O ambiente de trabalho deve ser um espaço de convivência respeitosa, cooperação e segurança emocional. No entanto, nem sempre isso acontece. Em muitas empresas, situações de ofensa entre colegas podem surgir, comprometendo o bem-estar de todos. Quando um trabalhador se sente ofendido por outro colaborador, surgem diversas dúvidas: devo confrontar a pessoa? Avisar o RH? Registrar um boletim de ocorrência? Processar a empresa ou o agressor? Este artigo responde a todas essas questões com base na legislação brasileira, nas boas práticas profissionais e no entendimento dos tribunais.
O que caracteriza uma ofensa no ambiente de trabalho
A ofensa no ambiente de trabalho ocorre quando um colega, por palavras ou atitudes, viola a honra, a imagem, a dignidade ou o respeito de outro profissional. As ofensas podem ocorrer de forma direta, pública ou privada, presencialmente ou em meios digitais (como e-mails ou mensagens de aplicativos).
Exemplos comuns de ofensa:
Xingamentos
Gritaria ou tom agressivo
Comentários preconceituosos
Acusações infundadas
Piadas ofensivas sobre aparência, gênero ou religião
Insinuações de incompetência
A depender da gravidade, essas condutas podem configurar assédio moral, injúria, difamação, ou até mesmo discriminação, gerando consequências civis, trabalhistas e penais.
A importância de agir diante de uma ofensa
Ignorar uma ofensa grave ou repetitiva no ambiente de trabalho pode gerar:
Prejuízos emocionais
Queda de desempenho
Agravamento da situação
Conivência involuntária com práticas abusivas
Dificuldade futura em comprovar o ocorrido
Por isso, agir corretamente desde o primeiro episódio é essencial para preservar sua integridade, seus direitos e seu ambiente profissional.
Passo a passo: o que fazer quando for ofendido no trabalho
1. Mantenha a calma
Evite reagir de forma impulsiva. Uma reação agressiva pode inverter a situação e prejudicar sua razão. Respire fundo e, se necessário, afaste-se para evitar um confronto imediato.
2. Registre o ocorrido
Anote o que aconteceu, com data, hora, local, conteúdo da ofensa e nomes de testemunhas. Se possível, guarde mensagens, áudios, e-mails ou qualquer prova que possa ser usada posteriormente.
Esses registros serão fundamentais para:
Comprovar o comportamento ofensivo
Demonstrar a reincidência da conduta
Embasar denúncias internas e processos judiciais
3. Converse com o ofensor (se for seguro)
Em casos de ofensas leves e isoladas, uma conversa direta pode resolver a situação. Diga de forma clara que se sentiu ofendido e que espera respeito. Isso pode evitar que a situação se repita.
Porém, não tente conversar sozinho com o agressor se houver risco de confronto ou se a conduta for grave.
4. Comunique o setor de Recursos Humanos
O RH tem a obrigação de zelar pela integridade física e psicológica dos colaboradores. Informe formalmente o ocorrido e solicite providências. Se sua empresa tiver canal de ouvidoria ou compliance, utilize-o.
Importante:
Faça a denúncia por escrito ou por e-mail
Peça protocolo ou confirmação de recebimento
Guarde cópia da comunicação
5. Solicite testemunhas
Se alguém presenciou a ofensa, peça que relate o fato por escrito, ou esteja disposto a confirmar a versão dos fatos, se necessário. Testemunhas são fundamentais, especialmente em denúncias internas e processos trabalhistas.
6. Formalize uma denúncia
Se a empresa não tomar providências, é possível formalizar denúncia externa, como:
Ministério Público do Trabalho (MPT)
Superintendência Regional do Trabalho
Sindicatos da categoria
Esses órgãos poderão fiscalizar o ambiente e verificar se há omissão patronal.
7. Registre boletim de ocorrência
Se a ofensa ultrapassar o limite do aceitável, como em casos de:
Agressões verbais graves
Ameaças
Injúrias raciais
Ofensas sexuais
Você pode e deve registrar um boletim de ocorrência (BO) na delegacia mais próxima ou pela Delegacia Eletrônica (em alguns estados). A depender do caso, o agressor poderá responder por:
Injúria (art. 140 do Código Penal)
Difamação (art. 139)
Ameaça (art. 147)
Injúria racial (art. 140, §3º)
Assédio sexual (art. 216-A)
Consequências jurídicas para o agressor
O colega que ofende outro pode responder nas esferas:
Penal
Dependendo da gravidade, pode ser condenado por crime contra a honra ou violência verbal, com penas que variam de detenção a prestação de serviços comunitários.
Cível
A vítima pode entrar com ação de indenização por danos morais, exigindo do ofensor o pagamento de uma compensação financeira.
Trabalhista
A empresa pode aplicar advertência, suspensão ou justa causa ao ofensor, conforme a política interna e a gravidade da conduta.
