Não, em regra, quem tem passagem pela polícia não pode ingressar na Polícia Militar. A existência de antecedentes criminais, inquéritos, processos judiciais ou qualquer envolvimento em atos ilícitos pode impedir a aprovação do candidato em concursos públicos para a carreira militar. O ingresso na Polícia Militar exige idoneidade moral, reputação ilibada e conduta compatível com a função pública, especialmente considerando o rigor necessário para quem ocupará funções armadas e com autoridade sobre a população. No entanto, há diferenças entre tipos de passagens e entre situações resolvidas ou não judicialmente, o que pode gerar exceções pontuais. Neste artigo, explicamos de forma completa o que significa ter passagem, como isso interfere no ingresso na Polícia Militar, o que dizem os editais, qual o entendimento da jurisprudência e quais os caminhos possíveis para quem já teve problemas com a justiça.
O que significa “ter passagem pela polícia”
Ter passagem pela polícia é uma expressão informal e amplamente usada para indicar que uma pessoa já foi conduzida a uma delegacia ou já teve o nome envolvido em algum registro policial, seja como investigado, suspeito ou até mesmo como autor de algum crime.
Passagem não é sinônimo direto de condenação, mas pode significar:
-
Ter sido detido por suspeita de crime, mesmo sem condenação
-
Ter respondido a inquérito policial
-
Ter figurado como autor em boletim de ocorrência
-
Ter respondido a um processo penal, mesmo que absolvido depois
-
Ter firmando um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO)
Portanto, nem toda pessoa que tem “passagem” foi condenada. No entanto, em concursos públicos de natureza militar, qualquer indicativo de envolvimento com conduta ilícita pode ser usado como critério eliminatório.
O que exige o concurso da Polícia Militar
Os concursos para ingresso nas Polícias Militares dos estados (PMs) geralmente preveem requisitos bastante rigorosos. Além da prova teórica, é comum a realização de:
-
Teste de aptidão física
-
Avaliação psicológica
-
Investigação social
-
Exames médicos
-
Entrevistas
-
Curso de formação
É na fase de investigação social que o histórico de vida do candidato é analisado. Nessa fase, a comissão avalia aspectos como:
-
Antecedentes criminais
-
Histórico escolar
-
Vínculos sociais
-
Conduta moral e familiar
-
Participação em delitos, mesmo que não resultem em condenação
Ter passagem policial, mesmo sem condenação, pode ser considerado fator eliminatório dependendo da avaliação subjetiva da banca organizadora.
O que dizem os editais sobre antecedentes criminais
A maioria dos editais de concursos para Polícia Militar dos estados exige que o candidato:
-
Não tenha antecedentes criminais
-
Não tenha condenação com sentença transitada em julgado
-
Comprove idoneidade moral
-
Apresente certidões negativas criminais estaduais e federais
Por exemplo, o edital pode conter cláusulas como:
“Será considerado inapto o candidato que apresentar conduta social incompatível com o exercício da função policial, incluindo registros policiais, inquéritos em andamento ou condenações criminais.”
Assim, mesmo que a pessoa não tenha sido condenada, o simples fato de ter passagens ou investigações pode ser usado contra ela, especialmente se envolver crimes considerados graves ou incompatíveis com a função militar.
Diferença entre inquérito, processo e condenação
É essencial distinguir os diversos estágios de um procedimento criminal:
-
Boletim de ocorrência: simples registro, sem implicações automáticas
-
Inquérito policial: investigação formal, pode ou não virar processo
-
Processo criminal: ação judicial onde o réu se defende
-
Sentença condenatória: quando o juiz decide pela culpa do réu
-
Sentença absolutória: absolvição por falta de provas ou negativa de autoria
-
Trânsito em julgado: quando não cabe mais recurso
Alguns editais permitem o ingresso de pessoas que respondem a processos ainda não julgados. Outros exigem que não exista qualquer pendência judicial, o que abrange também inquéritos arquivados e ações extintas.
Na prática, quanto mais avançado o envolvimento do candidato com a justiça criminal, maior a chance de ser eliminado no concurso.
