Sexta parte dos vencimentos incide sobre os vencimentos integrais por expressa disposição da Constituição Estadual e da Lei Orgânica do Município

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Breve abordagem do tema


A Lei nº 13.400/2000 do Município de São Paulo aboliu o triplique da verba honorária devido aos integrantes de carreira de Procurador Municipal. Manteve a verba singela e o valor do triplique foi tornado permanente pela média aritmética, devidamente atualizada pelo IPC-FIPE, percebida nos últimos cinco anos, contados da data da publicação da referida lei (art. 2º). Essa verba tornada permanente ficou conhecida como VOP. O seu § 1º prescreveu que a parcela tornada permanente “não constituirá, sob nenhuma hipótese, base de cálculo para adicionais, gratificações ou benefícios de qualquer natureza”. O § 2º, por sua vez, dispôs que a “referida parcela será atualizada, com base na variação do índice de Preços do Consumidor, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo- FIPE”. Finalmente, o art. 9º dessa lei prescreveu que a VOP é paga aos Procuradores aposentados e aos pensionistas respectivos.


Verifica-se de pronto que o valor tornado permanente, conhecido como VOP, integra o padrão de vencimento do Procurador Municipal. Por isso, é paga a todos os integrantes da carreira, seus aposentados e pensionistas.


O destaque em separado da VOP deve-se unicamente à necessidade de sua atualização monetária mensal pela variação do IPC-FIPE, exatamente porque incorporada pela média aritmética dos valores percebidos nos últimos cinco anos a título de triplique, que compunha a parte variável dos vencimentos do Procurador. Sem a correção monetária, essa VOP, com o passar do tempo, desapareceria em termos de expressão do poder aquisitivo.


Equivocou-se o legislador municipal ao conferir à VOP tratamento próprio de vantagem pessoal vedando sua inclusão na base de cálculo da sexta parte dos vencimentos.


Por isso, esse § 1º do art. 2º da Lei Municipal de nº 13.400/2002 não pode prevalecer em face do disposto na Constituição do Estado de São Paulo e na Lei Orgânica do Município de São Paulo, que prescrevem:


Art. 129 da CE:


“Ao servidor público estadual é assegurado o percebimento do adicional por tempo de serviço, concedido no mínimo por qüinqüênio, e vedada a sua limitação, bem como a sexta parte dos vencimentos integrais, que se incorporarão aos vencimentos para todos os efeitos, observando o disposto no art. 115, XVI, desta Constituição”.


Art. 97 da LOMSP:


“Ao servidor público municipal é assegurado o percebimento do adicional por tempo de serviço público, concedido por qüinqüênio, bem como da sexta parte dos vencimentos integrais, concebida aos vinte anos de efetivo exercício no serviço público, que se incorporarão aos vencimentos para todos os feitos, não sendo computados para fins de concessão de acréscimos ulteriores sob o mesmo título ou idêntico fundamento”.


Não há que se falar em usurpação de iniciativa da lei salarial privativa do Chefe do Executivo de modo a ofender o princípio da separação dos Poderes, como ventilado em alguns acórdãos da Corte Suprema que examinou situações diferentes a do caso sob análise.


Neste caso, tanto a Constituição Estadual, como a LOMSP estatuíram a incidência da sexta parte sobre vencimentos integrais em suas redações originais. Não foram aqueles textos introduzidos por meio de emendas como sucedâneos ao veto aposto pelo Executivo ao projeto de lei de iniciativa do Legislativo e por ele aprovado.


Não há que se cogitar, no caso, de violação do princípio da independência e harmonia do Poderes, mas há que se atentar para o princípio da autonomia e independência dos entes federados.


Segue decisão judicial proferida na ação ordinária com pedido de tutela antecipatória proposta por intermédio do nosso escritório.


Decisão judicial acolhendo o pedido inaugural


“COMARCA DE SÃO PAULO


FORO CENTRAL – FAZENDA PÚBLICA/ACIDENTES


3ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA


VIADUTO DONA PAULINA, 80, São Paulo – SP – CEP 01501-010


053.09.003594-4 – lauda 1


SENTENÇA


Processo nº: 053.09.003594-4 – Procedimento Ordinário (em Geral)


Requerente: Edgard Ortega Sant’Anna e outros


Requerido: Municipalidade de São Paulo


Juiz(a) de Direito: Dr(a). Celina Kiyomi Toyoshima


Vistos.


