Resumo: O início do século XXI de destaca por uma grande atenção das empresas para as novas abordagens da gestão da qualidade, questão que passou a ganhar atenção especial nas últimas décadas do século XX por conta da competição gerada pelo mercado globalizado. O modelo Seis Sigma desperta interesse tanto no ambiente acadêmico como no empresarial. Este programa possui duas vertentes, o DMAIC (“Define”, “Measure”, “Analyse”, “Improve” e “Control”) que tem foco na melhoria da qualidade em processos e o DFSS (“Design for Six Sigma”) que lida com a qualidade em projeto de produtos e serviços ou em reengenharia de processos. Os laboratórios especializados em genética forense, em muitos casos, poderiam se beneficiar da implantação de uma metodologia Seis Sigma. Neste trabalho serão apresentados aspectos em que esta ferramenta poderia contribuir para a melhoria dos serviços prestados por estes estabelecimentos, gerando melhoria nos serviços, aumento a lucratividade e evitando injustiças.
Abstract: The beginning of the 21th century has been marked by a great deal of attention from companies for new approaches to quality management, an issue now gaining attention in the last decades because of the competition generated by the global market. The Six Sigma model arouses interest both in the academic environment and in business. This program has two parts, the DMAIC (Define, Measure, Analyze, Improve and Control) that is focused on improving quality in processes and DFSS (Design for Six Sigma) that deals with quality in design of products and services or reengineering of processes. The laboratory specializing in forensic genetics, in many cases, could get benefits from the deployment of a Six Sigma methodology. This work will be presented ways in which this tool could help improve the services provided by these establishments, generating improvements in services, increase the profitability and avoiding injustice.
1. INTRODUÇÃO
Em resposta às necessidades impostas pela globalização e para melhor se adaptar a um ambiente cada vez mais competitivo, as empresas estão buscando novas formas para aprimorar os seus processos e produtos. O Seis Sigma é uma metodologia que objetiva incrementar a qualidade por meio do aperfeiçoamento contínuo de processos do negócio, eliminando sistematicamente falhas, erros, defeitos e desperdício (TONINI e OLIVEIRA 2007).
Em laboratórios especializados em genética forense, a parte técnico-especializada do negócio consiste em investigar o perfil genético de amostras e comparar os perfis genéticos entre si visando testar as hipóteses de existência de vínculo genético, etnia, nacionalidade ou relação de pessoas com crimes (MELGAÇO et al. 2007a). A ocorrência de erros em laudos laboratoriais já foi reportada na literatura especializada, sendo a falta de padronização de metodologias uma de suas causas (MELGAÇO et al. 2007a, b).
As primeiras aplicações da genética forense, ramo da biologia que utiliza técnicas de biologia molecular para traçar o perfil genético de amostras, ocorreram na década de 1980 no Reino Unido e, desde então, se espalharam por praticamente todo o mundo (JEFFREYS et al. 1985a, b). Contudo, as metodologias variam de acordo com o avanço tecnológico de cada região ou disponibilidade de recursos laboratório (FIGUEIREDO e PARADELA 2006; SMARRA, PARADELA e FIGUEIREDO 2006). No Brasil existem dezenas de laboratórios que realizam tais exames, não havendo na rede privada uma padronização absoluta de métodos. A disputa do mercado levou a queda significativa nos preços dos exames e, no momento, diversos laboratórios buscar a qualidade total, com serviços “Classe Mundial”, reduzindo prazos, variando as formas de coleta oferecidas e especializando suas equipes (SMARRA, PARADELA e FIGUEIREDO 2006).
Em investigações de vínculo genético, como por exemplo em testes de paternidade e maternidade, o resultado de cada exame é expresso através de um índice que indica estatisticamente a probabilidade do parentesco analisado. Um índice de paternidade ou maternidade de 99% representa chances de erro de 1 em cada 100 exames. Em análises para identificação humana ou de cenas crimes, os resultados são também reportados estatisticamente (MELGAÇO et al, 2007a; SMARRA, FIGUEIREDO e PARADELA 2006).
