Resumo: O trabalho da mulher sempre foi cercado de especificidades, em virtude do tratamento e do papel desempenhado por esta na sociedade ao longo dos séculos. Em virtude disso, a Consolidação das Leis do Trabalho, Decreto-lei nº. 5.452/1943, trouxe um capítulo (Capítulo III, no Título III, apenas para cuidar “Da Proteção do Trabalho da Mulher”. No entanto, muitas das disposições deste capítulo não se encontram mais adequadas a concepção de igualdade disciplinada na nossa Constituição de 1988, estando muitas delas revogadas. Diante desse contexto, e considerando, ainda, a atual participação da mulher no mercado de trabalho e o princípio da igualdade insculpido na Constituição Federal de 1988, propõe-se através do presente trabalho uma releitura das normas que cuidam da proteção do trabalho da mulher, lastreada pelo princípio da igualdade.
Palavras-chave: mulher; trabalho; proteção; igualdade.
Sumário: 1. Introdução; 2. Normas sobre duração, condições e discriminação do trabalho da mulher, 2.1. Condição e duração do trabalho da mulher, 2.2. Métodos e locais de trabalho; 3. Proteção à maternidade; 4. O princípio da igualdade e o combate à discriminação e a proteção do trabalho da mulher no âmbito da ordem constitucional vigente: aplicação do princípio da igualdade; 5. Conclusão; 6. REFERÊNCIAS.
1. Introdução
Desde os primórdios da humanidade diferenças biológicas entre homens e mulheres geraram distinções na divisão do trabalho e na postura social entre os sexos. Com a Primeira Revolução Industrial, a exploração do trabalho feminino, eficiente e mais barato, tornou-se intensa. A utilização da máquina possibilitou uma massificação no uso das chamadas “meias-forças dóceis”, trabalho da mulher e do menor, que nesse período possuíam menor força reivindicatória.
O cenário da época é muito bem retratado pelo trecho a seguir:
“A completar o quadro, era usual a utilização das chamadas “meias-forças”, ou seja, trabalho do menor, trabalho da mulher, cuja remuneração era ainda inferior a do trabalhador maior, do sexo masculino. A conseqüência foi o aviltamento das condições de trabalho”[1].
A necessidade de proteção ao trabalho da mulher tornou-se evidente, sendo objeto de regulamentação por vários organismos internacionais[2], que influenciaram sobremaneira a legislação trabalhista brasileira, especialmente no capítulo alusivo ao trabalho da mulher presente em nossa Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Referidas normas vieram, a seu tempo, equilibrar uma relação absolutamente desproporcional existente entre os trabalhos masculino e feminino, introduzindo elementos de discriminação de modo a trazer paridade a relação entre os sexos.
No entanto, na sociedade contemporânea, o que se nota é uma ascensão do trabalho feminino em todos os seus aspectos, de modo que se questiona: será que as normas de proteção ao trabalho da mulher, muitas das quais datam da elaboração da CLT, ou seja, 1943, ainda se adéquam a realidade social e constitucional brasileira? E quanto a igualdade entre homens e mulheres, prevista nos art. 5º, caput e inciso I, bem como no art. 7º, inciso XXX, todos da Constituição Federal de 1988 (CF/88), como fica diante das previsões celetistas?
O presente estudo visa justamente fazer uma reflexão sobre a proteção especial dada ao trabalho feminino, disciplinada no Capítulo III, do Título III da CLT, que trata de normas especiais de tutela do trabalho da mulher, e sua adequação à nova ordem constitucional, principalmente diante do princípio da igualdade.
Para isso, inicialmente, serão comentados os temas e os dispositivos presentes no Capítulo III referido. Em seguida, tratar-se-á do princípio da igualdade e do combate a discriminação e, por fim, serão delineados os contornos para uma interpretação da proteção do trabalho da mulher à luz constitucional.
2. Normas sobre duração, condições e discriminação do trabalho da mulher
2.1. Condição e duração do trabalho da mulher
Em sua primitiva redação os arts. 379 e 380 da CLT proibiam o trabalho noturno para as mulheres, salvo exceções previstas em lei. Mais tarde, veio a Lei 7.189/1984 e transformou o comando proibitivo em permissivo, admitindo o trabalho noturno da mulher maior de 18 anos, salvo algumas exceções, como o trabalho em empresas ou atividades industriais. Atualmente esses artigos encontram-se revogados pela Lei 7.855/1989, resultante da conversão da MP nº. 89 de 1989.
A redação original dos mencionados dispositivos constituía reflexo claro dos traumas causados pelas condições de trabalho ocorridas durante a Revolução Industrial e visavam evitar a exploração do trabalho da mulher.
Após a revogação dos dispositivos mencionados, o artigo 381 da CLT manteve previsão de trabalho noturno para a mulher, passando a ter a seguinte redação:
“Art. 381. O trabalho noturno das mulheres terá salário superior ao diurno.
§ 1º Para os fins deste artigo, os salários serão acrescidos duma percentagem adicional de 20% (vinte por cento).
§ 2º Cada hora do período noturno de trabalho das mulheres terá cinqüenta e dois minutos e trinta segundos.”
Constata-se pela leitura do dispositivo acima transcrito que apesar de consentâneo com o ordenamento jurídico, nele foi dito o óbvio, uma vez que a Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso IX, garante remuneração do trabalho noturno superior a do diurno e o artigo 73 e seus parágrafos da CLT regulamenta a hora ficta noturna (52’ 30”), além de outros aspectos do trabalho noturno. Veio, portanto, o artigo 381 da CLT repetir o tratamento dado aos trabalhadores em geral, para dizer que este se aplica ao trabalho prestado pela mulher.
