Sim, é possível processar uma pessoa que fica perturbando você, desde que essa perturbação seja injusta, reiterada e cause prejuízo moral, psicológico, físico ou à sua liberdade. A depender do tipo de perturbação, o caso pode se enquadrar como crime, gerar processo cível por danos morais ou materiais, ou ainda justificar uma medida protetiva. A seguir, explicamos em detalhes todas as formas legais de reagir a esse tipo de situação.
O que caracteriza uma perturbação
Perturbação, no contexto jurídico, envolve qualquer ação que interfira negativamente na paz, no sossego, na honra ou na integridade física e psicológica de uma pessoa. Isso pode ocorrer por meio de barulhos excessivos, perseguições, ligações insistentes, mensagens constantes, ofensas verbais, ameaças ou comportamentos invasivos, seja em ambiente público, privado ou digital.
É importante entender que, para configurar uma situação juridicamente relevante, a perturbação deve ultrapassar o limite do razoável e ser recorrente ou grave. Por exemplo, um desentendimento pontual pode não justificar um processo, mas um comportamento reiterado e incômodo pode ensejar medidas judiciais.
Quais tipos de perturbação são passíveis de processo
A depender do comportamento da pessoa que está perturbando, diferentes tipos de ações podem ser adotadas. Veja alguns exemplos e como o direito brasileiro os classifica:
Perturbação da tranquilidade ou do sossego
A perturbação do sossego alheio é prevista na Lei de Contravenções Penais. Barulhos, algazarras, som alto em horários impróprios ou comportamentos que perturbam a paz podem configurar contravenção penal. A vítima pode acionar a polícia e registrar boletim de ocorrência.
Ameaças e ofensas
Se a pessoa que perturba utiliza palavras, gestos ou ações para ofender, ameaçar ou intimidar, pode estar cometendo crimes contra a honra (como calúnia, difamação e injúria) ou ameaça, conforme o Código Penal. Nesses casos, é possível apresentar uma queixa-crime ou buscar uma ação indenizatória por danos morais.
Perseguição (stalking)
Desde 2021, o Brasil tipificou o crime de perseguição, também chamado de stalking. Esse crime ocorre quando alguém reiteradamente persegue outra pessoa, ameaçando sua integridade física ou psicológica, invadindo sua liberdade ou privacidade. Exemplo: seguir a vítima, enviar mensagens insistentes, aparecer em locais frequentados por ela sem motivo legítimo.
Assédio moral ou sexual
No ambiente de trabalho ou em relações interpessoais, quando há insistência de comportamentos inadequados, constrangedores, ofensivos ou abusivos, pode-se configurar assédio moral ou sexual. O assédio pode gerar consequências tanto na esfera penal quanto cível.
Ato de importunação
Quando a perturbação ocorre por meio de abordagem de conotação sexual sem consentimento, especialmente em locais públicos, pode haver a prática do crime de importunação sexual. Também é possível ocorrer importunação ofensiva ao pudor, principalmente em casos mais antigos ou que não envolvem contato físico direto.
Quais medidas podem ser tomadas contra a pessoa que perturba
Antes de ingressar com um processo judicial, é possível adotar algumas medidas extrajudiciais ou de prevenção. No entanto, se essas medidas não surtirem efeito, o caminho judicial é uma alternativa legítima e protegida por lei.
Registrar um boletim de ocorrência
A primeira providência, quando se sente perturbado por alguém de forma insistente ou grave, é registrar um boletim de ocorrência em uma delegacia, preferencialmente com provas (mensagens, fotos, vídeos, testemunhas). Esse documento formaliza a denúncia e permite que a autoridade policial investigue o caso.
Solicitar medida protetiva
Em casos de perseguição, ameaça ou importunação, a vítima pode solicitar medidas protetivas de urgência, mesmo sem relação familiar com o agressor. As medidas incluem o impedimento de contato, a proibição de aproximação e outras providências para resguardar a segurança da vítima.
Ação cível por danos morais
Mesmo que não exista um crime formal, é possível ajuizar uma ação cível por danos morais. Por exemplo, se a perturbação causou abalo emocional, vergonha, constrangimento ou crise de ansiedade, o responsável pode ser condenado a pagar uma indenização.
Ação penal ou queixa-crime
Se a conduta for enquadrada como crime (injúria, ameaça, difamação, perseguição, etc.), o caminho pode ser a apresentação de uma queixa-crime ou a abertura de investigação pela polícia. Algumas infrações penais exigem representação da vítima dentro do prazo de seis meses, contado a partir da data do fato ou do conhecimento da autoria.
Como reunir provas da perturbação
Um processo judicial só terá êxito se a vítima conseguir provar o que está alegando. Por isso, é fundamental reunir e preservar provas. Veja os meios mais comuns:
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Prints de mensagens e ligações: capturas de tela de conversas por WhatsApp, SMS, e-mails, redes sociais ou chamadas constantes.
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Testemunhas: pessoas que presenciaram os atos de perturbação podem ser ouvidas no processo.
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Imagens e vídeos: registros em vídeo, gravações de som ou filmagens de câmeras de segurança.
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Ata notarial: documento lavrado em cartório que atesta a existência de determinado conteúdo, como mensagens ou interações online.
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Relatórios médicos ou psicológicos: em casos de abalo emocional, relatórios de profissionais de saúde ajudam a demonstrar o impacto da perturbação.
