Faltar ao trabalho durante o período de aviso prévio pode trazer consequências diretas para o trabalhador, tanto do ponto de vista legal quanto financeiro. O aviso prévio é uma fase delicada da rescisão do contrato de trabalho, e, mesmo que o vínculo esteja prestes a ser encerrado, o empregado ainda tem deveres e obrigações a cumprir até o último dia.
Neste artigo, vamos explicar em detalhes o que acontece se o trabalhador faltar durante o aviso prévio, quais são as consequências legais, se a empresa pode aplicar penalidades, como funciona o desconto proporcional, como deve ser feito o controle de ponto e o que diz a jurisprudência sobre o tema. Também abordaremos os diferentes tipos de aviso prévio e o que muda em cada caso.
O que é aviso prévio
O aviso prévio é um direito previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), especificamente no artigo 487. Ele tem como finalidade informar antecipadamente a outra parte sobre a rescisão do contrato de trabalho, permitindo uma transição menos abrupta.
Esse aviso pode ser:
Concedido pelo empregador, quando ele decide encerrar o contrato de trabalho;
Concedido pelo empregado, quando é este quem deseja sair da empresa.
O prazo do aviso prévio é, no mínimo, de 30 dias, mas pode ser acrescido de até 3 dias por ano completo trabalhado, limitado a 90 dias totais, conforme prevê a Lei nº 12.506/2011, no caso de demissão sem justa causa.
Durante esse período, o contrato de trabalho permanece em vigor, com todos os direitos e deveres mantidos para ambas as partes.
Tipos de aviso prévio
Antes de entender o que acontece quando há faltas no aviso prévio, é essencial conhecer os dois tipos principais de aviso:
Aviso prévio trabalhado
Nesse modelo, o empregado permanece trabalhando durante os dias do aviso, cumprindo jornada regular ou reduzida. A CLT prevê duas possibilidades:
Jornada diária reduzida em 2 horas;
Redução de 7 dias corridos no total do aviso, ao final do período.
A escolha cabe ao trabalhador, quando o aviso é dado pelo empregador.
Aviso prévio indenizado
Neste caso, a parte que não deseja que o contrato se prolongue por mais 30 dias (ou mais, conforme o tempo de serviço) opta por indenizar financeiramente o outro lado.
Por exemplo, se o empregador manda o trabalhador embora e decide não exigir os 30 dias de trabalho, ele deve pagar os dias como se fossem trabalhados.
Já se o empregado pede demissão e não deseja ou não pode cumprir o aviso, ele poderá ter o valor correspondente aos 30 dias descontado das verbas rescisórias.
O problema das faltas se dá, na prática, quando o aviso é trabalhado.
Faltar durante o aviso prévio trabalhado
Quando o trabalhador falta ao serviço durante o aviso prévio que está sendo cumprido, essa ausência pode trazer consequências disciplinares e financeiras.
Mesmo durante o aviso, o contrato de trabalho ainda está ativo, o que significa que o trabalhador deve:
Cumprir a carga horária estabelecida;
Justificar faltas, quando for o caso;
Evitar atrasos;
Cumprir com suas atribuições normalmente.
Faltas injustificadas no período do aviso prévio podem gerar descontos no salário, suspensão e até justa causa, dependendo da gravidade e reincidência da conduta.
Exemplo prático
Se um trabalhador falta 5 dias injustificadamente durante o aviso de 30 dias, ele poderá sofrer o desconto proporcional de 5/30 no valor a receber.
Se, além disso, houver reiteradas faltas e negligência no cumprimento de suas funções, a empresa pode avaliar a conduta como desídia (falta de interesse no trabalho), que está prevista como motivo de justa causa no artigo 482 da CLT.
Aviso prévio e controle de ponto
Durante o aviso prévio trabalhado, o controle de ponto continua sendo obrigatório, da mesma forma que em qualquer outro período do contrato.
Caso o trabalhador não registre sua jornada, a empresa pode considerar a ausência como falta injustificada.
Por outro lado, se o empregador não fornecer meios de controle adequados, poderá ser responsabilizado por eventuais descontos indevidos.
É fundamental que o trabalhador:
Registre corretamente a entrada, saída e horários de intervalo;
Justifique ausências com documentos (atestado médico, declarações oficiais etc.);
Guarde cópias de documentos enviados e recebidos durante o aviso.
A falta durante o aviso prévio pode ser descontada?
Sim. Toda falta injustificada durante o aviso prévio pode ser descontada do valor que o trabalhador receberá ao final do contrato. Esse desconto deve seguir a proporcionalidade:
Uma falta em 30 dias equivale a 1/30 do valor do salário;
Duas faltas, 2/30, e assim por diante.
Além disso, em casos mais graves, o empregador pode adotar medidas disciplinares como advertência e suspensão.
O trabalhador também perde, proporcionalmente, o valor de benefícios vinculados à presença, como:
Vale-transporte;
Vale-refeição;
Bonificações por assiduidade.
Pode haver justa causa por falta no aviso prévio?
Em tese, sim. O aviso prévio é parte do contrato de trabalho ainda vigente, e a CLT prevê, no artigo 482, que o trabalhador pode ser dispensado por justa causa se cometer faltas graves como:
Insubordinação;
Desídia (preguiça, negligência, desinteresse);
Ato de indisciplina;
Abandono de emprego.
Se o trabalhador deixa de comparecer reiteradamente, sem justificativa, ou manifesta desinteresse completo no cumprimento das tarefas, o empregador pode rescindir o contrato por justa causa, mesmo durante o aviso prévio.
No entanto, como a justa causa tem efeitos severos e retira uma série de direitos do empregado, a empresa deve comprovar a falta grave, além de seguir o princípio da graduação das penas disciplinares (advertência, suspensão, justa causa).