Atualmente, diversas organizações empresariais estão aplicando o programa Seis Sigma em seus processos, de modo especial no segmento de serviços, como financeiras, administradoras de cartão de crédito, varejistas e hospitais. Pelos resultados obtidos até o momento, as empresas que procuraram alcançar a melhoria contínua nos processos administrativos apoiando-se no Seis Sigma reduziram custos por meio da eliminação de erros, diminuíram o tempo dos ciclos de atividades, aumentaram a produtividade e melhoraram a qualidade dos processos (WATSON 2001).
As oportunidades de aprimoramento nos processos são as mais variadas: tempo excessivo de espera; perdas de negócios e vendas; erros de previsão; entregas incorretas; pagamentos fora dos prazos; cobranças indevidas; emissão de notas fiscais erradas; pedidos incorretos; estoques elevados; respostas impróprias; liberações atrasadas de produtos; metas inconsistentes; erros de codificação; identificação incorreta de mercado e público alvo e dados impróprios de clientes, entre outros. Diante dessas oportunidades, a aplicação do programa Seis Sigma representa um poderoso recurso para a eliminação de erros, a diminuição de desperdícios e a conquista de resultados que melhoram significativamente os processos. As metas práticas da aplicação de um sistema Seis Sigma incluem, segundo TONINI e OLIVEIRA (2007):
1. Reduzir a variabilidade devida a causas especiais para a marca de 3,4 partes de defeito por milhão (ppm), ou seja, atingir 99,99966% de perfeição em todos os processos;
2. Adequar a capacidade do processo aos objetivos estipulados pelos clientes.
De acordo com AGUIAR (2002), as principais mudanças obtidas com a implantação do Seis Sigma são:
– A atuação da empresa volta-se principalmente para o atendimento das necessidades dos clientes;
– Todo projeto ou meta a ser desenvolvido deve trazer um retorno monetário, mesmo que mínimo;
– Todos os funcionários devem buscar o aperfeiçoamento na condução de seu trabalho, além de procurar eliminar operações que não agregam valor ao produto final;
– Os problemas da empresa são considerados problemas de todos os seus funcionários;
– A forma de condução da solução de um problema é padronizada em todos os setores da empresa.
Desta forma, a maioria dos laboratórios especializados em genética forense não atende aos quesitos de qualidade almejados em uma metodologia Seis Sigma, uma vez que as usuais chances de erro reportadas em laudos de 1 em 100 (99, %) ou 1 em 1.000 (99,9%) não estão em concordância com os objetivos básicos apresentados. Abaixo, informações retiradas do website de um dos laboratórios de teste de paternidade por análise de DNA mais antigos e respeitados do país (www.gene.com.br, extraído em 28/11/2008):
99% : 99 acertos em 100 inclusões ou um erro em 100 – INACEITÁVEL;
99,99% : 9.999 acertos em 10.000 inclusões ou um erro em 10.000: A maioria dos laboratórios se limita a este percentual, considerando-o bom “o suficiente”;
99,9999% : 999.999 acertos em 1 milhão de inclusões ou um erro em 1 milhão – ÓTIMO
99,999999% : 99.999.999 acertos em 100 milhões de inclusões – ALTÍSSIMO ÍNDICE.
