SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; I – ASPECTO GERAL DA TUTELA ANTECIPADA NA ARBITRAGEM – JURISDIÇÃO ARBITRAL E JURISDIÇÃO ESTATAL; II – PODERES DO ÁRBITRO E DO JUIZ TOGADO; III – CONFLITO ENTRE A DECISÃO ARBITRAL E A JUDICIAL; IV – TUTELA ANTECIPADA NA ARBITRAGEM (MEDIDAS COERCITIVAS, CAUTELARES E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA), CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
RESUMO: A lei 9.307/96 composta de quarenta e quatro artigos surge como um instrumento viável de pacificação social, aceito no mundo todo, para dirimir os litígios de maneira rápida, menos onerosa, civilizada e efetiva. As vantagens deste instituto são inúmeras sendo que as partes ao escolher um juiz arbitral para a solução dos conflitos sociais de forma adequada, não poderão vislumbrar nenhum demérito que possa advir dessa opção. O árbitro tem total poder para resolver as necessidades da sociedade e, sobretudo, deferir uma liminar de tutela antecipada ou outras medidas emergências (cautelares ou coercitivas). Entretanto, lhe falta competência para executá-las, a isto cabe ao Poder Estatal. Com efeito, o instituto da antecipação da tutela foi trazido pelo reforma do Código de Processo Civil, com o advento da Lei 8.952/94, que alterou o CPC em seu artigo 273, tendo como objetivo, primordialmente, acelerar e proporcionar uma maior efetividade à prestação jurisdicional, diante da lentidão do curso normal do processo. A tutela antecipada, especificamente, no procedimento arbitral, indiscutível e indispensável às soluções dos litígios pelas quais exigem efetividade no oferecimento da proteção jurisdicional. Dentre as várias técnicas de tutela, a Lei 9.307/96 permite total aplicação da tutela antecipada, entendida pela doutrina majoritária. Se o árbitro tem a soberania de regular definitivamente sem a participação do Poder Judiciário o mérito do litígio na medida em que a convenção o autoriza, não há qualquer razão plausível para impedir a conceder a tutela de ofício ou a requerimento dos interessados. A tutela antecipada (art. 273 CPC) na verdade seria um deferimento provisório do pedido inicial na qual o juiz estatal e, em especial, o juiz privado concede, no todo ou em parte, com força de execução se necessário. Desta forma, com relação ao tema Tutela Antecipada na Arbitragem, este artigo pretende demonstrar a possibilidade da aplicabilidade da tutela antecipada no procedimento arbitral.
O presente artigo aspira demonstrar a possibilidade de um juiz arbitral conceder a tutela antecipada, embora haja autores, em sua minoria, contrários a esta posição, aceitando que apenas ao Estado é permitido tal conduta.
Também analisar algumas diferenças entre a justiça arbitral e a justiça estatal, com as principais características da Lei 9.307/96 e da Tutela Antecipada.
É claro que o artigo não irá esgotar toda a matéria concernente a tutela antecipada na arbitragem, preocupando-se em discutir sem chegar a uma conclusão definitiva.
Aliás, a doutrina, ainda que majoritária, não chegou em um consenso, daí a problemática deste artigo.
Sabe-se que a arbitragem surgiu no Brasil em razão da preocupação do legislador frente ao sistema processual brasileiro, por ser ele deficiente e moroso.
Em face disso, a arbitragem é um grande avanço para a solução de conflitos contratuais que dizem respeito aos bens patrimoniais disponíveis, sendo que o Poder Judiciário na atualidade dificulta as partes receberem uma digna prestação jurisdicional.
Entretanto, ante a falta de conhecimento deste instituto cada vez mais vem sendo deixada para trás e “entupindo” os órgãos judiciários com demandas que poderiam ser recepcionadas pela Lei 9.307/96 propiciando uma solução mais rápida e eficaz daquele conflito.
