1. Introdução
Indispensáveis para a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, a conservação da natureza e a preservação da diversidade biológica possuem, como instrumento central de proteção, o desenvolvimento de sistemas de áreas protegidas que destinam determinadas porções do território a um regime jurídico específico, cuja finalidade é proporcionar a satisfação do direito fundamental ao meio ambiente sadio erigido pelo art. 225 da Constituição Federal de 1988.
Enquadrada na modalidade de conservação in situ, prevista na Convenção de Diversidade Biológica, a instituição de áreas protegidas carrega consigo a vantagem de não apenas conservar os elementos da diversidade biológica e os atributos naturais da região, mas também, permitir a manutenção dos serviços ambientais prestados por estes elementos contribuindo de uma forma mais efetiva à qualidade do meio ambiente.
No entanto, as áreas protegidas, como todos os elementos pertencentes ao meio ambiente, dadas as suas características de interação e interdependência com os demais recursos ambientais, não podem ser visualizadas de forma apartada de todo o contexto estabelecido em seu entorno.
Com o avanço dos estudos da biologia da conservação, novos conhecimentos foram trazidos para a implementação das técnicas de conservação da natureza, o que, aliado ao interesse de possibilitar uma melhor efetivação a este instrumento, culminou com a preocupação de se estabelecer um melhor tratamento ao entorno das unidades de conservação, buscando, assim a inserção da área protegida junto aos aspectos ecológicos e socioeconômicos que a envolvem sua circunvizinhança.
A atenção com o entorno das áreas desempenha um papel fundamental para se alcançar os objetivos de conservação da natureza, pois ao mesmo tempo em que permite a manutenção da biodiversidade da área e de toda a dinâmica da paisagem, funciona também como uma região onde podem ser implementadas ações que conciliam a conservação e a geração de benefícios sociais, servindo como local para a transferência das necessidades das populações tradicionais que habitavam o interior da unidade de conservação.
Com este trabalho, pretende-se analisar o papel que desempenha a zona de amortecimento na tarefa de proteção à biodiversidade na áreas protegidas, abordando o processo de desenvolvimento e de construção do modelo moderno de conservação da natureza e as conseqüências provocadas pela inserção da proteção à diversidade biológica como um dos objetivos das áreas protegidas, identificando os fundamentos jurídico ecológicos e a evolução histórica da proteção junto ao entorno para, posteriormente, situar a zona de amortecimento frente ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
2. Fundamentos jurídico-ecológicos da proteção ao entorno das áreas protegidas
Não obstante ser um dos maiores patrimônios naturais da humanidade, a biodiversidade não tem escapado das conseqüências nefastas das atividades expansivas do homem, sofrendo elevados índices de degradação, resultando perdas inestimáveis para toda a sociedade.
Dentre as maiores ameaças à preservação da diversidade biológica provocadas pela intensa alteração ambiental causada pelo homem, a degradação e a fragmentação de habitats se destacam pelo seu alto potencial de provocar a extinção das espécies e ecossistemas que são atingidas pela ausência de continuidade e pela sensível redução diminuição dos espaços em que se localizam.
Abordando a problemática da fragmentação de ecossistemas, Bensunsan enfatiza que este se trata de “um processo dinâmico constituído basicamente de três componentes: a perda de habitats na paisagem como um todo, a redução do tamanho dos remanescentes e o crescente isolamento do fragmento por novas formas de uso.”[1]
Atingindo também as unidades de conservação, a fragmentação de ecossistemas, acarreta distintos reflexos ecológicos, fruto do denominado “efeito borda”, resultante das implicações causadas nas zonas limítrofes, ocorridas em virtude do contato entre dois ecossistemas estruturalmente distintos, que deixam as fronteiras da área protegida mais susceptíveis a determinadas condições ambientais adversas.
Com a fragmentação, as fronteiras do ecossistema acabam ficando expostas e se tornam mais frágeis a condições que influenciam negativamente na conservação da natureza, pois a borda da área protegida representa uma região extremamente sensível a uma gama de efeitos degradadores, estando totalmente vulnerável aos efeitos abióticos, que podem provocar alterações microclimáticas no ecossistema protegido, em virtude da maior penetração do sol e do vento, que influenciam na luminosidade e umidade do solo e do ambiente interno das unidades.
