A queda do PIB brasileiro (e, em última instância, global) em 2020 será inevitável. Diante dos impactos da crise do COVID-19, estudos recentes indicam perspectivas nada animadoras de uma recessão girando em torno de 4,4% (FGV) – a qual, se confirmada, será a maior retração do Produto Interno Bruto do país desde 1962.
Também consequência deste nebuloso cenário, o desemprego já aumentou em todas as regiões do país nesse primeiro semestre, devendo alcançar níveis, infelizmente, ainda maiores até o fim do período mais agudo da crise.
Dada a necessidade atual das medidas de isolamento, como forma de minimizar os impactos para os sistemas de saúde público e privado, bem como, para preservar a vida, a grande questão que fica é: que caminhos o Governo deve tomar para que o Brasil consiga se recuperar da crise de modo mais ágil e impulsionar uma retomada econômica efetiva, que traga menos danos para a população?
Para responder a essa pergunta, analisamos algumas perspectivas que vêm sendo discutidas por especialistas ao longo das últimas semanas, levando em consideração, em especial, ideias envolvendo o cenário tributário e trabalhista brasileiro, que tornem o Brasil um polo que atraia investimentos de caráter permanente.
A urgência de uma reforma tributária
O primeiro ponto que deve ser tomado como prioridade em um cenário pós-COVID-19 diz respeito a condução de uma reforma tributária profunda que torne o nosso sistema tributário mais enxuto e, com uma carga de impostos menos onerosa para as empresas. Deste modo, poderemos atrair investimentos, tornar o país mais competitivo dentro do ambiente de negócios global e acelerar a geração de empregos que, por sua vez, contribuirá para o aquecimento da economia brasileira.
Atualmente, duas propostas de Reforma Tributária estão sendo avaliadas e podem ter suas discussões retomadas após o controle da pandemia. a primeira (PEC 45/19) está na Câmara dos Deputados; a segunda, PEC 110/19, está sendo discutida no Senado. Apesar das diferenças entre as duas propostas, os textos têm como objetivo central a simplificação na cobrança de impostos sobre consumo e propõe a unificação de vários tributos – no entanto, a carga tributária seria mantida, mudando apenas a forma de cobrança, que passaria a ser no consumo em si, ao invés de ser na produção de cada item.
Entre os pontos de diferença, o primeiro são os tributos englobados em cada proposta, uma vez que o texto que tramita na Câmara propõe a substituição de cinco tributos federais, estatuais e municipais (ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI) por um único, o Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS). Já a PEC 110/19 propõe extinguir 9 tributos – IPI, PIS, Cofins, ICMS, ISS, IOF, Pasep, Salário-Educação e Cide Combustíveis – e a criação do IBS, de competência estadual, e do Imposto Seletivo, de competência federal.
Quanto às alíquotas, na PEC 45/19, o valor fixado será único para bens e serviços, de modo que os entres tributantes terão autonomia para fixar suas alíquotas. Na segunda proposta, no entanto, ela será diferenciada. Com isso, certos produtos, como cigarros ou bebidas alcóolicas, por exemplo, poderão extrapolar o teto.
Outro ponto que diferencia as duas propostas está relacionado à questão dos incentivos fiscais. O texto avaliado pelo Senado propõe que os incentivos fiscais sejam permitidos em operações com alguns produtos e serviços, como, por exemplo, alimentos, medicamentos, saneamento básico, ensino fundamental, médio e superior, entre outros. Na outra proposta, no entanto, o tema foi vetado.
Além disso, há a questão do regime especial de tributação que, na PEC do Senado, prevê tratamento diferenciado para micro e pequenas empresas, enquanto, no segundo texto, o assunto não foi abordado. Há distinção, também, no que diz respeito à Zona Franca de Manaus. A PEC 45/19 prevê sua extinção, já na PEC 110/19, a ideia é que haja uma manutenção.
