Resumo: O presente trabalho analisa o contexto sob o qual se inserem as politicas públicas brasileiras de ações afirmativas, dissertando desde as necessidades iniciais que se fizeram como combustível para implementação de tais medias, até os aspectos da contemporaneidade, onde em uma sociedade modificada pelo decorrer dos anos e na qual já se faz repleta de ações afirmativas, se percebe apesar de iniciais resultados positivos boa parte dos escopos estabelecidos não foram alcançados, de modo que a estratégia tendo chagado ao estágio de declínio carece de uma reformulação, isto como resultado de pesquisa bibliográfica a livros, artigos científicos e legislação e metodologia qualitativa. Defende-se que a grande problemática é o mero caráter remediador de tais ações afirmativas enquanto que o contexto da sociedade moderna explicita a necessidade de medidas preventivas.
Palavras-chave: Isonomia. Ações afirmativas. Insustentabilidade. Reformulação. Minorias.
Abstract: This paper analyzes the context in which Brazilian public policies of affirmative actions are framed, explaining since they need initiatives that were made as fuel for the implementation of such means, even for contemporaneity, where in a society changed to the determinant of years and in which it is considered that it is an action of affirmative actions, it is perceived although once the results are positive, the part of the established scopes is not controlled, books, scientific articles and legislation and qualitative methodology. It is argued that a major problem is a rectifying characteristic of such affirmative actions that the context of modern society makes explicit a need for preventive measures.
Keywords: Equality. Affirmative action. Unsustainability. Reformulation. Minorities.
Sumário: Introdução 1. A evolução do direito das minorias no tempo 2. No Mundo 2.1. No Brasil 2.2. O Direito das Minorias diante da Constituição Federal de 1988 2.2.1. Conceitos básicos 3. Grupo de Minorias 3.1. Isonomia 3.2. Ações afirmativas 3.3. Ações afirmativas nas politicas públicas brasileira 4. Perda da Isonomia diante dos excessos bem como das inecessidades 5. Sistema de Cotas 5.1. Criminalização da homofobia e criação do feminicídio 5.2. Bolsa Família 5.3. A problemática das ações afirmativas 6. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
As ações afirmativas devido a sua eminência faz parte do cotidiano do povo brasileiro, bem como a luta por garantir tratamento igualitário aos considerados diferentes, no entanto, a falta de acompanhamento executório de tal estratégia culminou no desvio de algumas finalidades.
De tal modo, o tema sopesado neste trabalho de conclusão de curso, que concretizou-se mediante pesquisa bibliográfica, visa demonstrar as mudanças de cenários ocorridas, como também as consequências e propor soluções.
Feitas tais considerações, notar-se-á que o Brasil trilhou sua história sob a perspectiva de que era necessária a tomada de medidas que neutralizassem as discrepâncias existentes, bem como sanar injustiças concretizadas em razão da desigualdade de oportunidades aos membros de grupos minoritários.
Nessa toada, houve uma evolução paulatina no desenvolvimento das politicas sociais brasileiras, chegando até a promulgação da Constituição Federal vigente, que é considerada a Constituição cidadã, pois tem em seu teor claras e expressivas garantias e proteções à grupos de minorias como mulheres, negros, indígenas e outros.
Tal sistemática foi abraçado como a grande possibilidade de reverter os abismos existentes entre as classes da sociedade brasileira, como prova disso basta se verificar o grandioso montante de ações afirmativas existentes e de dinheiro público à elas destinadas, todavia, nem por isso não se revelou tão eficaz quanto se almejava.
Assim, o referido estudo se justifica sob a apreciação do quadro politico, jurídico e econômico ao qual o Brasil se inseriu, evidenciando a necessidade de efetuar determinadas revisões.
1. Alguns marcos históricos do direito das minorias
1.1. No mundo
Ao contrário do que se pode imaginar, a abordagem dos Direitos das Minorias não é relativamente recente, possuindo relatos históricos desde o século XVII, com um caráter inicial meramente ligado à liberdade religiosa.
O fim da Primeira Guerra Mundial também se evidencia como eminente marco histórico, pois regeu o desfazimento do Império Otomano e de Habsburgo, acarretando assim no surgimento do principio da autodeterminação nacional, criando um novo bloco de eventos jurídicos que tinham por escopo favorecer as minorias.