2- O MODELO SEIS SIGMA
O modelo Seis Sigma nasceu na empresa Motorola, na década de 1980. Insatisfeito com o aumento de reclamações relativas às falhas de produtos dentro do período de garantia, o engenheiro Bill Smith imaginou um método em que fosse possível gerenciar por meio da análise estatística constante dos números. A metodologia foi denominada de “Nível Sigma”, cuja escala vai do dois ao seis. O nível dois ficou conhecido como a etapa onde mais defeitos são contabilizados. O nível seis, segundo o programa, é a etapa que mais se aproxima da perfeição industrial. Ao aplicar o sistema em questão, a empresa triplicou a produtividade e reduziu os custos significativamente ao longo dos anos seguintes. Posteriormente, através de Jack Welch, ex-presidente da General Electric (GE), a solução se tornou conhecida no mundo inteiro. Ao implantar o Seis Sigma na GE, J. Welch chegou a dizer que a metodologia “faria parte do código genético da empresa”. O trabalho envolvendo o Seis Sigma resultou em substancial economia de recursos à empresa (TONINI e OLIVEIRA 2007).
O sigma é uma letra grega usada na estatística e na matemática para representar o desvio padrão. Isso nada mais é do que a variação que um conjunto de dados sofre. Geralmente as letras gregas são representativas de parâmetros não conhecidos, e é exatamente isso que acontece com o sigma. Todavia, ele é estimado através de uma amostra calculando-se o desvio padrão desta, sem esquecer que está amostra deve ser significativa e não tendenciosa. Para fins práticos, o desvio padrão quantifica a variabilidade existente em um processo ou característica (Werkema 2004).
O nível de qualidade Sigma ou escala Sigma de qualidade é o número de desvios padrão do processo, existentes entre a média do processo e o limite de especificação. Na figura 1 pode-se observar uma relação entre a capacidade de um processo e o número de defeitos por milhão e na figura 2 é apresentada uma curva mostrando o nível Sigma do processo e suas aplicações mais comuns, bem como seu índice de defeitos.
O DMAIC (“Define”, “Measure”, “Analyse”, “Improve” e “Control”), representado na figura 3, é uma versão do Seis Sigma para melhoria de processos, que utiliza amplamente o ferramental estatístico já tradicional de controle da qualidade em cinco fases bem definidas (RECHULSKI E CARVALHO 2004):
1. DEFINIÇÃO (“Define”), direcionada a escolha de processos-chave que afetam as expectativas do consumidor e cujos desempenhos podem comprometer profundamente o alcance das metas estratégicas;
2. MEDIÇÃO (“Measure”), avaliação da habilidade dos processos atuais em fornecer os produtos de acordo com as exigências e seleção das variáveis do processo a serem mais bem analisadas. Entre as ferramentas estatísticas usadas neste momento estão: Diagrama de Pareto (recurso gráfico utilizado para estabelecer uma ordenação nas possíveis causas de problemas que devem ser sanados. O diagrama torna visivelmente clara a relação ação-benefício, ou seja, prioriza a ação que trará o melhor resultado); Lista de Verificação (permite uma coleta de dados organizada, facilitando sua análise e interpretação); Histograma (trata-se de uma forma de descrição gráfica de dados quantitativos, agrupados em classes de freqüência); Diagrama de Dispersão (pode ser utilizado para identificar se existe uma tendência de variação conjunta (correlação) entre duas ou mais variáveis); Gráfico Linear (permite que seja avaliada a evolução de um conjunto de dados ao longo do tempo, caso os dados sejam contínuos (série temporal)); Gráfico (Carta) de Controle (permite avaliar se o comportamento de um processo, em termos de variação, é (ou não) previsível. Neste gráfico o eixo horizontal representa o tempo e, o vertical, o valor da característica (pontos), que por sua vez ficam unidos por segmentos de reta); Diagrama de Causa-e-Efeito (o diagrama de Causa e Efeito é também conhecido como espinha de peixe ou Ishikawa, que foi um dos pioneiros nas atividades de qualidade no Japão. Este diagrama constitui uma técnica visual que interliga os resultados (efeitos) com os fatores (causas)); Diagrama de Relações (permite a visualização das relações de causa e efeito de um problema, a partir de um conjunto de dados não numéricos. Sua utilização é recomendada quando as relações entre as causas de um problema são complexas e é necessário evidenciar que cada evento não é resultado de uma causa única, porém de várias causas relacionadas);
3. ANÁLISE (“Analyse”), etapa onde os dados atuais do processo são analisados para se determinar o desempenho e a capacidade sigma do mesmo e são identificadas as causas raízes de defeitos e seus impactos;
4. MELHORIA (“Improve”), momento onde são desenvolvidas soluções para intervir no processo para reduzir significativamente os níveis de defeitos;
5. CONTROLE (“Control”), controle estatístico do processo através de medições e monitoramento para manter as melhorias no desempenho. A metodologia DMAIC não prevê retroalimentação, ou seja, um projeto bem aplicado não deve em nenhum momento retornar às fases anteriores. Se o resultado financeiro do projeto não for o esperado ou se o número de defeitos voltar a subir, é porque não houve uma correta priorização das variáveis de entrada.