E não poderia ser diferente, tendo em vista que diante de uma interpretação sistêmica não se justificaria distinção entre o trabalho noturno do homem e da mulher, em virtude da igualdade proclamada pelos artigos 5º, caput e inciso I e 7º, inciso XXX, todos da Constituição Federal de 1988, cuja redação segue:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; […]
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: […]
XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;”
Ademais, o que justifica o pagamento de adicionais é a prestação do trabalho em condições adversas. Na espécie em apreço, a condição adversa é o trabalho noturno, igualmente prejudicial do ponto de vista biológico tanto para o homem quanto para a mulher, não havendo qualquer justificativa para distinções.
Ressalte-se, ainda sobre o tema da proibição de trabalho noturno, que persiste a proibição para as empregadas que se encontram no ciclo gravídico-puerperal de laborarem no período noturno, durante 16 semanas, sendo oito semanas anteriores ao parto, tendo em vista a ratificação pelo Brasil da Convenção n. 171 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Nos artigos 382 a 385[3], a CLT estabelece normas acerca dos períodos de descanso para o trabalho feminino. Aqui, cabem as mesmas observações feitas anteriormente quanto à repetição do disciplinamento constitucional e legal. Isso porque os artigos 382, 383 e 385 praticamente repetem a redação dos artigos 66, 71 e art. 7º, inciso XV c/ c art. 67da CLT. Dessa maneira, a previsão contida na Seção III, do Capítulo III da CLT, que trata dos períodos de descanso, praticamente traz direitos que já foram assegurados e garantidos a todos os trabalhadores, não havendo, portanto, do ponto de vista lógico e sistêmico necessidade de tais previsões.
Assim sendo, diante da evidente recepção da disciplina desses artigos pela ordem constitucional não haveria necessidade de disciplina específica quanto ao tema.
No entanto, um ponto merece menção, trata-se do artigo 384 da CLT, in litteris:
“Art. 384. Em caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de quinze (15) minutos no mínimo, antes do início do período extraordinário de trabalho.”
Nota-se que esse artigo fala de um intervalo que não encontra correspondência no trabalho realizado por empregados do sexo masculino, ou seja, sua previsão no capítulo que aborda a proteção ao trabalho da mulher tornaria esse intervalo devido apenas para as empregadas.
Sua análise no contexto da sociedade atual leva algumas vozes, a exemplo de Alice Monteiro de Barros[4], a concluir que o dispositivo constitui verdadeiro óbice ao acesso da mulher ao mercado de trabalho, pois claro está, que o empregador preferirá contratar homens para o trabalho, já que a estes não precisaria ser concedido o aludido intervalo antes de iniciar o labor extraordinário.
Discorrendo sobre o assunto, manifesta-se Alice Monteiro de Barros[5]:
“Em conseqüência da revogação expressa do art. 376 da CLT, pela Lei n.10.244, de junho de 2001, está também revogado, tacitamente, o art. 384 da CLT, que prevê descanso especial para a mulher, na hipótese de prorrogação de jornada. Ambos os dispositivos conflitavam, sem dúvida, com os art. 5º, I, e art. 7º, XXX, da Constituição da República.”
Contudo, há decisões entendendo de modo diverso, como se pode constatada pela transcrição abaixo:
“INTERVALO PRECEITUADO NO ARTIGO 384 DA CLT – CONSTITUCIONALIDADE E VIGÊNCIA – NÃO CONCESSÃO – O princípio da isonomia visa a impedir que diferenças arbitrárias encontrem amparo em nosso sistema jurídico, e não cumpre seu objetivo quando é interpretado em termos absolutos, servindo de fundamento para tratamento igual àqueles que são desiguais. Desta forma, considerando a inquestionável diferença física existente entre homem e mulher, o artigo 384 da CLT foi recepcionado pela atual ordem constitucional, não se havendo falar que sua aplicação viola o artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal. Assim, vigente o referido dispositivo, sua inobservância, deixando o empregador de conceder à mulher o intervalo de 15 (quinze) minutos entre a jornada normal e a extraordinária, impõe-se penalizá-lo com o pagamento do tempo correspondente, com acréscimo de 50%. Recurso conhecido a que se dá parcial provimento.” (TRT 23ª R. – RO 00643.2002.021.23.00-9 – Cuiabá – Relª Juíza Maria Berenice – DJMT 25.02.2003 – p. 24)
“BRASIL TELECOM S/A – INTERVALO DO ARTIGO 384 DA CLT – O artigo 384 da CLT, que prevê, para a mulher, o direito a intervalo de quinze minutos antes do início da jornada extraordinária, transmuda-se, constatada a sua inobservância, em direito ao pagamento do tempo correspondente como extra. Não se cogita de ofensa ao princípio da igualdade (art. 5º, I, da CF), decorrendo o tratamento diferenciado, no caso, da condição desigual da mulher, relativamente à sua higidez física.” (TRT 9ª R. – RO 01356-2001 – (26479-2001) – 2ª T. – Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther – J. 10.07.2001) (Ementas no mesmo sentido) JCLT.457 JCLT.457.1 JCLT.384 JCLT.10 JCLT.448 JCF.37 JCF.5 JCF.5.I”.
O próprio Tribunal Superior do Trabalho, em recente decisão, resolvendo questão incidente, posicionou-se favorável à recepção do art. 384 da CLT pela Lei Maior, entendendo que a aplicação desse dispositivo não afronta o princípio da isonomia:
Diante do exposto, claro está que o problema da recepção do art. 384 da CLT pela Constituição Federal de 1988 não se mostra de tão fácil solução.