Jurisprudência sobre o tema
O Poder Judiciário já analisou inúmeros casos em que candidatos eliminados em concursos da Polícia Militar recorreram à Justiça para reverter sua exclusão com base na passagem policial.
Algumas decisões reconhecem que não se pode eliminar um candidato apenas por ter sido investigado, sem que haja condenação ou comprovação de conduta inidônea.
Exemplo:
“A mera existência de inquérito policial sem denúncia ou condenação não pode, por si só, servir como fundamento para exclusão do candidato.” (TJSP – Apelação Cível)
Por outro lado, tribunais também já decidiram que a Administração tem discricionariedade para avaliar a idoneidade moral, especialmente nas carreiras militares, onde o padrão de exigência é mais elevado.
Exemplo:
“É legítima a eliminação de candidato cuja conduta social, embora não resulte em condenação penal, revele incompatibilidade com os valores da corporação militar.” (TJMG – Apelação Cível)
A jurisprudência, portanto, oscila conforme o caso concreto, mas tende a considerar a gravidade do fato, o tempo decorrido e se houve ou não condenação.
Posso entrar na PM se tive passagem, mas fui absolvido?
Depende. Se a pessoa foi absolvida judicialmente ou teve o processo arquivado, não há condenação, e ela não está legalmente impedida de assumir cargo público.
No entanto, o edital e a comissão de investigação social podem entender que o fato ocorrido é suficiente para indicar má conduta ou risco à reputação da corporação, o que pode levar à eliminação.
Nesses casos, é possível ingressar com mandado de segurança ou ação ordinária, alegando que a exclusão foi abusiva ou desproporcional, especialmente se a absolvição foi por negativa de autoria ou ausência de provas.
Posso ser policial militar se tenho antecedentes criminais?
Em regra, não. Antecedentes criminais impedem o ingresso na Polícia Militar. Isso inclui:
-
Condenações com trânsito em julgado
-
Condenações por crimes dolosos (com intenção)
-
Crimes contra a administração pública, a fé pública, a dignidade sexual ou o patrimônio
-
Crimes hediondos ou com violência
Mesmo que a pena já tenha sido cumprida, a ficha criminal pode ser usada para eliminar o candidato com base na falta de idoneidade moral.
Alguns tribunais têm entendido que, após a reabilitação criminal, o candidato não pode mais ser discriminado. Mas esse processo é lento, depende de decisão judicial e não é automático.
E se o crime estiver prescrito ou for de menor potencial ofensivo?
Crimes de menor potencial ofensivo, como lesões leves, porte de drogas para consumo ou perturbação da ordem, não impedem automaticamente o ingresso na PM, desde que não haja condenação e que o candidato tenha cumprido eventuais penas alternativas.
Ainda assim, cada caso será avaliado individualmente pela comissão de investigação social, que pode considerar a natureza do delito, o tempo transcorrido e o comportamento posterior do candidato.
Se o processo estiver prescrito, também não há condenação, mas o histórico pode ser considerado um indício negativo na avaliação de conduta.
Como comprovar idoneidade moral
A idoneidade moral é avaliada com base em uma série de documentos e investigações, incluindo:
-
Certidões negativas criminais estaduais e federais
-
Certidões da Justiça Eleitoral
-
Certidões da Justiça Militar
-
Ficha escolar
-
Declarações de conduta assinadas por autoridades ou empregadores
-
Entrevistas pessoais
-
Visitas domiciliares
-
Relatórios sobre vizinhança e convívio social
A apresentação de documentos positivos, histórico escolar exemplar, trabalho voluntário, experiência profissional e boas referências podem compensar registros antigos de conduta duvidosa.
Reabilitação criminal e civil
Quem já foi condenado pode, após certo tempo e preenchidos os requisitos legais, buscar a reabilitação criminal (artigos 93 a 95 do Código Penal), que tem como efeito:
-
Tornar inacessíveis os registros da condenação
-
Restaurar a plena capacidade moral e jurídica do cidadão
-
Facilitar o acesso a cargos públicos
Também existe a reabilitação civil, aplicável a servidores públicos expulsos que buscam o reingresso após decisão favorável da Justiça.
No entanto, a reabilitação não é automática, depende de pedido judicial e avaliação de comportamento posterior.