Figura 1: O nível de qualidade Sigma ou escala Sigma de qualidade é o número de desvios padrão do processo. A figura abaixo representa a relação entre a capacidade de um processo e o número de defeitos por milhão.
Figura 2: curva mostrando o nível Sigma do processo e suas aplicações mais comuns, bem como seu índice de defeitos.
Figura 3: O DMAIC (“Define”, “Measure”, “Analyse”, “Improve” e “Control”), versão do Seis Sigma para melhoria de processo.
A metodologia DFSS (“Design for Six Sigma”) é uma vertente do Seis Sigma que lida com a qualidade no projeto de novos produtos e pode ser aplicada para processos produtivos e de serviços que precisam ser constituídos de forma que, ao estarem em funcionamento, já atinjam o nível Seis Sigma. O DFSS também pode ser aplicado em processos nos quais seu nível de desempenho esteja tão baixo e o próprio processo esteja tão ruim que, quaisquer esforços aplicados para se realizar um projeto DMAIC, não resultarão em um processo de nível Seis Sigma. Ou seja, pode-se projetar um novo produto ou serviço, ou re-projetar um produto ou serviço já existente (RECHULSKI E CARVALHO 2004).
Durante a execução do programa Seis Sigma são usados métodos estatísticos para a mensuração do progresso e do sucesso. A escolha dos processos empresariais que devem ser melhorados é fundamental. Os projetos são conduzidos por grupos de funcionários, as equipes formadas são lideradas por “green-belts” que por sua vez são assistidos pelos “black-belts”. Tais pessoas, os “black-belts” (“faixas pretas”) dedicam 100% de seu tempo ao Seis Sigma. Normalmente, os Black Belts conduzem os projetos que visam oportunidades de aprimoramento em áreas administrativas e serviços, melhorando:
– Tempo excessivo de espera
– Perdas de vendas
– Erros de previsão
– Entrega incorreta
– Pagamentos fora do prazo
– Cobranças incorretas
– Notas fiscais incorretas
– Pedidos incorretos
– Mídia incorreta
– Falta de resolução no primeiro contato
– Estoque elevado
– Liberação atrasada de produtos
– Metas inconsistentes
– Erros de codificação
– Identificação incorreta de mercado
– Erros nos materiais de publicidade
– Dados incorretos/faltantes
Uma empresa está em condições de obter sucesso com essa estratégia Seis Sigma quando todos os seus processos alcançarem o que ele qualifica como “Qualidade Classe Mundial”. Em BHOTE (1996) são identificados quatro estágios de desenvolvimento para os programas de qualidade empresarial:
– Estágio 1 – Inocência. A direção da instituição considera a qualidade como um mal necessário, “os ossos do ofício”;
– Estágio 2 – Despertar. A direção admite que qualidade é importante, mas insiste que seu custo é elevado e que não observa claramente uma relação entre o investimento e o benefício;
– Estágio 3 – Compromisso e Implantação. A direção reconhece que a qualidade agrega valor para os clientes e para a instituição, então se compromete com uma profunda transformação e destina recursos para treinamento e implantação;
– Estágio 4 – Classe Mundial. A direção formaliza a qualidade como um dos valores mais importantes da instituição. Esse valor é reconhecido e vivenciado por todos desde a alta direção até o “chão” de fábrica.
