Resumo: O presente
artigo apresenta um estudo sobre o tratamento dado pelo Direito Penal
brasileiro aos crimes cometidos com o auxílio dos sistemas computadorizados. O
uso da tecnologia da informação (TI) tem contribuído para o desenvolvimento
sociocultural, porém, juntamente com o avanço, surgem usuários que se utilizam
desses sistemas para cometer atos ilícitos. A imprensa tem noticiado diversos
casos de crimes cometidos pela Internet ou por outros sistemas computadorizados.
Porém, em alguns casos percebe-se que determinadas condutas, praticadas com a
utilização da TI, que causam danos a bens jurídicos que deveriam ser tutelados
pelo Direito, mas que não se enquadram em nenhum dos tipos penais previstos no
sistema jurídico-penal do nosso país, ficam impunes. Os aplicadores do Direito
tentam enquadrar, na medida do possível, esses atos lesivos aos tipos penais
previstos no Código Penal e na legislação esparsa. Com o desenvolvimento do
trabalho percebeu-se que várias condutas que trazem prejuízos consideráveis às
vítimas não são tipificadas e, portanto, não podem ser consideradas como
criminosas e sim como fatos atípicos. Assim, conclui-se ser necessária a
criação de lei específica prevendo crimes dessa natureza ou a reformulação das
leis existentes. Para o desenvolvimento do trabalho foi aplicado o método
indutivo, efetuando-se uma pesquisa exploratória, com a aplicação da técnica de
pesquisa bibliográfica.
Palavras-chave: Crimes de
Informática – Direito Penal – Tecnologia da Informação
1 Introdução
A informatização da sociedade se dá em alta velocidade. O impacto da tecnologia da
informação (TI) sobre o Direito é um tema complexo, pois envolve vários dos
seus ramos, dentre eles, o Civil, o Processual Civil, o Penal, o Processual
Penal, o do Trabalho, o Comercial, o do Consumidor, o Tributário e o
Internacional. Neste trabalho, a preocupação é somente com relação ao Direito
Penal.
O uso da TI, principalmente da
Internet, tem contribuído muito para o desenvolvimento sociocultural, mas,
juntamente com o avanço, surgem usuários que se utilizam desses sistemas para
cometer atos ilícitos e que praticam, com o auxílio do computador, condutas
tipificadas como crime e outras novas, anti-sociais, porém não tipificadas, que
fazem com que a ciência do Direito, sobretudo o Penal, tenha de assumir uma
posição.
Escuta-se, diariamente, a imprensa
noticiar a ocorrência dessas práticas via Internet ou por outros sistemas
computadorizados. Porém, em muitos desses casos percebe-se que tais condutas
causam danos a bens jurídicos que deveriam ser tutelados, mas que ainda não
possuem essa proteção estatal.
Os aplicadores do Direito tentam
enquadrar, na medida do possível, esses atos lesivos aos tipos penais previstos
no Código Penal e na legislação esparsa brasileiros, mas muitas, por não se
enquadrarem em nenhum dos tipos penais previstos no sistema jurídico-penal do
nosso país, ficam impunes, já que não são consideradas como condutas criminosas
e sim como fatos atípicos.
Nesse contexto, conclui-se ser
necessária a criação de lei específica prevendo crimes dessa natureza ou a
reformulação das leis existentes. Além disso, é preciso, também, que sejam
criados mecanismos de controle que garantam a identificação do autor dessas
práticas, para que as pessoas possam utilizar as tecnologias da informação de
forma segura, com a certeza de que o Direito possa garantir a paz social e a
manutenção do Estado Democrático de Direito.
Para o desenvolvimento do trabalho foi
aplicado o método indutivo, efetuando-se uma pesquisa exploratória, com a
aplicação da técnica de pesquisa bibliográfica.