Além disso, se o agressor for superior hierárquico e houver habitualidade, o caso pode configurar assédio moral, gerando direito à indenização.
Responsabilidade da empresa
A empresa tem o dever de zelar por um ambiente de trabalho saudável, sendo responsável por atos de seus empregados durante o expediente ou no exercício de suas funções.
O artigo 932, III do Código Civil estabelece:
“São também responsáveis pela reparação civil: os empregadores, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir.”
Se a empresa ignorar denúncias ou se omitir, poderá ser responsabilizada solidariamente por:
Danos morais sofridos pelo empregado
Multas administrativas
Rescisão indireta do contrato (artigo 483 da CLT)
Rescisão indireta por ofensas no ambiente de trabalho
Se as ofensas forem graves ou persistentes e a empresa não tomar providências, o trabalhador pode requerer a rescisão indireta, que equivale à demissão sem justa causa, com pagamento de:
Aviso prévio
Multa de 40% sobre FGTS
Saque do FGTS
Seguro-desemprego
Férias + 1/3 e 13º salário
Esse pedido é feito por meio de ação trabalhista, com apresentação de provas e testemunhas.
Danos morais por ofensa no trabalho
A vítima de ofensas pode ajuizar ação de indenização por danos morais contra:
O colega agressor (esfera cível ou trabalhista)
A empresa (se for omissa)
O valor da indenização será fixado com base em:
Gravidade da ofensa
Circunstâncias do fato
Capacidade econômica do ofensor
Impacto na vida da vítima
Os tribunais trabalhistas têm reconhecido valores entre R$ 5.000 e R$ 50.000 em casos comprovados de humilhação, assédio ou violência verbal no ambiente profissional.
O que não fazer ao sofrer uma ofensa
Não responder na mesma moeda: isso pode configurar descontrole e prejudicar sua razão
Não publicar nas redes sociais: evite exposição pública ou difamação, que podem gerar ações contra você
Não se calar diante de casos graves: omissão não resolve e pode piorar a situação
Não desistir de seus direitos: mesmo que o ofensor peça desculpas, você tem direito a reparação
A atuação do sindicato
Se houver sindicato da sua categoria, você pode:
Denunciar o caso
Solicitar intermediação
Requerer apoio jurídico
Participar de comissões internas de ética (onde houver)
O sindicato pode ser uma ponte entre o empregado e a empresa para soluções amigáveis ou representações formais.
Exemplo prático
João é operador de máquinas e, durante uma reunião, é chamado de “burro” pelo colega de setor, na frente de outros funcionários. Ele não reage, mas registra o ocorrido com testemunhas e comunica o RH por e-mail. A empresa não toma providência. João registra boletim de ocorrência e, com apoio jurídico, entra com ação de rescisão indireta e pedido de indenização por danos morais.
Esse é um caso clássico de conduta abusiva, em que há omissão da empresa e violação clara à dignidade do trabalhador.
Perguntas e respostas
Um colega me chamou de um nome ofensivo. Posso processar?
Sim. Ofensas verbais podem configurar injúria e gerar direito a indenização e até processo criminal, dependendo do teor.
A empresa pode ser responsabilizada mesmo sem participar diretamente da ofensa?
Sim, se for omissa ou negligente ao tomar ciência do ocorrido.
Preciso de testemunhas para comprovar a ofensa?
Não é obrigatório, mas ajuda muito na comprovação. Prints, áudios, e-mails e relatos por escrito também são provas válidas.
O agressor pode ser demitido por justa causa?
Sim. A empresa pode aplicar justa causa por ofensa grave, conforme o artigo 482, alínea “k”, da CLT.
Posso gravar conversas para me proteger?
Sim, desde que você participe da conversa. Gravações unilaterais (em que você está presente) são aceitas como prova.
Posso sair da empresa se me sentir ameaçado?
Sim, mas é preferível buscar orientação jurídica antes para garantir seus direitos. A saída pode ser convertida em rescisão indireta judicialmente.
Qual o prazo para entrar com ação por ofensa?
Na Justiça do Trabalho, o prazo é de até dois anos após o término do contrato, e o direito abrange os últimos cinco anos de vínculo.
Conclusão
Sofrer uma ofensa no ambiente de trabalho é algo que ninguém deve tolerar. A dignidade, o respeito e o equilíbrio emocional são direitos fundamentais de qualquer profissional. Quando um colega ultrapassa os limites do respeito e da civilidade, é dever da vítima agir, registrar e buscar reparação. A legislação brasileira garante meios eficazes de proteção e punição para essas situações. Seja por meio de diálogo, denúncia interna, ação judicial ou rescisão indireta, existem caminhos seguros para restaurar o respeito no ambiente profissional. O importante é não se calar e buscar ajuda jurídica sempre que necessário.