Utilizando os princípios supracitados, a FAE Consulting (empresa de consultoria empresarial) elaborou uma pesquisa com clientes dos mais variados ramos de atividades. Os primeiros resultados apresentaram algumas tendências e observações interessantes (BLAUTH 2003):
– 20% das empresas têm seus processos classificados no estágio 1 “Inocência”. Essas empresas correm o sério risco de se tornar cada dia menos competitivas no mercado;
– 70% têm seus processos classificados nos estágios 2 ou 3, o que significa que estão engajadas em programas de qualidade. Sua permanência no mercado está relacionada com o grau de comprometimento com esses programas e busca do estágio 4 “Qualidade Classe Mundial”;
– 10% apenas das empresas têm seus processos classificados no estágio 4 “Qualidade Classe Mundial” e estão em condições de alcançar resultados com a estratégia Seis Sigma.
3- O PRODUTO EM UM LABORATORIO DE GENÉTICA FORENSE
A dimensão da qualidade, a confiabilidade, tem se tornado cada vez mais importante para os consumidores, pois, a falha de um produto, mesmo que prontamente reparada pelo serviço de assistência técnica e totalmente coberta por termos de garantia, causa, no mínimo, uma insatisfação ao consumidor ao privá-lo do uso do produto por determinado tempo. Além disso, cada vez mais são lançados produtos em que determinados tipos de falhas podem ter conseqüências drásticas para o consumidor, tais como aviões e equipamentos hospitalares nos quais o funcionamento inadequado pode significar até mesmo um risco de morte ao usuário. No produto oriundo de análises laboratoriais de genética forense, pode-se cometer injustiças a partir de erros como a identificação equivocada de um corpo, de um criminoso ou a inclusão de vínculo familiar inexistente.
O produto, no ramo de atividades de laboratórios de análises clínicas especializados em genética forense é a prestação de um serviço laboratorial específico. Existe uma vasta literatura sobre o processo de desenvolvimento de produto (CLARK e FUJIMOTO 1991; PUGH 1991). O projeto de desenvolvimento de um produto e/ou serviço corresponde a um conjunto de atividades sistemáticas necessárias, desde identificação de uma necessidade do consumidor ou mercado até a sua venda e serviços de pós-venda. Para delinear as especificações no projeto de produto, o limite do design, deve-se levar em consideração características, como: custo do produto, cliente, processo, facilidade de manufatura, políticas de mercado, manutenção, patentes, segurança e materiais. Estes aspectos representam os vários requisitos no desenvolvimento do produto, tornando este modelo de aplicação universal.
No Brasil, cerca de 25% dos registros não apresenta o nome do PAI no documento (informações da socióloga Ana Liése Thurler, publicadas na Gazeta do Povo – PR em 12 de outubro de 2008). Isto, em adição ao grande número de crimes em metrópoles, constitui um mercado a ser explorado pelas empresas do ramo estudado. Uma regra básica da ciência é a reprodutibilidade dos experimentos e, no caso das aplicações forenses da genética, isto requer padronização (MELGAÇO et al. 2007a, SMARRA, PARADELA e FIGUEIREDO 2006). Por razões de segurança do processo e reprodutibilidade internacional dos resultados, a maioria dos laboratórios do setor emprega kits comerciais que servem para analise de diversos marcadores genéticos, regiões da molécula de DNA (ácido desoxirribonucléico), de uma única vez (reações multiplex) através da reação em cadeia da polimerase (PCR) [1]. Os dois principais vendedores de kits para os supracitados fins são as empresas Promega Corporation e Applied Biosystems. O preço médio da análise de uma amostra biológica é de aproximadamente trinta dólares (estes valores não são válidos para amostras post mortem e para misturas oriundas de abuso sexual, onde há material da vítima e do(s) criminoso(s). Estas análises são mais caras, pois demandam maior tempo de análise e gasto de material).