2 Crimes praticados com o computador
e o Direito Penal Brasileiro
Costa (1995),
já na década de 90, afirmava que no Brasil ocorreriam várias dessas práticas e
que, porém, as mesmas não eram noticiadas, devido à possibilidade dessa notícia
abalar a credibilidade das empresas (vítimas), por se pensar que a conseqüência
da divulgação poder ser mais grave do que o resultado da própria ação, já que pode
acarretar desespero, comoção geral ou perda de inúmeros clientes que ficam
receosos de negociar com uma empresa que não tenha segurança de dados,
informações e sistemas.
O autor
afirma que existem, há muitos anos, no Brasil, tímidas iniciativas no sentido
de regulamentar essas condutas, através de projetos de lei que tramitam nas
casas do Congresso Nacional. Porém até os dias atuais continua-se sem medidas
efetivas.
O nosso
Código Penal, quando defrontado com delitos dessa natureza, deixa claras as
suas deficiências com relação ao tema, até porque a Parte Especial do referido Código
data de 1940, época em que os sistemas computadorizados ainda não tinham
aportado em nosso país (PIRAGIBE, 1985). Dessa forma verifica-se a “quase”
impossibilidade de se aplicar esta parte do Código aos chamados “Crimes de
Informática”. Porém, através dos princípios gerais do Direito Penal, é possível
aplicar regras da Parte Geral do Código Penal a esse tipo de conduta.
Um dos
temas mais polêmicos entre os doutrinadores de Direito Penal de Informática é a
conceituação, pois essa vem, muitas vezes, em forma restritiva ou então
abrangente demais, não refletindo as muitas situações em que se enquadram os
crimes de informática (PINTO FERREIRA, 2007).
Muitas
condutas delitivas de natureza informática são difíceis de ser tipifictivas de natureza informentalizar-se o Estado
na sua miss inform**), daadas. Os crimes de informática, segundo Costa (1995),
devem ser classificados adequadamente para que o legislador pátrio possa
elaborar normas eficientes, e, se necessário, indicar as normas vigentes que
podem ser aplicadas, porém é imprescindível o estudo crítico desses delitos. É
necessário, também, que se busque individualizar as suas espécies, assim se instrumentalizaria
o aprofundamento do objeto jurídico a ser protegido, bem como a aplicação da
norma e da pena adequadas ao delito.
Antes de se falar em
crimes praticados pelo computador é necessário que se tenha em mente a idéia do
conceito de crime.
2.1 Crime
Para Capez (2008) e Mirabete (2007), crime pode ser conceituado sob três
aspectos diversos, quais sejam:
– material – sob esse enfoque crime é
“todo fato humano que, propositada ou descuidadamente, lesa ou expõe a
perigo bens jurídicos considerados fundamentais para a existência da
coletividade e da paz social” (CAPEZ, 2008). Mirabete (2007) também chama esse
aspecto de substancial e destaca que nele o que está sendo observado é o
conteúdo do fato punível;
– formal – sob esse enfoque “o crime resulta da mera subsunção da conduta
ao tipo legal e, portanto, considera-se infração penal tudo aquilo que o
legislador descrever como tal, pouco importando o seu conteúdo” (CAPEZ, 2008).
Aqui se está atendendo “ao aspecto externo, puramente nominal do fato”
(MIRABETE, 2007) e, assim, se conceitua crime como “o fato humano contrário à
lei” (CARMIGNANI apud MIRABETE, 2007). Capez (2008) salienta que a consideração
da existência de um crime sem considerar a essência ou lesividade material
afronta o princípio constitucional da dignidade humana, e Mirabete (2007)
destaca que as definições sob essa ótica “alcançam apenas um dos aspectos do
fenômeno criminal, o mais aparente, que é a contradição do fato à norma de
direito, ou seja, sua ilegalidade como fato contrário à lei penal. Então, essas
definições não penetram em sua essência, em seu conteúdo, em sua matéria”;
– analítico – nesse enfoque que busca, sob um prisma jurídico,
estabelecer os elementos estruturais do crime, o conceito é: “todo fato típico
ilícito” (CAPEZ, 2003). Aqui, em primeiro lugar, deve-se observar a tipicidade
da conduta do agente. Mirabete (2007) afirma que, quanto a esse prisma, o que se
analisa são as características ou os aspectos do crime.