Caminhos para quem teve passagem e quer ser PM
Se você teve passagem policial e deseja seguir carreira na Polícia Militar, algumas medidas podem ser úteis:
-
Consulte o edital com atenção e identifique os critérios objetivos sobre antecedentes
-
Verifique se há condenações em aberto e busque certidões atualizadas
-
Contrate um advogado especializado para analisar sua situação jurídica
-
Acompanhe a jurisprudência do seu estado sobre ingresso de candidatos com passagens
-
Busque reabilitação, se aplicável, antes de participar de concursos
-
Invista em construção de imagem e reputação, com bons registros de conduta
-
Prepare uma defesa administrativa, caso seja convocado para apresentar esclarecimentos
Lembre-se: cada caso será analisado individualmente, e o que é motivo de eliminação em um concurso pode não ser em outro, dependendo do estado, do edital e da decisão judicial cabível.
Perguntas e respostas
Quem já foi preso pode ser policial militar?
Depende. Se houve prisão mas nenhuma condenação, e o processo foi arquivado, pode haver chance, mas a banca pode considerar a passagem como desabonadora. Se houve condenação com trânsito em julgado, a admissão é praticamente inviável.
Responder a inquérito atrapalha o ingresso na PM?
Sim. A depender do edital, o simples fato de responder inquérito ou processo pode eliminar o candidato. Alguns estados são mais rígidos que outros.
Posso ser PM se fui absolvido no processo?
Depende da justificativa da absolvição e da análise da comissão. A absolvição por negativa de autoria pesa mais a favor do candidato do que uma absolvição por insuficiência de provas.
Passagem por ato infracional na adolescência impede ingresso?
Não necessariamente. Registros como menor de idade são protegidos pelo ECA e, em geral, não podem ser usados contra o candidato na fase adulta. Mas podem ser analisados se vierem à tona.
O que fazer se for eliminado por má conduta, mas nunca fui condenado?
Você pode entrar com mandado de segurança ou ação judicial e pedir reintegração no concurso, especialmente se tiver provas de conduta idônea.
Ter ficha limpa basta para ser aprovado?
Não. A ficha limpa é um dos requisitos. Além disso, é preciso passar por todas as etapas do concurso, como provas escritas, físicas, psicológicas e curso de formação.
Se o processo foi extinto sem julgamento de mérito, ainda posso ser eliminado?
Pode. Mesmo sem sentença, a banca pode considerar a existência do processo como indício de conduta questionável.
Com reabilitação criminal posso ser policial?
Sim, em tese. A reabilitação tem como objetivo restaurar a capacidade civil e moral da pessoa. Mas a aceitação vai depender da interpretação da banca e, em muitos casos, da via judicial.
O que é considerado má conduta na investigação social?
Além de passagens, também pesam negativamente: comportamento antissocial, histórico escolar violento, envolvimento com grupos criminosos, uso excessivo de redes sociais com conteúdo inadequado, entre outros.
Existe concurso que não exige ficha limpa?
Não para carreiras militares ou de segurança pública. Nesses casos, a ficha limpa e a idoneidade moral são essenciais.
Conclusão
A exigência de idoneidade moral para ingresso na Polícia Militar é uma realidade indiscutível. O rigor no processo seletivo não é à toa: trata-se de uma função que envolve armas, autoridade pública, confiança da população e forte responsabilidade institucional. Ter passagem policial, mesmo que sem condenação, pode sim dificultar ou até impedir o ingresso na carreira militar, dependendo do estado, do edital e da interpretação da banca avaliadora.
Entretanto, o simples fato de já ter respondido a um processo ou inquérito não representa automaticamente a exclusão do candidato. A análise deve ser feita caso a caso, com base em critérios objetivos e sempre com respeito ao princípio da presunção de inocência.
Se você tem esse objetivo e já teve problemas com a justiça, é fundamental buscar orientação jurídica, reunir documentos que comprovem sua conduta atual, e, se necessário, recorrer judicialmente. A honestidade, a transparência e a preparação são essenciais para garantir uma chance justa de participar de um concurso tão importante como o da Polícia Militar.