O número de marcadores usados em um teste genético influi diretamente na confiabilidade estatística dos resultados obtidos (quanto maior a quantidade de marcadores analisados e a variabilidade dos mesmos, maiores os graus obtidos, de acordo com o tipo de investigação. Logo, menor a chance de erros). Todavia, análises completas, irrefutáveis, fidedignas, acarretam custos.
4- JUSTIFICATIVA
Este TRABALHO se justifica pela necessidade de melhoria de qualidade dos laboratórios brasileiros especializados em genética forense, que precisam de tecnologias mais robustas e padronizadas para atingir o nível de qualidade “Classe Mundial”. Os dados recentemente publicados em MELGAÇO e colaboradores (2007a, b), SMARRA, FIGUEIREDO e PARADELA (2006) e SMARRA, PARADELA e FIGUEIREDO (2006) demonstram que não há padronização e validação de metodologias em muitos laboratórios nacionais. Sendo o Seis Sigma uma ferramenta muito discutida nos ambientes acadêmico e empresarial para melhoria dos processos e redução de erros, é válido discutir o seu emprego em laboratórios de genética forense.
5- DISCUSSÃO
Uma preocupação permanente na estratégia Seis Sigma é a redução da quantidade de desperdício, que tecnicamente é denominada de “defeitos”. Na estratégia Seis Sigma, defeito é qualquer desvio de uma característica que gere insatisfação ao cliente, seja este externo ou interno (BLAUTH 2003). Em um laboratório especializado em genética forense, a detecção de erro durante a execução do serviço implica em retrabalho e, logicamente, em custo. Os autores BERLITZ e HAUSSEN (2005), ao analisar a aplicação do Seis Sigma em laboratórios de análises clínicas, separaram os custos com falhas internas e externas. As primeiras incluem o retrabalho, reteste, erros ou defeitos detectados ainda no interior da empresa. As falhas externas refletem erros ou defeitos detectados pelos clientes, ou seja, reclamações. O anexo I apresenta manchetes e reportagens extraídas da Internet que demonstram o custo das falhas externas, que podem ser ainda mais significativas se forem levados em conta os prejuízos para a imagem da marca.
A estratégia do programa Seis Sigma consiste em monitorar o processo, mantendo-o sob estabilidade e controle efetivo, atuando sobre suas causas de variações, com o objetivo de reduzir o número de defeitos nos produtos finais do processo até valores muito próximos de zero. A métrica Sigma, dessa forma, demonstra o grau no qual qualquer processo se desvia de sua meta, isto é, a capacidade do processo em gerar produtos dentro das especificações pré-definidas.
Um processo Seis Sigma é aquele que não produz mais que 3,4 defeitos por milhão de oportunidades, onde defeito é definido como qualquer característica do produto fora das especificações percebidas pelo cliente (WESTGARD 2001). Há situações onde dois ou mais laboratórios de genética forense trabalham juntos para resolver casos, podendo um repetir as análises do outro ou cada um trabalhar com parte das amostras biológicas e, ao final, comparar os resultados para testar a hipótese investigada. Supondo-se que um dos laboratórios cometa uma falha, todo o processo pode ficar comprometido. A aplicação da tecnologia do DNA em investigações forenses cresceu rapidamente nos últimos 15 anos. Entretanto, as evidências de DNA que não são apropriadamente coletadas, documentadas, reconhecidas e preservadas podem ser invalidadas numa investigação criminal. Portanto, a coleta e preservação dessas amostras precisam ser garantidas ou a comunidade forense não será capaz de usar essa notável tecnologia para o interesse da justiça (IWAMURA e MUÑOZ 2003; LEE e LADD 2001).