2.2 Crimes de
informática
Com a expansão da
utilização dos sistemas computadorizados e com a difusão da Internet, tornam-se
cada vez mais freqüentes os casos em que as pessoas se utilizam dessas
ferramentas para cometer atos que causam danos a bens jurídicos de terceiros. O
desvalor cometido por intermédio desses meios não tem fronteiras, pois de um
computador situado num país pode-se acessar um sistema e manipular seus dados,
sendo que os resultados dessa ação podem ser produzidos em outro computador
muito distante daquele em que ela foi originada, podendo, inclusive, estar
localizado em um país diverso (ROSA, 2005).
Em questão de
segundos, um computador pode processar milhões de dados. No mesmo intervalo de
tempo, ele também pode ser utilizado para furtar milhares de reais, porém,
nesse caso, com a comodidade de poder cometer tal crime na privacidade do seu
lar, desde que possua o conhecimento e o equipamento necessários, sem os riscos
de, por exemplo, assaltar um banco ou um comércio portando uma arma de fogo.
Os crimes cometidos
com o auxílio do computador, normalmente, são difíceis de ser detectados,
costumam envolver grandes quantias e são crimes considerados ‘limpos’ (STAIR,
1998).
Percebe-se que não há
um consenso quanto à denominação desse tipo de delito na bibliografia
relacionada ao tema, sendo encontradas diversas expressões, tais como crimes de
Informática, crimes informáticos, crimes com computador, cybercrimes, e-crime,
crime hi-tech, crimes eletrônicos,
entre outros.
Além do problema
quanto à denominação, existe uma questão mais grave, que diz respeito à
utilização da expressão crime.
2.2.1
A expressão “crime de informática”
Durante o
desenvolvimento do trabalho constatou-se que diversos autores utilizam o termo
“crime” quando estão falando dessas condutas lesivas a dados, informações ou
sistemas informáticos. Abaixo, é apresentado o conceito de “crimes de
informática” encontrado por grande parte da doutrina e, dessa forma, pode-se comprovar
tal utilização.
Costa
(1995) afirma que grande parte dos doutrinadores define “crime de informática”
como a conduta que atenta contra o estado natural dos dados e recursos
oferecidos por um sistema de processamento de dados, seja pela transformação,
armazenamento ou transmissão de dados, na sua forma, compreendida, pelos
elementos do sistema de tratamento, transmissão ou armazenagem dos mesmos, ou
ainda, na forma mais rudimentar.
Assim,
depreende-se que “crime de informática” é todo aquele procedimento que atenta
contra os dados, que o faz na forma em que estejam armazenados, compilados, transmissíveis
ou em transmissão. Daí pressupõe-se a existência de dois elementos
indissolúveis: dados (objeto material) e hardware
(parte física do sistema) + software
(parte lógica do sistema) para realizar alguma conduta com esses dados (meio
executório).
Nesse
sentido, “crime de informática” é, então, qualquer conduta ilegal não ética ou
não autorizada que envolva processamento automático e/ou transmissão de dados
(Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento apud Costa, 1995).
Costa
(1995) definiu “crime de informática” como toda a ação típica, antijurídica
culpável contra ou pela utilização de processamento automático de dados ou sua
transmissão.
Vianna (2003, p.2-3)
alerta sobre a utilização desse termo e explica que, partindo do conceito
formal de crime, conclui-se que, para o Direito Penal brasileiro, algumas
condutas ditas na bibliografia como crimes de Informática, como, por exemplo, o
acesso não-autorizado a sistemas, não é crime, visto não haver previsão legal
de tais condutas no Código Penal de nosso país. Quanto ao conceito analítico,
segundo o qual crime é toda a conduta típica e antijurídica, tais ações são
apenas condutas atípicas, pois não são contempladas em nenhum dos tipos penais
do nosso sistema jurídico penal. Já com relação ao conceito material, é mister
verificar se a conduta ofende ou não a um bem juridicamente tutelado. O autor
afirma que “a inviolabilidade das informações é decorrência natural do direito
à privacidade, devendo, portanto, ser reconhecida como bem jurídico essencial
para a convivência numa sociedade”. Assim, defende o autor, a inviolabilidade
de dados e informações armazenados em sistemas computadorizados surge como um
novo bem jurídico a ser tutelado pelo Direito Penal, de forma a garantir a
privacidade e a integridade desses bens. Então, “existindo um bem jurídico a
ser tutelado, há crime sob o aspecto material. A simples omissão normativa não
é suficiente para descaracterizá-lo como objeto de estudo do Direito Penal, já
que este reconhece sua existência sob o aspecto material”.