EDGARD ORTEGA SANT’ANNA E OUTROS ajuizaram a presente Ação em face da MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO, com escopo de obterem o recálculo da sexta parte, para que passe a incidir sobre seus vencimentos integrais, incluindo a Verba Tornada


Permanente, VOP, instituída pela Lei nº 13.400/02.


Citada, a ré ofereceu a contestação e pugnou pela improcedência do pedido.


Houve réplica.


É o relatório.


Decido.


Sendo de trato sucessivo, apenas as parcelas vencidas há mais de cinco anos do ajuizamento da ação forma atingidas pela prescrição.


Feita a ressalva, no tocante à matéria de fundo, apesar das percucientes razões exaradas, pela ré, acolho do pedido.


Alterando posicionamento anterior, consigno que a abrangência da base de incidência do adicional por tempo de serviço e da sexta parte engloba o vencimento integral, excetuadas as vantagens eventuais, assim compreendidas as de caráter assistencial ou de pagamento isolado, que não se identificam com remuneração pela contraprestação pelo efetivo desempenho das funções, como despesas ou diárias de viagens, auxílio alimentação e transporte.


A gratificação que por lei não seja incorporada compõe os vencimentos integrais, de sorte que enquanto seja paga, deverá ser considerada para o cálculo da sexta parte.


As leis que instituem as gratificações, de modo geral, estabelecem que não são passíveis de incorporação aos vencimentos e salários, para nenhum efeito, exceto no cômputo do décimo terceiro salário.


No entanto, é inegável que as aludidas gratificações têm sido concedidas, sem distinção de qualquer espécie ou gênero, a todos os servidores em efetivo exercício e representam um aumento efetivo dos vencimentos dos servidores ativos.


De igual sorte, a verba honorária e a VOP são devidas as integrantes da carreira de Procurador do Município, indistintamente.


O artigo 2º da lei nº 13.400, de 01/08/2002 não deixa dúvidas sobre a natureza salarial da verba honorária e da VOP, em virtude do caráter permanente de que são providas, ambas com origem nos cofres públicos.


A VOP corresponde, de fato, a um reajuste de vencimentos, tornada permanente pela lei citada.


A proibição de incidência dos adicionais sobre as gratificações e da VOP viola o disposto no artigo 129 da Carta Paulista que faz alusão ao direito atribuído aos servidores quanto ao adicional por tempo de serviço, que não faz distinção entre civis e militares.


Tal entendimento não ofende o artigo 37, XIV da CF, com redação da Emenda nº 19/98.


Não se trata de cumular acréscimos pecuniários ulteriores sobre os acréscimos precedentes em cascata, mas, de adotar para a sexta parte, que incide uma única vez, aos vinte anos de serviço, a sua correta base de cálculo que, a teor do artigo 129 da Carta Paulista.


O cunho alimentar do crédito e a verossimilhança dos fatos alegados autorizam a antecipação da tutela, em especial, porque o recálculo da sexta parte não se confunde com o aumento, outorga ou adição de vencimentos.


Em face do exposto, julgo procedente o pedido, antecipo a tutela, condeno a ré ao recálculo da sexta parte, para que passe a incidir sobre os vencimentos dos autores, incluindo-se a verba tornada permanente, instituída pela Lei nº 13.400/02, excetuadas as gratificações eventuais, em conformidade com o disposto pela Constituição Paulista e ao pagamento das diferenças a serem apuradas, acrescidas de juros de mora de seis por cento ao ano, incidentes a partir da citação e corrigidas a partir da data em que passou a ser devida, ressalvadas aquelas atingidas pela prescrição, procedendo-se o apostilamento do direito reconhecido.


Arcará a ré com o pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em dez por cento do valor da condenação. Para o reexame necessário, será observado o artigo 475 do Código de Processo Civil.


Publique-se, registre-se e intimem-se.


São Paulo, 24 de julho de 2009”.



Informações Sobre o Autor

Kiyoshi Harada

Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.