2.2. Métodos e locais de trabalho
Interessante é a redação do artigo 389 da CLT, que dispõe em seus incisos, in verbis:
“Art. 389 – Toda empresa é obrigada: (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)
I – a prover os estabelecimentos de medidas concernentes à higienização dos métodos e locais de trabalho, tais como ventilação e iluminação e outros que se fizerem necessários à segurança e ao conforto das mulheres, a critério da autoridade competente; (Incluído pelo Decreto-lei nº. 229, de 28.2.1967)
II – a instalar bebedouros, lavatórios, aparelhos sanitários; dispor de cadeiras ou bancos, em número suficiente, que permitam às mulheres trabalhar sem grande esgotamento físico; (Incluído pelo Decreto-lei nº. 229, de 28.2.1967)
III – a instalar vestiários com armários individuais privativos das mulheres, exceto os estabelecimentos comerciais, escritórios, bancos e atividades afins, em que não seja exigida a troca de roupa e outros, a critério da autoridade competente em matéria de segurança e higiene do trabalho, admitindo-se como suficientes as gavetas ou escaninhos, onde possam as empregadas guardar seus pertences; (Incluído pelo Decreto-lei nº. 229, de 28.2.1967)
IV – a fornecer, gratuitamente, a juízo da autoridade competente, os recursos de proteção individual, tais como óculos, máscaras, luvas e roupas especiais, para a defesa dos olhos, do aparelho respiratório e da pele, de acordo com a natureza do trabalho. (Incluído pelo Decreto-lei nº. 229, de 28.2.1967)”
Será que tais obrigações somente atingem as empresas que empregam mulheres? Dito de outro modo, os homens não têm direito a estabelecimentos de trabalho adequados e a equipamentos de proteção individuais?
Percebe-se claramente a desatualização da norma, que por ter sido elaborada numa época em que as condições de trabalho, de uma maneira geral, eram precárias e, outrossim, marcada pela visão de fragilidade e de cuidado com que a maior parte das mulheres era vista, resolve estabelecer certos parâmetros a serem observados pelas empresas que empregam mulheres.
Logo, deve-se interpretar a norma considerando seu contexto histórico e promovendo a atualização necessária, para ampliar as vantagens que foram atribuídas às empregadas de modo a abranger também os trabalhadores do sexo masculino, em observância às atuais normas de segurança e medicina do trabalho.
No que concerne às previsões contidas nos §§ 1º e 2º do artigo 389[6] da CLT, são estas de importante aplicação, por questão de saúde pública e de interesse social, pois permitem que a mulher volte para o mercado de trabalho sem prejuízo da amamentação e do cuidado com seu filho, resultando numa maior satisfação da empregada ao realizar seu trabalho e, via de conseqüência, num ambiente de trabalho mais agradável e de maior produtividade.
Além disso, não há como negar que a mulher ainda é dotada de uma dupla jornada de trabalho, tendo que cuidar de diversas atividades atinentes ao ambiente doméstico, além de suas atividades laborais. Esse natural desgaste pode ser em muito amenizado se a empresa fornece à empregada condições que propiciem uma maior qualidade no cuidado com seus filhos.
O artigo 390 da CLT, também, contém norma de proteção à mulher que merece menção, assim dispondo, in verbis:
“Art. 390. Ao empregador é vedado empregar a mulher em serviço que demande o emprego de força muscular superior a vinte (20) quilos, para o trabalho contínuo, ou vinte e cinco (25) quilos, para o trabalho ocasional.”
Essa proteção justifica-se num certo sentido, uma vez que diversos estudos[7] comprovam que as mulheres possuem uma força muscular inferior a dos homens e por isso não poderiam ser submetidas a um tipo de esforço superior às suas forças. Questiona-se, contudo, se a limitação disciplinada seria a mais adequada, ou dito de outro modo, talvez uma regulamentação feita mediante negociação coletiva se compatibilizasse mais com a realidade e se ajustasse melhor ao caso concreto.
Todavia, promover a revogação desse dispositivo, deixando para que apenas o caso concreto determine os limites para o uso de força muscular da mulher, poderia ser medida temerária, pois abriria margem à precarização do labor feminino. Por isso, medida de prudência seria relegar à negociação coletiva o estabelecimento desses limites, já que as categorias profissionais e econômicas teriam melhores condições de aferir a situação específica essa situação específica.
Por tudo quanto exposto, é imperioso destacar que disposições que venham a proteger a família, a maternidade e a criança e o adolescente merecem ser mantidas e difundidas, tendo em vista a proteção constitucional contida nos arts. 5º, incisos, XVIII e XIX, e 226 e seguintes todos da Constituição da República.
3. Proteção à maternidade
As normas de proteção à maternidade da legislação brasileira, previstas no artigo 391 a 400 da CLT, sofreram forte influência das Convenções nº. 3 e 103 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Cumpre ressaltar primeiramente, que alguns direitos foram a princípio restringidos a certas classes de trabalhadoras, como a rural, por exemplo, a qual por previsão expressa do art. 4º do Decreto nº. 73.626/74, que regulamenta a Lei 5.889/1973, Lei do Trabalho Rural, aplicam-se tão somente os arts. 387 a 396 e 399 da CLT. Desse modo, não havia autorização legal para a percepção de licença-maternidade por essas trabalhadoras, pois a lei especial que rege os rurícolas a esta licença não fazia alusão[8].
