Em um dos sebos que
frequentamos aqui em nossa cidade de Belém do Pará podemos encontrar raridades
que pouco estudiosos do direito tem o prazer de conhecer e, muito menos, ler.
Falamos da obra de Georges Ripert intitulada O Regimen Democrático e o Direito Civil
Moderno editada pela Saraiva & Cia Editores. Nela podemos encontrar
subsídios importantes e atuais para o pensamento.
Já naquela época Ripert
dizia que “Se há hoje falta de interesse
pelo nosso direito secular, é menos pelo facto de não corresponder às
necessidades provenientes das condições materiais da vida nova, do que pelo
desacôrdo com as nossas idéias modernas sobre a organisação social. Dizemos que
a evolução do direito é fatal e repetimos que ela é imposta pelos factos. Na
realidade desejamos realmente um direito novo, e, se afirmarmos a necessidade
da reforma, é pelo receio de nos julgarmos reformadores voluntários. Assim como
aquêle que ama as viagens as julga uteis à saúde, o democrata que quer um
direito novo afirma-o indispensável ao desenvolvimento da civilisação”(1).
Vivemos hoje a necessidade de
um direito novo tal qual Ripert almejava para resolver um dos maiores problemas
da história do direito que é a morosidade na tramitação de processos nos juízos
e nas Cortes de todo o país. Propostas legislativas, modificações na estrutura
do judiciário e outras medidas tem se apresentados pouco eficazes na solução
deste problema. A eternização das causas gera conseqüências graves a todos os
profissionais do direito. Os advogados perdem clientela pois em causas de
pequena monta, muitas vezes é mais interessante que a parte arque com os
prejuízos dos que gastar mais dinheiro com o pagamento de custas, honorários
advocatícios, tempo e paciência para esperar o deslinde de um processo que pode
levar anos. Para juízes e promotores a situação não é diferente pois a demora
enseja conseqüências ainda mais negativas como a desconfiança na própria
justiça e o descrédito no Poder Judiciário como um todo.
Diante desse quadro
desesperador de lentidão da máquina jurídica acreditamos que a solução passa
necessariamente pela informatização de todo o sistema desde o ajuizamento da
petição a satisfação da pretensão.
Mas como implantaríamos esta
estrutura eletrônica ?
A nosso ver precisaríamos mais
do que nunca da união de todos esquecendo as diferenças e peculiaridades de
membros da Ordem dos Advogados e suas seccionais, Poder Judiciário e Ministério
Público.
Após este ajuste o procedimento
idealizado por nós seria assim:
Acontecendo algum fato em que o
jurisdicionado entenda ter sido lesado ou preterido em algum ou vários direitos
e deseje reivindicá-los perante o judiciário o mesmo deverá procurar um
advogado para pleitear por intermédio de ação competente aquela pretensão
resistida.
Se o lesado não tiver advogado
poderá procurar na respectiva Seccional da OAB onde seriam informados os nomes
e breves currículos dos advogados inscritos e regulares constantes em seus
cadastros que poderiam ser disponibilizados no site da instituição permitindo a
escolha criteriosa e paciente aqueles que tivessem computador do causídico de
sua preferência.
Dependendo da complexidade da
questão a conversa com o advogado poderia ser feita através do correio
eletrônico onde o futuro cliente enviaria sua questão para análise. Em seguida
o advogado encaminharia a solução legal, sua proposta de pró-labore e honorários advocatícios ao cliente.
Entendendo justo o valor
solicitado o cliente encaminharia os documentos reproduzidos no scanner, procuração assinada
eletrônicamente e cópia do recibo de pagamento ou transferência para a conta do
advogado do valor cobrado.
Mediante o acordo prévio o
advogado elaboraria a petição e através de peticionamento eletrônico
encaminharia ao Tribunal que já disporia deste serviço de protocolo notificando
o recebimento e informando a conta para o depósito das custas do processo. Logo
em seguida o funcionário responsável repassaria os dados ao cartório que
reencaminharia conclusos ao juiz tudo pela via eletrônica.
Chegada a petição ao gabinete
virtual do juiz o mesmo analisaria a petição e verificaria sua regularidade.
Verificando sua adequação aos pressupostos legais exararia despacho opondo sua
assinatura digital ordenando o cite-se do réu encaminhando ao cartório para a
feitura do mandado. A intimação se daria pelo e-mail do advogado e do cliente e no Diário Oficial veiculado no
site da Instituição.
Feito o mandado este seguiria
pelo correio com aviso de recebimento através de convênio entre a Empresa de
Correios e Telégrafos e os Tribunais de todo o país. Feita a citação o Correio
informaria via e-mail ao cartório o
comprimento da ordem legal momento em que passaria a contar o prazo para
contestação. No mandado constaria o e-mail
do tribunal onde deverá ser protocolada a peça contestatória.