Em diversos países, há a aplicação de bancos de dados de DNA, onde os laboratórios credenciados podem comparar amostras analisadas internamente com outras pertencente a criminosos, cenas de crime ou pessoas desaparecidas e seus familiares (PARADELA e FIGUEIREDO 2006). Um erro simples dificultaria a identificação correta de pessoas. A perfeita adequação entre qualidade e custos é meta permanente do gerenciamento de processos, técnicos ou administrativos, em laboratórios clínicos (BERLITZ e HAUSSEN 2005). O Seis Sigma pode ser entendido como uma metodologia para reduzir continuamente a variabilidade de um processo, considerando a situação atual e a meta especificada
Alguns laboratórios executam testes de proficiência periodicamente. Os mesmos podem ser internos ou externos. No segundo caso, utiliza-se organizações como o GITAD (Grupo Ibero-Americano de Trabalhos em DNA) ou a ISFG (Sociedade Internacional de Genética Forense), entre outros. Todavia, uma parte significativa da rede privada de laboratórios não atende aos exames. Entre os itens requeridos por tais associações estão: Os laudos técnicos devem incluir as metodologias utilizadas e apresentar suas limitações; os protocolos e notas de bancada devem estar disponíveis; as credenciais dos técnicos devem ser apresentadas (deve-se ter mestrado ou doutorado em genética e, no mínimo, três anos de experiência comprovada na área); todas as atividades devem ser monitoradas; os equipamentos e reagentes devem obedecer critérios de qualidade e ser periodicamente testados (PARADELA e FIGUEIREDO 2007a, b). Naturalmente, tudo isto acarreta necessidade de investimentos.
De fato, mesmo que uma empresa que utilize maquinaria sofisticada e desenvolva processos automatizados, não representa um padrão Seis Sigma se nela ainda existirem processos ineficientes e pessoas descomprometidas. O objetivo prático do Seis Sigma é instituir uma forma sistemática de reduzir a variabilidade dos processos (TONINI e OLIVEIRA 2007).
Nos processos técnicos laboratoriais, produtos defeituosos podem ser traduzidos por resultados fora das especificações, ou seja, fora da variação máxima preconizada para a análise laboratorial em questão e, conseqüentemente, sem correlação com a situação real apresentada pela amostra analisada para o parâmetro em estudo (BERLITZ e HAUSSEN, 2005). Cada processo tem dois componentes básicos de variação: variação randômica (imprecisão) e variação sistemática (inexatidão). Para detectar a ocorrência dessas variações, os processos técnicos são monitorados pelo controle de qualidade (CQ) analítico, que inclui CQ interno e externo, avaliando características de desempenho como imprecisão e inexatidão, respectivamente (WESTGARD 2001). A avaliação dessas características geralmente é realizada de forma independente (WESTGARD 2002.). A utilização da métrica Sigma, porém, permite a transformação dessas características de desempenho em um dado único, possibilitando:
– Classificar e comparar processos, procedimentos e equipamentos distintos quanto a sua qualidade de performance, customizando sistemas de monitoramento de desempenho (controle estatístico do processo [CEP]);
– Padronizar procedimentos de escolha e validação de novos métodos e processos;
– Estimar e monitorar variações de rendimento (eficiência) associadas aos processos técnicos;
– Atuar sobre os possíveis defeitos do processo de análise, minimizando erros e mantendo (ou aumentando) o índice de satisfação dos clientes. Deve-se salientar que, via de regra, o produto do laboratório clínico (excluindo-se as questões relativas ao atendimento) é o resultado da análise laboratorial processada e que, basicamente, duas características nesse produto são percebidas pelo cliente: resultados corretos e tempo de liberação do laudo.
O Seis Sigma utiliza a estatística descritiva e a inferencial para que todas as decisões sejam baseadas em fatos comprováveis e mensuráveis. Em seguida, conhecendo as características de um processo, torna-se possível estabelecer novos padrões desejáveis de comportamento (TONINI e OLIVEIRA 2007).
