*Luiz Eduardo Amaral de Mendonça
De acordo com uma pesquisa realizada pela agência de marketing digital Sortlist o Brasil ocupa o segundo lugar na lista dos países que passam o maior tempo online do mundo. Em média, uma pessoa gasta 10 horas e 8 minutos por dia navegando na internet, equivalente a 154 dias por ano. O relatório Digital 2022, informou que há cerca de 171,5 milhões de usuários de redes sociais no Brasil. Os dados foram realizados a partir de uma pesquisa de janeiro de 2022 e revelam que 79,9% da população brasileira utiliza alguma rede social no seu dia a dia.
Estamos caminhando rapidamente do mundo físico para o mundo virtual. Tal tendência de comportamento já foi levada para o trabalho e hoje o trabalhador que não é ágil na sua comunicação, ou não retorna rapidamente as mensagens dos seus grupos de trabalho, é mal interpretado.
A modernização das formas de trabalho, o home office e a evolução da tecnologia fizeram com que o horário de trabalho (tempo à disposição da empresa) e a vida pessoal dos trabalhadores estejam por muitas vezes misturados. As empresas estão se estruturando para controlar as jornadas à distância, ter prova de que o colaborador conseguiu gozar seus intervalos intra e interjornada. Temos visto cada vez mais as empresas investirem em tecnologia da informação para tratar dados sensíveis dos seus trabalhadores de acordo com a LGPD, mas não temos visto a mesma preocupação por parte dos trabalhadores.
O Brasil é um país em que a alta exposição nas mídias sociais é sinônimo de sucesso. A vida fotografada e publicada nas redes sempre é mais bonita do que a realidade! O trabalho faz parte do dia a dia das pessoas e cada vez mais tem aparecido nas publicações dos seus empregados. Será que os empregados estão preparados para essa nova realidade? As notícias dos Tribunais estão dando conta de que não!
Para aqueles trabalhadores que utilizam os grupos de aplicativo para se comunicarem, há sempre que se verificar o conteúdo, a forma e o horário em que as mensagens estão sendo enviadas. Embora a intenção de um líder possa ser a melhor possível, tais mensagens poderão ser consideradas provas digitais de que algum subordinado tenha trabalhado além da sua jornada e em horas extraordinárias ou que tenha sido desrespeitado, caso a mensagem ultrapasse a linguagem profissional. É cada vez mais comum vermos os prints das conversas em aplicativo serem utilizados como prova na Justiça do Trabalho.
O primeiro exemplo foi um caso de um juiz trabalhista que indeferiu o benefício da Justiça Gratuita e concluiu que um reclamante não era pobre pelas suas postagens das viagens e refeições em um aplicativo de fotos. O reclamante não imaginava que a empresa pudesse ter pesquisado e o Juiz pudesse ter a curiosidade de entrar no seu perfil.
Em abril deste ano, o TST manteve a justa causa de funcionário que publicou fotos da empresa sem autorização. A empresa afirmou que, segundo seu código interno de conduta, esse tipo de prática é proibida e que o regulamento era do pleno e prévio conhecimento do empregado. O TRT gaúcho entendeu que “a divulgação do sistema produtivo da empresa é o que basta para caracterizar o dano” e que as fotografias, “aos olhos de pessoas versadas no tema, em especial dos concorrentes, têm potencial de revelar questões cruciais do sistema produtivo que o Código de Conduta fez questão de proteger e que era do conhecimento do empregado”.
Ainda no mês de julho de 2022, o TRT de São Paulo entendeu como correta a dispensa de um trabalhador que usou as mídias sociais para criticar a empresa em que trabalha. A Justiça do Trabalho paulista manteve a dispensa por justa causa do empregado de uma rede de supermercados do litoral que postou conteúdo ofensivo à empresa. O trabalhador compartilhou uma notícia no Facebook que era prejudicial à imagem da companhia, afirmando que produtos vencidos, separados para o descarte, foram encontrados pela vigilância sanitária no supermercado. A empresa depois provou que a denúncia não passou de um mal-entendido, mas o comentário ofensivo do empregado já havia causado prejuízo, configurando falta grave – ato lesivo da honra e da boa fama praticadas contra empregador – prevista na alínea “k” do artigo 482 da CLT.
Outro caso que ganhou bastante relevância na mídia, diz respeito à reclamante (autora de ação) na Justiça do Trabalho que, no mesmo dia em que prestou depoimento em uma audiência por videoconferência, publicou um vídeo em seu perfil do TikTok, com as duas testemunhas levadas por ela para depor. As três amigas apareceram dançando, com a legenda do vídeo, escrita: “Eu e minhas amigas indo processar a empresa tóxica“. O vídeo foi juntado ao processo pela empresa e a juíza anulou os depoimentos das testemunhas e ainda aplicou multa por litigância de má-fé à autora e às duas amigas testemunhas.
Em todos os casos acima mencionados a prova digital (seja ela de primeiro grau: quando produzida pelos próprios meios digitais ou de segundo grau: quando o fato foi praticado pelos meios convencionais e somente a sua demonstração é feita por meio digital) foi utilizada por uma das partes para convencer o juiz a respeito da existência do fato afirmado na causa, nas razões defensivas conforme dispõe o artigo 369 do CPC.
Antes de postar algo ligado à sua vida profissional, lembre-se: quanto maior a exposição e quanto menos profissionais forem as postagens e as publicações, maiores as chances dos colegas de trabalho, da empresa e até mesmo da Justiça do Trabalho terem acesso.
*Luiz Eduardo Amaral de Mendonça é sócio da área Trabalhista e Previdenciário do FAS Advogados e membro pesquisador do Getrab-USP