Essa situação se alterou com o advento da Constituição Federal de 1988 e a igualdade de direitos estabelecida entre os trabalhadores urbanos e rurais promovida pelo artigo 7º, que estendeu à empregada rural o direito à licença-gestante de 120 dias (art. 7º, inciso XVIII da CF/88).
O direito a salário-maternidade, todavia, só foi incluído entre as parcelas previdenciárias a que as empregadas rurais fazem jus com a Lei 8.213/91, conforme os artigos 18, I, alínea f e 71, desse diploma legal. Não obstante isso, o Supremo Tribunal Federal, já havia decidido pela aplicabilidade imediata do art. 7º, inciso XVIII da Constituição da República independentemente da existência da norma reguladora, é o que exsurgue da ementa abaixo transcrita:
“Licença-maternidade. Art. 7º, XVIII da CF – Norma de Eficácia Plena. Benefício devido desde a promulgação da Carta de 1988, havendo de ser pago pelo empregador, à conta da Previdência Social, independentemente da definição da respectiva fonte de custeio. Entendimento assentado pelo STF – RE-220.613-1-SP-1ª T.-Rel.: Min. Ilmar Galvão-DJU 2.6.2000. Revista Síntese. Setembro 2000, p. 86.”[9]
No que tange às empregadas domésticas, a Lei 5.859/72 que rege seu trabalho, não as contemplou com as disposições celetistas sobre o tema do trabalho da mulher. A nossa Lei Maior, entretanto, estendeu à classe o direito a licença-maternidade, consoante expressão do art. 7º, parágrafo único. Sendo, outrossim, contempladas com o beneficio da licença-gestante as trabalhadoras avulsa (art. 7º, inciso XXXIV da CF/88) e autônoma (art. 101, inciso III, do Decreto n. 3.048/99)
A licença-gestante encontra-se disciplinada no artigo 392 da CLT que estabelece licença de 120 dias para a empregada sem prejuízo do emprego e do salário:
“Art. 392. A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário. (Redação dada pela Lei nº. 10.421, 15.4.2002)
§ 1o A empregada deve, mediante atestado médico, notificar o seu empregador da data do início do afastamento do emprego, que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto e ocorrência deste. (Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)
§ 2o Os períodos de repouso, antes e depois do parto, poderão ser aumentados de 2 (duas) semanas cada um, mediante atestado médico.(Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)
§ 3o Em caso de parto antecipado, a mulher terá direito aos 120 (cento e vinte) dias previstos neste artigo. (Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)
§ 4o É garantido à empregada, durante a gravidez, sem prejuízo do salário e demais direitos: (Redação dada pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999)
I – transferência de função, quando as condições de saúde o exigirem, assegurada a retomada da função anteriormente exercida, logo após o retorno ao trabalho; (Incluído pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999)
II – dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e demais exames complementares. (Incluído pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999)
§ 5o (VETADO) (incluído pela Lei nº. 10.421, de 2002).”
Como se vê, o período da licença-gestante antes e depois do parto pode ser aumentado em duas semanas, mediante atestado médico, devendo a empregada notificar seu empregador da data de início do afastamento, que poderá ocorrer entre o 28º dia antes do parto e até a ocorrência deste.
Em relação à empregada adotante, a legislação não previa a possibilidade de concessão da licença-maternidade àquela que adotasse. Entrementes, com a Lei 10.421/2002 foi acrescentado o art. 392-A a CLT, que estendeu o benefício da licença-gestante à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial, nos seguintes termos:
“Art. 392-A. À empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança será concedida licença-maternidade nos termos do art. 392, observado o disposto no seu § 5o. (Incluído pela Lei nº. 10.421, 15.4.2002)
§ 1o No caso de adoção ou guarda judicial de criança até 1 (um) ano de idade, o período de licença será de 120 (cento e vinte) dias.(Incluído pela Lei nº. 10.421, 15.4.2002)
§ 2o No caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 1 (um) ano até 4 (quatro) anos de idade, o período de licença será de 60 (sessenta) dias.(Incluído pela Lei nº. 10.421, 15.4.2002)
§ 3o No caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 4 (quatro) anos até 8 (oito) anos de idade, o período de licença será de 30 (trinta) dias.(Incluído pela Lei nº. 10.421, 15.4.2002)
§ 4o A licença-maternidade só será concedida mediante apresentação do termo judicial de guarda à adotante ou guardiã. (Incluído pela Lei nº. 10.421, 15.4.2002)”
A referida lei também acrescentou o art. 71-A a Lei 8.213/2002, estendendo a licença-maternidade às empregadas rurais, domésticas, trabalhadoras avulsas e autônomas, na medida em que concedeu tal benefício às seguradas da Previdência Social.
Sem dúvida, as inclusões citadas representaram um passo importante para a evolução do trabalho feminino e da unidade familiar brasileira. Valentin Carrion[10] acerca do tema comenta:
“3. Mãe adotiva. Com a inclusão do art. 392-A pela L. 10.421/02, o legislador faz justiça com a criança adotada. Se o que pretende a lei, com a licença-gestante, é que mãe e filho tenham um contato e uma integração maior nos primeiros dias de vida da criança, a adoção também é a chegada de um novo ser para um relacionamento mãe e filho que se inicia. Nada mais justo que tenham o mesmo direito que a mãe biológica. Não dá a Lei estabilidade, mas a licença” (L. 8.213/91, art. 71-A, parágrafo único, red. 10.710/03).
