A compra de um imóvel, especialmente na planta, envolve grandes expectativas, planejamento financeiro e, muitas vezes, anos de economia. Contudo, problemas como atraso na entrega, defeitos na obra, cobranças indevidas e descumprimento contratual podem transformar esse sonho em um pesadelo. Nessas situações, surge a dúvida: quando é o momento certo para processar a construtora? Este artigo aborda as principais situações em que o comprador pode recorrer à Justiça, os direitos garantidos pela legislação e como proceder diante de problemas.
Entenda os direitos do consumidor no setor imobiliário
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é a principal base legal para proteger os compradores de imóveis em relação a construtoras e incorporadoras. A relação entre comprador e construtora é considerada uma relação de consumo, onde o consumidor é a parte vulnerável e tem direito à proteção contra práticas abusivas.
De acordo com o CDC, a construtora deve atuar com boa-fé, transparência e cumprir rigorosamente as obrigações estabelecidas no contrato. Qualquer descumprimento dessas obrigações pode dar origem a uma ação judicial.
Quando o atraso na entrega do imóvel justifica um processo?
O atraso na entrega do imóvel é uma das razões mais comuns para processar uma construtora. Em geral, os contratos de compra e venda de imóveis preveem um prazo de tolerância de até 180 dias para a conclusão da obra. Esse prazo adicional é legal, desde que esteja claramente previsto no contrato e informado ao comprador.
Se o atraso ultrapassar o prazo de tolerância, o comprador pode tomar as seguintes medidas:
- Solicitar o distrato contratual: Nesse caso, o comprador tem direito à devolução integral dos valores pagos, corrigidos monetariamente e, em alguns casos, acrescidos de juros.
- Exigir indenização por danos materiais: Essa indenização pode incluir o pagamento de aluguel, custos com mudanças ou armazenamento de móveis, entre outros.
- Solicitar indenização por danos morais: Quando o atraso causa sofrimento emocional, frustração ou impacto significativo na vida pessoal, é possível pleitear uma reparação por danos morais.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui entendimentos consolidados que asseguram esses direitos ao consumidor, garantindo que a construtora seja responsabilizada por atrasos injustificados.
Defeitos estruturais no imóvel e falhas de acabamento
Outra situação que pode justificar um processo contra a construtora é a entrega de um imóvel com defeitos estruturais ou falhas de acabamento. Problemas como rachaduras, infiltrações, irregularidades no revestimento, instalações hidráulicas ou elétricas defeituosas são exemplos comuns.
O comprador tem direito à garantia de qualidade e segurança do imóvel, conforme previsto no Código Civil. A construtora é obrigada a corrigir os problemas no prazo legal, que geralmente é de cinco anos para vícios aparentes ou ocultos. Caso a construtora se recuse a realizar os reparos ou demore para resolvê-los, o consumidor pode ingressar com uma ação judicial para exigir o cumprimento da obrigação.
Cobranças indevidas ou abusivas
Cobranças indevidas, como taxas de evolução de obra não informadas ou valores excessivos de corretagem, também são motivos para processar a construtora. O consumidor deve pagar apenas o que está expressamente previsto no contrato e devidamente detalhado.
Em relação à taxa de corretagem, o STJ já decidiu que a construtora deve informar o consumidor de forma clara e prévia sobre essa cobrança. Caso isso não ocorra, o comprador pode solicitar a devolução dos valores pagos indevidamente, corrigidos monetariamente.
Alterações no projeto ou área entregue menor que a contratada
Alterações no projeto original, redução da área útil do imóvel ou mudanças em áreas comuns sem o consentimento do comprador são práticas que ferem os direitos do consumidor. O Memorial Descritivo do empreendimento, que faz parte do contrato, deve especificar todos os detalhes do imóvel e das áreas comuns.
Se o imóvel entregue não corresponde ao que foi contratado, o comprador pode ingressar com uma ação para exigir:
- Cumprimento do contrato: Solicitar que a construtora entregue o imóvel conforme o combinado.
- Indenização: Em casos em que a alteração seja irreversível, o consumidor pode pedir indenização por perdas e danos.