Por esta razão serão debatidos alguns aspectos relevantes da tutela antecipada demonstrando que o legislador adotou tal procedimento, pois além de precisar de uma justiça rápida e barata, também é necessária uma justiça eficaz, que traga de imediato a prestação jurisdicional pleiteada.
Daí unir duas formas de solução de litígios rápidos: a arbitragem e a tutela antecipada. Razão esta ocorrerem situações em que as partes não podem esperar por muito tempo, até que seja lhe concedido o direito.
Por isso, é que a tutela antecipada e a cautelar surgiram, dando uma maior efetividade a essa turbulência de demandas que atormentam o Estado.
A principal temática, portanto, está em saber se um árbitro tem ou não competência para decretar tutela antecipada, inclusive, outras medidas de urgência.
É sabido que a doutrina vem discutindo esse enfoque demasiadamente, mas ninguém consegue consolidar o tema.
Neste passo, apesar de grande parte dos autores, na maioria, conservadores, não permitirem que um árbitro decida a respeito de tutela antecipada, jovens juristas já estão modificando o pensamento daqueles.
A aceitação está quase que majoritária, embora entendam que o árbitro pode apenas decretar cautelares e provimentos antecipatórios, e não exercerem o poder coercitivo sobre elas.
É claro que neste artigo o que se busca é precisar realmente se o árbitro pode ou não realizar tal medida, mesmo porque, ele tem as mesmas atribuições de um juiz togado como se verá.
Quanto a não ter o poder de imperium, não é o caso de discutir, pois apenas haverá intervenção do Estado se a parte, após deferida a tutela antecipada, não cumprir, cabendo ao juiz estatal determinar que se cumpra a prestação jurisdicional.
Assim, este será o tema discutido neste artigo, ante a possibilidade de um árbitro conceder medidas cautelares, tutelas antecipatórias as partes quando houver a necessidade, preenchidos os requisitos legais do artigo 273 do Código de Processo Civil.
I – ASPECTO GERAL DA TUTELA ANTECIPADA NA ARBITRAGEM – JURISDIÇÃO ARBITRAL E JURISDIÇÃO ESTATAL
Sabe-se que o árbitro tem a mesma finalidade de um juiz estatal, a de solucionar conflitos.
Isto é verdade que embora seja uma justiça particular, privada, tem uma característica pública, haja vista a sentença proferida por um árbitro ter respaldo do Poder Estatal, garantindo, assim, sua eficácia como se a decisão fosse do próprio juiz togado.
Aliás, segundo consubstancia o autor J. E. Carreira Alvim[1], “a sentença arbitral é idêntica em eficácia a sentença judicial”.
Entretanto, há uma diferença que não pode deixar de lado, pois a decisão proferida por um árbitro está sujeita a nulidade conforme depreende-se do artigo 33[2] da Lei Arbitral, enquanto, a sentença judicial apenas fica limitada a uma ação rescisória, nos termos do artigo 485 do Código de Processo Civil.
Mas esta distinção não implica na eficácia da sentença arbitral, pois deve-se levar em consideração, apenas, que o árbitro tem o poder de conhecer a demanda e julgá-la, sendo que o juízo togado além destes dois elementos tem o poder de promover a execução da decisão proferida no caso concreto.
Contudo, isto não faz com que o árbitro perca a sua jurisdição, porque o juízo togado, tão somente, garante a efetivação da decisão proferida por ele, sendo certo que o Estado não pode intervir na arbitragem, limitar ou regular o comportamento do árbitro. Trata-se de lei especial.
O artigo 32[3] da Lei 9.307/96 é claro ao afirmar que a sentença proferida por um árbitro terá a mesma força como se fosse de um juiz togado.
Vale ressaltar que a decisão arbitral não carece mais passar pelo crivo do Estado para ter eficácia, isto é, ser homologada, embora ainda reserve algum controle, pois a parte pode pleitear ao juiz togado a anulação daquela decisão arbitral.
