A sociedade brasileira ficou chocada quando, há uma semana, veio à tona a denúncia da adolescente de 15 anos presa numa cela com 20 homens durante quase um mês . Naquele período promoveu-se uma verdadeira afronta aos direitos humanos. A jovem teve seu corpo e seus direitos violentados.
Estarrecedor, o fato revela o quão distante dos direitos essenciais está grande parte da população brasileira. O caso da menor paraense é emblemático, pois trata-se de uma mulher, negra, pobre e menor de idade, categorias sociais sistematicamente discriminadas e maltratadas no nosso país.
O caso registrado no estado do Pará não é isolado. Sua publicidade trouxe à tona a existência de outros similares espalhados pelo país. Trata-se de um reflexo da fragilidade das instituições democráticas no Brasil. Faço questão de lembrar que não existe maior direito ou menor direito. Existem direitos que devem ser reforçados através do cumprimento da lei, visando-se o princípio da impessoalidade, ou seja, sem olhar a quem.
Não há atenuante ao se alegar que a menina era maior, já que isso não justifica a ilegalidade dela, mesmo sendo mulher, ter sido presa numa cela masculina. O simples fato do poder público tentar utilizar um argumento como este, já nos causa estranheza e vergonha, pois trata-se de tentativa de esquivar-se do cumprimento do dever.
Não basta que haja mobilização social para erradicar o preconceito contra os excluídos, é necessário que as leis que são criadas para diminuir a exclusão e a violência sejam cumpridas. O que se viu no caso da menor presa é que tanto a delegada que a prendeu, quanto a juíza que deu respaldo legal à prisão, passaram por cima das leis e deixaram de ser agentes públicos a serviço da Lei, para “legitimar” uma ilegalidade.
Em outras palavras, a sociedade brasileira precisa apropriar-se dos direitos já garantidos em lei. Tomar conhecimento profundo desses direitos e sentir-se detentora deles é um passo significativo. Estado, sociedade civil e iniciativa privada têm a responsabilidade de agir juntos para transformar direitos no papel em direitos de fato.
Ainda no decorrer da campanha 16 Dias de Ativismo Pelo Fim da Violência Contra a Mulher apresento meu desabafo como um desafio. Um desafio para a mobilização das mulheres brasileiras, especialmente às minhas queridas companheiras amapaenses, na busca dos seus direitos e na construção de uma sociedade onde a justiça e a igualdade considerem o gênero, a faixa etária e a classe social como valores positivos, não como mecanismos para a opressão.
Como mulher, mãe e avó e na condição de deputada federal, senti-me provocada e ultrajada com a situação de violência contra esta jovem – que representa os excluídos deste país. Este é um problema de todos nós. Quando a sociedade brasileira permite que se desrespeitem os direitos básicos dos seus cidadãos, ela se transforma em uma democracia extremamente frágil, que permite e institucionaliza as desigualdades.
Se uma mulher pode ser vítima de violência física e sexual sem estar protegida pelo manto da Lei, consequentemente, qualquer uma de nós, ou nossas filhas e netas, podem ser vítimas do mesmo tipo de violência. Não podemos nos calar diante de tamanha atrocidade. Pedimos justiça e ação por parte dos responsáveis.
Informações Sobre o Autor
Janete Capiberibe
Deputada Federal eleita pelo Partido Socialista Brasileiro do Amapá