A globalização reforça a necessidade de cada empresa aprimorar seus processos e produtos para se manter competitiva e atender às expectativas de um mercado dinâmico e de acionistas cada vez mais exigentes que buscam maximizar seus lucros. A grande maioria dos benefícios do Seis Sigma reside exatamente na sua metodologia de implementação e no uso correto e “sábio” das ferramentas e técnicas estatísticas que devem ser utilizadas. As simplificações na aplicação da metodologia, como a redução do número de pessoas treinadas e envolvidas no processo, podem acarretar resultados decepcionantes, muito aquém do desempenho que o Seis Sigma pode efetivamente propiciar (TONINI e OLIVEIRA 2007).
As organizações convivem, no setor produtivo, com falhas e problemas de ordem geral que comprometem a qualidade final do seu produto. Considerando as falhas expostas, o programa Seis Sigma representa uma alternativa para a solução destas falhas e uma garantia de qualidade no produto final. O treinamento direcionado aos colaboradores, necessário à implantação do programa, atuaria diretamente nas falhas pessoais. Reduziria drasticamente os problemas relacionados a erros ou a descumprimento de normas, dado a rigidez do controle de acompanhamento do programa.
Segundo BERLITZ e HAUSSEN (2005), a visão Seis Sigma da qualidade constitui uma nova ferramenta para o laboratório clínico, objetivando conjugar qualidade de desempenho de processos à gestão de custos. Ainda de acordo com os autores, o raciocínio envolvido no programa Seis Sigma não é simples de ser transposto para o setor de medicina laboratorial, visto que o cliente usuário muitas vezes não percebe as variações significativas nos resultados laboratoriais. Para fins de erros aceitáveis nas determinações laboratoriais são utilizadas referências na literatura que se baseiam em diferentes abordagens, incluindo desde variação biológica e performance técnica (teste de proficiência, por exemplo) até limites arbitrários ou estado da arte.
6- CONCLUSÃO
Neste trabalho buscou-se enfatizar a eficácia e os benefícios que seriam obtidos com a implementação de um programa Seis Sigma em laboratórios de genética forense. Foram relatadas a contribuição e as vantagens da utilização do programa, além do processo de melhoria denominado DMAIC como modo de garantir as conquistas obtidas. Contudo, não foi possível evidenciar, com exemplos, os resultados financeiros que seriam obtidos pelos acionistas nem quantificar a satisfação dos clientes das empresas neste setor que implementassem o Seis Sigma em seus processos, uma vez que não há dados na literatura a sobre esta temática específica. Certamente, esta é a limitação do trabalho, que poderá ser corrigida em outras abordagens sobre o assunto. Entretanto, fica a sugestão para implementação do Seis Sigma neste segmento laboratorial como meio para reduzir erros e, logicamente, aumentar os lucros. Eventuais trabalhos futuro poderão apresentar os resultados concretos deste tipo de empreendimento.
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Nota:
[1] PCR (Reação em Cadeia da Polimerase): reação utilizada para fazer cópias de seqüências específicas do DNA. Esta tecnologia é a mais usada na atualidade para genotipar amostras humanas.
Informações Sobre os Autores
Eduardo Ribeiro Paradela
André Luís dos Santos Figueiredo
Bacharel em Biomedicina pela Univercidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO
Especialista em Genética Humana pela Conselho Regional de Biomedicina
Mestre em Morfologia (Genética Molecular) pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
Professor Universitário
Secretário Geral do Colégio Forense de Gestores e Educadores Biologistas – COFGEB
Treinado em Entomologia Forense pelo COFGEB
Membro da Comissão Científica de Genética Médica e Molecular da Associação Gaúcha de Biomedicina
Consultor em Genética FOrense da Academia Jurídica, filiado à Associação dos Peritos Judiciais do Estado do Rio de Janeiro