Assim, o Instituto Arbitral, como método alternativo de solução de conflitos, está a cada dia ganhando mais ênfase, principalmente no Brasil, e ninguém pode negar que embora tenha origem contratual, desenvolve-se com a garantia do devido processo tendendo-se a assumir a mesma função de sentença judicial (jurisdição arbitral).
II – PODERES DO ÁRBITRO E DO JUIZ TOGADO.
O árbitro possui o poder, como os romanos diziam “cognitio” e “iurisdictio”. Significa que lhe falta o poder de império pertencente aos juizes togados.
Mas o que seria este poder de império que apenas os juizes estatais possuem? É como demonstra J. E Carreira Alvim[4], afirmando que ao árbitro é permitido apenas conhecer da lide e aplicar a sentença, entretanto, ao excuta-la deverá fazer um requerimento a autoridade judiciária para que exerça o poder coercitivo.
Como exemplo, utiliza-se a testemunha que se recusa a ir à audiência designada, devendo o árbitro determinar a sua condução coercitiva através de um requerimento realizado a autoridade judicial e esta, poderá conduzir a testemunha. Também no caso de busca e apreensão de coisas ou documentos, exigindo a intervenção do Poder Judiciário.
O mais interessante é que o mesmo autor entende e aceita em sede arbitral, medidas cautelares, sejam elas preparatórias ou incidentais, com o intuito de garantir a eficácia da sentença arbitral.
Não é só, diz ainda que embora o árbitro não possa efetivar uma medida constritiva, não o impede de decreta-la, para o que se basta a jurisdição, na qual se compreende a “cognitio”.
Da mesma forma, o caso da antecipação da tutela disciplinada no artigo 273[5] do Código de Processo Civil, que seguindo ao autor “tem perfeito cabimento na arbitragem”, sendo aplicada as regras processuais se outras não forem estabelecidas pelas partes ou fixadas pelo árbitro, com o seu consentimento.
III – CONFLITO ENTRE A DECISÃO ARBITRAL E A JUDICIAL.
Como já foi dito anteriormente, o árbitro tem o poder de conhecer do litígio e julga-lo, entretanto, quem tem o poder de executar a decisão, isto é, o poder coercitivo, é o juiz togado.
É neste ponto que surge o conflito entre a decisão arbitral e a judicial.
Ocorre que, solicita a efetivação de sua decisão ao juízo togado, seja ela uma medida cautelar, seja ela uma antecipação de tutela ou uma liminar, e este, contraria.
Ora, o poder judiciário entende que não é de competência do árbitro conceder tais medidas. O que fazer neste caso? É este o grande problema hoje enfrentado pelo Instituto Arbitral.
A lei estabelece que quem tem o poder coercitivo é o juiz togado e não o árbitro. Portanto, quem deve efetivar as medidas cautelares, a tutela antecipada ou a liminar é, tão somente, ele.
É um absurdo concordar com esta posição, como J. E. Carreira Alvim e muitos outros autores consagrados pelo direito não concordam com este entendimento, pois acabaria o Estado controlando o árbitro para satisfazer seu imperium.
Há algum método para coibir esta atitude do juiz togado? Não, como a lei lhe atribuiu esta prerrogativa, nada pode ser feito, entretanto, quando ele não aceita a decisão arbitral, somente a parte e não o árbitro terá legitimidade para interpor o recurso cabível. Não fica descartada a correição parcial ou a reclamação conforme previsto nos regimentos internos dos tribunais.
Para o autor J. E Carreira Alvim o mais acertado é o recurso de apelação, pois a decisão judicial põe fim ao procedimento na fase judicial.
Desta forma, vale sempre acreditar que a decisão de um árbitro tem força e que mesmo um juiz togado entendendo não ser de competência dele, as partes poderão recorrer.
IV – TUTELA ANTECIPADA NA ARBITRAGEM (MEDIDAS COERCITIVAS, CAUTELARES E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA)
Sabe-se que a tutela de urgência reflete a realidade do mundo contemporâneo, as necessidades, os problemas, as aspirações atuais da sociedade civil.