Se o réu informar seu e-mail passará a ser intimado pela via
eletrônica dos atos processuais. Recebida a contestação o cartório repassa
conclusos ao juiz que via de regra marcará a audiência de conciliação. As
partes poderão no dia informar a sua recusa em conciliar onde o juiz abrirá ata
de audiência virtual informando que não houve proposta ou a mesma foi recusada
intimando as partes para o comparecimento na audiências de instrução onde serão
ouvidas as partes e testemunhas. A intimação das partes seria feita por e-mail e das testemunhas por aviso de
recebimento pelos Correios utilizando o mesmo sistema de pagamento de custas e
informações sugerido na citação.
A audiência de instrução seria
o primeiro contato vivo entre o juiz, as partes, os advogados e as testemunhas.
De preferência seria interessante que fosse marcado em um único dia. Assim,
relatado os depoimento na audiência de instrução e julgamento os envolvidos
leriam a ata em computador comum no centro das mesas de audiência e fariam sua
assinatura digital recebendo cópia no e-mail
que indicassem sendo intimados em audiência do prazo para alegações finais que
seriam feitas da mesma forma da petição inicial acima descrita.
Feitas as peças o processo
seguiria conclusos para sentença que seria publicada no Diário Oficial eletrônico
e encaminhada para o e-mail indicado
pelas partes no processo. No caso de recurso e execução o procedimento seria
semelhante modificando alguns detalhes como por exemplo a sustentação oral que
poderia ser feita por vídeo conferência e a na execução a penhora on line de créditos e bens que poderia
ser feita diretamente em órgãos como o Detran, Banco Central, Cartório de
Registro de Imóveis e em todos os bens que tivessem registro governamental.
Os leilões poderiam ser feitos
por sites especializados na internet e, em sendo apurado os valores
com venda do bem os mesmos seriam transferidos para a parte beneficiada, para
pagamento dos honorários advocatícios e para a quitação das custas. O
acompanhamento processual poderia ser feito pelas partes e interessados que
tivessem o número do processo através da site
do Tribunal na internet.
Acima descrevemos um processo
comum sem seus vários incidentes, para não elastecer de forma cansativa e
desmedida o ensaio, que porém, em várias situações podem ser resolvidos pela
via eletrônica
Acreditamos que as idéias aqui
colocadas podem ser implementadas em curto espaço de tempo dependendo apenas da
boa-vontade do governantes pois muitos desse recursos já estão disponíveis e
são pouco utilizados ou padecem do maior impecílio que identificamos para o
avanço e aplicação dessa teconologia que é o próprio homem.
Deixamos claro que o avanço
aqui esperado deve ser acompanhado necessariamente pela promulgação de normas
(regras) específicas sobre o assunto pois como dizia Capitant: “é incontestável que se impõe a modificação
de certas regras gerais quando as condições da vida
material variam. Não se podem aplicar as regras do transporte rodado por
estradas aos transportes pela via férrea, nem esta últimas regras à aviação;
não se podem empregar as regras da propriedade imobiliária aos títulos de
bolsa; se há grandes bancos de depósito é preciso inventar o chéque; se é
necessário estabelecer o crédito para os comerciantes, crear a quitação e o
warrant. Um grande número de regras novas correspondem por esta fórma às novas
necessidades económicas” (2)
Queremos deixar ao leitor não
um pensamento fechado e alheio a críticas e sim uma pequena chama de esperança
para que essa construção seja realizada efetivamente para que nós,
profissionais do direito, não nos tornemos, ainda mais, as figuras
desacreditadas que todos os dias é vilipendiada seja pelo humilde cliente que
não entende absolutamente nada de direito mas já tem a concepção distorcida de
nossa atividade, seja pelos nossos próprios colegas pelo desestímulo que
encontram na atividade, seja pelos órgãos da imprensa que em sua grande maioria
denigrem a imagem e esclarecem muito pouco as mazelas existentes dando ênfase
apenas as os piores acontecimentos.
Em resumo entendemos que a
informática é seguramente o maior aliado de nossa atividade devendo ser levada
a sério e implementada o quanto antes como forma de minimizar o sofrimento de
todos que necessitam de uma Justiça célere e eficaz trazendo de volta o
sentimento primordial a cada cidadão de que a lei deve ser obedecida e
respeitada e que o seu descumprimento será impreterivelmente penalizado através
de um processo virtual e veloz que imobilize economicamente e socialmente o
indivíduo que desrespeita ou lesiona o direito de seu semelhante.
Notas:
(1) RIPERT, Georges. O Regimen Democrático e o Direito Civil
Moderno, Editora Saraiva, pág 45
(2) A. Capitant, Cours de droit
civil, 8º ed., t.I, nº 18.
Informações Sobre o Autor
Mário Antônio Lobato de Paiva
Advogado em Belém; sócio do escritório Paiva & Borges Advogados Associados; Sócio-fundador do Instituto Brasileiro da Política e do Direito da Informática – IBDI; Presidente da Comissão de Estudos de Informática Jurídica da OAB-PA; Conferencista