Faltar durante o aviso prévio pedido pelo trabalhador
Quando o empregado pede demissão e se compromete a cumprir o aviso prévio, ele também deve respeitar a carga horária e os deveres do contrato.
Se faltar injustificadamente, poderá ter descontos proporcionais e, em caso de faltas graves ou desídia, até mesmo ter o contrato encerrado por justa causa.
Além disso, se ele abandona completamente o cumprimento do aviso, a empresa pode optar por não pagar o período e registrar a ocorrência como descumprimento contratual.
Exemplo
Um trabalhador pede demissão no dia 1º e informa que cumprirá o aviso. No entanto, comparece apenas nos três primeiros dias e, depois, falta os 27 dias restantes, sem justificativa.
A empresa poderá descontar esses dias do acerto final, ou, dependendo do caso, considerar a conduta como abandono ou desídia, justificando justa causa.
Faltar durante o aviso prévio dado pela empresa
Quando o aviso parte da empresa e o trabalhador decide cumpri-lo, ele também deve manter sua regularidade funcional.
O empregado pode optar por:
Reduzir duas horas da jornada por dia;
Ou trabalhar 23 dias corridos (com 7 dias de redução).
Independentemente da escolha, se faltar sem justificativa nesse período, estará sujeito a descontos proporcionais, e eventualmente a sanções disciplinares.
Entretanto, por se tratar de uma rescisão imposta pela empresa, o empregador não pode exigir mais do que foi estabelecido legalmente, nem usar as faltas para penalizar o trabalhador de maneira desproporcional.
Faltas justificadas no aviso prévio
Nem toda falta durante o aviso gera penalidade. Faltas justificadas, previstas na CLT, não podem ser descontadas nem usadas como base para sanções disciplinares.
Exemplos de faltas justificadas durante o aviso:
Apresentação de atestado médico válido;
Falecimento de familiar próximo;
Casamento;
Comparecimento em juízo;
Doação de sangue;
Realização de exame vestibular.
Para que a falta seja aceita, o empregado deve apresentar o documento no prazo estipulado pela empresa, que geralmente varia entre 24 e 48 horas.
Pedido de dispensa do cumprimento do aviso
Se o trabalhador, ao pedir demissão, não deseja cumprir o aviso prévio, pode solicitar ao empregador que seja dispensado. Nesse caso, há três possibilidades:
O empregador aceita e não desconta nada;
O empregador aceita, mas desconta os 30 dias do acerto;
O empregador exige o cumprimento, e o trabalhador deve comparecer ou aceitar o desconto em caso de ausência.
Tudo depende da negociação entre as partes, e o ideal é que isso esteja documentado por escrito, para evitar conflitos futuros.
Jurisprudência sobre faltas no aviso prévio
A jurisprudência brasileira tem confirmado o entendimento de que o aviso prévio é parte do contrato de trabalho, e que as faltas injustificadas podem resultar em descontos proporcionais, desde que não haja abuso por parte da empresa.
Os tribunais também reconhecem que o abandono do aviso prévio pode configurar justa causa, mas sempre exigem a prova da intenção de não mais retornar ao trabalho, conforme estabelece a súmula 32 do TST.
O que se observa é que cada caso é analisado individualmente, levando em consideração o histórico do trabalhador, a gravidade da falta e a conduta da empresa.
Seção de perguntas e respostas
Faltar um dia no aviso prévio gera justa causa?
Não necessariamente. Uma falta isolada pode gerar desconto proporcional, mas não configura justa causa, salvo se houver reincidência e má-fé.
Quantos dias posso faltar no aviso prévio?
Não há um número permitido. Todas as faltas injustificadas podem ser descontadas. Faltas justificadas, com documentação, são aceitas.
O que acontece se eu faltar os 30 dias do aviso?
Você pode ter os 30 dias descontados das verbas rescisórias ou, em alguns casos, ser dispensado por justa causa, se ficar configurada a intenção de abandonar o trabalho.
Se estiver doente no aviso prévio, posso faltar?
Sim, desde que apresente atestado médico válido. As faltas por motivo de saúde são justificadas.
O empregador pode me proibir de sair antes do fim do aviso?
Pode exigir o cumprimento, sim. Se você sair antes sem acordo, pode sofrer o desconto ou outra penalidade proporcional.
O aviso prévio pode ser anulado por faltas?
Não, mas pode ser interrompido ou convertido em justa causa, se as faltas forem graves e intencionais.
Durante o aviso, tenho que cumprir horário normal?
Sim, salvo se optar pela jornada reduzida em duas horas ou pelos sete dias de redução no final.
A empresa pode mudar o horário de trabalho no aviso?
Mudanças drásticas e não acordadas podem ser consideradas abusivas. Qualquer alteração deve respeitar o contrato vigente.
O que fazer se a empresa descontar faltas justificadas?
Você pode buscar o sindicato, registrar queixa no Ministério do Trabalho ou até ajuizar ação trabalhista para reaver os valores indevidos.
Conclusão
Faltar durante o aviso prévio, quando este é trabalhado, pode trazer descontos financeiros, advertências e, em casos extremos, justa causa. O aviso prévio integra o contrato de trabalho e deve ser cumprido com seriedade por ambas as partes. Tanto o trabalhador quanto o empregador devem manter o diálogo, registrar acordos por escrito e respeitar os direitos mútuos para evitar litígios.
O ideal é que o empregado, se tiver necessidade de se ausentar, comunique e justifique formalmente suas faltas. Já o empregador deve atuar com razoabilidade, proporcionalidade e cumprir com os deveres legais. Em caso de dúvidas ou abusos, buscar orientação jurídica pode ser o melhor caminho para proteger direitos e esclarecer obrigações.