Tais efeitos abióticos acabam também resultando em efeitos biológicos que atingem adversamente o ecossistema, prejudicando a manutenção da diversidade biológica, como por exemplo, alterações nas relações entre parasitas e hospedeiros.[2]
Mas não são apenas os fatores ecológicos que condicionam a preocupação com a circunvizinhança das unidades de conservação. Não medindo as conseqüências de suas ações, inúmeras atividades humanas, desenvolvidas proximamente à área protegida, podem afetar significativamente a preservação dos atributos existentes na unidade.
Consideradas como instrumento central nas estratégias de implementação da conservação da natureza, a criação de áreas protegidas foi estruturada num esquema de ilhas, onde se delimita determinada porção territorial que passa a ser manejada para fins de conservação, representando assim uma “atomização dos habitats naturais”[3].
Em decorrência dos avanços no campo de conhecimento da biologia da conservação, despertou-se a respeito dos problemas associados a esta concepção de conservação efetivada em torno a espaços considerados de forma isolada, já que este tipo de tratamento implicaria na inevitável incidência do efeito borda e consequentemente do processo de fragmentação o ecossistema.[4]
Diante deste fato, as estratégias de conservação da natureza começaram a requerer ações e instrumentos orientados por uma visão sistêmica, considerando todo o domínio ecológico do ecossistema protegido de forma a preservar não apenas a área legalmente delimitada, mas toda a rede de influências e interações ecológicas que oferecem subsistência ao equilíbrio das condições ambientais da unidade de conservação.
Previstas na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, as zonas de amortecimento (art. 2º, XVIII), aplicadas ao entorno da área protegida, e os corredores ecológicos (art 2º, XIX), destinados a garantir a conectividade entre os ecossistemas, procuram conferir mecanismos adicionais de proteção, aptos a oferecer uma adequada sustentação da unidade de conservação, permitindo a manutenção dos processos ecológicos, do fluxo de espécies e genes, além de proteger a área dos efeitos negativos das intervenções humanas.
Em relação à proteção da diversidade biológica, sua inclusão como objetivo da instituição de áreas protegidas levou os conservacionistas a desenvolverem o conceito de “biodiversidade como usuária” buscando identificar a forma como se estabelecem as relações biológicas na área protegida e quais os processos ecológicos importantes para a sua manutenção, gerando informações que permitem conhecer a base de sustentação do ecossistema preservado e determinar o ponto de limite das atuações humanas nas unidades de conservação.[5]
No que se refere à perspectiva legal, Canotilho enfatiza que o Estado Constitucional, com a incorporação da proteção ao meio ambiente, “além de ser e dever ser um Estado de direito democrático e social, deve ser também em Estado regido por princípios ecológicos”.[6] Sob este perfil, o Estado Constitucional Ecológico deve pautar-se por uma concepção integrada da meio ambiente[7], estando atento às características peculiares e às necessidades especiais que marcam o objeto protegido.
O sistema jurídico ambiental, de acordo com Mirra, deve ser construído a partir de uma consideração ampla do meio ambiente, considerando todos os seus elementos, não de uma forma isolada, mas em sua unidade de inter-relação que mantém o equilíbrio ambiental que permite a manutenção da vida na terra.[8]
A própria Constituição reconhece a necessidade de se considerar os fenômenos ecológicos ao vincular a efetividade do direito consagrado no caput do art. 225 à preservação e restauro dos processos ecológicos essenciais (parágrafo 1º, I), ao manejo ecológico de espécies e ecossistemas (parágrafo 1º, I), e à proteção da diversidade e integridade do patrimônio genético (parágrafo 1º, II).
Constatando representarem a base da proteção à biodiversidade em nosso país, José Afonso da Silva aponta que tais dispositivos asseguram as condições necessárias para a interação biológica (processos ecológicos), conservam o equilíbrio das relações entre as comunidades bióticas e seus habitats (manejo ecológico), além de preservar a existência de todos organismos vivos a partir de seu fator caracterizante (patrimônio genético)[9].
Desta maneira, por se mostrar comprometido com a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, surge para o Estado Constitucional Ecológico o imperativo de estabelecer medidas efetivas a este desiderato, desenvolvendo meios e instrumentos de proteção que acompanhem a compreensão do funcionamento dos ecossistemas e dos processos ecológicos.
