Não, em regra, o exame admissional não deve ser realizado antes da efetiva rescisão do contrato de trabalho anterior, ou seja, antes da realização do exame demissional. Isso ocorre porque o exame admissional está diretamente relacionado à nova relação de emprego, enquanto o exame demissional serve para comprovar as condições físicas e mentais do trabalhador no encerramento do vínculo anterior. Fazer o exame admissional antes do demissional pode gerar implicações jurídicas sérias tanto para o trabalhador quanto para os empregadores envolvidos.
Neste artigo, explicamos em detalhes os fundamentos legais, as diferenças entre os exames, os riscos trabalhistas, previdenciários e éticos, e como agir corretamente diante de uma transição entre empregos. Também trazemos exemplos práticos, esclarecemos os entendimentos da jurisprudência e apresentamos respostas para as perguntas mais frequentes sobre o tema.
O que é o exame admissional
O exame admissional é uma avaliação clínica obrigatória exigida pelo artigo 168 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ele é realizado antes do início efetivo do contrato de trabalho com um novo empregador e tem como objetivo avaliar se o candidato está apto para exercer as funções do cargo que irá ocupar.
O exame deve ser realizado por um médico do trabalho e pode incluir:
Anamnese clínica ocupacional
Exames complementares (quando exigidos)
Avaliação da capacidade física e mental do trabalhador
Emissão do ASO (Atestado de Saúde Ocupacional)
O trabalhador só pode começar a trabalhar após ser considerado apto no exame admissional, sob pena de irregularidade na admissão e possíveis autuações por parte da fiscalização do trabalho.
O que é o exame demissional
O exame demissional, por sua vez, é realizado ao final do contrato de trabalho, também de forma obrigatória, com a finalidade de verificar as condições de saúde do empregado no momento da rescisão.
Esse exame deve ocorrer até o último dia de trabalho ou em até 10 dias após o término do contrato, salvo se o último exame ocupacional tiver sido feito nos últimos 135 dias (para empresas com grau de risco 1 e 2) ou 90 dias (grau de risco 3 e 4), conforme a nova redação da Norma Regulamentadora nº 7 (NR-7), em vigor desde janeiro de 2022.
O exame demissional serve para:
Detectar agravamentos de saúde relacionados ao trabalho
Atestar a aptidão para o desligamento
Evitar futuras ações trabalhistas relacionadas a doenças ocupacionais
Por que não se pode fazer o exame admissional antes do demissional
Realizar o exame admissional antes da efetiva rescisão do contrato anterior configura uma sobreposição indevida de vínculos trabalhistas, o que pode gerar uma série de problemas jurídicos e administrativos, tais como:
Vínculo empregatício duplo, algo vedado em muitos casos, principalmente quando há conflito de horários, jornadas ou funções incompatíveis
Riscos de responsabilização do novo empregador, que passa a ter ciência de um trabalhador ainda ativo em outro vínculo
Comprometimento da finalidade do exame demissional, já que o trabalhador pode ter sido exposto a riscos no novo emprego antes do encerramento do anterior
Problemas junto ao INSS, no caso de benefícios, afastamentos ou acidentes
Implicações éticas para o médico do trabalho, que pode responder por condutas inadequadas se emitir ASO de admissão para um trabalhador ainda vinculado a outro empregador
A legislação trabalhista presume que o vínculo de emprego é exclusivo enquanto vigente, salvo nos casos em que o trabalhador tem jornada compatível e o exercício da segunda atividade é lícito e permitido contratualmente.
Quais os riscos para o trabalhador
O trabalhador que realiza o exame admissional antes do exame demissional pode enfrentar os seguintes riscos:
Perda de direitos trabalhistas, caso a sobreposição de vínculos seja alegada para invalidar cláusulas de rescisão
Dificuldade em comprovar doença ocupacional, já que o novo vínculo pode confundir a origem da enfermidade
Cancelamento do ASO, se a empresa descobrir que o trabalhador não estava disponível para o novo vínculo
Impossibilidade de acessar benefícios do INSS, como auxílio-doença ou acidente, caso haja conflito de datas
Alegações de má-fé ou quebra de lealdade, especialmente se o novo empregador desconhecer o vínculo anterior
Em suma, o trabalhador deve aguardar o encerramento oficial do vínculo anterior para se submeter ao exame admissional, evitando problemas legais e éticos.
Quais os riscos para o novo empregador
O novo empregador que permite ou solicita o exame admissional antes da efetiva rescisão do trabalhador com outra empresa pode incorrer em diversas irregularidades, tais como:
Configuração de vínculo empregatício antecipado, mesmo sem registro na carteira
Multas por admissão irregular, se constatado que o trabalhador iniciou atividades sem estar formalmente desligado de outro empregador
Implicações previdenciárias, com possível cobrança de contribuições retroativas
Solidariedade em processos trabalhistas, se houver alegação de dupla jornada ou atividades conflitantes
Comprometimento da validade do ASO, que pode ser contestado judicialmente ou em auditoria
Além disso, o empregador pode responder por eventuais danos à saúde do trabalhador, caso este sofra acidente ou agravo durante a sobreposição de vínculos.
O que diz a legislação sobre os exames ocupacionais
O artigo 168 da CLT determina que o exame médico admissional deve ser realizado antes da contratação do trabalhador, enquanto o exame demissional deve ser feito na rescisão.