Alguns pontos, contudo, merecem ser comentados no que tange ao disciplinamento da licença-maternidade.
O primeiro aspecto é identificar qual é o objeto de proteção da norma, pois se o almejado é proteger a mulher-gestante, apenas do ponto de vista biológico, limita-se o escopo da norma à necessidade de proteção física e assim não haveria sentido conceder tal licença àquele que adota, uma vez que, neste caso, não há que se falar da necessidade desse tipo de proteção.
Ocorre que o disciplinamento dado ao tema deixa claro que o objeto de proteção é a maternidade e esse fato redunda em uma série de conseqüências, como a necessidade de concessão de licença também aos pais, licença-paternidade, e o surgimento da licença-maternidade adotante, por exemplo.
Impende ressaltar, que no caso da mulher que tem seu filho mediante o parto a licença-maternidade cumpre um duplo aspecto: sua recuperação física e a reorganização e adaptação da família àquele novo ser humano. Ao passo que para a mulher que adota, tal licença possui somente a função de adequação à nova realidade familiar.
Apesar da diferença funcional existente na licença-maternidade para aquela mãe que se submete ao parto e a que adota, o legislador quis equiparar a adoção ao próprio parto, na medida em que igualou os prazos da licença, pelo menos com relação ao prazo máximo da licença-maternidade adotante que é de 120 dias.
Há que se considerar, entretanto, a função de adaptabilidade que a licença-adotante visa a assegurar e as maiores dificuldades em se promover a adaptação de uma criança de mais idade em relação a um bebê recém-nascido.
Assim, para que a situação das famílias que adotam fosse mais condizente com a realidade e com a função desempenhada pela licença, dever-se-ia promover uma inversão em seus prazos, tendo em vista as maiores dificuldades existentes em promover a adaptação familiar de uma criança de oito anos de idade do que a de um bebê de poucos meses de vida.
À mulher grávida é também assegurado o direito de rescindir o contrato de trabalho, desde que este seja prejudicial à saúde. Nesse caso, a empregada está dispensada de conceder aviso prévio ao empregador, mas também não recebe indenização (art. 394 da CLT).
No cenário atual, doutrinadores[11] e magistrados brasileiros, seguindo a Convenção 103 da OIT, vêm se mostrando tendentes ao licenciamento da mulher mesmo no caso de falecimento da criança, isso se justifica, para que a mulher possa ter uma plena recuperação não só biológica como psíquica, em virtude dos abalos sofridos pela ocorrência de uma gestação infrutífera. Nesse diapasão, segue a ementa abaixo:
“Gestante. Estabilidade provisória e natimorto. A circunstância de filho de empregada grávida nascer morto, em parto prematuro, não exclui a garantia de emprego de que trata o art. 10, inciso II, alínea ‘b’ do ADCT/CF-1988. Natimorto significa aquele que nasceu morto. Nasceu, há o parto, e deste são contados os cinco meses de garantia de empregado à gestante” (TRT-3ª R. – 2ª T. – RO/19959/00 – Rel.: Juiz Antônio Fernando Guimarães – DJMG 31.1.2001 – P. 23. Revista TRT 3ª Região n. 63, janeiro-junho/2001, p. 309).[12]
Uma outra corrente[13] defende, ainda, que na hipótese de falecimento da mulher durante a licença-gestante, deveria ser assegurado ao pai em favor da criança, o gozo da licença- maternidade. Importante destacar que esse entendimento já foi defendido em jurisprudência do TST:
“Em caso de falecimento da empregada após o parto, mas ainda no decurso do período durante o qual prevalece a proibição de atividade estabelecida no art. 392 da CLT, deve ser assegurado o pagamento do salário-maternidade até o final desse período, ao cônjuge supérstite em benefício do herdeiro recém-nascido” (TST – 2ª T. – Proc. 6.210/51, Rel.: Min. Edgard Sanchez, Pub. DJ de 24.12.54).[14]
Diversa é a situação do aborto não criminoso, no qual se assegura um repouso remunerado de duas semanas para a mulher que o sofre, de acordo com o art. 395 da CLT.
Quanto a amamentação, o legislador reservou dois descansos especiais de meia hora cada, para permitir que a mulher possa amamentar seu filho até a idade de seis meses, período esse que pode ser dilatado a critério da autoridade competente, nos termos do art. 396, caput e parágrafo único da CLT. A não concessão do intervalo a que alude o artigo pode redundar em multa administrativa e no pagamento do intervalo supresso como hora extraordinária, por aplicação analógica do artigo 71 da CLT. De grande relevância é essa disposição legal, porque incentiva a mulher a amamentar seu filho por um período maior, situação que analisada no âmbito nacional contribui para a formação de uma sociedade mais saudável.
Nesse sentido, colaciona-se a ementa a seguir:
“Mulher. Amamentação. Intervalo não concedido (CLT, art. 39). É devida a hora extra diária, a partir do retorno ao serviço após o parto, até que o filho complete seis meses. A condenação nas horas extras não atende ao direito da criança, mas é indubitável que, nesse período, a genitora estava desobrigada por lei de prestar serviço” (TRT/SP, RO 02970259774, Valentin Carrion, Ac. 9ª T.).[15]
Por fim, os artigos 397 a 400 estabelecem vantagens para entidades e empregadores que mantiverem locais apropriados para cuidado e proteção dos filhos das empregadas.
O empregador que descumprir normas alusivas à proteção à maternidade se sujeita ao pagamento do salário atinente a prestação dos serviços e à penalidade administrativa prevista no artigo 401 da CLT, por ser norma de ordem pública.