Fraude ou propaganda enganosa
A publicidade realizada pela construtora deve ser fiel à realidade do empreendimento. Caso o comprador perceba que foi induzido a erro por meio de informações falsas ou enganosas, como promessas de benefícios inexistentes, descontos não aplicados ou prazos inviáveis, é possível processar a construtora por propaganda enganosa.
O CDC garante que todas as informações publicitárias têm força vinculante, ou seja, integram o contrato e devem ser cumpridas pela construtora.
Rescisão unilateral ou descumprimento de cláusulas contratuais
Se a construtora rescindir o contrato unilateralmente ou descumprir cláusulas contratuais importantes, o comprador pode buscar a Justiça para anular a rescisão ou exigir o cumprimento das obrigações contratuais. Situações como não disponibilizar o financiamento prometido ou alterar condições de pagamento sem autorização do comprador também configuram motivos para um processo.
Quando optar pelo distrato contratual?
O distrato contratual é uma opção para o comprador quando a relação com a construtora se torna insustentável, seja por atrasos, problemas na entrega ou descumprimento contratual. Nessa situação, o consumidor tem direito à devolução integral dos valores pagos, corrigidos monetariamente.
No entanto, é importante destacar que o distrato deve ser formalizado por meio de um acordo ou, caso não seja possível, por meio de uma ação judicial. A construtora não pode impor condições abusivas para o distrato, como retenção de valores sem justificativa.
Passo a passo para processar a construtora
Se você identificou que seus direitos estão sendo violados, siga os passos abaixo para processar a construtora:
1. Reúna toda a documentação
Tenha em mãos todos os documentos relacionados à compra do imóvel, como:
- Contrato de compra e venda
- Memorial Descritivo
- Comprovantes de pagamento
- Trocas de e-mails, mensagens ou notificações com a construtora
- Fotografias ou vídeos que comprovem defeitos ou descumprimentos
2. Tente resolver extrajudicialmente
Antes de ingressar com uma ação judicial, procure resolver o problema diretamente com a construtora. Envie notificações formais por escrito, expondo a situação e solicitando uma solução amigável.
3. Registre reclamações em órgãos competentes
Caso a negociação direta não funcione, registre uma reclamação no Procon ou outros órgãos de defesa do consumidor. Eles podem intermediar a resolução do conflito.
4. Procure um advogado especializado
Um advogado especializado em direito imobiliário poderá avaliar seu caso, orientar sobre os melhores caminhos e representar você em uma eventual ação judicial.
5. Ingressar com a ação judicial
Caso todas as tentativas de resolução amigável falhem, o advogado ingressará com uma ação judicial para garantir seus direitos. Nessa ação, poderão ser solicitados danos materiais, morais, multas contratuais ou o distrato.
Perguntas e respostas
Quando posso processar a construtora por atraso na entrega?
Quando o atraso ultrapassar o prazo de tolerância de 180 dias, previsto no contrato. Após esse período, o consumidor pode exigir reparação pelos prejuízos.
É possível processar a construtora por defeitos no imóvel?
Sim, a construtora é responsável por corrigir defeitos estruturais ou de acabamento no prazo de garantia, que é de cinco anos. Caso isso não seja feito, o comprador pode buscar reparação judicial.
O que fazer em caso de cobranças indevidas?
Procure a construtora para esclarecer a cobrança. Caso não haja acordo, é possível ingressar com uma ação para pedir a devolução dos valores pagos indevidamente.
A construtora pode alterar o projeto sem autorização?
Não. Alterações no projeto original sem o consentimento do comprador violam os direitos do consumidor e podem ser questionadas judicialmente.
Como resolver o problema sem recorrer ao Judiciário?
Tente negociar diretamente com a construtora ou registre uma reclamação no Procon. Em muitos casos, é possível alcançar uma solução extrajudicial satisfatória.
Conclusão
Processar uma construtora é uma medida necessária quando os direitos do consumidor são violados, seja por atraso na entrega, defeitos no imóvel, cobranças indevidas ou descumprimento contratual. No entanto, antes de ingressar com uma ação judicial, é recomendável buscar soluções extrajudiciais, como negociações diretas ou intermediação de órgãos de defesa do consumidor. Com a orientação de um advogado especializado e a documentação adequada, o comprador pode garantir seus direitos e obter reparação pelos prejuízos sofridos, preservando a confiança e o equilíbrio nas relações contratuais.