Rosa (2005), por sua
vez, destaca que existe um problema relacionado à dicotomização do delito comum
e o de Informática, já que muitos doutrinadores garantem que não existem
delitos dessa natureza, pois argumentam que os crimes cometidos com o
computador encontram-se todos positivados na legislação brasileira. Porém, o
autor destaca que existem crimes comuns – os previstos no Código Penal (CP)
brasileiro, crimes comuns cometidos com o auxílio do computador – que encontram
aplicação na legislação penal brasileira, visto que se enquadram nas condutas
descritas nos tipos penais previstos no CP, e certas condutas que não estão
tipificadas em tal legislação e que necessitam da utilização do computador para
o resultado desejado. Esses são os “crimes de Informática” propriamente ditos e
são essas situações que necessitam de legislação específica, já que não se
encaixam na tipificação do sistema jurídico penal brasileiro.
Gouveia (2007) cita,
dentre essas condutas não-tipificadas, as invasões, os vírus de computador e a
destruição de dados e afirma que esses e outros delitos tradicionais ou
clássicos, como pornografia infantil, racismo e violência moral, que vêm sendo
praticados no ciberespaço, estão causando prejuízos reais à vida das pessoas.
Vianna (2003)
classifica os crimes de Informática em:
1) impróprios –
aqueles em que o computador é usado como instrumento para a execução do crime,
porém não há ofensa ao bem jurídico inviolabilidade dos dados ou informações.
Exemplo: crimes contra a honra cometidos por meio da Internet;
2) próprios – aqueles
em que o bem jurídico protegido pela norma penal é a inviolabilidade dos dados
ou informações. Exemplo: Art. 313-A, do CP, acrescentado pela Lei nº
9.983/2000, que determina:
“Inserir
ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos ou excluir
indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados da Administração
Pública com o fim de obter vantagem para si ou para outrem ou para causar dano:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos e multa” (VIANNA, 2003);
3) mistos – são
crimes complexos em que a norma visa tutelar, além da proteção da
inviolabilidade dos dados, bem jurídico de natureza diversa. São delitos
derivados do acesso não-autorizado a sistemas computacionais. O autor destaca
que, no ordenamento jurídico brasileiro, o delito informático fundamental ainda
não foi tipificado, enquanto que um derivado já o foi, a saber: acesso
não-autorizado a sistemas computacionais do sistema eleitoral, com a Lei nº
9.100/95, em seu art. 69, VII, que prevê: “Obter ou tentar obter,
indevidamente, acesso a sistema de tratamento automático de dados utilizado
pelo serviço eleitoral, a fim de alterar a apuração ou contagem de votos” (apud
VIANNA, 2003);
4) mediatos ou
indiretos – delito-fim não-informático que herdou essa característica do
delito-meio informático realizado para poder ser consumado. Exemplo: o acesso
não-autorizado a um sistema computacional bancário para a realização de um
furto. Pelo princípio da consumação[1],
o agente só será punido pelo furto, e esse será classificado como informático
mediato ou indireto, pois um crime-meio informático não será punido em razão da
consumação desse outro crime.
Stair (1998) diz que
os crimes praticados com o computador possuem natureza dupla: o computador
tanto pode ser a ferramenta usada para cometer o crime como também pode ser o
objeto do crime.
2.2.1.1
O computador como ferramenta para o cometimento de crimes
Assim como pode-se
usar dinamite para abrir um cofre, o computador pode ser utilizado para se
obter acesso a informações valiosas ou a um determinado sistema.
