na arbitragem.
Como se sabe, o art. 100 da Constituição Federal estipula que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios. Ou seja, após ter litigado por alguns anos contra o poder público, o investidor privado ainda tem de suportar uma longa espera para receber a quantia arbitrada judicialmente.
Nesse ponto, o Decreto não afasta, necessariamente, a sistemática do pagamento de eventual condenação por meio da expedição de precatório. No entanto, traz a possibilidade, desde que seja estabelecido acordo entre as partes, que o cumprimento da sentença arbitral ocorra por meio de: (i) instrumentos previstos no contrato que substituam a indenização pecuniária, incluídos os mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro; (ii) compensação de haveres e deveres de natureza não tributária, incluídas as multas, nos termos do disposto no art. 30 da Lei nº 13.448, de 5 de junho de 2017; ou (iii) atribuição do pagamento a terceiro, nas hipóteses admitidas na legislação brasileira.
Como se pode perceber, o Decreto vem em bom momento e se soma à legislação vigente no intuito de facilitar e fortalecer a utilização da arbitragem nos contratos de infraestrutura firmados pelo Poder Público, sobretudo no âmbito das relações contratuais relacionadas aos setores portuário e de transportes rodoviário, ferroviário, aquaviário e aeroportuário envolvendo a União ou as entidades da administração pública federal e seus contratados.
* Diogo Albaneze é mestre e especialista em Direito Administrativo pela PUC/SP. Advogado de Giamundo Neto Advogados