Os métodos tradicionais são muito demorados e, se tratando de uma medida de urgência, surge o dever de criar algo alternativo que possa ser capaz de atender àquelas necessidades com mais velocidade.
O autor Joel Dias Figueira Junior (FIGUEIRA JUNIOR, p. 213)[6] ensina:
As tutelas sumárias (cautelares ou não) servem, em outras palavras, para neutralizar os efeitos do tempo que incidem impiedosamente sobre os bens litigiosos e reflexamente sobre as próprias partes litigantes, em razão da duração do processo cognitivo exauriente ou do processo de execução.
Significa dizer que, é a própria efetividade do processo através de remédios jurídicos mais apropriados e de medidas que atenuem o indesejável fenômeno do retardamento da prestação jurisdicional do Estado.
Ainda o mesmo autor reafirma que “Mais do que outras técnicas de diferenciação de tutela, a antecipação de seus efeitos é talvez a que melhor se harmoniza com o atual sistema processual, na medida em que pode ser adotada sem maiores transformações na estrutura”.[7]
Deste modo, as tutelas de urgência, sejam cautelares ou antecipatórias, realizam por meio do Estado-Juiz e, sobretudo, também pela Arbitragem, matéria discutida neste artigo, a abreviação dos conflitos de interesses resistidos ou insatisfeitos, voltando-se a pacificação social.
A grande polêmica, portanto, está em discutir a possibilidade ou não do árbitro ser detentor do poder de decretar medidas cautelares e, sobretudo, a antecipação de tutela.
Muitos autores negam esta possibilidade e afirmam que tal poder apenas detém ao juiz togado. Entretanto, outros, menos conservadores, acreditam que o juiz arbitral poderá até decretar uma tutela antecipada ou uma liminar ou uma medida cautelar, mas não terá o imperium, ou seja, o poder de efetivá-las.
A doutrina procura também diferenciar duas situações: antes da instauração do juízo arbitral e após sua implementação.
Se instaurado a justiça privada, preenchido os requisitos que a lei determina (perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, verossimilhança do direito alegado) quaisquer das partes poderão pleitear ao árbitro ou ao tribunal arbitral a concessão de tutela antecipada.
Caso as partes não tenham ainda implementado a arbitragem, deverão socorrer ao Juiz-Estatal (art.22, § 4, Lei 9.307/96).
É o que preleciona Joel Dias Figueira Junior[8]: “Desde que instaurado o juízo arbitral, inexiste possibilidade jurídica de o interessado dirigir qualquer desses requerimentos ao juiz togado que seria competente, originariamente, se fosse o caso, para conhecer da lide principal”.
O professor J. E. Carreira Alvim (ALVIM, 2004, p. 334)[9], em brilhante reconhecimento de medidas cautelares e antecipatórias no instituto arbitral afirmou ainda que:
Mas que o árbitro não disponha de poderes para decidir sobre medidas cautelares ou coercitivas (incidentes ou preparatórias) é algo que ainda não se demonstrou, limitando-se a doutrina ortodoxa a recitar a uma ‘cartilha’ com velhas lições, que não mais se amoldam com a moderna Lei de Arbitragem..
Fica claro o entendimento do autor, pois é devido aos estremados posicionamentos da doutrina ortodoxa ou conservadora que ao árbitro é negado o poder de cautelar lato sensu.
O maior problema é quando a convenção de arbitragem for omissa ou silenciar-se ao prever o poder aos árbitros para decretarem medidas cautelares ou antecipatórias, devendo, neste caso, submeter-se não apenas a Lei Arbitral, mas também ao Código de Processo Civil, pois o objetivo é resguardar ou preservar os interesses e direitos das partes.
Nota-se que o artigo 22 da Lei 9.307/96[10], expressamente postula a medida coercitiva ao juízo arbitral quanto a colher provas, ouvir testemunhas, determinar perícias, de modo que após cumprimento dessa exigência a ele é facultado solicitar sua imposição ao juiz togado.