Após a Segunda Guerra Mundial, por sua vez, a proteção das minorias foi alterada por ferramentas que resguardavam as liberdades e os direitos humanos individuais, fundamentados em dois princípios relevantes, o da igualdade e da não discriminação. A Segunda Guerra Mundial marcou ainda o término dos regimes de minorias na Europa Central, excedidos pelo sistema de ideias bolchevista da integração dos trabalhadores.
No final do século XX, várias ferramentas internacionais ousadas ressaltaram a relevância dos assuntos concernentes às minorias para a agenda dos direitos humanos. O epicentro foi especialmente o amparo dos interesses e preocupações das minorias por meio do Direito.
Atualmente, os Direitos das Minorias compõem uma peça de grande destaque do direito internacional e acham-se fundados em disposições que miram a assistência e promoção das minorias, considerando suas culturas e tradições.
1.2. No Brasil
Em nível de Brasil, a proteção do Direito das Minorias também tem sua história. A priori cabe lembrar que apesar do Brasil ser reconhecido mundialmente como um país altamente miscigenado, a discriminação esteve sempre presente em sua história e persiste em resistir ao tempo, a ponto de possuir um ritmo de certa forma lento em relação ao aprimoramento da defesa dos Direitos das Minorias no âmbito interno.
Como prova desta afirmação, pode-se citar como exemplo o fato de que o Brasil foi um dos últimos países a abolir a escravatura, e quando esta se concretizou, foi diante de um cenário no qual apenas 5% da população negra ainda vivia sob as condições do regime de escravidão.
As mulheres por sua vez, só obtiveram o direito de acesso à educação em meados do século XIX, sob o destaque que tinham acesso aos níveis básicos, pois os graus mais avançados eram permitidos somente aos homens. Quanto ao sufrágio feminino, este só se fez permitido no ano de 1932, quando o então Presidente Getúlio Vargas promulgou um novo código eleitoral, ressalvando que em 1928 um governador do Rio Grande do Norte havia conseguido uma alteração no corpo legal do código eleitoral, permitindo que as mulheres votassem, no entanto, os votos de todas as mulheres foram cancelados.
Ainda sobre as mulheres, nos anos 60 foi criado o Estatuto da Mulher casada, que possibilitou novos direitos às mulheres, em especial algumas liberdades para as casadas, consentindo-lhes que trabalhassem e recebessem sem a autorização do marido, bem como a possibilidade de solicitar a guarda dos filhos em caso de divórcio.
Quanto ao casamento homoafetivo, este se fez possível somente em maio de 2011 quando o Supremo Tribunal Federal – STF quando julgou conjuntamente a Ação Direta de Inconstitucionalidade de n.º 4.277, sendo relacionado como entidade familiar em analogia à união estável.
1.2.1. O Direito das Minorias diante da Constituição Federal de 1988
No que se refere a Brasil, é evidente que um dos principais marcos na história da proteção dos Direitos das Minorias certamente é a promulgação da Constituição Federal de 1988, que é também reconhecida como Constituição Cidadã.
Até os dias atuais, a CF/88 é reconhecida como uma Constituição revolucionária e moderna.
O texto legal deste documento traz garantias fundamentais de direitos, tendo o principio da dignidade da pessoa humana recebido dos doutrinadores o título de princípio supremo, como assevera Silva (2005, p. 589):
“Poderíamos até dizer que a eminência da dignidade da pessoa humana é tal que é dotada ao mesmo tempo da natureza de valor supremo, princípio constitucional fundamental e geral que inspiram a ordem jurídica, Mas a verdade é que a Constituição lhe dá mais do que isso, quando a põe como fundamento da República Federativa do Brasil constituída em Estado Democrático de Direito, Se é fundamento é porque se constitui num valor supremo, num valor fundante da República, da Federação, do País, da Democracia e do Direito. Portanto, não é apenas um princípio da ordem jurídica, mas o é também da ordem política, social, econômica e cultura”l.
A Carta Magna traz ainda seu bojo outras considerações relevantes no que concerne aos Direitos das Minorias, como o seu 3º art., por exemplo:
“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; […]
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Nota-se que o legislador fez questão de asseverar o caráter garantista da Constituição Federal, reiterando diversas vezes no decorrer de seu texto legal o seu compromisso em promover a não-discrimação e inclusão social.