Dadas as características do objeto tutelado, marcado pela indivisibilidade e interdependência de seus elementos, cabe aos dispositivos legais velar pela mínima intervenção humana nos fenômenos ecológicos, cuja materialização independe da manifestação de vontade do homem, lançando mão de uma abordagem ampla e sistêmica da natureza, para que, acompanhando suas características e especificidades, possa-se preservá-la concretamente.
Neste sentido, constata-se que a preocupação quanto a proteção ao entorno das áreas protegidas e a respectiva criação de zonas de amortecimento encontra respaldo constitucional, consistindo em mecanismo acessório e adicional que oferece maior efetividade para a conservação da natureza nas áreas protegidas.
3. Antecedentes históricos da preocupação com o entorno: as origens da zona de amortecimento
A preocupação quanto ao entorno das áreas protegidas é um fator que deriva da natureza interdependente do meio ambiente, onde a simples afetação de um único de seus elementos (ar, solo, água, fauna, flora dentre outros), seja ela de origem ecológica, como o “efeito borda”, ou decorrentes de intervenções humanas, representa a quebra de todo o equilíbrio ecológico que rege o funcionamento dos ecossistemas.
Tendo em vista esta conectividade e inter-relação dos bens ambientais, qualquer política destinada a implementar a conservação da natureza, que objetive e considere isoladamente o elemento a ser preservado, está fadada ao insucesso.
Em relação à proteção das fronteiras das áreas protegidas, constata-se que o início da percepção a respeito da importância destas regiões se deve aos grandes mamíferos que, diante de sua extensa mobilidade, não estavam se adequando aos limites estabelecidos na criação do Yellowstone National Park, se tornando presas fáceis de caças externas, fazendo surgir, no ano de 1882, movimentos favoráveis para o aumento dos limites do Parque, iniciativa que, a princípio, não obteve resultado. [10]
Nos anos seguintes, iniciaram-se discussões nos EUA acerca da necessidade de se aumentar os limites do Crater Lake National Park, já que seus fronteiras precisavam abranger uma área de proteção para que cervos e antílopes passassem o período do inverno.[11]
A mesma problemática foi constatada quanto a alces e ursos pardos, pois os limites de Yellowstone não eram suficientes para prover um refúgio durante o ano todo para estes animais, o que culminou em 1930, com a recomendação de criação de zonas de amortecimento – buffer zones, tendo em vista que as estratégias de conservação estavam truncadas em razão da caça externa ou em decorrência das modalidades de uso das propriedades existentes no entorno do da área protegida.[12]
Aos poucos, a idéia de preocupação com as adjacências de espaços especialmente protegidos evoluiu, tendo como base estudos, principalmente na área de biologia da conservação, que constataram o reflexo de efeitos externos sobre as condições do ecossistema no interior da área, identificando diversas fontes portadoras desta potencialidade, como por exemplo, as pressões de caça, exploração florestal, poluição industrial ou derivada da utilização de agrotóxicos, as conseqüências do uso do fogo nas propriedades vizinhas, a especulação imobiliária, além dos malefícios provocados por invasões de plantas e insetos exóticos ao ecossistema protegido.
O termo zona de amortecimento passou a ser amplamente utilizado após a criação do programa MAB (Man and Biosphere) da Unesco por volta de 1970, onde se lançou o conceito de Reserva da Biosfera, a qual estabelecia dentro das espécies de zoneamento de sua área, uma região com a mencionada denominação.[13]
Desta maneira, as Reservas de Biosfera propunham uma conciliação entre uma zona central de preservação com uma zona de amortecimento, onde seria possível a realização de determinadas atividades que não pusessem em risco a área protegida, sendo que, posteriormente, adicionou-se à reserva da biosfera, uma outra região denominada de zona de transição.
No Brasil, o primeiro documento legal a esboçar uma certa preocupação quanto ao entorno de áreas especiais foi a Lei nº 5197/67, que em seu art. 10, alínea f, estabelecia a distância de 5 km nos terrenos adjacentes a estabelecimentos oficiais e açudes de domínio público, onde a utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha de espécimes da fauna silvestre era proibida.
Em 1981, com a edição da Lei nº 6.902, que trata da criação de estações ecológicas e de áreas de proteção ambiental, estabeleceu-se, em seu art. 3º, que nas áreas vizinhas às estações ecológicas deveriam ser observados cuidados a serem estabelecidos em regulamento visando a proteção da biota local.