Significa que, ao árbitro é permitido decretar medidas coercitivas ou cautelares, ainda que tenha que requerer ao Poder Judiciário sua imposição.
Do mesmo modo, o § 4° do referido dispositivo[11] diz que, ressalvando § 2°, em havendo a necessidade de decretar uma tutela antecipada, uma medida cautelar ou coercitiva, o árbitro poderá solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário, sendo ele competente para julgar a causa.
Quando a lei diz expressamente que o árbitro “poderá” é possível entender da possibilidade dele conhecer esta necessidade e decretá-la, pois não tem o dever de solicitar ao Estado, mas, tão somente, poderá, isto é, torna-se facultativo.
É claro que o poder coercitivo está com o Poder Judiciário que detém da competência para efetivá-las, caso se faça necessário atos materiais de coerção.
Desta forma, deve-se distinguir a concessão e a efetivação da medida, uma vez que cabe ao órgão arbitral conceder ou decretar, mas precisará do judiciário para a sua efetivação.
Nesse sentido, o árbitro tem a iniciativa de determinar quaisquer medidas coercitivas relacionadas com a instrução do processo, só que se valendo do órgão do Poder Judiciário, se houver resistência ao seu cumprimento.
Os autores Sérgio Bermudas[12] e Pedro Antônio Batista Martins[13] também são a favor do árbitro decretar medidas cautelares e antecipação de tutela se houver a necessidade.
Nada impede as partes requererem tais medidas ao próprio juízo arbitral, nem que este as conceda, pois elas não poderão, segundo a visão destes autores, se dirigir ao Poder Judiciário sem antes ter obtido a determinação do juízo arbitral.
O interessante é que mesmo não instituída a arbitragem, a doutrina tem admitido o recurso ao juiz estatal a fim de que, dado ao caráter de urgência, conceda a medida cautelar ou a tutela antecipada.
Há ainda uma minoria de autores que dizem se a convenção de arbitragem nada dispuser a esse respeito, havendo necessidade de concessão de medida acautelatória ou antecipatória, esta poderá ser pleiteada mesmo não tendo sido instituído o juízo arbitral.
Entretanto, como bem afirmou Durval Vianna contrário a esta posição, “as medidas cautelares previstas no processo arbitral tem cunho exclusivamente incidental, isto é, são requeridas após a instituição da arbitragem, pois do contrário não poderão ser ‘solicitadas’ pelo árbitro. Devem os compromitentes, em caso de necessidade, antes de instituição do juízo arbitral, propor ações cautelares preparatórias no juízo arbitral”.[14]
Brilhante o que disse J. E Carreira Alvim (ALVIM, 2004, p. 335 e 336)[15] sobre a necessidade do juízo arbitral decretar a medida cautelar ou a tutela antecipada. Veja:
Vincular o juízo arbitral ao juízo togado, na eventualidade da necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, além de nada acrescentar em termos de proteção aos direitos constitucionais, presta-se a restringir os poderes jurisdicionais do árbitro, pondo toda a arbitragem na dependência de uma justiça sabiamente lenta, e que não tem condições de dar respostas satisfatórias às necessidades imediatas das partes interessadas.
E mais:
O árbitro dispõe de poderes para resolver o próprio mérito do litígio, nos quais foi investido por um ato de confiança das partes, por que não teria para conceder um simples provimento antecipatório, que não passa de antecipação dos efeitos da decisão de mérito?.
Isto é verdade, pois, embora o árbitro não tenha o poder de efetivar ou executar o provimento antecipatório, tem o poder cognitivo. Significa que, a ele é outorgado o poder de proferir ou decretar uma decisão, portanto, uma medida cautelar ou uma tutela antecipada.
O artigo pretende não debater se ao árbitro também possui o poder de executar a sentença, embora ele tenha permissão para providenciar tal medida, requerendo após, sua imposição ao juiz togado, mas, tão somente, se pode ou não decretar tais medidas de urgência.