Outro destaque é o Princípio da Isonomia, elencado no art. 5º CF/88, no qual prevê tratamento igualitário a todos, enfatizando inclusive o tratamento homogêneo entre homens e mulheres, considerando que até as constituições anteriores homem e mulher possuíam direitos e obrigações distintas baseadas por seus aspectos de gênero.
O que nota-se é que a Constituição Federal vigente fez questão de ser categórica na sua missão de prover garantias aos Direitos Fundamentais, protegendo ao individuo enquanto ser humano e não por segregação, assim como se pode notar diante de menção direta de direitos à liberdade religiosa, não discriminação por raça ou etnia, igualdade entre homens e mulheres, dentre outros exemplos.
2. Conceitos básicos
2.1. Grupo de Minorias
No que concerne ao conceito de Minorias, não há ainda um entendimento pacifico e totalmente arrematado, no entanto já se pode notar alguns apontamentos de entendimento homogeneizado.
Porém, existindo a necessidade de uma conceituação acerca do que venha a ser Minoria, o perito Francesco Capotorti a pedido da Subcomissão criada pela ONU para a Prevenção da Discriminação e a Proteção das Minorias, escreveu que as Minorias consistem em um grupo de pessoas em condição de não dominância e inferioridade numérica em relação aos demais, tendo seus membros características religiosas, étnicas, linguísticas ou religiosas distintas de todo o restante da população, demonstrando, ainda que implicitamente, um sentimento de solidariedade voltada à proteger e fazer perpetuar as suas tradições, cultura, língua ou religião (CAPOTORTI apud WUCHER, 2000, p. 78).
Nota-se, que no conceito desenvolvido por Francesco Capotorti são elencados alguns elementos, tais como o da solidariedade, status de não dominância e aspectos quantitativos, quanto a este último não há passividade no entendimento, sendo um elemento refutado por alguns pesquisadores.
Asseverando sobre o fator quantitativo, Moreno (2009. p. 152) observa que:
“Na sociologia, o termo “minoria” normalmente é um conceito puramente quantitativo, referindo-se ao subgrupo de pessoas que representa menos da metade da população total, sendo certo que, dentro da sociedade, ocupa uma posição privilegiada, neutra ou marginal”.
2.2. Isonomia
Como já mencionado aqui anteriormente, a Isonomia é um princípio da esfera Constitucional do Direito brasileiro, elencado no caput do art. 5º da CF/88 afiançando que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.
Advém que o Principio da Isonomia trazido pelo texto constitucional é acertado como Isonomia Formal, consistindo uma igualdade pura, simples e objetiva, visando que as características que individualizam cada pessoa – sejam elas quais forem – acarretem em um tratamento diferenciado, seja em regalias ou obrigações.
Deste modo, calham as considerações de Silva (2005) onde pondera que:
“Igualdade constitucional é mais que uma expressão de Direito; é um modo justo de se viver em sociedade. Por isso é princípio posto como pilar de sustentação e estrela de direção interpretativa das normas jurídicas que compõem o sistema jurídico fundamental’.
Em contrapartida, tem havido o entendimento que paralelamente à Isonomia Formal há também a Isonomia Material, facilmente verificada em um popular verbete jurídico cunhado por Aristóteles onde narra que “devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades”.
A visão devotada no âmbito da Isonomia Material é extremamente articulada pelos ativistas da defesa dos grupos minoritários, usando-o como argumento e ferramenta para implementação da sua visão de justiça.
Nesta linha de pensamento Silva J. (2005, p.215) pondera que:
“Quando se diz que o legislador não pode distinguir, isso não significa que a lei deva tratar todos abstratamente iguais, pois o tratamento igual – esclarece Petzold – não se dirige a pessoas integralmente iguais entre si, mas àquelas que são iguais sob os aspectos tomados em consideração pela norma, o que implica que os ‘iguais’ podem diferir totalmente sob outros aspectos ignorados ou considerados como irrelevantes pelo legislador. Este, julga assim, como "essenciais" ou "relevantes", certos aspectos ou características das pessoas, das circunstâncias ou das situações nas quais essas pessoas se encontram, e funda sobre esses aspectos ou elementos as categorias estabelecidas nas normas jurídicas”.
Assim, na medida em que a Constituição repele todas as formas de discriminação (art. 3º, IV), acaba por estabelecer tratamentos desiguais em prol da concretização da Igualdade Material.