Posteriormente, o art 27 do Decreto n° 99.274/90, estabeleceu que nas áreas circundantes das unidades de conservação, num raio de 10km, qualquer atividade com a potencialidade de afetar a biota ficará subordinada às normas editadas pelo CONAMA.
Ainda no mesmo ano, regulamentando o referido Decreto, a resolução n° 13 do CONAMA, de 6 de dezembro de 1990 passou a estabelecer normas relativas ao entorno das unidades de conservação, mencionando que num raio de 10km, qualquer atividade que afete a biota deverá obter licença ambiental, a qual só será concedida mediante a autorização do órgão ambiental responsável pela administração da unidade de conservação.
4. As zonas de amortecimento no SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação
A Lei do SNUC, inserida no ordenamento jurídico brasileiro com o objetivo de regulamentar a previsão constitucional de obrigação do Poder Público em estabelecer espaços especialmente protegidos em seus territórios (art. 225 parágrafo 1º, III), representa uma norma geral, que determina uma estrutura organizacional de modo disciplinar da criação e gestão de áreas protegidas, reunindo e integrando numa mesma sistemática todo o conjunto de unidades de conservação existentes nas esferas federal, estadual e municipal.
No texto da Lei são elencadas as espécies de unidades de conservação, que são divididas em duas categorias distintas (art. 7º): a) as unidades de proteção integral, onde se pretende preservar e manter o ecossistema livre de interferências humanas, admitindo-se apenas o uso indireto de seus atributos naturais, não se permitindo o consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais existentes em seu interior (art. 2º, VI e IX) e; b) as unidades de uso sustentável que possuem como objetivo a conciliação da conservação da natureza com o uso sustentável de parcela de seus recursos naturais (art. 7º, parágrafo 2º).
Juntamente com os mecanismos de implementação e gerenciamento das unidades, a Lei do SNUC prevê expressamente a existência de alguns instrumentos adicionais que auxiliam a efetivação e a concretização dos objetivos de conservação da natureza, dentre eles, a zona de amortecimento, que, nos termos do art. 25, a exceção da Área de Proteção Ambiental e da Reserva Particular do Patrimônio Natural, deverá estar presente juntamente a todas as outras espécies de unidades de conservação.
Constando expressamente no texto da CDB (art. 8, e) onde se configura como compromisso dos Estados na instituição dos sistemas de conservação in situ da biodiversidade, a promoção do desenvolvimento sustentável e ambientalmente sadio das áreas adjacentes às áreas protegidas representa um reforço nas estratégias de preservação da natureza, incrementando o potencial de eficiência desta política, ampliando o âmbito da proteção ao visualizar a unidade de conservação inserida no contexto social, econômico e ecológico que a circunda.
5. Conceito e finalidades da zona de amortecimento
Definida pelo art. 2º da Lei do SNUC como a região do “entorno das unidades de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade” as zonas de amortecimento se inserem no Sistema Nacional de Unidades de Conservação com o objetivo de contribuir para a manutenção da estabilidade e equilíbrio do ecossistema garantindo a integridade da área protegida.
Como a própria definição legal deixa transparecer, a finalidade da zona de amortecimento consiste na contenção dos efeitos externos que possam de alguma maneira influenciar negativamente na conservação da unidade. Desta maneira, mesmo não prevendo expressamente como seu objetivo a proteção aos reflexos ecológicos provocados pelo entorno, destinam-se as zonas de amortecimento a minimizar as conseqüências do efeito borda, de ocorrência comum nas zonas limítrofes, estabelecendo uma gradatividade na separação entre os ambientes da área protegida e de sua região envoltória, além de impedir que atuações antrópicas interfiram prejudicialmente na manutenção da diversidade biológica.
A zona de amortecimento configura-se assim como um espaço territorial que, em virtude de sua proximidade e contigüidade em relação às áreas protegida, é afetado pelo regime especial de conservação da natureza que rege esta região, passando a possuir também, um regime diferenciado de fruição, que estabelece controle e restrições a determinadas atividades.
No entanto, mesmo se caracterizando como um espaço com restrições específicas, a zona de amortecimento não pode ser considerada como parte integrante da unidade de conservação, ficando sujeita apenas a uma espécie de zoneamento obrigatório com a regulação das atividades exercidas dentro de seus limites.[14] Há, assim, uma extensão de certas preocupações conservacionistas em relação ao entorno, ampliando o raio de alcance de proteção à natureza.