A finalidade do juízo arbitral é de conhecer o conflito e julgá-lo. Caso seja concedida a tutela antecipada, mas a parte condenada não a cumpre, ao árbitro cabe solicitar ao órgão do Poder Judiciário sua execução, se este recusar-se, é cabível medida de segurança ao Tribunal Superior.
Em contrapartida, o Código de Processo Civil Italiano diz que ao árbitro não cabe conceder seqüestros, nem outros provimentos cautelares diversamente da Lei de Arbitragem Brasileira.
Quando a lei italiana diz expressamente ao árbitro não conceder, é diferente quando a Lei Arbitral brasileira diz é facultado ao árbitro solicitar ao órgão do Poder Judiciário.
Isto, pois, o árbitro só irá pedir ao Juiz Estatal a execução da tutela antecipada ou da medida cautelar caso a parte não cumpra a decisão proferida por ele.
Mas se o árbitro concede a cautelar ou a tutela antecipada e a parte cumpre voluntariamente a obrigação, não há porque a autoridade judicial intervir.
Percebe-se que ao árbitro são atribuídas duas formas, a da necessidade de intervenção do Estado e da não intervenção pelo cumprimento da medida pela parte, ou seja, ele pode conceder pelo iurisdictio, mas não pode efetivar por não ter o poder de imperium.
Na verdade, essa possibilidade que a Lei de Arbitragem confere ao árbitro de solicitar ao Poder Judiciário a execução de sua decisão, seja ela medida cautelar, seja ela tutela antecipada, é como se fosse um apoio.
Este apoio somente terá força se não implicar no desenvolvimento da arbitragem, limitando ou controlando o próprio comportamento do árbitro.
Ressalta-se que ao árbitro é atribuído o poder de conceder a medida cautelar sem a anuência das partes, isto é, de oficio, mas em uma única hipótese disciplinada no artigo 797[16] e 798[17] do Código de Processo Civil.
Seria um absurdo o árbitro não poder, a pedido das partes, sabendo que se demorar muito causará ao direito dela lesão grave e de difícil reparação, conceder a medida provisória.
Ora, a lei permite que ao árbitro, pela vontade das partes, decida o mérito do litígio sem que haja intervenção Estatal através de recursos ou homologação da decisão.
Desta forma, tendo o árbitro os mesmos poderes de um juiz togado, exceto o poder coercitivo, estará ele autorizado pela convenção arbitral a decretar tutela antecipada ou medida cautelar ou provisória.
É claro que a convenção arbitral deve regular expressamente quais os poderes que o árbitro terá, principalmente, quanto ao pronunciamento de medidas cautelares.
Neste último caso, em não havendo autorização pelas partes na convenção arbitral, as mesmas poderão solicitar a justiça comum tal procedimento ou, ainda, o próprio árbitro de ofício requer ao Estado a fim de garantir a efetividade da arbitragem, sabendo que seu poder iudicium continua existindo.
O autor Humberto Theodoro Júnior[18] entende ao contrário do que já se foi argumentado, pois a lei não confere ao árbitro ou ao tribunal arbitral poder de tomar medidas coercitivas ou medidas cautelares em caráter preparatório ou incidental.
Para ele, o árbitro deverá solicitar ao órgão judiciário para que conceda e execute se necessário tal medida.
Diferentemente o autor Ernane Fidélis dos Santos[19] diz que as medidas cautelares e coercitivas no juízo arbitral só são decretáveis por solicitação do árbitro, não competindo as partes requerê-las diretamente ao juiz estatal.
Deve levar em consideração sempre a vontade das partes, pois se estas na convenção arbitral deixar expressamente a condição de que ao árbitro não é permitido decretar ou conceder medidas cautelares ou coercitivas ou tutela antecipada, seu poder ficará circunscrito apenas a lide principal.