2.3. Ações afirmativas
No que tange às ações afirmativas baseadas na Isonomia Material, tem-se a referência de se tratarem de uma questão que assim como o conceito de Minorias se faz controversa, pois apesar de alguns articulistas abreviarem essas ações a determinadas espécies de discriminação, outros discorrem sob a face de obrigatoriedade de seu caráter provisório, entendendo também de que se trata de iniciativas cunhadas somente do poder público.
Gomes (2001, p. 40), conceitua como:
“[…] um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vista ao combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego”.
Assim, as ações afirmativas consistiriam na implantação de artifícios de políticas sociais com o desígnio de permitir a Igualdade Material aos grupos minoritários, e assim, com tais ações amortizar as desigualdades.
No que se refere à Brasil, as ações afirmativas abarcam não somente os afrodescendentes, mas sim os segmentos sociais discriminados ao longo da história em sua totalidade.
3. Ações afirmativas nas políticas públicas brasileira
Antes de qualquer coisa se faz primordial a asseveração da eminência das ações afirmativas, pois elas se fazem sim necessárias em meio à gestão de todo e qualquer governo, pois por mais evoluído que seja a nação, sempre haverão aqueles que se encontram em condições extremadas, carecendo assim da intervenção estatal.
Tal afirmação se revela tão real que é facilmente verificada na história dos governos brasileiros, até mesmo em períodos criticados como o da ditadura, quando o então Presidente Getúlio Vargas recebeu o título de “pai dos pobres” ressaltando as atividades de sua gestão que atendiam aos menos favorecidos.
No governo de Fernando Henrique Cardoso também se é capaz de notar politicas públicas com teor de ações afirmativas, como, por exemplo, em 1996, quando é lançado o Plano Nacional de Direitos Humanos pela Secretaria de Direitos Humanos, abrangendo a implementação de ações afirmativas com o intuito de inserção de negros em cursos de profissionalização, ambientes de conhecimento tecnológico, universidades e desenvolvimento de politicas equalizadoras para promoção econômica e social em face aos negros.
Posterior ao comando de FHC surge sobre o Brasil a gestão de lideres do Partido dos Trabalhadores – PT, sendo eles Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, de modo que ambos somaram pouco mais de 15 anos na detenção da presidência da República Federativa do Brasil.
O governo petista, diferentemente do governo de FHC se instala em condições econômicas mais estáveis, o que lhes permite dedicar maiores energias para o estabelecimento de suas ideologias de governo nitidamente bolivarianas e socialistas.
O primeiro mandato de Lula se deu com a eleição realizada no ano de 2002, representando um grande marco no que diz às politicas públicas em governos brasileiros, isto levando em consideração o triunfo eleitoral indiscutível de um partido de esquerda, com um Presidente que pela primeira vez na história do Brasil se enquadra nas características de um legítimo representante das classes mais necessitadas da população.
Além de toda utopia envolvendo tal vitória, esta reviravolta significa, para uma quantia considerável da população brasileira, a esperança de uma transformação expressiva em termos de rompimento da orientação política confessadamente neoliberal implementada inicialmente pelo governo Fernando Collor e prosseguida no governo Fernando Henrique Cardoso.
Destarte, o nascido governo do Partido dos Trabalhadores, calhou em representar um alento de perspectivas significativamente otimistas no que se refere à modificação no padrão neoliberal a partir da retomada de uma política com maior teor social e desenvolvimentista.
É justamente neste cenário voltado às politicas sociais que as ações afirmativas são incorporadas nos planos de governo, destaque inicial para a junção de programas sociais como Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxilio Gás e Fome Zero, culminando assim no tão reconhecido Bolsa Família; este último rendeu títulos a nível internacional ao então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Nessa toada, com objetivo de atenuar o abismo social entre pessoas de pele claras e negras, o administração pública resolveu por aplicar o sistema de cotas raciais nas universidades, efetuando a reserva de vagas nas referidas universidades federais para alunos sobrevindos de escolas públicas, com cotas direcionadas especificamente para negros e pardos.
Desde a sua implantação este processo tem recebido criticas ferrenhas, sob alegação de que tal sistemática contradiz ao principio constitucional da isonomia, que como aqui já abordado, consiste no tratamento igualitário entre os indivíduos.