Conforme Stair
(1998), para cometer esse tipo de crime, são necessárias duas habilidades:
1ª) saber como
conseguir acesso ao sistema computadorizado. Normalmente, precisará conhecer a
identificação e a(s) senha(s) de acesso ou deverá ter a capacidade de gerar
códigos falsos ou autênticos;
2ª) saber como
manipular o sistema para obter o resultado esperado.
2.2.1.2
O computador como objeto de crimes
O computador se torna
objeto de crime quando o acesso a um sistema computadorizado é obtido sem a
autorização de seu proprietário e/ou quando dados ou equipamentos
computacionais são furtados ou destruídos (STAIR, 1998).
Colares (apud
GOUVEIA, 2007) também faz uma classificação dos crimes cometidos com o uso do
computador, a saber:
1. crimes eletrônicos
– crimes tradicionais nos quais a Internet é utilizada como meio para a sua
prática, dentre eles: pornografia infantil, racismo, ofensas morais, plágio e
incitação à violência;
2. crimes
informáticos – práticas ofensivas que têm como fim a lesão de dados ou sistemas
computacionais, especialidade dos hackers[2],
que não têm previsão legal no Brasil e, portanto, não poderiam ser chamados de
“crimes” no sentido jurídico da palavra.
Essa discussão quanto
à utilização do termo crime se dá devido ao fato de o Direito Penal brasileiro
ter como dois de seus princípios fundamentais o da legalidade e o da
anterioridade, previstos no art. 1º, do CP e no art. 5º, XXXIX, CF, que
determinam que não há crime sem lei anterior que o defina e não há pena sem
prévia cominação legal. Pelo princípio da legalidade (MIRABETE, 2007), uma
pessoa só pode ser punida se, anteriormente ao fato por ela praticado, existir
uma lei que o considere como crime; mesmo que a conduta seja imoral,
anti-social ou danosa, não poderá ser punida, sendo irrelevante se entrar em
vigor lei posterior que o preveja como crime, devido ao princípio da
anterioridade (JESUS, 2002).
Também há muita
discussão a respeito da necessidade ou não da criação de legislação específica
para o tratamento dos ditos “crimes de Informática”. Rosa (2005) é um dos
defensores da corrente que entende ser mister a sua criação. Ele destaca que “é
preciso proteger a sociedade e o cidadão contra tais comportamentos, de modo
que a tipificação desses delitos específicos, os chamados crimes de
Informática, acaba sendo uma das medidas consideradas urgentes e que não pode
esperar mais”.
Já Silva (2003)
defende que a interação entre a Informática e o Direito, chamada por ela de
Direito de Informática, trata-se de um novo ramo do conhecimento jurídico. A
autora afirma haver sustentação doutrinária para o reconhecimento desse novo
ramo do Direito e que sua origem está na necessidade social perante a invasão
da informática na vida das pessoas; porém, ela destaca não haver unanimidade
quanto ao surgimento desse ramo, mesmo reconhecendo tratar-se de matéria que
exige cuidado devido a suas peculiaridades.
“O
aparecimento da Informática no meio social ocorreu de forma tão rápida e passou
a exigir, com a mesma rapidez, soluções que o Direito não estava preparado para
resolver. Com isso, a necessidade social aparenta estar desprovida da tutela do
Direito e a busca ansiosa por regular a matéria pode provocar a criação de leis
excessivas e desnecessárias” (SILVA, 2003).
2.2.2
Condutas classificadas como “crimes próprios de informática”
A seguir são
apresentadas algumas condutas danosas a bens jurídicos de terceiros e que só
podem ser realizadas com a utilização da TI.
2.2.2.1
Acesso e uso não-autorizados
O acesso
não-autorizado a um sistema computadorizado ou rede de computadores pela
violação de regras de segurança “concerne especificamente à conduta daquele que
ilegalmente penetra em um sistema informático ou telemático protegido por
medidas de segurança, ou, ainda, ali se mantenha contra a vontade expressa ou
tácita de quem tem o direito de excluí-lo” (ROSA, 2005). Já o uso
não-autorizado pode ser realizado aceitando o risco de causar prejuízo ou dano
ao sistema, ao seu proprietário ou a quem tenha autorização para acessá-lo, no
intuito de causar tal prejuízo ou efetivamente o causando.