Exemplos de casos em que é possível processar
Alguns exemplos ajudam a entender em que situações práticas a Justiça pode acolher um pedido da vítima:
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Ex-namorado(a) que envia mensagens todos os dias, insiste em retomar o relacionamento, ameaça divulgar fotos íntimas ou aparece no local de trabalho.
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Vizinho que coloca som alto em horários inadequados, faz provocações e tumultua a convivência na vizinhança.
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Colega de trabalho que faz comentários ofensivos ou piadas constrangedoras frequentemente.
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Pessoa desconhecida que liga repetidas vezes durante o dia ou envia mensagens ofensivas pelas redes sociais.
Em todas essas hipóteses, a pessoa que se sente perturbada pode procurar a Justiça para buscar reparação e proteção.
Quando o processo pode ser considerado abuso de direito
É preciso ter responsabilidade ao processar alguém. Um processo infundado, baseado em má-fé, vingança ou sem provas, pode ser entendido como abuso do direito de ação. Nesses casos, a própria vítima pode ser condenada por litigância de má-fé e obrigada a indenizar o réu por eventuais prejuízos morais ou materiais.
Portanto, é fundamental agir com base em fatos concretos, provas legítimas e, preferencialmente, com orientação de um advogado.
Preciso de advogado para processar quem me perturba?
Depende do tipo de ação:
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Para registrar um boletim de ocorrência, não é necessário advogado.
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Para apresentar queixa-crime ou ingressar com ação cível por danos morais, é necessário advogado.
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Para pedir medida protetiva de urgência, é possível buscar apoio da Defensoria Pública, especialmente em casos de violência contra mulheres, idosos ou vulneráveis.
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Em ações simples nos Juizados Especiais Cíveis (valor até 20 salários mínimos), é possível ingressar sem advogado, mas é sempre recomendável o acompanhamento jurídico.
Medidas judiciais cabíveis de acordo com o caso
A seguir, uma visão geral das ações que podem ser movidas conforme a situação concreta:
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Stalking ou perseguição reiterada: boletim de ocorrência, pedido de medida protetiva, ação penal.
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Perturbação do sossego: denúncia à polícia, boletim de ocorrência, ação por danos morais em casos reiterados.
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Ameaças verbais: boletim de ocorrência, representação por ameaça (art. 147 do Código Penal), ação por danos morais.
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Difamação ou calúnia: queixa-crime por crimes contra a honra, possível ação cível por danos morais.
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Assédio moral ou sexual no trabalho: denúncia à empresa, ação trabalhista, processo criminal e cível.
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Mensagens e ligações insistentes: boletim de ocorrência, medida protetiva, processo criminal, ação cível.
O que a Justiça analisa em casos de perturbação
Ao receber um processo por perturbação, o juiz analisa os seguintes elementos:
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Se houve comportamento reiterado e injustificado;
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Se o comportamento causou dano ou violou direitos fundamentais da vítima;
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Se há provas suficientes da perturbação;
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Se o autor do ato agiu com dolo, ou seja, com intenção;
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Qual a gravidade da conduta e o impacto na vida da vítima.
A depender do caso, o juiz pode conceder liminares, aplicar multa, condenar ao pagamento de indenização, fixar medidas protetivas ou até determinar a responsabilização penal.
Seção de perguntas e respostas
Posso processar alguém só por me mandar mensagens todos os dias?
Depende do conteúdo e da insistência. Se as mensagens forem inconvenientes, com tom ofensivo, ameaçador ou provocarem medo e desconforto, pode haver fundamento para processo por perseguição, ameaça ou danos morais.
Barulho de vizinho todo fim de semana pode justificar um processo?
Sim, desde que seja excessivo, constante e comprovado. Antes, é recomendado tentar resolver por meio de reclamação no condomínio e registro de ocorrência.
Uma briga no WhatsApp pode virar processo judicial?
Sim, especialmente se houver ofensas, ameaças ou exposição indevida. Mensagens trocadas podem ser usadas como prova.
Se a pessoa me persegue, mas nunca me encostou, posso denunciá-la?
Sim. A perseguição (stalking) não exige contato físico. A insistência em seguir, aparecer nos mesmos lugares ou tentar contato constante já configura crime.
O que posso fazer se me xingam nas redes sociais?
Você pode registrar os xingamentos por prints, lavrar uma ata notarial em cartório e procurar um advogado para entrar com ação por danos morais ou apresentar queixa-crime por injúria ou difamação.
Quanto tempo tenho para denunciar uma pessoa que me perturba?
Para crimes que exigem representação (como ameaça e crimes contra a honra), o prazo é de até seis meses a partir do conhecimento da autoria. Para ações cíveis, o prazo geralmente é de até três anos para pedir indenização por danos morais.
A Justiça pode proibir a pessoa de se aproximar de mim?
Sim. Medidas protetivas podem ser solicitadas e deferidas para proibir contato, aproximação física ou até comunicação por meio digital.
Conclusão
Sim, é possível processar uma pessoa que fica te perturbando, desde que você tenha elementos que demonstrem que a conduta ultrapassa os limites do tolerável e cause danos à sua integridade ou tranquilidade. O caminho pode envolver medidas policiais, civis e até criminais, a depender da gravidade da situação. Reunir provas, agir com cautela e buscar orientação jurídica são atitudes fundamentais para garantir sua segurança e seus direitos.
A lei está do lado de quem sofre perseguição, importunação, ameaças ou ofensas. Não é necessário esperar que a situação se agrave. Assim que se sentir violado, busque ajuda e registre os fatos. A Justiça brasileira reconhece o direito de cada cidadão viver em paz e com dignidade.