Outro fator que tem sido substância de crítica é fato que esse sistema recai em beneficiar estudantes que não são verdadeiramente negros ou pardos. Isso porquanto não há nenhuma metodologia objetiva a ser aplicada na determinação se o individuo em questão é branco, pardo ou negro, especialmente numa nação como a brasileira que tem entre umas das principais características da sua população justamente a miscigenação, permitindo assim, o beneficiamento indevido.
O PROUNI (Programa Universidade para Todos), por sua vez, foi desenvolvido com o escopo de conferir bolsas de estudo, tanto integrais quanto parciais, em cursos de nível superior de formação específica em estabelecimentos privados.
Além de programas de governo, na gestão petista também ocorreram ações afirmativas em outras esferas, como se pode evidenciar na considerável força que o movimento LGBT alcançou, ao ponto de se encontrar em tramitação três projetos de emenda constitucional pleiteando direitos a esta classe, inclusive a criminalização do da homofobia aos mesmos moldes do racismo.
Outro exemplo de ações afirmativas nas politicas públicas é a redistribuição de terra pleiteada pelo movimento dos Sem-Terra, que reivindica a desapropriação de grandes latifúndios que se encontram sob a posse de multinacionais, bem como a redistribuição de terras em status improdutivo, apresentando este movimento considerável êxito na ultima década. Cabe salientar que o referido movimento guerreia tão fervorosamente pela reforma agrária que acaba por sua luta se confundir com a sua própria história.
No mesmo sentido, têm-se a concessão pelo governo federal de inúmeras modalidades de benefícios sociais, como o a isenção de impostos dada às pessoas portadoras de deficiência, de modo que sendo ele o motorista lhe calha a isenção de IPVA, ICMS, rodizio municipal IOF; já o autista e deficiente visual, bem como portador de necessidades especiais que tenham deficiência física e não sejam condutores recebem isenção de IPI e rodizio municipal.
Aos deficientes físicos incide ainda o beneficio assistencial continuado por intermédio do instituto previdenciário, com acréscimo de 30% do valor concedido aos que necessitam de cuidados especiais permanentes, e ainda uma percentagem destinada a cotas em concursos e vestibulares, bem como percentual mínimo de pessoas com deficiência em empresas.
No âmbito jurídico também se é possível verificar medidas de caráter afirmativo, como no caso da Lei 13.104 do ano de 2015 que institui o crime do Feminicídio, concretizando este em face de homicídio cometido contra mulher motivado pelo fato de ser mulher, caracterizando-se pela discriminação ou depreciamento por tal fato ou violência de cunho doméstico.
Citando mais um grande exemplo que se molda sob os mesmos aspectos ao anterior citado, tem-se a Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha, na qual em sua ementa dispõe que:
“Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal”.
Na mesma toada, um exemplo clássico de medidas afirmativas que se incorporaram ao Direito brasileiro é o crime de racismo e injúria racial, levantados pela Lei 7.716 de 05 de janeiro de 1989 e consagrados pela Carta Magna promulgada em 1988, dispondo como ilícito, ilegal e punível condutas e expressões que têm como teor o menosprezo à raça de determinado, sendo o crime de racismo imprescritível e inafiançável.
4. Perda da Isonomia diante dos excessos bem como das inecessidades
Como já apontado neste trabalho, o Principio Constitucional da Isonomia insurge no Direito brasileiro sob duas vertentes. A primeira sob aspecto formal, na qual intui que o tratamento deve ser igualitário a todos os indivíduos. A segunda, por sua vez, é a material, narrando que a fim de afiançar a efetividade da justiça e sanar as desigualdades, as diferenças devem ser avaliadas e postas em consideração.
Ressalte-se aqui, que a abordagem material da Isonomia se faz necessária em meio a uma sociedade tão desigual e individualista, na qual as pessoas atropelam os direitos alheios para ampliar as próprias vantagens. Porém, abre-se espaço a criticas a partir do instante em que as ações afirmativas perdem o caráter de ferramenta equalizadora para tornar-se provedor de regalias.
Enquanto as ações afirmativas têm como substância dar subsídio para que as minorias concorram de igual para igual com os demais, estas se justificam, no entanto, quando não se é possível verificar tal substância perde-se por completo sua legitimidade, visto que perde-se a essência para o feito.
Diante de tal asseveração, pode-se avaliar melhor algumas das medidas afirmativas já explicitadas neste trabalho.
4.1. Sistema de Cotas
Desde a sua propositura, o sistema de cotas se fez altamente polêmico e diverge opiniões mesmo após 10 anos desde sua implementação.