Dentro desse contexto, é importante que o Governo Federal decida que rumos deseja tomar – se pretende apoiar uma das propostas ou enviar seu próprio modelo de reforma tributária para apreciação de deputados e senadores. Em fevereiro deste ano, o ministro Paulo Guedes prometeu formular uma proposta de reforma tributária junto a sua equipe econômica. Até o momento, no entanto, desconhece-se o projeto do Governo Federal.
Produção industrial e substituição de importações
Outro ponto importante que vem sendo discutido por especialistas da área econômica e industrial, envolve a possibilidade de um maior incentivo a indústria brasileira como forma de geração de empregos, inclusive abarcando a substituição de importações, em favor da produção nacional.
No contexto atual da crise do COVID-19, por exemplo, já há dois projetos na Câmara que tem como objetivo priorizar a compra de produtos nacionais para hospitais e para o SUS. Conforme release publicado na Agência Câmara de Notícias, o Projeto de Lei 2223/20 prioriza produtos fabricados no Brasil no enfrentamento do Coronavírus; ao passo que a PL 2254/20 estabelece que pelo menos 80% dos equipamentos e materiais de consumo médico utilizados no SUS devem sem produzidos nacionalmente.
A expectativa de alguns especialistas é de uma possível nova conjuntura econômica global, com os países diminuindo sua dependência da produção industrial chinesa. Se souber aproveitar esse momento, o Brasil pode vir, por exemplo, a costurar novos acordos internacionais e retomar uma política industrial que movimente a economia do País.
Desoneração da Folha
Finalmente, quando se fala em retomada de investimentos e fortalecimento econômico é, também, fundamental, que o Governo pense em alternativas efetivas para a desoneração da folha de pagamento das empresas.
Em live recente com empresários do setor varejista, o ministro Paulo Guedes informou que, após o controle da pandemia, o Governo Federal investirá esforços na desoneração da folha que, segundo ele, leva os brasileiros para a informalidade. O grande desafio, segundo especialistas da área econômica, é efetivar uma reforma trabalhista que permita a desoneração e crie saídas concretas para a queda na arrecadação.
Auxiliares da equipe econômica apontam inspiração nas reformas efetivadas nos Estados Unidos nos anos 80, pelo presidente Ronald Reagan, todavia, não foram apresentados detalhes ou um plano de execução para esta demanda.
Saindo do terreno das ideias e partindo para a ação
Para concluir esse artigo, um ponto essencial que deve ser reforçado é o de que, seja qual for o caminho escolhido pelo Governo Federal, é hora de buscar um esforço organizado para encaminhar projetos, concretizar estratégias e sair do terreno das ideias.
O Brasil não tem tempo a perder e já tivemos um excesso de desgastes nas últimas semanas com trocas de ministérios e discussões com outros poderes, gastando uma energia e minando a confiança no poder de execução do Governo – elementos esses, indispensáveis, para que o Brasil possa iniciar sua retomada econômica sem maiores solavancos.
Afinal de contas, obstáculos é o que não faltam neste momento. É dever do Governo trabalhar para superá-los – não para criar novos entraves.
*Ana Campos é Especialista em Aquisições e Reestruturações e sócia fundadora da empresa Grounds, empresa de consultoria inteligente especializada nas áreas contábil, tributária, trabalhista, previdenciária e financeira.
Sobre a Grounds
A Grounds é uma empresa de consultoria inteligente especializada nas áreas contábil, tributária, trabalhista, previdenciária e financeira. O core business da companhia abrange todas as áreas da empresa, se diferenciando assim dos serviços de advogados, por exemplo. No último ano de atuação, a Grounds solucionou mais de 40 projetos de due diligence, consultoria fiscal-financeira e assessoria permanente em vários segmentos de atuação: Investimentos e Private Equity, Energia e Infraestrutura, Serviços, Varejo e Indústria em geral. Saiba mais em: http://grounds.com.br/