Já a NR-7, norma do Ministério do Trabalho que trata do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), estabelece os prazos e condições para a realização dos exames, determinando que:
O exame admissional deve ser feito antes do início das atividades laborais
O exame demissional deve ser realizado no desligamento ou em até 10 dias após o término do contrato
Nenhum exame pode ser feito fora do tempo previsto na norma, sob pena de nulidade e sanções administrativas
Portanto, o exame admissional antecipado, antes do desligamento anterior, não encontra amparo legal e pode ser considerado inválido.
O papel do médico do trabalho
O médico do trabalho tem responsabilidade técnica e ética sobre os exames ocupacionais. Ele deve:
Avaliar a capacidade física e mental do trabalhador para a função
Garantir que o exame seja realizado no tempo e contexto corretos
Não emitir ASO para trabalhador com vínculo ativo em outra empresa, salvo se houver compatibilidade legal e conhecimento prévio de ambas as partes
Recusar o exame admissional se houver evidência de que o trabalhador ainda não foi desligado do vínculo anterior
O médico que descumpre essas orientações pode responder perante o Conselho Regional de Medicina (CRM) e o Ministério do Trabalho, além de comprometer a credibilidade da empresa onde atua.
Exceções: quando é possível ter dois vínculos de trabalho
Embora a regra geral seja evitar a sobreposição de vínculos, há exceções permitidas pela legislação:
Profissionais autônomos ou liberais, como médicos, advogados e professores
Trabalhadores com jornada parcial ou intermitente, que não ultrapassam os limites de horas semanais
Vínculos com horários distintos e compatíveis, mediante ciência de ambas as empresas
Nesses casos, o trabalhador pode ter dois registros ativos, com exames admissionais válidos, desde que não haja conflito de horários, atividades e exigências legais.
Entretanto, se o trabalhador está em processo de transição entre dois empregos fixos e integrais, o correto é aguardar o encerramento do primeiro contrato para realizar o exame admissional do segundo.
Exemplo prático
João trabalha como auxiliar administrativo em uma empresa e decide aceitar uma nova proposta de emprego como analista em outra organização. Ele está em período de aviso prévio com a primeira empresa, cujo término será no dia 30.
No dia 25, a nova empresa solicita o exame admissional para garantir a contratação.
Situação incorreta: João realiza o exame admissional no dia 26, antes de ser desligado formalmente da empresa anterior. Isso configura sobreposição de vínculos e invalida o exame, além de poder comprometer os direitos dele.
Situação correta: João realiza o exame admissional no dia 1º do mês seguinte, após a emissão do exame demissional e a baixa na carteira. A admissão segue legal e sem riscos trabalhistas.
Recomendações práticas
Para o trabalhador:
Não realize exame admissional enquanto estiver com contrato ativo em outro emprego, salvo se os vínculos forem legalmente compatíveis
Comunique à nova empresa que está em fase de desligamento e aguarde a finalização do processo
Solicite o exame admissional somente após o recebimento do ASO demissional
Guarde todos os documentos e registros das datas de rescisão e admissão
Para o empregador:
Exija a comprovação de desligamento anterior antes de agendar exame admissional
Oriente o setor de Recursos Humanos e o médico do trabalho sobre a vedação à admissão antecipada
Mantenha cronograma de contratações que respeite os prazos legais
Em caso de urgência, formalize por escrito que a admissão dependerá da efetiva rescisão anterior
Seção de perguntas e respostas
Posso fazer o exame admissional durante o aviso prévio de outro emprego?
Não é recomendável. O trabalhador ainda está com contrato ativo e a nova empresa pode enfrentar implicações legais se formalizar a admissão antes do desligamento anterior.
Se eu fizer o exame admissional e desistir da vaga, o que acontece?
Nada impede que você desista, mas o exame perde validade após determinado período. Não há obrigação de assumir o cargo após o exame.
O exame admissional pode ser agendado antes, mas realizado após a demissão?
Sim. O agendamento pode ser feito antecipadamente, desde que o exame só ocorra após o encerramento do contrato anterior.
É possível trabalhar em dois empregos e fazer exames admissionais válidos?
Sim, desde que as jornadas e funções sejam compatíveis, não haja conflito de horários e ambas as empresas estejam cientes da situação.
O que acontece se o INSS identificar dois vínculos sobrepostos?
Pode haver bloqueio de benefícios, cancelamento de registros e exigência de comprovações formais. Em caso de fraude, o trabalhador pode ser penalizado.
Empregador pode exigir que o trabalhador antecipe o exame admissional?
Não. Isso representa prática irregular. A admissão só pode ocorrer após a finalização do vínculo anterior.
O exame admissional feito antes da demissão é válido?
Em regra, não. Ele pode ser considerado nulo e comprometer a legalidade da contratação.
Há punição para o médico que realiza exame admissional indevidamente?
Sim. O profissional pode ser responsabilizado ético e administrativamente por burlar as normas legais e ocupacionais.
Conclusão
Fazer o exame admissional antes do demissional é uma prática que contraria as normas legais e pode gerar sérias consequências tanto para o trabalhador quanto para o empregador. O exame admissional marca o início de um novo vínculo contratual e, portanto, só pode ser realizado após a extinção do contrato anterior. Além das implicações legais e previdenciárias, há riscos éticos, administrativos e judiciais envolvidos nessa antecipação.
A recomendação, tanto do ponto de vista jurídico quanto da segurança ocupacional, é aguardar a finalização do vínculo empregatício anterior antes de iniciar qualquer processo formal de contratação com uma nova empresa. O cumprimento adequado dos prazos e regras trabalhistas é a melhor forma de proteger direitos e evitar problemas futuros. Em caso de dúvida, buscar orientação com um advogado especializado em direito do trabalho é sempre a melhor escolha.