Mais uma vez, o autor J. E. Carreira Alvim (ALVIM, 2004, p. 341)[20] demonstrou profundo conhecimento da matéria. Veja-se:
As decisões arbitrais sobre provimentos antecipatórios não se sujeitam, de imediato, à ação anulatória, que só alcança as sentenças arbitrais, como se vê do disposto no art. 33[21] da Lei de Arbitragem. Por fim, o árbitro, em nenhuma hipótese, pode ‘solicitar’ medidas cautelares ao juiz togado, cabendo-lhe decreta-las, fundado no seu iudicium, e, só depois, solicitar a colaboração do juiz togado para efetiva-las, se não forem cumpridas voluntariamente.
É com este entendimento que a doutrina vem cada vez mais se pautando na possibilidade do árbitro decretar a tutela antecipada.
Ora, as partes renunciam a justiça comum e elegem a justiça privada, a fim de que solucione todos os conflitos advindos de um contrato. Dessa maneira, elas estarão confiando a um árbitro julgar àquela causa. Portanto, qual seria o problema do juízo arbitral, autorizado pelas partes para dirimir todas as suas necessidades, conceder a tutela antecipada? A resposta é nenhuma.
Basta verificar o artigo 273 do Código de Processo Civil que permite, sempre quando a parte requerer, ao juiz decretar tutela antecipada. Veja:
O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e; I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
Como já dito neste trabalho, o árbitro é eleito pelas partes por mera confiança, não havendo, neste caso, qualquer motivo que impeça-o de decretar a tutela antecipada.
Aliás, se eleito livremente pelas partes, portanto, está preparado para analisar o caso, se optar em conceder a tutela antecipada ou a medida cautelar poderá fazê-lo sem a intervenção do Poder Judiciário.
Por estas razões é que o árbitro poderá decretar a medida cautelar ou a antecipação de tutela. Conclui o professor Pedro Antônio Batista Martins (MARTINS, p. 364)[22]:
Não há porque negar ao árbitro a possibilidade de antecipar a tutela seja por conta da aplicação à arbitragem – por escolha das partes – das regras processuais nacionais (e, se aplicável ao procedimento comum, a antecipação de tutela vem à baila), seja por conta de expressa adoção desta técnica de potencialização da eficácia da tutela jurisdicional no procedimento criado ou escolhido pelas partes para solucionar seu litígio. E considerando que a antecipação da tutela nada mais é do técnica que permite ao julgador desde lodo conceder à parte um, alguns ou todos os efeitos que a decisão final haverá de produzir (no momento oportuno) é evidente que caberá ao árbitro – e não ao juiz togado – tomar decisão a respeito, devendo a parte interessada na obtenção do provimento dirigir-se ao juiz privado (e não ao estatal). Decidida pelo árbitro a antecipação de tutela, resta saber se haverá ou não necessidade de concurso de força para sua implementação. Se houver, o auxilio do juiz togado será requisitado nos mesmos moldes relatados anteriormente.
Enfim, o que o professor quis dizer foi que o árbitro sendo escolhido pelas vontades das partes, além de decidir questão relativa a tutela antecipada, poderá também, decidir sobre medidas cautelares e coercitivas.
É claro que a exceção se dará quando não houver o cumprimento de uma das partes da decisão arbitral, devendo solicitar auxilio ao Poder Estatal para seu efetivo cumprimento.
Outro autor que procura explicar esta idéia é o jurista Joel Dias Figueira Junior, (FIGUEIRA JÚNIOR, p. 222) [23]:
Após o deferimento da tutela de urgência e verificado o não cumprimento espontâneo da medida, o árbitro ou o presidente do tribunal arbitral oficiará o órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa, solicitando que dê efetividade à medida já concedida. O requerimento será necessariamente instruído com a prova da existência da convenção arbitral, sendo dispensável qualquer outra formalidade ou demonstração (Artigo 22, parágrafo 4°). Neste caso, ao Estado-Juiz não é conferido pelo sistema qualquer poder para rever ou modificar a decisão concessiva da tutela emergencial proferida em juízo arbitral, nem mesmo indagar quanto a necessidade e utilidade da prova testemunhal, nas hipóteses em que a testemunha faltosa deva ser conduzida (artigo 22, parágrafo 2°, in fine).