4. O princípio da igualdade, o combate à discriminação e a proteção do trabalho da mulher no âmbito da ordem constitucional vigente.
A essa altura, após analisar os diferentes dispositivos que abordam um tratamento diferenciado do trabalho da mulher, importante fazer algumas observações e propostas de interpretação para compatibilizar a condição do trabalho feminino com a aplicação do princípio da igualdade.
O princípio da igualdade tem previsão no art. 5º, caput da Constituição Federal, que estabelece a igualdade de todos perante a lei. O dispositivo trata, portanto, da igualdade formal. Em seguida, o inciso I do mesmo artigo diz que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações nos termos da Constituição, daí se dessume que o próprio texto constitucional é passível de fazer distinções entre os sexos e as fará, prova disso são os prazos para aposentadoria previstos no artigo 40 da CF/88.
Conclui-se com isso que a desigualdade é suscetível de existência desde que o elemento discriminador se coadune com a desigualdade existente na relação, de modo a buscar um nivelamento entre as partes, ou seja, proporcionando igualdade material entre as partes.
Com o fito de esclarecer melhor o exposto transcreve-se a elucidativa lição de Alexandre de Moraes[16]:
“A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm direito de tratamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenças arbitrárias, as discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça, pois o que realmente protege são certas finalidades, somente se tendo por lesado o princípio constitucional quando o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito.”
Ao reservar um capítulo para cuidar “Da Proteção do Trabalho da Mulher” a Consolidação das Leis do Trabalho buscou à época de sua elaboração conceder à mulher uma série de garantias, que a estas não eram reconhecidas. Entrementes, anos após sua elaboração e diante de uma nova ordem constitucional que não concebe mais a submissão feminina, necessário se torna adequar a norma à realidade, por isso defende-se uma releitura dos dispositivos objeto desse estudo, baseada no princípio da igualdade, previsto no art. 5º, caput e inciso I da CF/88, bem como na disciplina dos art. 7º, inciso XX e XXX[17] da Constituição da República.
Em virtude da anterioridade da disciplina protetiva da mulher à atual ordem constitucional vigente, há que se analisar o fenômeno da recepção aplicável in casu.
O nascer de uma nova ordem constitucional redunda na perda de eficácia da Constituição primitiva. No entanto, as leis e atos normativos infraconstitucionais permanecem válidos, desde que sejam compatíveis com a nova Constituição. Logo, as normas que foram implícita ou explicitamente conflitantes serão excluídas da nova ordem constitucional que exige todo um reenquadramento do ordenamento jurídico. A esse fenômeno dá-se o nome de recepção.
A teoria da recepção promove o acolhimento das leis e atos normativos editados à luz da Constituição anterior, que são compatíveis, à nova Constituição. Importante trazer a lume, por elucidativo, comentário feito por Alexandre de Moraes[18]: “O fenômeno da recepção, além de receber materialmente as leis e atos normativos compatíveis com a nova Carta, também garante a sua adequação à nova sistemática legal”.
Na buscar por essa adequação promoveu-se a revogação, pela Lei 7.855/89, de alguns dos dispositivos previstos neste capítulo que trata das normas de tutela do trabalho da mulher um ano após a promulgação da nova Constituição da República.
Ocorre que, alguns dos dispositivos não revogados expressamente pela mencionada lei e que se encontrariam em vigor, têm sua receptividade questionada diante da garantia constitucional de igualdade entre homens e mulheres, prevista nos art. 5º, inciso I.
Assim, o Capítulo III, do Título III da CLT há que ser interpretado à luz da nova ordem constitucional, sem se olvidar do princípio da proteção orientador maior do Direito Laboral, bem como das garantias constitucionais previstas nos incisos XX e XXX, do art. 7º da CF/88.
Diante da realidade do mercado de trabalho, observa-se que as maiores distinções entre mulheres e os homens residem exatamente naquilo que os torna diferentes, a fisiologia e a maternidade. Dessa forma, a manutenção das normas relativas a esses temas se faz necessária, pois sua supressão constituiria um retrocesso social, dificultando as oportunidades de trabalho para as mulheres.
Quanto ao intervalo disciplinado no art. 384 da CLT, as divergências, conforme já exposto anteriormente, são grandes, dividindo-se entre os que defendem sua aplicação, os que entendem que tal dispositivo não fora recepcionado pela Constituição da República de 1988, ou que fora tacitamente revogado com a revogação expressa do art. 386 da CLT[19].
Um outro entendimento, porém, pode ser extraído. O fato de a lei 7.855/1989, posterior a Constituição, ter revogado os dispositivos desse Capítulo que considerava incompatíveis com a nova ordem e manter a redação do art. 384 da CLT pode indicar que o legislador entendeu por bem manter a concessão desse intervalo.
Considerando, ainda, a igualdade entre homens e mulheres perante a lei, não há óbice a extensão desse intervalo também ao sexo masculino. Afinal, a prestação de labor extraordinário é prejudicial tanto a homens como a mulheres, não havendo qualquer motivo a ensejar distinções.
Ademais, a concessão do intervalo do art. 384 da CLT a ambos os sexos se compatibiliza com os princípios do Direito Laboral, a exemplo do princípio da proteção, bem como com as normas de segurança e medicina do trabalho. Havendo, por isso, justificativas mais que suficientes a sua aplicação ampla para ambos os sexos.