O ponto de partida se faz sob a alegação de que o Brasil possui uma população em sua maioria negra com um percentual de aproximadamente 51% e os brancos de 49%, onde apesar de tamanha expressividade numérica, as universidades teriam em sua composição somente 2% de negros. No entanto em consulta ao último senso realizado pelo IBGE tem-se a seguinte disposição entre as raças:
Como se pode observar, enquanto 47,51% da população brasileira se declara branca, somente 07,52% intitulam-se negros, o que deve ser considerado com relação ao contexto aqui elencado, visto que está proporção é observada em outros aspectos estatísticos, inclusive com relação à inserção em universidades.
Porém, cabe aqui asseverar que a implementação do sistema de cotas raciais, sejam em universidades ou concursos públicos, acabam por concretizar uma modalidade diversa de discriminação, mas desta vez em face dos brancos em estado de pobreza, pois mesmo a hipossuficiência sendo notória, não se beneficiariam de tais recursos.
Ocorre que os patronos de tais ações afirmativas acabam por esquecer-se de indicar em suas argumentações a constância de certo grau de ineficácia quanto ao alcance dos objetivos pretendidos, visto que ao invés de dirimir conflitos acabam por ampliá-los e criar novas espécies de subversões, isto diante da ideia de favorecimentos a este grupo.
Como prova disso, tem-se dados estatísticos da Secretaria de Políticas de Promoção à Igualdade – SEPPI, que têm demonstrado crescimento no número de ocorrências de crimes de injúria e racismo, demonstrando que ao invés de contribuir com a sociedade com a inserção de uma ideologia de vida menos discriminatória tais ações têm obtido efeito inverso, como se pode observar no quadro abaixo:
O que tal metodologia não leva em consideração é que os vestibulares e concursos públicos são realizados como uma modalidade de filtro através do qual se extrai os melhores dos melhores, avaliando única e objetivamente o conhecimento de cada concorrente em relação aos demais, não havendo constatações cientificas que tons diversos de pele aumentem ou diminuam as capacidades cognitivas e intelectuais.
Como o grande argumento se tratada da narrada hipossuficiência detida pelos negros, ao invés de um sistema de cotas deve-se ampliar programas de bolsas de estudo e financiamentos estudantis, garantindo assim o acesso de modo mais justo e sanando o problema explicitado pelos padrinhos da causa sem interferências no sistema de avaliação dos conhecimentos.
Quanto aos concursos públicos, assim como também com relação à inserção em faculdades, necessita-se de maiores e mais efetivos melhoramentos na educação de base.
Outra solução plausível e mais isonômica refere-se à implementação de critérios econômicos para inserção em universidades públicas, garantindo assim preferencia àqueles que de fato não possuem condições econômicas para custear a obtenção de diploma de ensino superior em instituições privadas.
Por fim, quanto a este tópico certifico que quando se há objetivos e foco o resultado é atingido independentemente de cor ou condições financeiras.
Como prova disso têm-se histórias como a de Cícero Batista Pereira, brasiliense, negro e pobre que trabalhava como gari onde diante do sonho de ser médico preparou-se para o vestibular vasculhando livros que lhe fossem uteis nas prateleiras do projeto Biblioteca Popular.
Thompson Vitor, por sua vez, aos 15 anos de idade obteve a primeira colocação geral no exame de seleção do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, estudando apenas com os livros que sua mãe encontrava nos lixos de sua cidade.
Outro exemplo considerável é o do morador de rua como Valter dos Santos, que mesmo em sua condição de mendigo obteve a primeira colocação em concurso público realizado em Minas Gerais; e de Antônia Marina Faleiros, que apesar de ser empregada doméstica vinda de família extremamente pobre e chegando a morar na rua cursou Direito e atualmente exerce a magistratura.
4.2. Criminalização da homofobia e criação do feminicídio
Tanto a criminalização da homofobia quanto o recém-criado instituto do feminicídio, consistem na tipificação de tais condutas como discriminatórias. A primeira defronte de atitudes segregatórias em face dos homossexuais e o segundo em decorrência de crime contra a incolumidade física e a vida consubstanciada no fato da vítima ser mulher.
No entanto, deve-se ponderar a ocorrência que já há institutos vigentes no sistema jurídico brasileiro que abarcam a penalização de tais condutas, ainda que não especificadamente por tais características e sim em um contexto mais amplo, evidenciando que mais urgente é o desenvolvimento de medidas educativas que a instituição de medidas sancionatórias.