2.2.2.2
Alteração e destruição de dados
Dados e informações
são bens pessoais ou corporativos. O uso intencional de programas ilegais e
destrutivos para alterar ou destruir dados é um ato tão criminoso quanto a
destruição de bens tangíveis.
Os exemplos mais
comuns desse tipo de programas são os vírus que, quando carregados em um
computador, podem destruir dados, interromper ou provocar erros no
processamento.
Segundo O´Brien
(2001), vírus é o termo mais conhecido, mas, tecnicamente, é um programa que se
oculta dentro de outro programa, ou seja, não pode funcionar sem a existência
de outro no qual será inserido. Existe também um programa destrutivo que pode
rodar de forma independente e é chamado de verme. Os dois copiam rotinas
destrutivas nos computadores, isolados ou em redes, de qualquer pessoa que
acessar computadores infectados pelo vírus ou que utilizar cópias de discos
magnéticos tiradas a partir de computadores infectados. Assim, um vírus ou
verme de computador pode disseminar a destruição entre muitos usuários. Um
programa desse tipo pode apenas exibir mensagens humorísticas, mas, muitas
vezes alteram completamente o funcionamento de um computador ou de uma rede de
computadores, podendo destruir dados e programas, os quais correm o risco de
não voltar a ser funcionais (LAUDON e LAUDON, 1999). Normalmente, o vírus ou o
verme entra em um sistema computadorizado por intermédio de cópias ilegais de software ou de e-mails e links da
Internet.
Para diagnosticar,
remover e prevenir os computadores e as redes contra os vírus e os vermes, os
usuários devem ter programas antivírus instalados e atualizados em seus
computadores.
2.2.3
Condutas classificadas como “crimes impróprios de informática”
A seguir são
apresentadas condutas que trazem danos a bens jurídicos de terceiros e que
podem ser realizadas com ou sem a utilização dos sistemas computadorizados.
2.2.3.1
Furto ou roubo de equipamentos
A redução do tamanho
dos computadores e de seus componentes facilitou a prática de furto ou roubo
desse tipo de equipamento. Os computadores portáteis (notebooks, palmtops, etc.), juntamente com os dados e informações
contidos neles, são alvos fáceis para ladrões.
Destaca-se que esse
furto ou roubo não acarreta somente na subtração do hardware, visto que, na maioria das vezes, junto com ele são
subtraídos os softwares, dados e
informações existentes em tal equipamento.
Hodiernamente, esse
crime é tão comum que existem quadrilhas especializadas em furto ou roubo de notebooks nos aeroportos brasileiros.
2.2.2.2
Furto ou roubo de dados e informações
Assim como qualquer
bem, dados e informações podem ser objetos de furto ou de roubo. As pessoas que
acessam sistemas sem a autorização de seus proprietários, muitas vezes, o fazem
para furtar esses bens intangíveis.
Furto e roubo são
crimes previstos no CP, nos artigos 155 e 157, respectivamente. Assim, não há
porque se considerar essas condutas como crimes de Informática. Simplesmente o
objeto desses crimes pode ser um ou alguns dos elementos que compõem os
sistemas computadorizados.
Destaca-se que a
prática de roubo de dados e informações não é muito freqüente, porém é possível
sua configuração, já que, por exemplo, pode-se invadir uma empresa e sob ameaça
física obter seus dados.
2.2.3.3
Privacidade
A questão da
privacidade, segundo Stair (1998), trata, basicamente, da coleta e mau uso de
dados. Dados sobre as pessoas são constantemente coletados, armazenados e distribuídos por redes facilmente acessíveis,
sem o conhecimento ou o consentimento da pessoa a quem eles se referem ou a
quem eles pertençam.
De acordo com Moraes
(2005), a garantia constitucional do sigilo de dados foi trazida com a
Constituição Federal de 1988.