A doutrina mais atual vem se posicionando nesse sentido, pelo que se pode depreender da edição do Enunciado 22 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada em 23/11/2007 em Brasília, cuja transcrição se faz:
“22. ART. 384 DA CLT. NORMA DE ORDEM PÚBLICA. RECEPÇÃO PELA CF DE 1988. Constitui norma de ordem pública que prestigia a prevenção de acidentes de trabalho (CF, 7º, XXII) e foi recepcionada pela Constituição Federal, em interpretação conforme (art. 5º. I, e 7º, XXX), para os trabalhadores de ambos os sexos.”
Uma outra face do princípio da igualdade deve ser observada, uma vez que este não se dirige apenas ao legislador, mas também aos particulares que não podem estabelecer discriminações não permitidas pela lei. Em razão disso, o legislador, em vários momentos dispõe sobre a igualdade entre os sexos, como exemplo cita-se o artigo 461 da CLT que assegura a igualdade de salário ao trabalho de igual valor, independentemente de sexo.
Igualmente, o art. 391 da CLT proíbe a despedida da empregada pelo fato de ter contraído matrimônio ou estar grávida. Além da previsão do citado artigo, a despedida da empregada em estado gravídico, também é obstada pela estabilidade-gestante, que consiste na vedação de dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme previsão do art.10, inciso II, alínea “b” do ADCT. Ressalte-se que essa proteção foi concedida às domésticas pela Lei 11.324/2006, que acrescentou o art. 4º-A à Lei 5.859/72 e assim aduz:
“Art. 4º-A. É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto.”
Ademais, imperioso falar sobre as vedações trazidas pelo art. 373-A da CLT e que regula uma série de ações a serem evitadas pelos empregadores, por serem atentatórias aos direitos fundamentais, constituindo expressão maior da proteção dada ao trabalho da mulher.
“Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado: (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).
I – publicar ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir; (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).
II – recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível; (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).
III – considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional; (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999)
IV – exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego; (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).
V – impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez; (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).
VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias. (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).
Parágrafo único. O disposto neste artigo não obsta a adoção de medidas temporárias que visem ao estabelecimento das políticas de igualdade entre homens e mulheres, em particular as que se destinam a corrigir as distorções que afetam a formação profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho da mulher. (Incluído pela Lei nº. 9.799, de 26.5.1999).”
Entre tais vedações destaca-se a contida no inciso VI, a revista íntima, em virtude das constantes discussões doutrinárias e jurisprudenciais ao redor do tema.
Ocorre que os poderes do empregador, especialmente o poder diretivo, dão a falsa impressão de que no âmbito da empresa e para resguardar perdas na atividade econômica o empregador poderia realizar quaisquer espécies de atos, inclusive, revista íntima nas empregadas e empregados de modo geral. Na verdade, durante muito tempo essa justificativa foi utilizada como desculpa para que o empregador promovesse toda sorte de abusos, inclusive o sexual. Diante disso, a legislação veio proteger a intimidade do trabalhador contra a opressão do empregador.
Considera-se revista íntima aquela promovida no corpo do empregado, e as justificações para a existência da norma são muitas, a uma, porque a revista vai de encontro ao princípio da dignidade da pessoa humana e a duas, porque como “busca” somente poderia ser feita mediante autorização judicial ou flagrante delito e por autoridade competente, o empregador, portanto, não se enquadra nesse contexto.
Frise-se ainda que, exceto naquilo que for incompatível com o sexo, essas proteções de que o artigo 373-A da CT cuida são aplicadas ao homem e à mulher, pois esta norma por ser de higiene e segurança do trabalho deve ser observada para ambos os sexos, por aplicação do princípio da igualdade.
Outrossim, merece comento a necessidade de uma expansão desses direitos, incorporando uma visão mais social, resultando numa sociedade mais equilibrada.
Neste momento, mister destacar uma outra face da proteção a maternidade até então não abordada, pois até aqui somente a licença-maternidade esteve em comento, porém colhe-se a oportunidade para trazer à reflexão alguns pontos relativos a licença-paternidade, inclusive sua expansão ao pai que adota.
Malgrado o foco do presente estudo seja a proteção dada ao trabalho da mulher, abre-se espaço para discutir alguns aspectos da licença dada ao pai solteiro adotante, em virtude de sua condição peculiar diante do princípio da igualdade.
Primeiramente, é preciso destacar que a situação do pai solteiro que adota é totalmente diversa daquele que casado, adota uma criança. Isso porque em uma família binuclear (composta de pai e mãe, pode-se chamá-la assim) há, pelo menos do ponto de vista ideal, uma divisão de tarefas na promoção da adaptação familiar. Assim, o fato de um deles, no caso a mãe, poder gozar de uma licença mais ampliada, nos termos do artigo 392-A da CLT, repercute positivamente no âmbito familiar.
Já em uma família monoparental, composta por um pai solteiro, a concessão de licença-paternidade de 5 dias somente, nos moldes do art. 7º, inciso XIX da CF/88 e do art. 10, inciso II do ADCT, seria extremamente prejudicial para a nova família que se forma, uma vez que não há a suposta divisão de tarefas presente na adoção feita por casais, não dispondo o pai, nessa situação, da disponibilidade de tempo necessária para cuidar daquele novo membro da família.
Nessa hipótese apresentada, constata-se que o princípio da igualdade tem espaço para sua aplicação, não para igualar a licença-paternidade entre os homens, mas para igualar o prazo da licença-paternidade do solteiro que adota ao da licença-maternidade à adotante, prevista no art. 392-A da CLT.