Quanto ao feminicídio, o código penal já trazia como qualificadora para o crime de homicídio a motivação torpe e fútil, onde assim como no feminicídio eleva a pena mínima de 06 para 12 anos e amplia a máxima de 20 para 30 anos. O motivo torpe citado é tido como aquele em que é moralmente reprovável e desprezível, já o motivo fútil aquele no qual há uma espantosa desproporção entre a motivação moral e a conduta homicida.
Com relação à homofobia, apensar do projeto de lei nº 122/06 ter sido arquivado no ano de 2015 após 08 anos de discussões e debates, os movimentos defensores da causa perseveram em sua luta pela criminalização de tal conduta.
Acerca da proposição de lei arquivada, esta em parte desrespeitava por completo o Principio da Isonomia, porquanto, na tentativa de criminalizar quaisquer condutas que fossem manifestadamente contrárias às práticas homossexuais pretendia inclusive inibir que padres e pastores baseados em suas crenças não mais pregassem de modo contrário à homossexualidade, asfixiando assim o direito também constitucional da liberdade religiosa.
Calha ressaltar ainda que as jurisprudências têm demonstrado que o código de leis brasileiras é suficiente para dirimir e instituir a justiça para casos de tal matéria, visto que além dos danos morais previsto no Código Civil onde é estabelecida indenização em virtude de lesões de cunho moral e subjetivo, há ainda os crimes contra a honra tipificados no Código Penal, de modo que o art. 140 estabelece o crime de injúria, consistindo este na ofensa à dignidade ou decoro de outro indivíduo, havendo inclusive a previsão de pena de reclusão.
4.3. Bolsa Família
Com relação ao programa social destaque dos governos petistas, este de fato se faz necessário como ação para combate à má distribuição de renda entre a população brasileira, contudo, cabe a ressalva que a metodologia usada para instituição do referido programa acaba por desenvolver consideráveis níveis de dependência aos seus beneficiários.
Nessa toada, a edição online do Jornal Folha de São Paulo (2014) em uma de suas publicações fez as seguintes considerações sobre o tema:
“Com uma década de existência, o Bolsa Família representa hoje a maior parte dos ganhos de uma parcela significativa da população. O programa – que deveria ser temporário e servir apenas como forma de auxiliar os beneficiários em sua luta para sair da miséria – consolidou-se como a base da sobrevivência dessas famílias, pois a renda do trabalho, quando existe, é insuficiente, e não há perspectivas de que essa situação mude num futuro previsível. Esses brasileiros se tornaram, portanto, clientes permanentes de favores do Estado.”
Nota-se que ao contrário do pretendido, ao invés de promover a independência financeira vê-se a concretização do inverso, visto que a simples frequência escolar e regularidade no calendário de vacinas garante a continuidade do recebimento do beneficio, não havendo institucionalizado nenhuma modalidade de capacitação profissional ou outra estratégia que ensine e prepare a família para deixe de ser dependente do programa social.
Meirelles, (2016, Apud Scheller, 2016) em entrevista ao Jornal Folha de São Paulo se pronunciou que:
“O Bolsa Família impacta bastante o consumo e a vida de seus beneficiários, que possuem renda extremamente baixa. Entretanto, o valor desembolsado tem baixa representatividade. Corresponde a aproximadamente 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro”.
Deste modo nota-se que apesar dos aproximadamente 117,3 bilhões de reais desembolsados nos últimos 05 anos os retornos são irrisórios, especialmente quando se constata a persistência em haver altos índices de dependência ao programa pelos beneficiários, o que indica a necessidade da reformulação de tal estratégia, bem como implementação de metodologias capacitivas de habilidades profissionais, pois havendo desenvolvimento profissional tal dependência será desconfigurada.
5. A problemática das ações afirmativas
A problemática do excesso de ações afirmativas consiste na impossibilidade tanto da gestão pública quanto do sistema jurídico em sustentá-las por um período de tempo considerável, bem como manter o acelerado ritmo no qual o Brasil se encontra.