A inviolabilidade do
sigilo de dados está prevista no art. 5º, XII, CF e complementa a previsão ao
direito à intimidade, determinando ser “inviolável o sigilo da correspondência
e das comunicações telegráficas de dados e das comunicações telefônicas, salvo,
no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei
estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”
(NERY JUNIOR e NERY, 2006) e à vida privada, previsto no art. 5º, X, CF que
determina: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”.
Pinho (2003) afirma
que o direito à privacidade, dentro da sistemática estabelecida pela CF, trata
de uma denominação genérica que compreende a tutela da intimidade, da vida
privada, da honra e da imagem das pessoas e destaca que “em razão dos avanços
tecnológicos, com a possibilidade crescente de intromissão na vida íntima das
pessoas, é indispensável assegurar-se, entre os direitos individuais, o
respeito à privacidade de cada ser humano”.
A intimidade e a vida
privada são círculos concêntricos da esfera de reserva da vida pessoal, sendo a
intimidade mais restrita, por se referir ao próprio indivíduo, bem como ao que
possui de mais próximo como seus segredos, seus desejos e seus relacionamentos
sexuais. Já a vida privada abrange o relacionamento do indivíduo com outras
pessoas, tais como seus familiares, seus amigos e seus sócios (PINHO, 2003).
A defesa da
privacidade deve proteger a pessoa contra (NERY JUNIOR e NERY, 2006): a) a
interferência em sua vida privada, familiar e doméstica; b) a ingerência em sua
integridade física ou mental, ou em sua liberdade intelectual e moral; c) os ataques
à sua honra e reputação; d) a sua colocação em perspectiva falsa; e) a
comunicação de fatos relevantes e embaraçosos relativos à sua intimidade, f) o
uso de seu nome, identidade e foto; g) a espionagem e a espreita; h) a
intervenção na correspondência; i) a má utilização de informações escritas e
orais; j) a transmissão de informes dados ou recebidos em razão de segredo
profissional.
Honra, em termos
jurídicos, é o “conjunto de atributos morais, físicos e intelectuais que tornam
uma pessoa merecedora de apreço no convívio social e que promovem em sua
auto-estima” (NERY, apud MENDES, 2005).
A honra, segundo
Pinho (2003), é um atributo pessoal que compreende a consideração que ela tem
de si mesma, a sua auto-estima, o seu amor-próprio, que é a chamada “honra
subjetiva”, e a consideração de que ela goza no meio social, ou seja, a imagem
que a pessoa tem perante a sociedade, a sua reputação, também conhecida como “honra
objetiva”. A legislação penal tutela a honra, estabelecendo os crimes de
calúnia, difamação e injúria em diversos estatutos legais, dentre eles: CP,
arts. 138 a
140; Código Eleitoral – Lei nº 4.737/65, arts. 324 a 326 e Lei de Imprensa –
Lei nº 5.250/67.
Nery Junior e Nery
(2006) destacam que a ofensa à honra, liberdade ou intimidade das pessoas
enseja indenização por dano moral e patrimonial.
Conforme Araújo Nunes
(apud PINHO, 2003), o direito à imagem tem dupla acepção: 1) retrato físico ou
imagem-retrato – é a representação gráfica, fotográfica, televisionada ou
cinematográfica de uma pessoa, ou seja, é o direito de não ter sua
representação reproduzida por qualquer meio de comunicação sem a devida
autorização; 2) retrato social ou imagem-atributo – forma pela qual uma pessoa
é vista no meio social em que vive. A imagem de bom profissional, de pessoa de
boa índole, leal e honesta, é construída ao longo dos anos, não podendo ser
atingida por notícia difamatória veiculada de forma precipitada. A Súmula 227
do STJ determina que a pessoa jurídica também pode sofrer danos morais (NERY
JUNIOR e NERY, 2006).
2.2.3.4 Pirataria de software
No Brasil, a
pirataria de software é tratada como
propriedade intelectual e, como tal, é considerada um bem jurídico tutelado
pelo Direito.