Posto isto, diante de todos estes argumentos, é certo que o árbitro poderá se houver necessidade, atender o pedido das partes conceder ou decretar a tutela antecipada, mas não somente, também medidas cautelares e coercitivas.
Ao Estado-Juiz não é conferido pelo sistema qualquer poder para rever ou modificar a decisão concessiva de tutela emergencial proferida em juízo arbitral.
Ressaltando que ao Poder Judiciário caberá, apenas, em caso de não cumprimento de uma das partes da decisão arbitral, exercer o imperium, isto é, dar efetividade àquela sentença que concedeu o provimento antecipatório.
CONCLUSÃO
No presente artigo restou demonstrado que apesar do Brasil estar em um processo lento de aperfeiçoamento e aceitação do Instituto Arbitral, não há dúvidas de que cada vez mais ganha espaço entre os juristas como método de solução de litígios mais rápido e menos oneroso.
Se não bastasse, há autores que entendem que somente o juiz estatal poderia decretar tutela antecipada ou medida cautelar e reconhecer o procedimento arbitral ou mesmo declarar nula a sentença arbitral.
Então, o árbitro poderia, tendo ele os mesmo quesitos, competência para decretar estas medidas emergenciais? Esta é a questão debatida no presente artigo com o intuito de divulgar não só a arbitragem como meio alternativo de pacificação social, sequer se aprofundar em relação a tutela antecipada, mas a importância que tornaria se ao árbitro fosse permitido tal medida.
É claro que esse entendimento não predomina sendo que a doutrina acredita na possibilidade do árbitro conceder tutelas antecipadas e até providenciar sua execução, mas sempre ressalvando que em caso de descumprimento, deverá pedir auxilio ao juiz togado.
Além de ser rápida e eficaz, a lei arbitral não diz expressamente que lhe é proibido, pelo contrário, no artigo 22, parágrafo 4° faz referência a esta possibilidade, inclusive, diz ser facultado (poderá) o auxilio do juiz togado, apenas pelo descumprimento da decisão arbitral que concedeu a tutela antecipada.
No mais, a solução adotada no Brasil é, sobretudo, lógica, pois se o árbitro está autorizado a regular definitivamente o conflito, não seria razoável impedi-lo de conceder incidentalmente medidas de urgência de oficio ou por requerimento dos interessados, desde que a hipótese vertente justifique a tomada dessa providencia emergencial.
Nesse sentido, o próprio autor Carlos Alberto Carmona (Arbitragem e processo, p. 215), consagrado e citado várias vezes no presente trabalho, entende que repeliu a possibilidade do árbitro servir de interlocutor junto ao juiz togado para tornar concreta uma decisão cautelar: “Isto levaria a situações francamente insustentáveis, tornando-se árbitro um mero substituto processual da parte que apenas instaria o árbitro a requerer (em nome próprio) a tutela de um pretenso direito do litigante”.
Além disso, a doutrina ou admite de modo absoluto ao árbitro conceder tutela antecipada, medidas coercitivas ou cautelares providenciando sua execução, ou caso não lhe seja permitido o parágrafo 4° do artigo 22 será letra morta.
Enfim, mesmo que não contasse expresso na lei de arbitragem, a concessão de medida cautelar ou coercitiva seria poder implícito à função desempenhada pelo árbitro, já que a ele cabe julgar a questão posta e buscar viabilizar o resultado final pretendido.
Informações Sobre os Autores
Rogério Montai de Lima
Doutorando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá do Rio de Janeiro, Juiz de Direito Substituto do Tribunal de Justiça de Rondônia. Professor da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça de Rondônia e programas de graduação e pós-graduação.
Marcelo de Oliveira Silva
Especializando em Direito Empresarial pela Universidade Estadual de Londrina
Bacharel em Direito da FEMA – Fundação Educacional do Município de Assis
Estagiário de Direito