Nunca antes na história brasileira houve tantas ações afirmativas em aplicação e nem tanta força os grupos sociais. O lado positivo de tal afirmação é a percepção de que a sociedade tem mudado e abandonado velhos hábitos abomináveis. No entanto, a razoabilidade deve se fazer presente na implementação de tais modificações ideológicas, para que desta forma não se perca o norte estabelecido pela Carta Magna por intermédio do Principio da Isonomia, seja em sua vertente formal ou material.
De fato, em determinado momento da história do Brasil havia-se a necessidade de expandir o quantitativo de ações afirmativas em funcionamento, para que deste modo à qualidade de vida da população fosse aprimorada.
Contudo, ao analisar a crise politica, jurídica e econômica em que a nação brasileira inseriu-se em face da teoria de Kotler na qual afiança que produtos e sistemas passam respectivamente pelas etapas de introdução, crescimento, maturidade e declínio e posteriormente renovam-se, é possível constatar que tal estratégia baseada em ações afirmativas de caráter remediador após seu ápice alcançou a fase de declínio, fazendo-se necessária a renovação para que assim se retorne a obter resultados positivos.
Como demonstração da insustentabilidade da estratégia em vigência basta sopesar o montante destinado a programas sociais no ano de 2016, que segundo o Portal da Transparência são aproximadamente 339,7 bilhões de reais, quantia excessivamente considerável diante da expressiva recessão em que o país se encontra.
Na esfera jurídica, o costume rotineiro de criminalização de condutas somente apregoa a falta de politicas básicas e preventivas, pois havendo práticas educativas e socializadoras desde as bases da sociedade se fará cada vez mais desnecessário a instituição de novas normas legais com caráter punitivo e/ou repressivo. Tipificações legais estas que carecem da participação direta do poder legislativo, que por sua vez custa anualmente aos cofres públicos a quantia de 01 bilhão de reais por deputado.
Como exemplo da insustentabilidade e do agravamento de tais afirmações tem-se nações como Venezuela e Bolívia, que por meio da aplicação de politicas extremamente socialistas elevaram drasticamente os dispêndios do poder público, onde apesar de bons resultados em um curto espaço de tempo o decorrer dos anos mostrou que se tornou complicada a empreitada de garantir tais gastos visto que se tornaram exacerbadamente volumosos.
6. CONCLUSÃO
Como se pode observar, percebe-se que tamanha preocupação em afiançar o desenvolvimento social da população brasileira fez com que os governos sucessivamente instituíssem medidas afirmativas, inclusive programas sociais, ao ponto de tornar-se destaque internacional neste quesito.
Todavia, como asseverado neste trabalho à manutenção de tais práticas tornou-se precária, pois apesar de resultados positivos em curto prazo, boa parte dos resultados pretendidos não foram alcançados, visto que ao invés de prover independência acabaram por instaurar um significativo quadro de dependência.
Tal situação concretizou-se em especial pelo mero caráter remediador de tais ações, de modo que não havendo combate a raiz do problema, este se perpetuará.
Expresse-se aqui a enorme carência que o Brasil possui em medidas preventivas junto à base da sociedade, principalmente no que se refere à educação, pois o país alicerçado por critérios e medidas que priorizem a educação desenvolve-se de maneira organizada e progressiva, justamente o que a nação brasileira carece.
Tem-se a necessidade de perceber que nem sempre a solução é o estabelecimento medidas que sanem as desigualdades e que um grande volume de ações afirmativas não é sinônimo de desenvolvimento social, porquanto como protestado em todo este trabalho, tal estratégia da forma em que é executada culmina em ocasião na qual se perde a efetividade.
De fato, ainda não se chegou ao modelo de sociedade almejado, bem como este escopo ainda se faz distante, no entanto, precisa-se repensar as táticas aplicadas dando maior ênfase à medidas preventivas, assim como fizeram países que atualmente são potências mundiais, tais como Estados Unidos, Coréia do Sul, Finlândia, dentro outros.
Finalmente, considerando que tais modificações nas politicas públicas, a reformulação das estratégias afirmativas e ampliação de empenhos em prol do melhoramento no sistema educacional basilar brasileiro tratam-se de medidas a serem atingidas em longo prazo, defende-se aqui a existência sim de ações afirmativas no âmbito das politicas públicas, porém com o intuito de minimizar a problemática sob a qual se inserem e não mais como solução principal e definitiva como vinha ocorrendo até então.
Informações Sobre o Autor
Amanda Pereira Oliveira Dias
Servidora pública com formação superior em Logística e Bacharelado em Direito