Apesar de tratar-se de termo recente na terminologia da conservação da natureza, observa-se que o conceito de zona de amortecimento, antes mesmo de ser plenamente construido já era frequentemente aplicado tendo como exemplo o caso de plantações de chá que foram cultivada ao redor das áreas de conservação no Quênia, Uganda e China, visando conter a saída dos animais selvagens que eventualmente deixavam a floresta.[15]
Neste sentido, Ebregt e De Greve constataram que o pensamento conceitual a respeito das zonas de amortecimento, percorreu 3 fases de distintas desenvolvimento. No primórdio era utilizada para proteger pessoas e plantações de animais que se afastavam das áreas protegidas. Posteriormente, as zonas de amortecimento passaram a ser direcionadas à proteção das áreas de conservação das atividades e intervenções humanas. Já em sua concepção contemporânea são freqüentemente aplicadas para simultaneamente, minimizar o impacto humano na unidade protegida, bem como, servir como região para a transferência das necessidades sócio-econômicas das populações tradicionais afetadas pela criação da área.[16]
Assim, acompanhando a evolução conceitual, constata-se que as zonas de amortecimento foram gradualmente passando a serem consideradas mais como um conceito sócio-econômico do que somente uma área geograficamente delimitada com restrições ao uso dos recursos.[17]
Analisando a falta de uma definição clara a respeito das zonas de amortecimento, Martino acredita que esta se deve a dúplice tarefa destas zonas, as quais devem conciliar conservação com desenvolvimento, pois embora a meta principal seja a proteção da biodiversidade, deve-se harmonizá-la com a criação de benefícios para a população local.[18]
Este é um dos fundamentos para que não se considere a zona de amortecimento como parte da unidade de conservação já que a sua dupla perspectiva busca estabelecer na região do entorno, a subsistência dos objetivos de conservação conciliados com o exercício de atividades socioeconômicas que não prejudiquem as condições ambientais da unidade e que permitam a sobrevivência cultural dos modos de agir, viver e se manifestar das populações tradicionais.
A própria menção existente no texto da CDB quanto a implementação do desenvolvimento sustentável nas adjacências da área protegida revela a concepção existente no instrumento internacional sobre a necessidade de se visualizar esta região como espaço de integração das práticas de conservação com a proteção ao modo de vida das comunidades locais, garantindo a geração de benefícios socioambientais.
6. Considerações finais
Os avanços no campo da biologia da conservação possibilitaram a constatação de que ecossistemas e espécies inseridos em áreas protegidas delimitadas pelo Poder Público podem ser afetados por efeitos externos, de ordem ecológica ou de natureza humana, dando origem às preocupações a respeito da necessidade proteção ao entorno destas áreas.
Devido às características do meio ambiente, marcado pela indivisibilidade e interdependência de seus elementos, a conservação da biodiversidade por meio da instituição de unidades de conservação requer um enfoque sistêmico, não podendo ser vislumbradas como ilhas, apartadas do contexto ecológico e socioeconômico que as circunda.
O art. 225, da Constituição, reconhece a rede de influências que caracteriza o objeto protegido, gerando o imperativo de se estabelecer medidas efetivas para a conservação da biodiversidade por meio de instrumentos que acompanhem o funcionamento dos ecossistemas, respaldando, assim, a criação das zonas de amortecimento ao redor das UCs.
A zona de amortecimento consiste em um espaço com restrições específicas funcionando como mecanismo acessório e adicional que se destina a conter os efeitos externos que possam influenciar negativamente na conservação da unidade.
Não podendo ser considerada como parte integrante da unidade de conservação a zona de amortecimento se destina a uma dupla perspectiva, buscando estabelecer na região do entorno, a subsistência dos objetivos de conservação conciliados com o exercício de atividades socioeconômicas, permitindo a sobrevivência cultural das populações tradicionais.
Informações Sobre os Autores
Gabriel Luis Bonora Vidrih Ferreira
Mestre em Direito Ambiental pela UEA. Doutorando em Direito PUCSP. Professor do Curso de Direito da UEMS
Priscila Mari Pascuchi
Advogada, mestre em Direito Ambiental pela UEA – Universidade do Estado do Amazonas.