Assim como os livros
e filmes, os programas de computador (software)
são protegidos por leis de direitos autorais. Normalmente, pessoas que jamais
pensariam em plagiar uma obra escrita por outro autor não hesitam em usar e
copiar programas pelos quais nada
pagaram. As pessoas que fazem essas cópias ilegais são chamadas de “piratas”, e
o ato de realizar tais cópias chama-se “pirataria de software”.
Quem adquire um software recebe, somente, o direito de
utilizá-lo sob certas condições, ou seja, não o possui de fato. Geralmente,
essas condições permitem que seja feita uma cópia de segurança (backup) para uso no caso da ocorrência
de problemas ou de destruição do programa original. Qualquer cópia além dessa é
passível de sanção.
A legislação especial
que trata sobre a pirataria de software
é a Lei nº 9.609/98, chamada de Lei do Software.
3 Considerações
finais
O Código Penal
brasileiro foi elaborado em 1940, quando o legislador daquela época visou o bem
a ser protegido, na definição de cada crime. Desse período para os dias atuais
inúmeras mudanças ocorreram na sociedade, principalmente quanto ao
desenvolvimento tecnológico e, mais especificamente, quanto à Informática, e
percebe-se que esta mudança não foi acompanhada pela legislação pátria.
A tecnologia da
informação passou a ser utilizada não somente com os fins para os quais ela foi
desenvolvida, tornando-se poderosa “arma” para a prática de crimes e de
condutas lesivas a diversos bens jurídicos se utilizada por pessoa mal
intencionada.
Com o desenvolvimento
deste trabalho verificou-se que a evolução da informática proporcionou uma nova
dimensão à criminalidade, pois a TI trouxe um modus operandi distinto daquele amplamente conhecido pelos
operadores do Direito. Nos crimes
cometidos por meio de computador, não há contato direto entre autor e vítima, o
contato é apenas virtual, e os meios de execução foram simplificados a um
aparato eletrônico.
Com a utilização dos
sistemas computadorizados, os agentes podem cometer, além de crimes impróprios
de informática – aqueles podem ser realizados com ou sem a utilização do
computador, tais como os contra a honra e a prática de pornografia infantil, os
específicos ou próprios – os que só podem ser realizados através desse tipo de
sistema, tais como o acesso ao sistema alheio para furtar, alterar, danificar,
excluir ou transferir dados sem a autorização do proprietário.
O crescimento
desenfreado da utilização da Informática obriga os aplicadores do Direito a uma
adaptação forçada, ou seja, se tenta, na medida do possível, enquadrar as
práticas cometidas por meio dos sistemas computadorizados nos tipos penais
existentes, descritos na legislação penal brasileira, já que, em âmbito
legislativo, as adaptações não acontecem no mesmo ritmo.
Assim, verifica-se
que a falta de um enquadramento da conduta lesiva aos tipos penais existentes
no ordenamento jurídico brasileiro pode levar à impunidade de seus agentes. Por
isso, torna-se imperioso o desenvolvimento de uma legislação específica ou a
adequação da existente com relação aos chamados crimes de informática.
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Notas:
[1] De
acordo com Zaffaroni e Pierangeli (apud VIANNA, 2003, p. 26), “em função do
princípio da consumação, um tipo descarta outro porque consome ou exaure seu
conteúdo proibitivo, isto é, porque há um fechamento material”.
[2] Hacker é uma
pessoa que possui uma grande facilidade de análise, assimilação, compreensão e
capacidades surpreendentes para lidar com um computador. Ele sabe que nenhum
sistema é completamente livre de falhas e sabe onde procurar por elas,
utilizando-se de técnicas das mais variadas. Popularmente o hacker é visto como um ‘criminoso’, porém,
tecnicamente, quem utiliza as habilidades de hacker ‘para o mal’ é chamado de cracker (ULBRICH et al, 1999)91t al, ou mais computadores.ias de
hoje.os usu 2003), “lterar a apuraçano: Pena – reclusministraç.
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Lóren Formiga de Pinto Ferreira