O elemento discriminador se justifica para promover a igualdade daqueles que se encontram em situação de desigualdade, em outras palavras, o solteiro que adota deve ter um prazo maior do que o casado que adota, pois deverá dispor de uma maior disponibilidade para cuidar da criança, já que não tem, mais uma vez frise-se, a princípio, como dividir seus cuidados na adaptação daquele ser no meio familiar. Assim, verifica-se que as circunstâncias materiais entre solteiro adotante e empregada adotante são semelhantes, merecendo, por isso, tratamento igualitário.
A sociedade de um modo geral tem se mostrado favorável a esse entendimento, sendo que a consolidação dessa posição corresponderia a um importante passo no avanço dos direitos sociais do país. Em recente decisão o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas) concedeu licença de 90 dias, consoante previsão do artigo 210 da Lei 8.112/1990, a funcionário seu que adotou uma criança.
O Conselho Superior da Justiça do Trabalho não apenas confirmou a decisão proferida pelo Regional, como deu caráter normativo a mesma, que passa a alcançar todos os servidores da Justiça do Trabalho na mesma situação. Veja-se trecho da notícia divulgada no site Tribunal Superior do Trabalho, no dia 27 de março de 2009, sobre o tema:
“O Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) reconheceu hoje (27) a um servidor público da Justiça do Trabalho, na condição de pai solteiro, o direito à licença de 90 dias pela adoção de uma criança com menos de um ano de idade. A decisão foi tomada, por unanimidade de votos, em julgamento envolvendo um servidor do TRT da 15ª Região (Campinas-SP). Como o Conselho, por maioria de votos, deu caráter normativo à decisão, ela alcança todos os servidores da Justiça do Trabalho na mesma situação.
Em seu voto, o relator do processo, conselheiro Carlos Alberto Reis de Paula, reconheceu o direito com base no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e em dispositivos constitucionais que garantem a proteção à criança e ao adolescente. A Lei 8.112/90 (artigo 208), que rege o funcionalismo público, reconhece o direito apenas às mulheres. Foi com base nesta lei que o então presidente do TRT de Campinas, juiz Luiz Carlos de Araújo, negou administrativamente a licença. O servidor recorreu ao Pleno do TRT e seu direito foi reconhecido. O então presidente recorreu ao Conselho Superior da Justiça do Trabalho. O servidor, que é assistente social, veio a Brasília acompanhar o julgamento.
Embora não tenha reconhecido legitimidade ao presidente do TRT para recorrer da decisão, o conselheiro Carlos Alberto examinou a questão, de ofício, por considerar que a matéria extrapolava o interesse pessoal do servidor e poderia vir a ser suscitada por outros servidores na mesma situação. Em seu voto, o conselheiro afirmou que, se o Estatuto da Criança e do Adolescente confere a qualquer pessoa com mais de 21 anos, independentemente do sexo, o direito à adoção, é absolutamente normal que um servidor, ainda que não seja casado, opte por adotar uma criança.
“Aliás, conduta desta natureza, além de se encontrar em perfeita harmonia com o artigo 227 da Constituição – que prevê ser dever do Estado, da família e da sociedade assegurar com absoluta prioridade proteção à criança e ao adolescente-, é digna de louvor, principalmente se levarmos em consideração que vivemos num País que, embora em desenvolvimento, convive ainda com elevado número de crianças em total abandono e às margens da criminalidade”, afirmou Carlos Alberto. O relator acrescentou que a negativa da licença ao servidor público nesta condição implicaria ofensa ao princípio constitucional da isonomia, e também na consagração de tese que certamente não acompanhou a evolução da sociedade.”
Essa decisão, sem dúvida, promove uma ampliação dos conceitos que envolvem a maternidade e a família, constituindo um importante indicador da necessidade de adequação do direito às novas realidades sociais.
Outras normas do Capítulo III da CLT constituem, por outro lado, mera repetição da disciplina que rege as relações de trabalho como um todo, não havendo a menor necessidade de sua inserção nesse capítulo, porque seria inconcebível a vedação de tais direitos às mulheres, como por exemplo, o adicional noturno previsto no art. 381 da CLT, o repouso intrajornada estabelecido no artigo 383 da CLT, entre outros dispositivos, cuja pertinência já foi devidamente analisada.
Outros porque repetem direitos assegurados a todos os trabalhadores. Alguns outros (Art. 373-A da CLT), ainda, deveriam ser deslocados para outro capítulo ou seção, pois impertinente sua colocação no capítulo de proteção da mulher.
5. Conclusão
É patente que as proibições de trabalho das mulheres em condições insalubres, em regime de horas extras, em período noturno, em minas de subsolo, entre outras, cumpriram a sua função à época, porém com a evolução do trabalho feminino muitas dessas normas se tornaram entraves ao mercado de trabalho da mulher, adquirindo cunho discriminatório.
Afinal, uma proteção demasiada do trabalho feminino seguramente redunda em uma maior dificuldade para a mulher de acesso ao mercado de trabalho, já que aumentaria os custos do empregador e, consequentemente, da atividade produtiva. Não seria justo, então, que a mulher além de enfrentar os preconceitos sociais enfrentasse obstáculos legais.
A tutela de direitos precisa acompanhar o ritmo das modificações das condições de trabalho, para que a aplicação do princípio da igualdade seja concebida como não-discriminação e não como uma repartição estanque de direitos entre os sexos, daí a necessidade de uma releitura dos arts. 372 a 401 da CLT à luz do princípio da igualdade.
Informações Sobre o Autor
Itatiara Meurilly Santos Silva
advogada, bacharela em Direito pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), pós-graduada em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Universidade Tiradentes (UNIT).